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Rose/Stradlin: Em Qualquer Realidade

Summary:

Uma coleção de one-shots independentes onde a paixão entre Axl Rose e Izzy Stradlin é a única constante através de realidades, tempos e estilos de vida diferentes. Cada capítulo é uma história completa. Leia na ordem que preferir!

Notes:

Aviso:Esta história é uma ficção e não tem a intenção de ofender nenhum dos membros da banda Guns N' Roses

✨ Oi, gente! Tudo bem com vocês? ✨

Trago uma novidade super especial: nossa fanfic agora virou uma COLETÂNEA! 💫

Isso significa que cada capítulo é uma historinha independente e completa sobre Axl e Izzy! 😊

🎵 CAPÍTULO1: "Fita Demo Proibida" (Já postado!) foi EXPANDIDO e ATUALIZADO!

🚌🌴 CAPÍTULO2: " Verdade ou Desafio no Inferno Verde"

🔧 CAPÍTULO 3: "O Mecânico e o Rockstar"

👻 CAPÍTULO 4: "Avisos de Sangue"

💔🔥 CAPÍTULO 5: “ O Amante que Nunca Fui”

❤️‍🩹 🕊️ CAPÍTULO 6 " Marcas Do Passado"

🌧️💔 CAPÍTULO 7 " O Dia Em Que O Céu Desabou"

💉🦋👥CAPÍTULO 8 NOVO!!!! " O Reflexo No Vidro"

🌊⚓CAPÍTULO 9 NOVO!!!!! " A Maré E A Âncora"

 🏚️🎸🚬⚡CAPÍTULO 10 ( EM BREVE!!) " Um Apartamento em Los Angeles"

🌀⏳💊 CAPÍTULO 11 ( EM BREVE!!!) " Viagem no Tempo"

Agora você pode ler na ordem que quiser! 💖

Espero que curtam muito essa nova fase!
Amo escrever para vocês! 🥰💙💙💙

 

Beijos e até logo! 😘

Chapter 1: Gemidos e Notas Altas

Summary:

A noite em que a tensão sexual no estúdio criou não apenas um hino do rock, mas um segredo que poderia destruir tudo.

Notes:

Oi pessoal! 💖

Este é o capítulo que deu origem a tudo! A clássica e proibida "Fita Demo", agora expandida e mais quente que nunca!

Avisos/Tags do capítulo:
Estúdio de Gravação Making of Rocket Queen Gravação Secreta Posse Ciúmes Sexo Explícito Segredos e Mentiras

Atenção: cenas intensas de poder e submissão pela arte! 🎤🔥

PS: Quem já leu antes vai encontrar +5.000 palavras NOVAS de pura tensão!

Comentem qual foi a cena que mais pegou fogo! 😉

Chapter Text

Los Angeles, Estúdio de Gravação – Madrugada de 1988

A sala de controle fedia a café velho, nicotina e a um inconfundível cheiro agridoce de Jack Daniel's. Eram quatro da manhã, e a escuridão do lado de fora parecia ter invadido o estúdio, deixando apenas as luzes vermelhas e amarelas dos consoles acesas, criando um cenário claustrofóbico e íntimo.

Oficialmente, o resto da banda – Duff, Slash e Steven – haviam desistido há horas, arrastados pela exaustão. Mas a sessão não terminara, pois para Axl Rose e Izzy Stradlin, o trabalho raramente parava, especialmente quando havia uma melodia incompleta ou uma garrafa de uísque.

Axl estava sentado na grande cadeira de couro em frente à mesa de mixagem Neve, com os dedos nervosamente tamborilando sobre os faders. Ele usava uma regata branca, e o suor da garganta na qual ele berrava as melodias estava quase seco.

Izzy, mais contido, estava do outro lado do vidro na sala de gravação principal. Ele tinha tirado a camisa pesada de flanela, deixando à mostra um torso magro e nervoso. Seus olhos estavam semicerrados, focados na harmonia que ele dedilhava repetidamente em sua Les Paul Sunburst, sem amplificador, apenas o som da madeira oca. Ele era o contraste perfeito de Axl: calmo onde Axl era fogo, silêncio onde Axl era grito.

"De novo, Stradlin," Axl sibilou pelo microfone de talkback, a voz rouca. "O groove está morrendo na ponte. Precisa daquele veneno. O seu veneno."

Izzy soltou um bufo, mas obedeceu. Ele amava odiar a obsessão implacável de Axl por aquela perfeição. A música era um rascunho de algo pesado e sinuoso – o que mais tarde se tornaria "Rocket Queen".

Ele reiniciou o riff. Os dedos longos e finos de Izzy deslizavam pelo braço, a melodia carregada de uma melancolia suja, a cara de Izzy debaixo do cabelo longo.

Axl fechou os olhos. Ele não precisava ver a notação musical; ele precisava sentir. Ele se inclinou para frente no console, quase em transe.

"Sim. Isso," ele murmurou. "Agora adicione a distorção. Me dê o desespero."

Izzy pegou a garrafa de Jack Daniel's deixada no chão da sala de instrumentos, tomou um gole longo, e a colocou de volta. Ele chutou o pedal.

A sala de controle foi instantaneamente inundada pelo som da Les Paul rugindo. O riff de Izzy não era agressivo como o de Slash; era mais calculista, mais sedutor, como um convite perigoso.

Axl se levantou, incapaz de ficar parado. Ele abriu a porta da sala de controle e se encostou no batente, observando Izzy.

"Mais! Deixe-o sangrar, Izzy!"

Izzy parou abruptamente. Ele largou o violão, que pendurou no corpo pelo strap. Ele estava cansado de obedecer.

"Eu te dei o que você pediu. Trinta vezes," Izzy disse, e mesmo que o talkback estivesse desligado, a voz dele ecoou na sala de gravação, clara e cansada.

Axl pegou o copo de uísque e deu um gole, o gelo estalando. "Você pode fazer melhor. Você sempre pode fazer melhor. É por isso que você está aqui, e os outros não. Porque você sabe disso."

"Eu não estou aqui," Izzy respondeu, tirando os headphones. "Eu nem sei se sou aqui. Eu só estou... tocando."

Axl empurrou a porta de vidro para se juntar a Izzy na sala de gravação. O ar aqui era mais frio, saturado de pó e poeira do carpete velho.

"Você sabe que a banda é a nossa desculpa, Izzy," Axl disse, caminhando lentamente em torno dos equipamentos. "É o nosso disfarce para fazer esse tipo de coisa. Ficar acordado, fedendo, fazendo a única coisa que tem algum sentido. Criar."

Ele parou bem na frente de Izzy. A proximidade era imediata, a bolha de segurança de Izzy invadida.

"Eu sinto a música. Ela está crua. Mas eu preciso que você me mostre o que está na sua cabeça. Não o que está na sua mão. O que você sente quando toca isso?" Axl estendeu a mão, e em vez de tocar a Les Paul, ele tocou o peito de Izzy, logo acima do coração.

Izzy o empurrou para longe, mas não com força o suficiente. Era mais um aviso do que uma rejeição. "É um groove, Axl. Não é uma poesia existencial. É uma batida."

"Não minta," Axl retrucou, o tom dele aumentando, mas não em raiva, e sim em uma intensidade perigosa. "Você só toca assim para mim. Para os outros, você se esconde. Você me dá a sua alma. Eu sei."

Izzy pegou a garrafa de Jack, mas Axl a tomou dele. "Chega de bebida. Você precisa estar limpo para isso."

Axl colocou a garrafa no chão, longe do alcance de ambos. O silêncio tomou conta do estúdio. Agora, o único som era a respiração de Axl, irregular e pesada.

Izzy olhou para as luzes vermelhas que piscavam no display de gravação na sala de controle. "Eu tenho uma ideia," ele finalmente disse, ignorando a invasão de Axl. "O segundo verso. A batida no violão precisa ser mais rápida, mais urgência."

"Mostre," Axl exigiu.

Izzy não tinha amplificador ou cabos, e o estúdio era grande demais. Ele hesitou. "Eu não consigo. Você não vai ouvir a nuance da mão."

Axl, com uma decisão repentina, pegou a cadeira de rodinhas do piano e a arrastou para a frente da mesa de mixagem. Ele se sentou e bateu na perna, impaciente.

"Eu não vou sair daqui. Eu sou o ouvinte. Venha. Me mostre no violão."

Izzy hesitou por mais um momento. O convite era direto e inocente do ponto de vista musical. Mas ele sentia o calor de Axl, a maneira como os olhos dele brilhavam no escuro, o perigo que ele representava.

Ele finalmente cedeu. Izzy pegou o violão. Em vez de ficar em pé, ele caminhou até Axl.

A sala de controle era pequena, e a única maneira de Axl ouvir de perto, e para Izzy mostrar o ritmo, era se aproximar.
Izzy parou atrás da cadeira de Axl. Ele inclinou o corpo para trás, apoiando as costas na parede do estúdio, mas isso ainda não era suficiente.

"Não consigo ver," Axl reclamou. "Eu preciso ver seus dedos."

Izzy soltou um suspiro, cheio de exasperação. Ele olhou para a porta de saída, para a escuridão. Não havia escapatória.

Ele deu um passo à frente, montando na cadeira de Axl. Izzy não estava sentado no colo de Axl, ele estava mais para a lateral, equilibrando-se nos apoios de braço da cadeira de couro, com o quadril apoiado na lateral da coxa de Axl, e o violão acústico pressionado contra o peito de Axl.

Agora, eles estavam em perfeita proximidade. Axl podia ver as mãos de Izzy e sentir o calor do seu corpo magro através do tecido fino da calça jeans. A respiração de Izzy roçava a orelha de Axl enquanto ele se inclinava para mostrar a batida.

Izzy começou a tocar. Seus dedos eram rápidos e precisos, o novo ritmo entrando no ar.

Axl não ouvia a música. Ele sentia o tremor do violão contra seu peito, o cheiro de tabaco e a pele quente de Izzy.

"Não," Axl sussurrou, a voz profunda e rouca, as mãos pousando firmemente na cintura de Izzy, como se estivesse segurando-o para garantir a estabilidade da cadeira. "O ritmo está certo. Mas não pare. Me mostre a intensidade, Izzy."

Os olhos de Axl se fecharam novamente. Ele estava pressionando os quadris para perto, e o toque das mãos na cintura de Izzy não era mais de suporte, mas de posse.

Izzy parou de tocar. O violão caiu em seu colo.

"Axl," Izzy disse, a voz quase inaudível, mas cheia de aviso.

Axl abriu os olhos, com a visão perigosamente focada.

"Ninguém está aqui. Só você e eu. Você sabe disso."

Axl moveu uma das mãos de forma lenta e deliberada, apertando a cintura de Izzy e puxando seu quadril ainda mais para perto. Ele inclinou a cabeça para trás, olhando para o rosto de Izzy.

"O que você quer, Axl?"

"Você sabe o que eu quero. É o mesmo que você quer," Axl respondeu, a voz perigosamente baixa. Ele moveu a mão, deslizando-a de baixo da regata branca de Izzy, a pele fria encontrando a pele quente.

Izzy se inclinou, jogando o violão desajeitadamente para o lado, onde ele bateu no braço do sofá. Ele não se afastou. Em vez disso, ele jogou o corpo para frente, as mãos nos braços da cadeira, prendendo Axl. Ele estava com raiva, mas com uma raiva que era quase atração.

Axl sorriu. Triunfante.

Izzy fechou a distância, roubando o fôlego de Axl com um beijo que era mais uma mordida. As bocas se encontraram com a urgência de meses de tensão acumulada. A língua de Izzy invadiu a boca de Axl, explorando cada centímetro. Axl respondeu com a mesma intensidade, aprofundando o beijo.

Axl agarrou Izzy pela cintura e o puxou com força em direção ao velho sofá encostado na parede do estúdio, onde as almofadas afundavam com o peso da história e do cansaço.

Izzy tropeçou junto, o corpo colidindo com o de Axl, os dois caindo sobre o couro gasto. As mãos de Axl subiram pelas costas de Izzy, agarrando o tecido fino do jeans, puxando-o para mais perto, como se quisesse fundi-los.

Izzy começou a puxar a camiseta de Axl, os dedos tremendo levemente, como se cada movimento fosse uma decisão difícil. Axl ergueu os braços devagar, deixando que Izzy o despisse. A camiseta caiu no chão, esquecida.

Izzy passou as mãos pela barriga de Axl, sentindo o calor da pele, os músculos tensos sob o toque. Ele olhou para o rosto de Axl, procurando alguma hesitação — mas só encontrou desejo.

"E se alguém aparecer?" Izzy perguntou, a voz baixa, quase um sussurro.

Axl sorriu, os olhos semicerrados. "Então eles vão ouvir o que é real."

Sem esperar resposta, Axl abaixou a cabeça e afundou o rosto no pescoço de Izzy, beijando com intensidade, mordendo com precisão. Izzy soltou um gemido abafado, tentando conter o som contra o ombro de Axl.

"Não," Axl murmurou contra a pele quente. "Não esconde. Eu quero ouvir você."

As mãos de Axl desceram pelas costas de Izzy, alcançando a cintura, passando pela calça jeans. Ele começou a abrir o botão com lentidão, como quem saboreia cada segundo.

O som seco do zíper descendo pareceu ecoar no estúdio vazio. O tecido caiu, e o sorriso malicioso surgiu nos lábios de Axl.

"Você está sem cueca…," ele soltou, em tom baixo, carregado de provocação.

Izzy virou o rosto de lado, tentando manter a calma, mas as bochechas ardiam em um vermelho que o traía.

"Cala a boca, Axl…," resmungou entre dentes, sem encarar de imediato.

O cantor não obedeceu. Ao contrário, aproximou-se de repente, colando a boca na dele. O beijo foi urgente, quase brutal, e Izzy não conseguiu se conter: correspondeu, os dedos deslizando nervosos pela nuca do ruivo, puxando-o para mais perto.

Quando Axl se afastou um instante, o olhar dele era intenso, quase perigoso. Passou a ponta dos dedos devagar pelo rosto de Izzy, contornando-lhe a mandíbula, como se estivesse decorando cada traço. Depois, o polegar roçou a linha dos lábios dele, testando a resistência. Izzy o olhava de volta, os olhos semicerrados, mas cheios de algo que misturava desafio e rendição.

Então Axl forçou um pouco mais, empurrando dois dedos contra a boca dele. Izzy hesitou por um segundo, antes de abrir os lábios, deixando-o entrar. O silêncio do estúdio foi quebrado apenas pelo som úmido quando Izzy começou a chupar os dedos de Axl, lento, provocativo apesar da vergonha que queimava em suas bochechas.

Axl não desviava os olhos, e a tensão entre os dois parecia vibrar no ar. Izzy chupava os dedos dele como se cada movimento fosse um desafio, mas o rubor intenso no rosto denunciava o quanto estava entregue.

Axl deixou a outra mão escorregar pela barriga lisa de Izzy, os dedos descendo até alcançar o membro rígido. Ele o envolveu com firmeza, arrancando um arquejo imediato. O movimento começou lento, mas seguro — a palma deslizando, o punho subindo e descendo, marcando um ritmo que Izzy não conseguiu resistir.

O polegar pressionava contra a glande, espalhando o líquido que já escorria, e cada passada fazia Izzy estremecer. O som que escapava da garganta dele era abafado, porque os dedos de Axl ainda estavam em sua boca. Izzy os chupava com força, a língua enrolando em torno deles, gemendo contra a pele, os olhos semicerrados encarando os de Axl em desafio e rendição ao mesmo tempo.

Axl, naquele momento de caos, estendeu a mão na escuridão. O console de gravação estava ali, a poucos metros. No calor do momento, ele sentiu o toque do botão.

REC.

Ele pressionou levemente. A pequena luz vermelha de gravação acendeu, quase invisível na penumbra. O microfone do talkback, que estava aberto, captou tudo — a respiração entrecortada, os gemidos abafados que Izzy tentava esconder no pescoço de Axl, o som do atrito do couro e do tecido, o ritmo sujo dos corpos se encontrando.

As pernas dele cederam, se fechando ao redor da cintura de Axl, puxando-o para mais perto, como se quisesse arrastá-lo para dentro de si. O quadril se arqueava instintivamente, pedindo mais fricção, mais pressão.

Axl se inclinou, o sorriso perverso roçando nos lábios de Izzy, e sussurrou com voz rouca, mal contida pelo prazer:

"Olha só pra você… tão bonito assim, gemendo pra mim… Minha querida."

Izzy fechou os olhos, as bochechas queimando de vergonha e desejo misturados, mas o corpo se entregava sem trégua.
Axl retirou os dedos da boca dele lentamente, observando o fio de saliva que se rompeu quando os afastou. Depois levou a mesma mão ao rosto de Izzy, passando o polegar pelos lábios inchados, marcados pelas mordidas.

"Quero você todo pra mim… agora," a voz dele saiu como uma ordem.

Izzy sentiu o corpo inteiro estremecer. Ele não respondeu com palavras, apenas puxou Axl de volta para um beijo desesperado, ofegante, como se não houvesse mais nada no mundo além daquele momento.

Axl deixou a mão deslizar pela pele quente de Izzy, os dedos ainda úmidos da saliva dele. Desceu devagar até encontrar a entrada apertada, e naquele instante Izzy interrompeu o beijo, soltando um suspiro trêmulo. A cabeça caiu para trás no encosto do sofá, expondo o pescoço alvo.

Axl aproveitou. Colou a boca ali, mordendo e beijando, deixando marcas enquanto apenas roçava os dedos na entrada. O toque era provocação pura — pressionava, circulava, mas não cedia logo.

Quando finalmente empurrou o primeiro dedo, o corpo de Izzy arqueou inteiro, e um gemido alto escapou, ecoando pelo estúdio vazio.

"Isso...," Axl murmurou contra a pele, a voz rouca e satisfeita.

O movimento se repetiu: entrando, saindo, cada vez mais fundo, até que Izzy se contorcia sob ele, tentando acompanhar o ritmo. Quando Axl acrescentou um segundo dedo, o gemido de Izzy foi mais grave, quebrado. O terceiro dedo o fez perder qualquer controle — as coxas tremeram contra a cintura de Axl, e quando ele atingiu um ponto mais profundo, Izzy deixou escapar um grito involuntário, quase doloroso de tão intenso.

O som surpreendeu até Axl, que parou por um instante só para olhar o rosto dele, suado e entregue.

"Porra, Izzy… você não sabe o quanto eu gosto de te ouvir assim."

Izzy apertou os olhos, mordendo o lábio inferior, até sussurrar entre respirações pesadas:

"P-para… por favor… eu quero você… quero você dentro de mim."

Axl obedeceu sem hesitar. Se ergueu rápido, desfazendo o zíper da própria calça, baixando o tecido até se livrar dele. O corpo dele surgiu inteiro — pele iluminada pela fraca luz do estúdio, músculos tensos pelo desejo, e o membro duro, vermelho, pulsando, já marcado pelo pré-gozo.

Izzy o encarou com as bochechas vermelhas, o peito subindo e descendo em desespero. Por um instante, parecia que queria desviar o olhar, mas não conseguiu.

Axl voltou para cima dele, retomando o beijo com uma força quase brutal, misturando saliva, desejo e urgência.
Axl se moveu, a ponta do pau entrando com lentidão, encontrando resistência. Izzy respirou fundo, o corpo tenso, mas não recuou. Axl esperou, sentindo a pele quente e apertada envolvendo-o, e então, com um gemido rouco, empurrou mais fundo.

O estúdio se encheu de sons crus: a respiração acelerada, o rangido do sofá, o atrito das peles. Izzy tentou erguer uma mão para abafar a própria boca, mas Axl prendeu os pulsos dele contra o estofado, acima da cabeça, segurando firme.

"Não," a voz de Axl era um comando, quente no ouvido dele. "Eu quero ouvir você. Quero todo esse som só pra mim."

Os gemidos de Izzy ecoavam, cada vez mais altos, quebrando a pose de indiferença que ele tanto tentava manter. Axl olhava para ele como se quisesse gravar cada expressão, cada tremor, cada entrega.

Axl se moveu, a penetração lenta, mas firme. Izzy sentiu a ponta dura preencher, esticando-o, e um gemido curto escapou: “ah…”. Axl esperou, aproveitando a sensação de Izzy se adaptando, antes de empurrar mais fundo.

"Ah, porra…," Izzy gemeu, a voz embargada, enquanto Axl preenchia-o por completo. O corpo dele se arqueou, as unhas fincadas no estofado.

Axl começou a se mover, lento a princípio, aproveitando cada centímetro, cada reação. Os gemidos de Izzy se intensificaram, intercalando curtos e longos: “hnn…”, “aaahh…!”, “Ax…”. A cada estocada, o prazer se tornava mais intenso, a entrega mais completa.

"Gosta disso, meu amor?," Axl perguntou, a voz rouca, enquanto acelerava o ritmo.

Izzy não respondeu com palavras, apenas com gemidos, a respiração pesada, o corpo convulsionando sob o dele. A cada movimento, a sensação de preenchimento e prazer se intensificava, levando-o ao limite.

Axl aumentou a velocidade, a intensidade, e os gemidos de Izzy se tornaram mais desesperados, mais quebrados: “a-ahhhhnn…”, “aaahh…!”, “a-ahhhhnn…”. O corpo dele tremia, as pernas se fechando e abrindo, em busca de mais contato.

O clímax se aproximava, e Axl sentiu a própria excitação aumentar. Ele se moveu com mais força, mais profundidade, e Izzy gritou, um grito longo e agudo, quando o prazer o dominou por completo.

"A-ahhhhnn…!," Izzy gritou, a voz rouca, enquanto o corpo dele se contorcia.

A cada estocada, Izzy se contorcia, as unhas cravadas no estofado. Axl aumentou o ritmo, a intensidade, e os gemidos de Izzy se transformaram em gritos abafados, cheios de prazer e dor. O suor escorria pelos corpos, grudando-os, e o cheiro da excitação preenchia o ar.

Axl se moveu com força, a boca colada ao pescoço de Izzy, mordendo e beijando, enquanto as mãos exploravam o corpo dele, acariciando, apertando, provocando. Izzy se entregou, o corpo respondendo a cada toque, a cada movimento, a cada gemido.

A intensidade aumentou, o ritmo frenético, e a sensação de prazer se tornou quase insuportável. Izzy sentiu o corpo tremer, a visão turva, e um grito agudo escapou de seus lábios. Axl o acompanhou, a respiração pesada, o corpo em êxtase.

O clímax chegou, e o estúdio foi tomado por gemidos, suspiros e o som da pele contra pele. Axl se entregou, sentindo o prazer percorrer cada célula do corpo, e Izzy o acompanhou, a alma em chamas.

A respiração de ambos se acalmou lentamente, o corpo ainda trêmulo. Axl se afastou, mas não completamente, os olhos fixos em Izzy, que respirava fundo, o rosto corado, os lábios inchados.

"Você… você é lindo," Axl sussurrou, a voz rouca.

Izzy sorriu, um sorriso fraco, mas verdadeiro. "Você também."

Axl se virou, esticando o braço para o console de mixagem e, com um movimento silencioso, pressionou o botão stop. O pequeno clique foi engolido pelo silêncio pós-clímax, imperceptível para Izzy, que ainda estava perdido no torpor.

As luzes do estúdio já pareciam mais baixas, e a madrugada pesava no ar. O silêncio depois de tudo era denso, só quebrado pelo respiro ainda acelerado de Izzy e o riso contido de Axl, como se aquele espaço inteiro fosse cúmplice deles. Por alguns minutos, ficaram apenas largados no sofá, o cheiro de cigarro e suor misturado, o calor do outro ainda grudado na pele.

Axl se levantou calmamente, beijou a testa de Izzy, e vestiu suas calças como se estivesse apenas terminando uma longa sessão de ensaio. Izzy se encolheu no sofá, nu e exposto, sentindo o frio do couro e o peso da intimidade que era apenas deles. Axl pegou o copo vazio.

"Melhor irmos. Amanhã teremos que regravar aquela ponte. Mas o refrão... está ótimo."

Axl sorriu, um sorriso pequeno, mas com um brilho malicioso nos olhos. Ele se inclinou, pegou a camiseta amassada de Izzy e a jogou sobre o torso nu dele.

Izzy agarrou o tecido e o puxou, cobrindo-se apressadamente. Ele se sentou, lutando para vestir as calças, tropeçando na própria roupa. A pressa dele apenas divertiu Axl.

"Você não tem que se apressar tanto," Axl murmurou, aproximando-se novamente. Ele se abaixou e, num gesto surpreendentemente íntimo, puxou o zíper da calça de Izzy e a ajustou na cintura dele. Seu hálito quente roçou a orelha de Izzy. "Afinal, você já me deu tudo que eu precisava por hoje, Rainha."

Izzy sentiu o rosto queimar instantaneamente com o apelido e a referência clara à sua entrega. Ele empurrou Axl com o ombro, o rosto em brasa.

"Não foi grito, foi nota alta, Axl," Izzy retrucou, a voz rouca pela exaustão, mas carregada de ironia. "E você não estava afinado, como sempre."

Axl riu, um som rouco e satisfeito. "Eu sei," ele respondeu, com aquela certeza inabalável. Ele estendeu a mão para Izzy, não em um convite gentil, mas em uma ordem silenciosa para que se levantassem.

Izzy demorou um segundo, mas acabou aceitando a mão, deixando-se puxar para fora do sofá. Eles saíram da sala de controle juntos. No corredor estreito, os passos eram lentos, quase em silêncio. A mão de Axl pousou por um instante na cintura de Izzy, a posse exibida para ninguém, mas sentida por tudo.

Do lado de fora, a noite ainda dominava Los Angeles, com o ar frio contrastando com o calor que ainda queimava nos corpos deles.

Izzy acendeu um cigarro, olhando para o nada enquanto Axl o observava de canto de olho, aquele sorriso satisfeito estampado no rosto. Nenhum dos dois falou sobre o que tinha acabado de acontecer — como se o silêncio fosse a forma mais segura de guardar aquilo só para eles.

Quando chegaram até o carro, Axl abriu a porta com um gesto exagerado de cavalheiro. Izzy soltou uma risada curta, sacudindo a cabeça.

"Você é um idiota," comentou Izzy, entrando.

"Eu sei," respondeu Axl, com aquela certeza desconcertante, entrando logo em seguida.

E, no fundo, Izzy sabia também. Sabia que aquele idiota ainda ia lhe dar muita dor de cabeça. Mas, por ora, deixou-se afundar no banco, tragando devagar, enquanto a cidade adormecida os recebia de volta.

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O carro era uma cápsula no tempo, pairando sobre o asfalto úmido de Los Angeles. O silêncio dentro dele era tão pesado que quase tinha textura. Izzy mantinha os olhos fixos na janela, os dedos tamborilando nervosamente no joelho enquanto a cidade adormecida desfilava como um filme mudo. Cada farol era um risco vermelho no vidro embaçado, cada placa de rua um testemunho mudo do que havia acontecido.

Axl dirigia com uma calma perturbadora, uma mão solta no volante, a outra apoiada na janela semi-aberta. Seus olhos, porém, traíam a serenidade postiça - eles cortavam para o lado a cada poucos segundos, devorando o perfil de Izzy na penumbra. A lembrança do corpo quente e submisso do guitarrista ainda queimava em suas mãos como uma marca de fogo.

"Você tá quieto até demais, Stradlin," a voz de Axl quebrou o silêncio como um vidro estilhaçado.

Izzy não se moveu. "Não tenho nada pra dizer."

"Depois do que a gente fez, você não tem nada pra dizer?" Axl riu baixo, um som que era mais ar do que humor. "Porra, Izzy, você gemeu no meu ouvido como se estivesse morrendo e renascendo ao mesmo tempo."

A mão de Izzy se fechou em um punho involuntário. "Cala a boca, Axl."

"Por que? Tá com vergonha?" Axl pisou suavemente no freio em um sinal vermelho e finalmente virou o rosto para ele. "Tá com medo que eu lembre como você ficou duro só com meus dedos na sua boca? Ou como você gritou quando eu--"

"Para!" Izzy se virou de repente, os olhos faiscando no escuro. "É isso que você quer? Ouvir você falando? Relembrar? Fazer o que, exatamente?"

A luz do sinal verde iluminou o sorriso lento e predatório de Axl. "Eu só quero ter certeza de que você não vai fingir que não aconteceu amanhã."

"E se eu fingir?"

"Então eu vou lembrar você," a resposta veio imediata, carregada de uma promessa perigosa. "Nota por nota, gemido por gemido. Eu tenho uma memória musical excelente, você sabe."

Izzy sentiu um calafrio percorrer sua espinha. Havia algo na forma como Axl disse aquilo que soou... específico demais. Como se estivesse se referindo a uma gravação mental precisa, não apenas a uma lembrança vaga. Ele afundou no banco, puxando a gola da jaqueta como se pudesse se esconder dentro dela.

O resto do caminho foi feito em silêncio novamente, mas desta vez carregado de palavras não ditas e ameaças sussurradas na penumbra.

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Quando chegaram no apartamento compartilhado, o cheiro familiar de cerveja velha e poeira os recebeu como um abraço sufocante. Slash havia deixado uma pilha de revistas de guitarra no chão da sala, e o sofá estava coberto por cabos e pedais. Era o caos de sempre, mas naquela noite, parecia diferente - como se o próprio ar estivesse carregado com o segredo que eles traziam consigo.

Axl trancou a porta atrás deles com um clique definitivo. O som ecoou no silêncio do apartamento como um ponto final em uma sentença não dita.

Izzy se dirigiu diretamente para o corredor que levava aos quartos, mas a voz de Axl o parou.

"Pra onde você tá indo?"

"Dormir, porra. São quase cinco da manhã."

"Tá mesmo com pressa assim pra se afastar de mim?" Axl se aproximou, seus passos quase silenciosos no carpete sujo.

Izzy respirou fundo, ainda de costas. "Axl, não começa."

"Começa o quê?" Os dedos de Axl tocaram levemente sua cintura, fazendo-o estremecer. "Eu só tô perguntando."

Finalmente, Izzy se virou. Os dois estavam tão perto que podiam sentir o calor um do outro. O corredor estreito amplificava a intimidade, criando uma bolha onde apenas eles existiam.

"O que você quer de mim?" A pergunta de Izzy saiu como um sussurro exausto.

Axl olhou para ele por um longo momento, seus olhos percorrendo cada detalhe do rosto de Izzy como se estivesse memorizando. "Eu quero que você admita."

"Admita o quê?"

"Que você quer isso tanto quanto eu." A mão de Axl subiu até o pescoço de Izzy, o polegar pressionando suavemente a linha de sua mandíbula. "Que você não vai conseguir dormir pensando em como foi, que você vai acordar hard só de lembrar da minha mão em você."

Izzy fechou os olhos, uma onda de desejo tão intensa que quase o derrubou percorrendo seu corpo. Ele estava exausto, confuso, com raiva... e incrivelmente excitado. A contradição o estava dilacerando.

"Axl..." Seu protesto soou fraco, até para seus próprios ouvidos.

"Shhh," Axl aproximou os lábios do seu ouvido. "Não fala. Só sente."

E então ele estava beijando Izzy novamente, mas desta vez era diferente - não era a fúria descontrolada do estúdio, nem a provocação do carro. Era lento, profundo, quase reverente. Suas mãos deslizaram por baixo da jaqueta de Izzy, encontrando a pele quente nas costas, puxando-o para mais perto até que não houvesse espaço entre eles.

Izzy gemeu na boca de Axl, sua resistência se desfazendo como açúcar na água. Suas mãos encontraram os cabelos ruivos, puxando com uma mistura de desejo e frustração. Era inútil lutar contra isso - contra ele. Axl sempre conseguia o que queria, especialmente quando o que ele queria era Izzy.

Eles se moveram pelo corredor como um único organismo, tropeçando na porta do quarto de Axl. Quando a cama apareceu atrás deles, era um alívio e uma condenação ao mesmo tempo.

Axl o deitou sobre os lençóis sujos com uma delicadeza que contrastava brutalmente com a violência do estúdio. Seus olhos percorreram o corpo de Izzy como se estivesse vendo uma obra de arte.

"Porra você é tão bonito," ele murmurou, suas mãos abrindo os botões da camisa de Izzy com uma paciência excruciante. "Especialmente quando para de lutar contra isso."

Izzy olhou para cima, seu peito subindo e descendo rapidamente. "Eu te odeio."

Axl sorriu, um sorriso genuíno que raramente mostrava para ninguém. "Eu sei." Ele se inclinou e beijou a clavícula de Izzy, seus lábios quentes contra a pele pálida. "Mas seu corpo me ama."

E então não houve mais palavras, apenas toques, gemidos abafados e a sensação esmagadora de dois corpos se encontrando novamente, mais lentamente desta vez, mas com uma intensidade que era, de alguma forma, ainda mais assustadora.

Enquanto Axl entrava nele, Izzy enterrou o rosto no pescoço do cantor, seus dedos apertando os ombros musculosos com uma força que deixaria marcas. Era diferente do estúdio - mais íntimo, mais consciente, mais perigoso. Porque desta vez não era sobre raiva ou frustração musical, era sobre desejo puro, e isso era infinitamente mais aterrorizante.

Axl movia-se dentro dele com uma cadência hipnótica, seus sussurros sujos e carinhosos uma trilha sonora que Izzy não queria admitir que adorava.

"Você é meu," Axl respirou em seu ouvido, suas mãos segurando os quadris de Izzy com firmeza. "Sempre foi."

E no auge do prazer, quando o mundo desabou em estrelas brancas atrás de suas pálpebras fechadas, Izzy percebeu com um choque aterrador que ele não estava apenas cedendo ao corpo de Axl, mas ao que quer que isso significasse. E que não havia volta.

Quando terminaram, ficaram deitados entrelaçados na cama suja, a luz do amanhecer começando a filtrar-se pelas frestas das persianas. O apartamento estava silencioso, o mundo lá fora ainda não havia acordado.

Axl traçou círculos lentos nas costas de Izzy, sua respiração ainda irregular.

"Então," ele disse finalmente, sua voz rouca pelo cansaço e pelo sexo. "Amanhã..."

Izzy esperou, seu corpo tensionando involuntariamente.

"...vamos terminar a música," Axl terminou, e havia uma nota de triunfo em sua voz que fez o estômago de Izzy se contrair.

Porque, eles sabiam que não era apenas sobre a música. Nunca era apenas sobre a música.

E enquanto Izzy fechava os olhos, tentando em vão dormir, em algum lugar na bolsa de equipamentos de Axl, uma pequena fita cassete continuava existindo - um segredo dentro de um segredo, uma bomba-relógio silenciosa esperando para detonar suas vidas.

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O estúdio cheirava a desinfetante barato e derrota. Três dias desde aquela noite, e "Rocket Queen" ainda não estava finalizada. A tensão na sala era palpável, diferente daquela noite - agora era pesada, carregada de coisas não ditas.

Izzy estava encostado na parede longe de todos, fumando seu quinto cigarro seguido. Seus olhos evitavam Axl com uma determinação quase física. Cada vez que o cantor se aproximava, ele se afastava, como se Axl queimasse.

"Stradlin, pelo amor de Deus, para de ficar se escondendo e vem tocar essa merda!" a voz de Slash ecoou pela sala, impaciente.

Axl, sentado na cadeira de couro da mesa de mixagem, observava Izzy com uma intensidade que beirava o doentio. Seus olhos azuis pareciam perfurar através da fumaça do cigarro, estudando cada microexpressão no rosto do guitarrista.

"Deixa ele," Axl disse, sua voz estranhamente calma. "Ele tá no processo criativo."

Duff soltou uma risada. "Processo criativo? Ele tá parecendo um fantasma desde segunda-feira. O que você fez com ele, Axl?"

A expressão de Axl não se alterou. "Nada que ele não quisesse."

Izzy sentiu as palavras como um soco no estômago. Seus dedos tremeram em torno do cigarro, e as cinzas caíram no chão. Ele finalmente olhou para Axl, e o que ele viu o deixou gelado - havia uma posse nos olhos do cantor que não existia antes, uma certeza obscena que fez o coração de Izzy acelerar com puro pânico.

Mais tarde, no apartamento, Izzy estava tentando dormir quando ouviu a porta do quarto ao lado abrir e fechar. Os passos de Axl eram inconfundíveis - pesados, decididos. Ele ouviu-os parar do lado de fora de seu quarto, e sua respiração parou.

A maçaneta girou lentamente.

"Trancada," Izzy disse no escuro, sua voz mais firme do que ele esperava.

Risada baixa do outro lado da porta. "Você acha que uma fechadura vai me impedir?"

"Vai tentar explicar pro Slash porque você arrebentou minha porta?"

Silêncio. Então: "Abre a porta, Izzy."

"Não."

"Eu não tô pedindo."

Izzy se levantou da cama, suas mãos tremendo. Ele abriu a porta apenas o suficiente para ver o rosto de Axl iluminado pela luz fraca do corredor. "O que você quer?"

Axl empurrou a porta suavemente, mas com força suficiente para fazer Izzy recuar. Ele entrou no quarto e fechou a porta atrás de si.

"Você tá me evitando."

"Surpresa," Izzy respondeu secamente.

Os olhos de Axl percorreram o quarto minúsculo - a guitarra encostada na parede, as roupas no chão, a cama desfeita. "Eu não gosto disso."

"Eu não tô aqui pra agradar você, Axl."

" Não?" Axl deu um passo à frente, invadindo seu espaço. "Parece que na segunda-feira você tava bem interessado em me agradar."

Izzy sentiu o rosto queimar. "Isso foi um erro."

"Foi?" Axl pegou a ponta do cabelo de Izzy, enrolando ao redor do dedo. "Não pareceu um erro quando você tava gritando meu nome."

"Para com isso." Izzy tentou se afastar, mas suas costas encontraram a parede.

"Por quê?" Axl sussurrou, sua boca perto demais do ouvido de Izzy. "Tá com medo de gostar demais? De precisar disso de novo?"

"Eu não preciso de você."

Axl riu, um som baixo e perigoso. "Todo mundo precisa de alguma coisa, Izzy. Eu só descobri do que você precisa."

Foi então que Izzy viu. Pendurado no cinto de Axl, meio escondido sob a jaqueta - um pequeno walkman. O mesmo walkman que Axl usava para ouvir demos. O mesmo walkman que podia tocar fitas cassete.

Seu sangue gelou.

"O que você tá ouvindo ultimamente?" A pergunta saiu mais aguda do que ele pretendia.

Axl seguiu seu olhar e sorriu, um sorriso lento e satisfeito. "Ah, só umas demos antigas. Coisas que ninguém mais ouviu." Sua mão tocou o walkman quase carinhosamente. "Tesouros particulares, você entende."

Izzy sentiu uma náusea subir em sua garganta. As peças se encaixaram com uma clareza horrível - a obsessão repentina de Axl por aquela gravação, a forma como ele parou a fita naquela noite com um movimento furtivo, a luz vermelha que ele pensou ter visto...

"Você..." a voz de Izzy sumiu. "Você não..."

"Eu não o quê, Iz?" Axl inclinou a cabeça, seus olhos brilhando com pura malícia. "Fala. Tô curioso."

Mas as palavras não saíram. Izzy só conseguia ficar paralisado, olhando para aquele walkman como se fosse uma cobra prestes a atacar.

Axl se aproximou mais, até que seus corpos quase se tocavam. "Você sabe," ele sussurrou, seu hálito quente no rosto de Izzy. "Algumas performances são tão perfeitas, caralho, que merecem ser preservadas. Para sempre."

Ele deu um tapinha no walkman e se afastou, deixando Izzy encostado na parede, tremendo e enjoado.

Na porta, Axl parou e olhou para trás. "Ah, e Izzy? Amanhã no estúdio... toca como você tocou pra mim na segunda-feira. Eu quero ouvir de novo aquele... veneno."

A porta se fechou, e Izzy deslizou pela parede até o chão, suas pernas incapazes de sustentá-lo. O quarto girava ao redor dele, e a única coisa que ele conseguia pensar era na pequena fita dentro daquele walkman, rodando, rodando, rodando... guardando cada som que ele fez naquela noite.

E pela primeira vez desde que se conheciam, Izzy Stradlin teve verdadeiramente medo de Axl Rose.

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Uma semena depois, a atmosfera no estúdio estava carregada de uma energia diferente. Depois de dias de gravações tensas, Axl finalmente declarara que "Rocket Queen" estava pronta para a mixagem final. A banda inteira estava lá - Slash, Duff, Steven, o produtor, todos aglomerados na sala de controle.

Todos, exceto Izzy.

Ele havia sumido novamente, e ninguém sabia onde estava. Só Axl parecia não se importar, ocupado demais ajustando os controles da mesa de som com um zelo quase religioso.

"Cadê o Stradlin?" Slash perguntou, ajustando a cartola."Ele devia estar aqui pra ouvir isso."

"Acho que ele tá se escondendo de novo," Duff resmungou, tomando um gole de cerveja. "Algo aconteceu entre vocês dois, Axl? Ele tá estranho até para os padrões Izzy."

Axl nem olhou para cima. "Ele vai aparecer. E quando aparecer, vai entender tudo."

Havia algo na forma como ele disse isso que fez até Slash franzir a testa. Mas antes que alguém pudesse questionar, a porta do estúdio se abriu com um estrondo.

Izzy estava parado na entrada, pálido como um fantasma, mas com os olhos queimando de uma raiva pura e rara. Ele não olhou para ninguém exceto Axl.

"Onde está?" a voz de Izzy saiu tremula, mas cortante como uma lâmina.

Axl finalmente levantou os olhos, um sorriso lento surgindo em seus lábios. "Bem-vindo de volta, Stradlin. Estávamos esperando por você."

"Onde está a fita, Axl?"

O ar na sala congelou. Slash e Duff trocaram olhares confusos.

"Que fita?" Duff perguntou.

Axl ignorou todos, mantendo os olhos fixos em Izzy. "Qual fita, Iz? Temos tantas..."

"Você sabe qual." Izzy deu um passo para dentro da sala, fechando a porta atrás de si. "A que você gravou sem eu saber. A que você anda ouvindo como um maldito pervertido."

Os olhos de Slash se arregalaram. "Peraí... que porra que vocês tão falando?"

Axl riu, uma risada baixa e perigosa. "Ah, essa fita." Ele pegou o walkman de seu cinto e o balançou suavemente. "Você quer ouvir? É uma performance incrível, realmente. Sua melhor criação, eu diria."

Izzy avançou, mas Duff o segurou. "Para com isso, cara! O que tá acontecendo?"

"Pergunta pra ele!" Izzy gritou, apontando para Axl. "Pergunta que porra ele gravou naquela noite! Pergunta por que ele tem uma fita com... com..."

Ele não conseguiu terminar, a vergonha e a raiva o engasgando.

Axl se levantou, sua expressão mudando de divertida para sombria em um instante. "Com o que, Izzy? Fala. Fala pra todo mundo o que a gente fez naquela noite. Fala como você gemeu pra mim. Como você implorou."

Um silêncio pesado e horrível caiu sobre a sala. Slash soltou o braço de Izzy, recuando um passo. O produtor pareceu querer se fundir com a parede.

"É verdade?" Duff perguntou, incrédulo.

Axl não esperou Izzy responder. "Claro que é verdade. E foi lindo. Foi a coisa mais real que essa banda já produziu." Ele olhou para Izzy com um misto de desafio e possessividade. "E eu preservei. Porque algumas coisas são grandes demais para serem esquecidas."

Foi então que Izzy perdeu o controle. Com um rugido de pura fúria, ele pulou em cima de Axl, derrubando-o sobre a mesa de mixagem. Botões voaram, faders quebraram com estalos secos.

"Você vai destruir essa merda!" Izzy gritou, tentando arrancar o walkman das mãos de Axl. "Agora!"

"Nunca!" Axl gritou de volta, lutando sob ele com uma força surpreendente. "É minha! Você é meu!"

Slash e Duff puxaram Izzy para trás, mas ele lutou como um homem possuído. "Ele gravou a gente! Ele gravou a gente transando! Essa porra tá na fita!"

Os olhos de Steven arregalaram. "Caralho..."

Axl se levantou, ofegante, o lábio sangrando. Ele endireitou a jaqueta, seus olhos agora completamente loucos. "Você quer destruir? Tá bom. Vamos destruir."

Antes que alguém pudesse reagir, ele pegou a fita do walkman e correu para o console principal. Com movimentos frenéticos, ele conectou a saída do walkman em um canal da mesa de mixagem.

"Não!" Izzy gritou, tentando se libertar. "Axl, não faça isso!"

"Todo mundo merece ouvir arte pura!" Axl gritou, seus dedos voando sobre os controles. "Vocês queriam saber por que a 'Rocket Queen' tá tão boa? É porque ela nasceu disso! Desse som aqui!"

Ele apertou play no walkman e, ao mesmo tempo, abriu todos os canais principais do estúdio.

Por um segundo, houve apenas estática. Então...

"...não, Axl... para..."
A voz de Izzy, abafada e quebrada, encheu as caixas de som do estúdio.

"Não esconde... eu quero ouvir você..."
Era a voz de Axl, rouca e implacável.

E então vieram os sons. Os gemidos. Os suspiros. O rangido do sofá. A respiração ofegante. O som úmido de corpos se movendo juntos. E no meio de tudo, a voz de Izzy, cada vez mais alta, mais descontrolada, até o grito final, agudo e vulnerável, que ecoou pela sala de controle como uma faca.

Ninguém se mexia. Ninguém respirava.

A fita continuou, com Axl sussurrando "Minha querida..." e Izzy respondendo com um gemido de rendição.

Foi Slash quem se moveu primeiro, avançando no console e arrancando os cabos com força brutal. O silêncio que se seguiu foi mais ensurdecedor que qualquer som.

Izzy estava encolhido no chão, o rosto enterrado nos joelhos, os ombros tremendo. Ele nunca parecera tão pequeno.

Axl estava em pé, o peito ainda ofegante, mas com uma expressão de triunfo horrível em seu rosto manchado de sangue. "Agora vocês sabem," ele disse, sua voz estranhamente calma. "Agora todo mundo sabe de onde veio a música."

Duff olhou para Axl como se estivesse vendo um monstro. "Você tá completamente maluco, Rose. Você destruiu ele. Você destruiu a banda."

"Eu criei algo real!" Axl gritou, de repente furioso novamente. "Algo que importa! E ele..." Ele apontou para Izzy no chão. "Ele foi parte disso! Ele deu isso pra mim!"

Foi então que Izzy se levantou. Lentamente, como se cada movimento doísse. Seu rosto estava molhado, mas sua expressão era de uma calma vazia e assustadora.

"Terminou," ele disse, sua voz não mais que um sussurro, mas cortando o ar como um grito.

Axl franziu a testa. "O quê?"

"Terminou," Izzy repetiu, olhando diretamente para Axl pela primeira vez. "O que quer que a gente tinha. A banda. Tudo. Acabou."

Pela primeira vez, uma fenda apareceu na máscara de Axl. "Izzy, espera..."

"Não." Izzy sacudiu a cabeça, um movimento lento e final. "Você cruzou uma linha. Não tem volta."

Ele virou as costas e começou a caminhar em direção à porta.

"Onde você vai?" A voz de Axl soou estranhamente jovem, quase assustada.

Izzy parou na porta, mas não se virou. "Longe de você. Para sempre."

E então ele saiu, e a porta se fechou atrás dele com um clique suave que soou mais final que qualquer golpe.

Axl ficou parado, olhando para a porta fechada, a fita ainda em sua mão - sua preciosa gravação, sua prova de posse, que de repente parecia não valer nada.

Slash olhou para Duff, depois para o produtor paralisado, e finalmente para Axl.

"Parabéns, cara," ele disse quietamente. "Você finalmente conseguiu. Matou a única coisa que importava."

E deixando Axl sozinho na sala de controle destruída, com o fantasma dos gemidos de Izzy ainda pairando no ar, eles também saíram.

Axl ficou sozinho, segurando a fita que destruiu tudo, e pela primeira vez em sua vida, o silêncio era absolutamente aterrorizante.

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LOS ANGELES - 1991

O rádio do carro tocava "Don't Cry", mas o motorista mudou de estação com um gesto brusco. "Welcome to the Jungle" explodiu pelos alto-falantes, e o homem no banco do passageiro fechou os olhos, um estremecimento quase imperceptível percorrendo seu corpo.

Izzy Stradlin olhou pela janela do táxi enquanto Los Angeles passava, uma cidade que não mudara tanto, mas que carregava um sabor amargo de fantasmas. Ele estava mais magro, os olhos mais fundos, mas havia uma paz nos seus ombros que não existia antes. A sobriedade lhe dera clareza, e a distância, sobrevivência.

O táxi parou em um semáforo, e um outdoor gigantesco olhou para ele. Era o poster do Use Your Illusion. Axl Rose, maior que a vida, envolto em couro e arrogância, seus olhos azuis ainda desafiando o mundo. Mas Izzy, que conhecia cada microexpressão daquele rosto, via a sombra lá no fundo. A loucura não era mais puro fogo; agora era um negócio, uma máquina.

Ele desviou o olhar. Alguns fantasmas eram grandes demais.

* BACKSTAGE DE UM SHOW SOLO *

Horas depois, Izzy terminara seu set em um clube pequeno, suando e satisfeito. A música era sua outra vida, sem demônios compartilhados. Ele estava arrumando sua guitarra quando um vulto familiar apareceu na porta do camarim.

Duff McKagan parecia mais velho, mas com um sorriso mais fácil. "Stradlin. Ainda sabe fazer barulho, hein?"

Izzy acenou com a cabeça, um sorriso raro surgindo. "McKagan. Tá perdido, baixista?"

"Vim te ver," Duff encostou na batente. "A turnê está um inferno. Lembra como era?"

"Lembro." Izzy não precisava dizer qual turnê. Sempre seria a turnê. A banda.

Duff ficou em silêncio por um momento. "Ele ainda ouve a fita."

O ar saiu dos pulmões de Izzy como se ele tivesse levado um soco.

"O quê?"

"Na sala dele, no ônibus da turnê. Às vezes, de madrugada." Os olhos de Duff estavam sérios. "A gente ouve o som baixinho vazando. Aquele... trecho da música. E os outros sons."

Izzy sentou-se no armário, suas pernas repentinamente fracas. Quatro anos. Quatro anos e aquele demônio ainda assombrava.

"Ele tá destruindo todo mundo, Izzy. O Slash tá a um passo de pular fora. Steven já se foi." A voz de Duff estava carregada de uma exaustão profunda. "Ele transformou a banda num circo. E aquela porra da fita é o segredo podre que ele não larga. Como se fosse a única coisa real que ele ainda tem."

"Ele devia tê-la destruído," Izzy sussurrou, olhando para as próprias mãos.

"Ele não consegue." Duff olhou para ele. "É a única prova de que ele te teve. De que algo daquilo foi real."

**NO MESMO MOMENTO - EM UM EM ALGUM LUGAR DOS EUA**

Axl Rose estava sozinho na suíte trancada, a luz azulada de um equalizador iluminando seu rosto. Nos alto-falantes de alta fidelidade, o refrão sujo de "Rocket Queen" dava lugar à parte lenta, sensual. E então, como sempre acontecia, ele baixava o volume da música e aumentava o da fita.

O estúdio vazio enchia o quarto. A respiração ofegante. O rangido do sofá.

E os gemidos.

"Axl... por favor..."

A voz de Izzy, quebrada e entregue, ecoava na escuridão. Era um som que ele não ouvia há anos, exceto aqui, nesta gravação amaldiçoada e preciosa.

Seus olhos estavam fixos no teto, vazios. A fama era um barulho ensurdecedor, uma multidão gritando seu nome, um mar de rostos. Mas nada, nada, preenchia o silêncio que Izzy Stradlin deixou para trás. A fita era seu segredo mais sujo e sua única verdade. Uma verdade que ele repetia até ela doer, como um homem cutucando uma ferida que nunca sara.

Ele a ouvia até o fim, até o último suspiro, até o silêncio final que se seguiu naquela noite. O mesmo silêncio que agora o envolvia, vasto e impiedoso.

**DE VOLTA AO CAMARIM**

Izzy se levantou, endireitando os ombros. A dor era antiga, uma cicatriz.

"Diz pra ele que eu não sou mais aquele cara na fita," Izzy disse, sua voz calma. "Aquele cara morreu naquela sala."

"Ele sabe," Duff respondeu quietamente. "É por isso que ele nunca para de ouvir."

Izzy pegou seu caso de guitarra. O passado era um país estrangeiro. Ele tinha sua própria música para fazer agora, sua própria paz para guardar.

Mas aquela noite, sozinho em seu apartamento limpo e silencioso, ele se pegou parado diante da janela, olhando para a cidade. E por um breve, torturante momento, ele jurou que podia ouvir o eco distante de um riff sujo e o fantasma de um gemido, flutuando na névoa noturna de Los Angeles, preso para sempre na melodia de uma música que o mundo todo cantava, mas que só dois homens entendiam de verdade.

O preço de um sucesso infernal. A trilha sonora de uma queda.

E em algum lugar, em um ônibus de turnê na estrada, um homem destruía tudo ao seu redor, preso em um loop eterno, tentando em vão recapturar o único momento em que sentiu que algo era real.

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LOS ANGELES - 2001

O estúdio era menor, mais íntimo, e não cheirava a Jack Daniel's, mas a café fresco e incenso. Izzy Stradlin, agora com os cabelos grisalhos nas têmporas e os olhos mais tranquilos, ajustava as cordas de uma guitarra acústica. Ele gravava um álbum solo, no seu próprio ritmo, no seu próprio controle.

Seu manager apareceu na porta. "Izzy, tem uma visita pra você. Insiste que você vai recebê-lo."

Antes que Izzy pudesse perguntar, um vulto familiar preencheu a porta. Era Axl Rose.

O tempo havia sido mais gentil com alguns do que com outros. O rosto de Axl estava marcado por anos de batalhas legais, turnês faraônicas e a solidão do topo. A fúria nos olhos havia dado lugar a um cansaço profundo. Ele segurava uma pequena caixa de metal.

Os dois homens se encararam em silêncio por um longo momento, o peso de uma década pairando entre eles.

"Stradlin," Axl cumprimentou, sua voz ainda a mesma, mas sem a aresta cortante de antes.

"Rose," Izzy respondeu, baixando a guitarra. "O que te traz ao meu covil?"

Axl deu um passo para dentro, fechando a porta suavemente. Ele olhou ao redor do estúdio simples, funcional. Um lugar para fazer música, não para guerrear.

"Eu... ouvi suas demos novas," Axl começou, hesitantemente. "Elas são boas. Honestas."

Izzy acenou com a cabeça, esperando. Ele sabia que não era só por isso que Axl estava ali.

Axl respirou fundo e colocou a caixa de metal na mesa de mixagem, entre eles. Era a mesma caixa que Izzy reconheceu instantaneamente. A caixa da fita.

"Peguei um avião pra te dar isso," Axl disse, sua voz um fio de rouquidão. "Eu... eu não consigo mais ouvi-la."

Izzy olhou para a caixa como se ela contivesse um veneno. "Por que agora?"

"Porque eu estava me tornando aquele fantasma, Izzy. Aquele homem possessivo e doente que destruiu a melhor coisa que já tive. A música... e você." A admissão saiu baixa, dolorosa, mas clara. "E eu cansei de ser um fantasma."

Os olhos de Axl encontraram os de Izzy, e pela primeira vez, não havia manipulação, nem jogo, nem triunfo. Apenas a verdade nua e crua do arrependimento.

"Eu estraguei tudo. Eu sei disso. E essa fita... ela era o símbolo de tudo que eu fiz de errado. Eu pensei que era um troféu, mas era a minha prisão."

Ele empurrou a caixa em direção a Izzy.

"Ela é sua. Destrua. Queime. Faça o que quiser. Só... me deixe ir, Iz. Depois de todos esses anos, me deixe em paz."

Izzy olhou para a caixa, depois para o rosto de Axl - não o monstro da sua memória, mas o homem cansado e quebrado à sua frente. O homem talentoso e insuportável que ele amou outrora, escondido sob as cicatrizes.

Ele não pegou a caixa imediatamente. Em vez disso, ele se virou e pegou sua guitarra acústica.

"Eu escrevi uma música nova," Izzy disse, seu dedo traçando as cordas. "É sobre... deixar coisas velhas para trás. E sobre lembrar que, antes do inferno, houve um pouco de céu."

Ele tocou alguns acordes, uma melodia simples, melancólica, mas com um fio de redenção. Era a antítese de "Rocket Queen" - não sobre posse e fúria, mas sobre libertação e paz.

Axl ouviu, seus olhos se fechando. Quando Izzy parou, o silêncio no estúdio era diferente. Não era pesado. Era limpo.

Izzy finalmente pegou a caixa de metal. Ele a segurou na palma da mão por um momento, sentindo o peso de todos aqueles anos. Então, com um movimento calmo, ele a colocou em sua mochila.

"Vou cuidar disso," ele disse simplesmente.

Era um perdão. Não em palavras grandiosas, mas em um ato de aceitação.

Axl assentiu, um peso saindo de seus ombros. Ele se virou para sair, parando na porta.

"Obrigado, Izzy," ele sussurrou. "Pela música. E por... tudo antes disso."

E então ele se foi.

Izzy ficou sozinho no estúdio. Ele não destruiu a fita na hora. Ele a guardou, não como um troféu ou um fantasma, mas como uma lembrança de uma época selvagem, de um amor complicado que, no fundo, forjou quem ele era. Uma parte da sua história que não precisava mais doer.

Anos depois, em um show beneficente, eles se encontraram nos bastidores. Não houve abraços dramáticos ou conversas profundas. Apenas um aceno de cabeça, um quase sorriso. E quando, por um acaso do destino, soaram os primeiros acordes de "Rocket Queen" na casa, Axl no palco e Izzy na plateia, seus olhos se encontraram por uma fração de segundo.

E não havia mais dor. Apenas a memória de uma chama que queimou intensamente, e o respeito silencioso pelas cinzas que ficaram.

O passado, finalmente, havia se tornado apenas música.

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LOS ANGELES - 2010 | SHOW BENEFICENTE

O backstage era um caos organizado de músicos envelhecidos, roadies apressados e o zumbido elétrico de um palco prestes a explodir. Izzy Stradlin, agora com quarenta anos bem vividos nas pontas dos dedos e no canto dos olhos, ajustava a pulseira de couro no pulso. Ele estava lá por uma causa, não por nostalgia.

Foi então que o burburinho mudou. O ar ficou carregado, como antes de uma tempestade. Axl Rose entrou no camarim coletivo, envolto em uma aura que, mesmo na mesma idade, anos, ainda comandava silêncio e respeito. Seus olhos, menos tempestuosos mas ainda intensos, varreram a sala e... pararam em Izzy.

O mundo diminuiu para aquele corredor entre eles. Dez anos. Dez anos desde aquele encontro no estúdio, desde a devolução da fita. O tempo havia suavizado as arestas, mas a atração... a atração ainda era um campo magnético.

Axl se aproximou, seus passos mais medidos, mas ainda com aquele balanço icônico.

"Stradlin," a voz dele, mais grave, ecoou baixo, só para eles.

"Rose," Izzy assentiu, um canto da boca se erguendo num quase-sorriso. "Ainda consegue assustar as pessoas ao entrar num lugar, vejo."

"É um dom," Axl retruou, um brilho familiar acendendo em seus olhos. Ele olhou para a guitarra nas costas de Izzy. "Vai tocar 'Rocket Queen' hoje?"

"Algumas músicas são fantasmas melhores do que outras," Izzy respondeu, evasivo. "Prefiro deixar a sua versão no palco."

O olhar entre eles se alongou, carregado de décadas de história não dita. A trégua que haviam firmado anos atrás ainda estava lá, mas algo mais estava fervilhando por baixo – uma curiosidade antiga, um "e se" que nunca fora totalmente respondido.

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Mas tarde, após o show, a energia do palco ainda vibrava em seus ossos. Izzy estava encostado na parede do corredor vazio dos bastidores, tomando um gole de água, quando a porta do camarim de Axl se abriu.

O cantor estava lá, sem a jaqueta de couro, apenas com uma camiseta suada colada ao torso. Seus olhos encontraram os de Izzy no corredor mal iluminado.

Sem uma palavra, Axl fez um gesto quase imperceptível com a cabeça, convidando-o para entrar.

Izzy hesitou por um segundo que pareceu uma eternidade. Então, com um suspiro que era tanto rendição quanto decisão, ele entrou.

A porta do camarim trancou com um clique grave. O ruído externo morreu. Axl Rose, o torso ainda lustroso de suor, a respiração pesada da performance, encostou Izzy Stradlin contra a parede. Seus corpos se colidiram, não como uma guerra, mas como a maré encontrando o rochedo – inevitável, antigo.

“Izzy…” a voz de Axl saiu áspera, um sussurro carregado de vinte anos de ausência. “Iz… eu… preciso.”

Izzy não respondeu com palavras. Suas mãos, calejadas e mais finas agora, subiram até o rosto de Axl. Os dedos traçaram as novas rugas, os sulcos profundos em torno daqueles olhos azuis que já comandaram multidões. “Você tá mais velho,” ele murmurou, a voz um baixo rouco e familiar.

“Você também,” Axl respondeu, capturando sua mão e enterrando o rosto na palma, inalando fundo. “E ainda é a coisa mais linda que meus olhos já viram.”

Foi quando Izzy fechou os olhos e o beijou.

Não foi um beijo de adolescente. Foi uma rendição. A boca de Axl era quente, sabia a uísque caro, a suor e a algo inerentemente dele. A língua de Axl não invadiu – explorou, reverente, como se estivesse redesenhando um território sagrado na boca de Izzy.

“Eu lembro disso,” Axl respirou, quebrado, contra seus lábios. “Porra, eu lembro exatamente do seu gosto.”

Suas mãos desceram para a camisa de Izzy. Os dedos, que outrora esmagavam microfones, tremiam levemente ao abrir cada botão. Quando o tecido caiu no chão, ele parou. A respiração faltou.

“Olha pra você,” ele sussurrou, os olhos percorrendo o torso de Izzy – mais magro, a pele mais macia em alguns lugares, marcada por tatuagens desbotadas e a história silenciosa de uma vida longe dos holofotes. “Tão lindo que chega a doer.”

Ele se ajoelhou. O som do cinto de couro de Izzy se abrindo ecoou no silêncio. O zíper desceu com um ruído áspero.

“Levanta as penas,” Axl ordenou, suave, e Izzy obedeceu, deixando que ele puxasse calças e cuecas até os tornozelos.

E então Izzy estava nu, sob a luz crua de um camarim, seu corpo de quarenta anos completamente exposto. Ele esperou pela piada, pelo comentário ácido. Em vez disso, os olhos de Axl se encheram de água.

“Cacete, Izzy,” sua voz falhou. “Você ainda é perfeito.”

Ele se inclinou e enterrou o rosto na virilha de Izzy, na curva do quadril, inalando fundo como um homem faminto. “O seu cheiro… é o mesmo. Exatamente o mesmo.”

Izzy enterrou as mãos nos cabelos ruivos, agora grisalhos, de Axl, seus dedos se contraindo quando a língua quente do cantor percorreu seu pau já rígido.

“Na cama,” Izzy ordenou, a voz mais áspera do que pretendia. “Agora. Quero te ver também.”

Axl levantou-se com um sorriso lento – aquele mesmo sorriso de garoto de Indiana que conseguia qualquer coisa. Ele levou Izzy até o sofá de couro gasto.

Sentado na beirada, Axl despiu-se. Primeiro, as botas pesadas. Depois, as meias. Então, ele puxou a própria camiseta, revelando um torso que ainda mantinha a potência, mas mais suave, mais humano. As linhas do tempo estavam ali, discretas, marcando a pele que já fora tão exposta.

“Viu?” Axl disse, os olhos fixos nos de Izzy. “Eu também não sou mais aquele menino.”

Izzy se aproximou. Suas mãos encontraram a pele quente do abdômen de Axl. “Você é melhor,” ele sussurrou, antes de se ajoelhar e, com os dentes, abrir o cinto de Axl.

O gemido que escapou de Axl foi pura, crua rendição.

Quando ambos estavam nus, ficaram de pé, frente a frente. Dois mapas de vidas vividas com excesso. Era mais íntimo do que qualquer sexo.

Axl estendeu a mão, o cansaço profundo nos olhos azuis.

"Como sempre," Izzy sussurrou, o olhar fixo no rosto de Axl. "Mas eu quero ver você. Eu preciso ver seus olhos enquanto isso acontece."

Axl o levou até o sofá. Izzy deitou-se sobre o couro frio, as pernas abertas. Axl pairou sobre ele, seus joelhos ladeando os quadris de Izzy. Ele cuspiu na própria mão, o cuspe brilhando sob a luz fraca, antes de fechar os dedos em volta do proprio pau, lubrificando-o com movimentos lentos e firmes.

“Você lembra…” Axl começou, os olhos vidrados no ponto onde seus corpos se encontrariam.

“Eu lembro de tudo,” Izzy cortou, ofegante. “Cada maldita vez.”

Axl se posicionou. A ponta do seu pau pressionou a entrada de Izzy. Ele não enfiou. Esperou. Os olhos de Izzy se arregalaram, sua boca se abriu num suspiro trêmulo.

“Agora,” Izzy implorou, os quadris se erguendo num convite arqueado.

Axl cedeu. Ele entrou num movimento único, lento, profundo, inexorável. Um grito rouco e abafado rasgou a garganta de Izzy. Seu corpo arqueou no sofá, as mãos agarrando os braços de Axl com força de desespero.

“Caralho… Axl…” ele gemeu, os olhos fechados, o rosto uma máscara de prazer e dor.

“Abre os olhos,” Axl ordenou, sua voz um rosnado baixo. “Olha pra mim.”

Izzy obedeceu. Seus olhos escuros, marejados, encontraram os azuis de Axl. Eles estavam conectados. Completamente. Axl começou a se mover. Não era frenético como nas outras vezes. Era uma cadência profunda, meditada, cada investida uma reconquista de território perdido.

“É isso?” Axl sussurrou, sua boca a centímetros da de Izzy. “É aqui que você sente mais?”

Ele mudou o ângulo, buscando, até que Izzy gritou – um som agudo, quebrado, de pura entrega.

“Aqui?” Axl repetiu, atingindo o mesmo ponto, e o corpo de Izzy estremeceu violentamente sob o dele.

“Sim! Porra, Axl, aí… não para…” Izzy suplicou, as unhas cravadas nos ombros do cantor.

O ritmo de Axl se intensificou. A pele de seus estômagos suados se colidia com um som úmido e ritmado. O sofá rangia em protesto. O ar ficou pesado, saturado com o cheiro de sexo, suor e o perfume fantasma do passado.

“Você é meu, Izzy Stradlin,” Axl rosnou, suas palavras saindo entre ofegadas. “Sempre foi. Seu corpo sabe. Sua alma sabe.”

“Seu maldito… seu… filho da puta…” Izzy gemia, cada insulto um termo de afeto, cada gemido uma confissão. Seu pau, preso entre seus estômagos, pulsava a cada investida.

Axl se inclinou, capturando os lábios de Izzy num beijo desesperado e molhado. Sua língua invadiu, dominou, enquanto seus quadris continuavam seu trabalho, metódicos, implacáveis.

“Eu te amo,” Axl confessou, a voz quebrada, o rosto molhado – de suor ou lágrimas, era impossível dizer. “Eu sempre te amei. Mesmo quando eu tava destruindo a gente.”

Foi a gota d’água. A admissão foi o gatilho. O corpo de Izzy enrijeceu num arco perfeito, um grito longo e rouco explodindo de seus pulmões enquanto ele gozava entre seus estômagos, quente e convulsivo.

O espetáculo da própria queda foi o que tirou Axl do sério. Com um rosnado gutural, ele enterrou-se fundo, uma última vez, e explodiu dentro de Izzy, seu próprio grito abafado no pescoço suado do guitarrista.

Eles desabaram juntos. Um peso úmido e ofegante de carne, ossos e vinte anos de história não dita. Muito tempo depois, ainda entrelaçados, Axl rolou para o lado, levando Izzy com ele, sem se desconectar. A respiração aos poucos se acalmou.

A mão de Axl traçou círculos lentos nas costas de Izzy.

“Fica,” ele sussurrou, era um pedido, não uma ordem.

Izzy, o rosto enterrado no pescoço de Axl, não respondeu. Mas seu braço se apertou around da cintura do cantor.

Na manhã seguinte, quando a luz real invadiu o camarim, Izzy se vestiu em silêncio. Axl o observou da cama, os olhos limpos, sem o peso de duas décadas.

“Até a próxima?” Axl perguntou, sua voz um fio de esperança.

Izzy parou na porta. Olhou para trás. Um sorriso verdadeiro, que não estampava seu rosto desde os anos 80, o iluminou.

“Até a próxima, Axl.”

A porta se fechou. Axl Rose sorriu para o teto vazio. Pela primeira vez em vinte anos, o silêncio não doía. Ele era apenas paz.

💫 Fim.

 

 

Chapter 2: Verdade ou Desafio no Inferno Verde

Summary:

1992, turnê sul-americana. Um calor úmido e opressivo. O ônibus da banda quebra no meio do nada, na fronteira entre Brasil e Argentina. Só Axl e Izzy no ônibus, esperando o reboque.

Notes:

Oi, gente! ❤️

Esse capítulo foi especialmente especial pra mim porque coloquei nossos garotos no Brasil! Escrever sobre Axl e Izzy perdidos num ônibus quebrado no meio do nada, com esse calorão que só a gente conhece, foi uma delícia.

Espero que tenham curtido essa bagunça quente, suja e eletrizante tanto quanto eu curti escrever. É incrível pensar que essa história tá rolando bem aqui, na nossa terrinha.

Beijos e até o próximo capítulo,
Sua autora que adora um rock'n'roll e uma trama picante! 😘🎸

PS: Contem pra mim: qual foi a cena que mais pegou fogo pra vocês? Os comentários de vocês são meu combustível! 💋

Chapter Text

O ar dentro do ônibus da turnê era tão espesso que dava para cortar com uma faca. Uma umidade pesada, carregada do cheiro da floresta úmida do lado de fora da janela, se infiltrava por cada fresta, grudando as roupas na pele como uma segunda pele indesejada. Eram três da manhã, e o mundo além dos vidros embaçados era uma escuridão absoluta, pontuada apenas pelos sons alienígenas de insetos e animais noturnos. Em algum lugar na fronteira entre Brasil e Argentina, o ônibus, um monstro prateado outrora imponente, agora jazia morto no acostamento de uma estrada de terra, vítima de um motor fundido.

Dentro, apenas dois ocupantes. Axl Rose, estirado em uma das banquetas de couro, a camisa aberta, o suor traçando caminhos limpos na maquiagem de palco e na poeira do dia que ainda cobria seu rosto. E Izzy Stradlin, encostado na porta traseira de emergência, fumando um cigarro com uma expressão de tédio profundo que beirava a resignação.

"Puta que pariu," Axl resmungou pela centésima vez, virando-se de lado. O couro da banqueta chiava, grudento. "Eu odeio este país. Odeio este calor. Odeio estes malditos mosquitos."

"Você odeia tudo, Rose. É sua característica definidora," Izzy retrucou, sem tirar os olhos da escuridão lá fora. Sua voz era plana, mas carregada daquela ironia seca que só ele dominava.

O silêncio retornou, pesado e opressivo. Uma hora se arrastou. Ou talvez duas. O tempo havia perdido o significado naquele vácuo úmido e quente.

"Tá," Axl disse, sentando-se de repente. Seus olhos, mesmo cansados, tinham um brilho familiar de pura travessura. "Isto é um tédio mortal. Vamos jogar um jogo."

Izzy virou a cabeça lentamente, uma sobrancelha arqueada. "Jogo?"

"Verdade ou Desafio."

Izzy soltou uma baforada de fumaça, um sorriso pequeno e cético brincando em seus lábios. "Você tem doze anos, Axl?"

"Melhor do que ficar aqui mofando. Eu começo. Verdade ou Desafio, Stradlin?"

Izzy suspirou, esmagando o cigarro no chão. " Que seja."
Verdade.."

Axl inclinou-se para frente, os cotovelos nos joelhos. "Verdade: qual foi a pior, a mais merda, a mais patética música que a gente já compôs? E não pode dizer 'nenhuma'."

Izzy não hesitou. " Anything Goes. É uma piada com um riff."

Axl riu, um som rouco e genuíno. "Porra, sim. Um lixo completo. Minha vez."

"Verdade ou Desafio, Rose?"

"Desafio. Óbvio."

Izzy olhou around pelo ônibus abafado, seus olhos pousando no pequeno bule elétrico na microcozinha. "Desafio: bebe um copo da água que tá nesse bule desde São Paulo."

Axl fez uma careta, mas se levantou. Ele pegou um copo de plástico, encheu com a água duvidosa e, com um olhar de desafio para Izzy, bebeu de um só gole. Ele arfou, engasgando levemente. "Gosto de morte e mofo. Satisfeito?"

"Imensamente." O sorriso de Izzy era um pouco mais largo agora.

"Minha vez. Verdade ou Desafio?"

"Desafio," Izzy disse, o desafio silencioso nos seus olhos.

Axl olhou para ele, seus olhos percorrendo o corpo magro e suado de Izzy, a regata colada ao torso, a postura desleixada que era tão deliberada. O ar no ônibus pareceu mudar, a energia mudando de tédio para algo mais carregado, mais perigoso.

"Desafio," Axl disse, sua voz baixando para um sussurro áspero. "Tira a roupa. Tudo. E fica de joelhos no corredor aqui. Por um minuto."

O sorriso de Izzy congelou. Ele prendeu a respiração por um segundo, seus olhos encontrando os de Axl. O desafio não era mais sobre água mofada. Era sobre atravessar uma linha. O calor, o isolamento, a tensão sexual latente que sempre existira entre eles – tudo conspirou, tornando o impossível, possível.

"Você está maluco," Izzy murmurou, mas já estava se levantando.

"É o jogo, Stradlin. Você aceitou."

Izzy manteve o contato visual enquanto puxava a regata suada por sobre a cabeça. Sua pele era pálida no luz fraca do ônibus, os ossos das costelas visíveis sob a pele. Seus dedos abriram o botão da calça, puxaram o zíper. O jeans pesado caiu, formando uma poça em torno de seus tornozelos, seguido pela cueca. Ele ficou parado por um momento, completamente nu no corredor estreito, sua nudez uma afirmação chocante naquele espaço mundano.

Então, ele se ajoelhou. O vinil duro do piso do ônibus era áspero contra seus joelhos. Ele olhou para cima, para Axl, seu rosto uma máscara de desafio e uma vulnerabilidade que ele nunca permitiria em qualquer outro contexto.

Axl o observou, sua respiração mais rápida. O minuto pareceu uma eternidade. O som da respiração ofegante de Izzy, o zumbido dos insetos lá fora, o cheiro de suor, poeira e desejo repentino.

"O tempo acabou," Axl finalmente disse, sua voz rouca.

Izzy se levantou, se vestindo com movimentos bruscos, mas seus olhos não se desviaram de Axl. "Minha vez. Verdade ou Desafio, Rose?"

"Desafio." A resposta foi instantânea, um fio de adrenalina percorrendo sua voz.

Izzy se aproximou, parando a poucos centímetros de Axl. Seus olhos estavam escuros, intensos. "Desafio: você me beija. Como se quisesse provar o meu próprio gosto na minha boca."

Axl não hesitou. Ele fechou a distância, sua mão enterrando-se nos cabelos molhados de Izzy, puxando-o para um beijo que não foi sobre prazer, mas sobre conquista. Era dentes e língua e raiva, uma colisão de vontades. Ele podia sentir o gosto do suor de Izzy, o resquío do cigarro, a própria essência dele. Quando ele se afastou, ambos estavam ofegantes.

" Satisfeito?" Axl cuspiu.

"Não," Izzy respondeu, seus olhos faiscando. "Mas você está. E agora a satisfação é minha. Sua vez de escolher, Rose."

O jogo acelerou, degenerando rapidamente. Cada desafio era uma escalada, um teste aos limites do outro.

"Desafio: deixa eu amarrar suas mãos com esse cinto de segurança e chupar você até você gritar."

"Desafio: aguenta cinco minutos com este," Axl pegou a escova de cabelo elétrica de Izzy, a única coisa que vibrava no ônibus, e pressionou-a contra a virilha de Izzy através da calça, "no máximo, enquanto eu te beijo e você não pode se mexer."

"Desafio: senta no meu pau no banco do motorista, sem usar as mãos, enquanto eu não tiro as minhas do volante."

O ônibus tornou-se um parque de diversões perverso. O banco do motorista, as banquetas, o corredor estreito – tudo foi usado. Roupas foram abandonadas, suor escorria livremente, gemidos abafados eram engolidos pelo ar noturno. Era sexo, mas era mais do que isso; era uma guerra de vontades, uma competição para ver quem quebraria primeiro, quem perderia o controle de forma mais espetacular.

Axl, com suas mãos presas atrás das costas pelo cinto, gemeu o nome de Izzy quando a boca do guitarrista o levou ao clímax, seu corpo se contorcendo contra o couro da banqueta. Izzy, suportando a vibração brutal da escova com os dentes cerrados, um gemido longo e tremulo escapando quando Axl finalmente o libertou, sua coxa ficando manchada de umidade

A loucura atingiu o pico quando Izzy, ofegante, suado, com os olhos vidrados, desafiou: "Desafio final, Rose. Você me come aqui, de quatro, no corredor. E faz eu gozar mais rápido do que você conseguiu na última música do show."

Axl riu, um som selvagem e sem freios. "Você tá afim de perder, Stradlin."

A posição era desconfortável, constrangedora. O piso do ônibus era duro, o espaço apertado. Mas a crueza disso, a falta de romance, era o que tornava tudo tão intensamente excitante. Axl atrás dele, suas mãos agarrando os quadris de Izzy com força, sua respiração um rosnado quente em sua nuca.

"Gosta disso, sua putinha competitiva?" Axl rosnou, cada investida uma afirmação de domínio. "Gosta de ser fodido num chão de ônibus sujo?"

"Sim! Porra, Axl, mais!" Izzy gemeu, sua fronte pressionada contra a base fria de uma banqueta. Ele estava perdendo, e a sensação era eletrizante. O prazer era uma espiral ascendente, rápida e implacável, exatamente como ele desafiara.

Foi quando os faróis apareceram na estrada.

Dois pontos de luz branca, crescendo rapidamente no escuro. O reboque.

"Porra!" Axl gritou, seu ritmo se tornando frenético, desesperado. "Eles tão chegando!"

A corrida contra o tempo tornou o sexo final uma loucura. Não havia mais técnica, apenas necessidade animal. Os gemidos de Izzy se tornaram mais altos, mais urgentes. O som dos corpos se colidindo ecoava no ônibus metálico.

"Vai, porra! Axl, agora!" Izzy gritou, seu corpo se arqueando num espasmo violento quando o orgasmo o atingiu, seu release jorrando no piso de plástico.

O som, a visão, a adrenalina foram demais para Axl. Com um rosnado gutural, ele enterrou-se até o fundo e despejou-se dentro de Izzy, seu corpo tremendo contra as costas do guitarrista.

Eles desabaram juntos, ofegantes, por talvez dez segundos. Então, a realidade irrompeu. Os faróis estavam lá fora, iluminando o interior do ônibus através das cortinas.

"Merda, merda, merda," Izzy sussurrou, tentando se levantar, suas pernas trêmulas.

Eles se arrastaram, pegando roupas, se vestindo com movimentos descoordenados e rápidos. O suor escorria, misturando-se ao sêmen e à poeira. Quando a porta do ônibus se abriu e o mecânico argentino, um homem baixo e moreno, subiu, eles estavam sentados em banquetas separadas, fingindo normalidade, suas respirações ainda um pouco aceleradas.

"Problema no motor, senhores?" o mecânico perguntou, sua lanterna varrendo o interior.

"Sim," Axl respondeu, sua voz incrivelmente estável. "Parece que superaqueceu."

Enquanto o mecânico se virava para o motor, Axl se inclinou para perto de Izzy.

"Desafio final de verdade," ele sussurrou, seu hálito quente no ouvido de Izzy. "Fica quieto o show inteiro amanhã à noite com a minha porra vazando na sua cueca."

Izzy virou a cabeça, seus olhos escuros encontrando os de Axl. Ele não sorria, mas havia um brilho lá, um reconhecimento do abismo que haviam encarado juntos.

Ele não respondeu. Apenas deu um chute leve no tornozelo de Axl, um gesto que era ao mesmo tempo uma repreensão e uma aceitação. O jogo havia terminado. Mas a partida, ambos sabiam, estava longe de acabar. O ônibus podia ser rebocado, mas a tensão que eles haviam liberado naquela noite úmida continuaria viajando com eles, um segredo sujo e eletrizante nas estradas infinitas da América do Sul.

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A turnê sul-americana seguiu seu curso, um turbilhão de shows caóticos, hotéis luxuosas e estradas intermináveis. O incidente no ônibus quebrado nunca foi mencionado, mas pairou sobre Axl e Izzy como um fantasma úmido e quente, mudando tudo.

Duas noites depois, em um estádio lotado em Santiago, algo aconteceu.

O show estava no auge, um monstro de três horas de pura energia. A banda estava coesa, a multidão, enlouquecida. Durante "You Could Be Mine", Slash se aproximou para um duelo de guitarra com Izzy, seus corpos se curvando sobre os amplificadores, suor voando. Duff, ao fundo, marcava o ritmo pesado com seu baixo, um sorriso largo em seu rosto.

Foi então, no meio daquele caos controlado, que Axl viu sua oportunidade.

Ele se aproximou de Izzy por trás, como se fosse para compartilhar o microfone, um movimento comum no palco. Mas em vez de cantar, seus lábios se aproximaram do ouvido de Izzy, sua voz um fio de som perdido no rugido da música.

"Desafio," ele sussurrou, sua boca tocando acidentalmente – ou não – o ouvido de Izzy. "Você tem até o final desta música. Vou ficar de costas, olhando para o público e você goza só de me ver de costas. Sem tocar em si mesmo. E ninguém, ninguém, pode saber."

Izzy quase perdeu o acorde. Seus dedos trêmulos produziram um ruído áspero na guitarra, rapidamente disfarçado por um bend. Seus olhos se arregalaram por trás dos óculos escuros. Era impossível. Insano. Perigosíssimo. Eles estavam no palco, sob holofotes, com Slash a menos de dois metros de distância, Duff do outro lado, e cinquenta mil pessoas gritando.

Ele olhou para as costas largas de Axl, envoltas em couro, o cabelo ruivo molhado de suor caindo sobre seus ombros. A lembrança da noite no ônibus, da língua de Axl em sua pele, do peso dele, inundou Izzy com uma intensidade avassaladora. Seu corpo reagiu instantaneamente, uma onda de calor percorrendo sua virilha, tão potente que ele sentiu as pernas amolecerem.

Axl sabia. Sabia o poder que tinha. Sabia que aquela memória era suficiente.

Izzy tentou se concentrar no riff, nos dedos de Slash voando sobre o braço da guitarra, no rosto de Duff, concentrado na batida. Mas sua visão periférica estava presa em Axl. Cada movimento dos ombros de Axl, cada balanço de seus quadris enquanto ele comandava a multidão, era um golpe direto em seu autocontrole.

Ele sentiu o suor escorrer por suas costas, não apenas do calor do palco. Sua respiração ficou mais rápida, ofegante, misturando-se ao microfone. Ele se mordeu com força, o gosto do sangue o ancorando à realidade. Era uma tortura. Uma tortura deliciosa e pública.

Slash, sentindo a energia estranha, olhou para ele de través, uma sobrancelha arqueada. Izzy desviou o olhar, focando em um ponto distante na plateia.

Axl, sentindo a luta de Izzy, balançou os quadris de forma mais pronunciada, um movimento sutil, quase imperceptível para qualquer um, exceto para Izzy. Era um aceno privado, uma provocação.

O final da música se aproximava. Os acordes finais ecoavam. Izzy sentiu uma tensão insuportável se acumulando em seu baixo ventre, uma pressão dolorosa e doce. Ele estava perdendo. Estava realmente prestes a... ali, no palco, com a banda toda ao redor.

Os últimos acordes foram golpeados. O rugido da multidão explodiu, enchendo o estádio. No meio daquele barulho ensurdecedor, sob a cortina de luzes estroboscópicas e confete, o corpo de Izzy estremeceu com um espasmo silencioso e intenso. Suas pernas quase cederam. Ele ofegou, um som abafado pelo rugido ao seu redor, seus dedos agarrando o braço da guitarra com os nós dos dedos brancos.

Axl se virou, seu rosto um manto de suor e triunfo. Seus olhos encontraram os de Izzy, e ele sabia. Um sorriso minúsculo, um brilho de pura possessão maliciosa, tocou seus lábios antes que ele se virasse para a multidão, erguendo os braços.

"Obrigado, Santiago!" ele gritou, sua voz um rugido, enquanto Izzy ficava para trás, tremendo, manchado e aniquilado, tentando recuperar o fôlego e a compostura diante de Slash, Duff e de milhares de fãs sem suspeitar de nada.

O segredo deles não era mais apenas um fantasma na estrada. Era uma entidade viva, respirando no palco, escondida à vista de todos. E era mais perigoso, e mais excitante, do que qualquer coisa que eles já tivessem feito na solidão da noite. A partida havia se tornado uma performance. E Izzy era agora, para sempre, o instrumento mais íntimo de Axl Rose.

Os dias que se seguiram ao show em Santiago foram um teste de fogo para a sanidade de Izzy. Cada ensaio, cada passagem de som, cada momento no palco tornou-se um campo minado de possibilidades perversas. Axl, intoxicado pelo poder que descobrira, tornou-se um mestre na arte da tortura silenciosa.

Em Buenos Aires, durante um ensaio tedioso de "November Rain", com Slash trabalhando em um solo interminável e Matt batucando distractedly na bateria, Axl se aproximou do amplificador de Izzy.

Fingindo ajustar o som, ele sussurrou, baixo o suficiente para que apenas Izzy ouvisse: "Desafio. Durante o próximo solo do Slash, você vai até o banheiro dos fundos, se alivia, e volta. E eu vou saber se você cumpriu ou não."

Izzy sentiu um calor subir em seu rosto. Era humilhante. Era infantil. E era incrivelmente excitante. A ideia de se levantar, sob o olhar inconsciente de seus companheiros de banda, e realizar um ato tão íntimo e prosaico, tudo sob as ordens de Axl, fez seu coração acelerar.

Ele esperou. Slash mergulhou em seu solo, fechando os olhos, perdido em seu próprio mundo. Duff estava de costas, ajustando o som do baixo. Matt batucava um ritmo complexo em seus pratos.

Era a hora.

Izzy atravessou o corredor escuro como um sonâmbulo, suas pernas trêmulas, o olhar de Axl ainda queimando em suas costas como um brand físico. Ao fechar a porta do banheiro dos fundos, o mundo exterior desapareceu, substituído pelo cheiro ácido de urina e cloro. O coração batia tão forte em seu peito que ele quase conseguia ouvi-lo ecoando nas paredes sujas de pichações.

Ele se trancou na última cabine, as mãos tremendo tanto que mal conseguia abrir o zíper. Quando finalmente conseguiu, seu pau já estava completamente ereto e latejante, endurecido tanto pela ordem de Axl quanto pela adrenalina perversa da situação.

"Porra, Axl..." ele gemeu baixinho para as paredes rabiscadas, imaginando que eram os ouvidos do cantor.

Sua mão fecharam ao redor de si mesmo com uma urgência animal. O toque foi inicialmente áspero - seus próprios dedos calejados contra a pele sensível - mas rapidamente se transformou em algo mais. Ele fechou os olhos e deixou a mente vagar, imaginando que não era sua mão, mas a de Axl. A mão larga e forte que ele conhecia tão bem, com seus dedos musculosos e as tatuagens que se moviam com cada movimento do pulso.

"É isso, sua puta," sussurrou para si mesmo, imitando mentalmente a voz rouca de Axl. "Me mostra como você se toca quando pensa em mim."

Seus dedos se moveram mais rápido, o punho subindo e descendo em um ritmo sujo e familiar. A mão esquerda se agarrou à parede fria para se equilibrar, os nós dos dedos brancos. Ele imaginou Axl de pé atrás dele, o corpo quente pressionado contra suas costas, a boca quente em seu pescoço.

"Axl... porra..."seu gemido foi mais alto desta vez, ecoando no banheiro vazio.

O polegar esfregou a glande inchada, espalhando o fluido que já escorria abundantemente. Cada nervo em seu corpo estava vivo, super-sensível. Ele podia quase sentir o hálito quente de Axl em seu ouvido, os dentes mordendo seu lóbulo, as mãos agarrando seus quadris.

"Vou gozar... Axl, estou gozando..." ele anunciou para o banheiro vazio, sua voz um gemido quebrado.

O orgasmo o atingiu como um trem desgovernado. Seu corpo arqueou contra a porta da cabine, um grito abafado saindo de seus pulmões enquanto jorrava contra a parede suja, listras brancas e quentes marcando a pichação de uma banda local. Seus joelhos amoleceram e ele teve que se segurar no vaso sanitário para não cair, ofegante, suado, completamente aniquilado.

Por um longo momento, ele ficou parado lá, tentando recuperar o fôlego, o cheiro de seu próprio sexo misturando-se ao mofo do banheiro. Finalmente, ele se limpou com papel higiênico áspero, as mãos ainda trêmulas. Ao se recompor e abrir a porta da cabine, ele carregava não apenas o cheiro do banheiro, mas a marca invisível da obediência - úmida, quente e completamente sua, mas fundamentalmente de Axl.

Quando ele voltou, tentando parecer normal, Axl nem olhou para ele. Mas um pequeno aceno de cabeça, quase imperceptível, foi sua recompensa. Uma onda de alívio e vergonha percorreu Izzy. Ele havia obedecido.

A intimidade deles tornou-se uma coreografia secreta, uma dança de olhares, sussurros e toques furtivos escondida no caos da turnê.

Em uma viagem de ônibus noturna, com todos dormindo – Slash encolhido em seu assento com seu top hat puxado sobre os olhos, Duff roncando suavemente, Matt com a cabeça encostada na janela – Axl se moveu com a fluidez de um predador. Ele deslizou para o chão, entre os assentos, um fantasma no seu próprio reino. Izzy estava semi-adormecido quando sentiu o cobertor sendo puxado.

Antes que pudesse reagir, a mão de Axl - larga, quente, inconfundível - deslizou para dentro de suas calças. Os dedos encontraram seu pau já semi-ereto com uma familiaridade que fez Izzy prender a respiraça num suspiro afiado. Seus olhos se arregalaram no escuro, focando na silhueta de Slash dormindo a poucos metros, com o chapéu cobrindo seu rosto como um véu.

Axl não fez rodeios. Seu punho fechou ao redor do pau de Izzy com uma posse absoluta. O movimento era preciso, implacável - uma masturbação que era mais sobre afirmação de poder do que sobre prazer. Sua palma era áspera contra a pele sensível, seu polegar pressionando a glande de forma que fazia os quadris de Izzy se erguerem involuntariamente.

Izzy mordeu o próprio lábio até sangrar para silenciar os gemidos que ameaçavam explodir. Ele podia sentir cada callus nos dedos de Axl, cada movimento do pulso, a respiração quente do cantor contra seu joelho através do tecido do jeans. Era uma violação gloriosa, uma possessão no escuro mais íntima do que qualquer sexo que já tiveram. Quando o orgasmo o atingiu, foi com uma força silenciosa e convulsiva que fez todo seu corpo estremecer, suas unidas cravando-se nas próprias palmas. Ele enterrou o rosto no encosto do assento, sufocando um último suspiro trêmulo enquanto Axl trabalhava cada última gota de sua libertação.

Axl se retirou, limpando a mão no próprio jeans, e voltou para seu assento como se nada tivesse acontecido. Ninguém acordou. Ninguém viu.

O auge da audácia veio em São Paulo, durante uma entrevista coletiva. Eles estavam sentados atrás de uma longa mesa, microfones à sua frente, repórteres gritando perguntas. Axl, no centro, dominava a entrevista com seu charme abrasivo e respostas evasivas.

Izzy estava ao seu lado, quieto como sempre, respondendo com monossílabos.

Foi então que, sob a mesa, longe dos olhares das câmeras e dos repórteres, Axl deslizou a mão e a colocou firmemente na coxa de Izzy, subindo até a virilha.

Izzy quase saltou da cadeira. Seus olhos se encontraram com os de Axl por uma fração de segundo. Axl não estava nem mesmo olhando para ele; ele estava sorrindo para um repórter, respondendo uma pergunta sobre a inspiração para "Estranged".

Sob a mesa, longe dos flashes e dos olhares dos repórteres, a mão de Axl era um tirano silencioso. Seus dedos não apenas pressionavam - eles exploravam. A palma da mão se apertou contra a virilha de Izzy através do tecido áspero do jeans, a pressão tão intensa que era quase dolorosa.

Enquanto Axl discorria sobre "a essência criativa do Guns N' Roses" para um repórter japonês, seus dedos começaram um trabalho metódico de tortura. Um dedo traçou a linha do zíper de Izzy, depois subiu para pressionar a ponta já endurecida que tentava se erguer contra o tecido. Izzy sentiu um calafrio percorrer sua espinha, seu estômago se contrair. Ele se encolheu na cadeira, tentando disfarçar o rubor que subia de seu peito para seu rosto.

Axl ajustou sua posição, e sob a mesa, sua mão deslizou para dentro da abertura da calça de Izzy, encontrando a carne quente e tensa por baixo da cueca. Seus dedos fecharam ao redor do pau dele, não com carícia, mas com posse. Um movimento lento, calculado, enquanto ele respondia uma pergunta sobre influências musicais.

Izzy sentiu o suor escorrer por suas costas sob a camisa. Sua respiração ficou superficial, seus dedos tremiam sobre a mesa. Cada círculo que a mão de Axl traçava era uma afirmação: "Você é meu, não importa quem esteja olhando." Era a dominação mais pura que ele já experimentara - pública e completamente invisível. E o corpo dele, o traidor, respondia com uma excitação avassaladora que ameaçava desmontá-lo ali mesmo, diante das câmeras e de seus companheiros de banda.

Quando a entrevista finalmente terminou e eles se levantaram, Axl retirou a mão como se nada tivesse acontecido. Ele deu um tapinha nas costas de Izzy, um gesto de camaradagem para as câmeras.

"Você tá tenso, Stradlin," ele disse, alto o suficiente para os outros ouvirem. "Precisa relaxar."

Naquela noite, no palco do Morumbi, diante de uma das maiores multidões da turnê, Izzy tocou como um homem possuído. Cada acorde era um grito abafado, cada solo uma fuga. Ele se entregou à música com uma ferocidade que fez Slash olhar para ele com uma sobrancelha arqueada, impressionado.

E quando seus olhos encontraram os de Axl no palco, não havia mais medo ou vergonha. Havia apenas um reconhecimento profundo e sombrio. A partida havia fundido-se completamente com suas vidas. Já não havia mais separação entre o público e o privado, entre o performer e o homem.

Eles eram o segredo. O jogo era a realidade. E a turnê, com suas estradas infinitas e palcos iluminados, era o único lugar onde aquela verdade perigosa e eletrizante poderia existir.

---

A sensação de poder era um vício para Axl. A submissão silenciosa de Izzy, aquele brilho de vulnerabilidade nos seus olhos escuros, era mais intoxicante que qualquer droga ou aplauso. Ele se sentia invencível, o mestre absoluto daquele jogo que só eles conheciam.

Até que, em uma noite abafada no Rio de Janeiro, as regras mudaram.

A banda estava em um camarim coletivo e apertado, se preparando para o show. O ar estava carregado do cheiro de cerveja, spray de cabelo e suor. Slash afiava os solos de "Paradise City" em um canto, o som um zumbido constante de fundo. Duff amarrava suas tranças no espelho, e Matt ajustava as tiras da sua calça de couro.

Axl, vestindo apenas um roupão de seda vermelha, ditava alterações no setlist para um roadie assustado. Ele estava no seu elemento, comandando, o centro de tudo.

Izzy, quieto como sempre, estava sentado em um banco no canto mais escuro, aparentemente concentrado em afinar sua Les Paul. Mas seus olhos, por trás da franja, não estavam nas cordas. Estavam em Axl.

Ele observou Axl gesticular, sua voz cortando o ar, o roupão se abrindo levemente com o movimento, revelando a pele pálida do seu peito. Um plano, lento e perverso, começou a se formar na mente de Izzy. Era hora de revidar.

Ele se levantou e, sem dizer uma palavra, caminhou até a mesa de drinks. Ele pegou uma garrafa de uísque e dois copos de plástico. Com movimentos calmos e deliberados, ele encheu os dois copos. Então, ele pegou um pequeno sachê de pimenta caiena que alguém tinha deixado perto de uma bandeja de comida – um resto de alguma pizza esquecida.

Com os olhos fixos em Axl, ele rasgou o sachê e despejou metade do conteúdo em um dos copos. Ele mexeu com o dedo, um gesto obsceno, antes de limpar o dedo na própria calça.

Ele então se aproximou de Axl, que estava no auge de uma discussão sobre a ordem das músicas.

"Rose," a voz de Izzy era suave, mas cortou através da fala de Axl como uma lâmina.

Axl se virou, irritado pela interrupção. "O que foi, Stradlin? estou ocupado."

"Toma." Izzy estendeu o copo com pimenta e uísque para Axl. Um gesto de paz. Um gesto de camaradagem.

Axl hesitou por um segundo, então pegou o copo com um grunhido. "Obrigado." Ele tomou um gole grande, seus olhos ainda furiosos com o roadie.

Izzy manteve seu próprio copo – o copo com pimenta – mas não bebeu. Ele apenas ficou parado, observando.

Alguns minutos depois, durante "Welcome to the Jungle", o ataque aconteceu.

Axl estava no palco, no meio de seu ritual de possessão, gritando para a multidão, quando uma dor aguda e familiar começou a queimar em seu estômago. Não era a queimadura usual do uísque. Era algo diferente, mais profundo, mais traiçoeiro. Sua garganta começou a coçar, sua pele a formigar.

Ele tentou ignorar, lançando-se no refrão. Mas a queimadura intensificou, tornando-se uma agonia latejante que se espalhou para suas entranhas. Sua performance, normalmente impecável, começou a vacilar. Ele perdeu o timing de um verso, sua voz falhou em uma nota alta.

Ele olhou para a lateral do palco. Lá estava Izzy, encostado em um amplificador, tocando seu riff com uma expressão de completa inocência. Mas seus olhos... seus olhos encontram os de Axl, e neles havia um brilho de pura e silenciosa retribuição.

A pimenta, Axl percebeu, sua mente girando. O filho da puta botou pimenta no meu uísque.

A humilhação foi tão avassaladora quanto a dor física. Ele, Axl Rose, o tirano do palco, tinha sido derrubado por uma manobra tão suja, tão simples. E pior, ele não podia fazer nada. Não podia parar o show. Não podia gritar. Não podia nem mesmo se contorcer de dor sem que cinquenta mil pessoas vissem.

Ele teve que aguentar. Cantar, pular, performar, enquanto seu corpo lutava contra o fogo que Izzy acendera dentro dele. Cada grito era um esforço, cada movimento uma agonia. Foi a performance mais longa e dolorosa de sua vida.

Quando as luzes finalmente se apagaram e ele praticamente correu para os bastidores, dobrado sobre si mesmo, ele encontrou Izzy esperando por ele no camarim vazio.

Sem uma palavra, Izzy estendeu uma garrafa de leite.

Axl a arrancou de suas mãos e bebeu avidamente, o líquido frio oferecendo um alívio mínimo.

"Desafio," Izzy sussurrou, sua voz era como seda áspera no ouvido de Axl. "Conseguir performar 'Welcome to the Jungle' com o cu em chamas. Parabéns. Você venceu."

Axl cuspiu um pouco de leite. "Seu... seu maldito"

Izzy se aproximou, seu rosto a centímetros do de Axl. Pela primeira vez, não havia submissão em seus olhos. Havia igualdade. Havia o fogo do revide.

"O jogo tem dois lados, Rose," ele disse calmamente. "E eu acabei de aprender a jogar."

Ele virou as costas e saiu, deixando Axl sozinho, ofegante, encharcado de suor e leite, a dor em seu estômago uma lembrança vívida de que ele não era o único mestre naquela dança. O jogo havia evoluído. E Izzy Stradlin, o quieto, o submisso, acabara de mostrar suas garras. A partida estava mais perigosa, e muito mais interessante.



💫 Fim.

Chapter 3: O Mecânico e o Rockstar

Summary:

Um astro do rock e um mecânico de poucas palavras. Dois mundos opostos onde o desejo não entende de diferenças sociais.

Notes:

Olá, amores! 🌟
Agora mudamos completamente de clima! Este é um AU Moderno onde as coisas esquentam na oficina!

Avisos/Tags do capítulo:
AU Moderno Mecânico Izzy, Rockstar Axl, Slow Burn, Dinâmica de Poder, Atração Proibida e Oficina é o novo motel 🔥

*Mudança de cenário, mas a mesma tensão de sempre! Comentem se amaram o Izzy de macacão! 😉

Chapter Text

O calor em Los Angeles naquele verão de 2016 era tão intenso que distorcia o asfalto. Dentro da oficina "Stradlin & Sons", fundada por seu avô na década de 50, Izzy Stradlin enxugava o suor da testa com um pano sujo de graxa. A oficina cheirava a óleo queimado, gasolina e café velho – os aromas que compunham sua vida. Aos 54 anos, seu corpo era mais magro, suas mãos calejadas contavam histórias de décadas consertando motores, e seus olhos, ainda intensos sob a franja grisalha, refletiam uma paz que ele conquistara longe dos holofotes.

Ele estava debaixo de um Chevrolet Impala 67 quando o estrondo aconteceu. Um barulho de metal rasgando seguido por uma sequência de palavrões criativos que fariam um marinheiro corar. Izzy deslizou de sob o carro em seu carrinho de rolimã e se levantou, esfregando as mãos em um pano ainda mais sujo.

Na entrada da oficina, um Bentley Continental GT de preço obsceno estava encostado no poste de uma placa de "Pare", sua roda dianteira direita destruída, o para-choque dianteiro pendurado como um maxilar quebrado. A porta do motorista se abriu e um homem saiu, vestindo jeans justos e uma jaqueta de couro que custava mais que o orçamento mensal da oficina. Ele arrancou os óculos escuros, revelando um rosto que Izzy reconheceu instantaneamente – mais velho, mais marcado, mas inconfundível.

Axl Rose. O ícone do rock. A voz de uma geração. E, aparentemente, um péssimo motorista.

"Porra!" Axl gritou, chutando o pneu dianteiro intacto. "Maldito GPS! Maldita cidade! Maldita porra de placa de pare!"

Izzy se aproximou, os braços cruzados. "Chutar o carro não vai consertá-lo."

Axl se virou, seus olhos azuis – famosos por incinerarem repórteres e fãs – focaram em Izzy. Ele olhou para o macacão sujo de graxa, para as mãos calejadas, para o rosto sério sob o boné de baseball gasto.

"Você é o mecânico?" Axl perguntou, sua voz ainda carregava aquele timbre inconfundível, agora mais grave, mais cansado.

"Sim. Izzy Stradlin." Ele não estendeu a mão. "Parece que você encontrou a placa."

Axl deu uma risada seca. "Engraçadinho. Quanto tempo para consertar isso?" Ele gesticulou em direção ao Bentley.

Izzy se ajoelhou, examinando os danos. "Eixo dianteiro quebrado, suspensão destruída, roda, pneu... pelo menos três dias. Se eu tiver as peças."

"Três dias? Eu tenho um show no Staples Center amanhã à noite!"

"Talvez você devesse ter parado na placa, então," Izzy disse secamente, levantando-se. Sua calma era um contraste gritante com a tempestade que era Axl Rose.

Eles se encararam. O ar entre eles pareceu vibrar. Dois mundos colidindo no calor abafado de uma oficina de Los Angeles.

O Bentley foi rebocado para dentro da oficina. Axl, relutantemente, aceitou que estava preso. Seu manager, um homem nervoso de terno, tentou argumentar, mas Axl o dispensou com um aceno de mão. "Deixa. Eu lido com isso."

Enquanto Izzy trabalhava, Axl ficou por perto, observando. Ele não estava acostumado a ser ignorado. As pessoas geralmente tremed diante dele, pediam autógrafos, selfies. Izzy Stradlin tratava-o como tratava qualquer outro cliente – com uma cortesia profissional e distante que beirava a indiferença.

"Você não sabe quem eu sou?" Axl finalmente perguntou, encostado na lateral de um Mustang em restauração.

Izzy parou de martelar uma peça, sem olhar para cima. "Sei. Você é o cara que não soube frear um carro de meio milhão de dólares."

Axl riu, um som genuíno e surpreendido. "Porra, você é diferente."

Ele passou a observar Izzy com um interesse renovado. Havia uma graça econômica em seus movimentos, uma confiança silenciosa que Axl, cercado por sósias e bajuladores, raramente via. Era autêntico. E Axl, cuja vida era uma performance constante, sentiu-se estranhamente atraído por aquela autenticidade.

No segundo dia, Axl apareceu com duas xícaras de café. "Pensei que você poderia querer um."

Izzy olhou para a xícara de papel, depois para Axl. "Obrigado." Ele aceitou e tomou um gole.

"Então... Izzy, Você é de Los Angeles?"

"Nasci aqui." Izzy voltou ao trabalho, mas sua postura estava um pouco menos rígida.

"Sempre quis ser mecânico?"

"Algumas pessoas consertam coisas. Outras as quebram." A resposta foi dada enquanto ele ajustava uma ferramenta.

Axl sentiu a cutucada. "Eu não quebro tudo."

"Só carros e placas de pare, aparentemente."

Novamente, aquela risada. Axl se sentou em um tambor de óleo vazio, observando Izzy trabalhar. "É tranquilo. Esse lugar."

"É o meu lugar," Izzy disse, e pela primeira vez, houve um fio de emoção em sua voz.

---

Na tarde do terceiro dia, aconteceu. Izzy estava tentando soltar um parafuso teimoso no eixo do Bentley. Suas mãos escorregavam, a ferramenta não dava alavancagem.

"Deixa eu tentar," Axl ofereceu, se aproximando.

Izzy hesitou, então entregou a chave. Axl a ajustou, seus dedos longos e musculosos – famosos por segurarem microfones – fechando ao redor do metal. Ele fez força, seus músculos do braço tensionando sob a tatuagem. O parafuso gemeu, mas não cedeu.

Izzy, sem pensar, colocou sua mão sobre a de Axl, ajustando o ângulo. "Assim."

O toque foi um choque. Um corrente de eletricidade silenciosa percorreu ambos. Seus olhos se encontraram. A oficina ficou silenciosa, exceto pelo zumbido distante do tráfego.

Axl puxou a chave. O parafuso cedeu com um rangido alto.

Eles ainda estavam com as mãos quase se tocando.

"Funcionou," Axl sussurrou, sua voz anormalmente baixa.

Izzy recuou, limpando as mãos no macacão. "Preciso de uma chave de torque diferente." Ele se virou e foi até seu armário de ferramentas, seu coração batendo um ritmo acelerado contra suas costelas.

Axl ficou parado, olhando para sua própria mão, sentindo o fantasma do toque de Izzy. Ele era desejado por milhões, mas aquele toque rápido e impessoal de um mecânico quieto era a coisa mais intensa que ele sentia em anos.

Naquela noite, quando a oficina estava fechada e o sol se punha, pintando o céu de laranja e roxo, Axl voltou. Ele encontrou Izzy sentado na soleira da porta, tomando uma cerveja, observando o movimento da cidade.

"O carro vai ficar pronto amanhã?" Axl perguntou, sentando-se ao lado dele no concreto ainda quente.

"Sim."

Silêncio. O ar entre eles estava carregado, pesado com coisas não ditas.

"Por que você está realmente aqui, Rose?" Izzy perguntou, sem olhar para ele. "Você poderia estar em um hotel de cinco estrelas, cercado por... seja lá o que você é cercado."

Axl pegou a garrafa de cerveja da mão de Izzy e tomou um gole. "Cercado por sósias. Por pessoas que me odeiam e me amam pelo personagem, não pela pessoa." Ele devolveu a garrafa. "Aqui... aqui é real. Você é real."

Izzy finalmente olhou para ele. A luz do crepúsculo suavizava os traços afiados de Axl, revelando o cansaço nos seus olhos, a solidão sob a fachada de rockstar.

"Realidade é superestimada," Izzy murmurou.

"Tenta viver sem ela por vinte anos e me diz se ainda acha isso."

Seus joelhos se tocavam. A proximidade era um ímã. Axl sentiu uma atração tão forte que era quase dolorosa. Não era apenas física; era uma atração por aquela quietude, por aquela paz que ele havia perdido há muito tempo.

"Eu deveria ir," Axl disse, mas não se moveu.

"Você deveria," Izzy concordou, mas sua mão, repousando no concreto entre eles, estava a centímetros da de Axl.

Foi Axl quem quebrou. Sua mão cobriu a de Izzy, seus dedos se entrelaçando. A pele de Izzy era áspera, marcada por arranhões e calos. A pele de Axl era suave, bem cuidada. Dois mundos.

Izzy não puxou a mão. Ele virou a palma para cima, permitindo o toque. Seus olhos estavam fechados, seu peito subia e descia lentamente.

"Eu não sei o que estou fazendo," Axl admitiu, seu polegar traçando círculos na palma de Izzy.

"Nem eu," Izzy sussurrou. "Mas parece que é isso que a gente faz."

E então, sob o céu crepuscular de Los Angeles, com o som dos carros como trilha sonora, Axl Rose se inclinou e beijou Izzy Stradlin.

Não foi um beijo de rockstar. Foi hesitante, questionador. Um beijo que perguntava "posso?" e "você quer?".

E a resposta de Izzy foi lenta, deliberada. Sua mão livre subiu para o rosto de Axl, puxando-o para mais perto, aprofundando o beijo. Era o gosto de cerveja barata, de suor honesto e de uma verdade que ambos haviam evitado a vida inteira.

---

Eles não foram para um hotel. Foram para o apartamento modesto acima da oficina. Era pequeno, limpo, funcional. Cheirava a madeira, a café, a Izzy.

Axl olhou olhou em volta, sentindo-se como um intruso em um santuário. Havia fotos antigas na parede, ferramentas em uma prateleira, uma guitarra acústica em um canto.

"Você toca?" Axl perguntou, apontando para a guitarra.

"Às vezes. Para mim mesmo."

Axl pegou o instrumento, seus dedos encontrando os acordes de "Patience" instintivamente. A música encheu o pequeno espaço, uma melodia familiar em um lugar estranho.

Izzy o observou, seus braços cruzados. "É estranho. Ouvir você aqui."

"É estranho estar aqui," Axl concordou, colocando a guitarra de lado. "Mas de um jeito bom."

Eles ficaram em pé no meio da sala, se encarando. A atração era um campo de força agora, puxando um para o outro.

"Eu não sou bom nisso," Izzy advertiu, sua voz baixa. "Em... pessoas. Em complicações."

"Eu sou complicação ambulante," Axl respondeu, dando um passo à frente. "Mas eu acho que você já sabe disso."

Ele tocou o rosto de Izzy, seus dedos limpos e suaves contra a pele áspera do mecânico. "Você é tão real, caralho. Isso me assusta."

"Você é tão inacreditavelmente irreal. Isso me assusta," Izzy retrucou, mas ele se inclinou no toque.

O beijo deles na sala foi diferente – mais confiante, mais faminto. Era a ponte entre seus dois mundos. As mãos de Axl abriram os botões do macacão, descobrindo um torso magro e pálido, marcado pelo trabalho duro. As mãos de Izzy puxaram a jaqueta de couro de Axl, depois a camisa, revelando a pele tatuada e familiar do rockstar.

Eles se moveram para o quarto, uma sala espartana com uma cama de solteiro simples. Não havia luxo, apenas necessidade.

Na cama, sob a luz fraca de um abajur, eles exploraram um ao outro com uma mistura de urgência e reverência. Axl beijou cada calo nas mãos de Izzy como se fossem medalhas. Izzy traçou as tatuagens no corpo de Axl como se estivesse lendo sua história.

"Você é lindo," Axl sussurrou, sua boca percorrendo o pescoço de Izzy. "De um jeito que nenhuma foto de revista poderia jamais capturar."

Izzy não respondeu com palavras. Sua resposta foi arquear as costas quando a boca de Axl encontrou seu mamilo, um gemido baixo escapando de seus lábios. Suas mãos enterraram-se nos cabelos grisalhos de Axl, puxando-o para mais perto.

Era uma inversão de tudo. O poderoso Axl Rose, de joelhos, adorando o corpo de um mecânico quieto. O mundo não saberia, nunca entenderia.

Quando Axl o penetrou, foi com uma paciência que surpreendeu a ambos. Não havia pressa, apenas a sensação avassaladora de se conectar com algo verdadeiro. Izzy envolveu suas pernas na cintura de Axl, puxando-o para dentro, mais fundo, como se quisesse fundi-los.

O sexo foi uma conversa silenciosa e intensa. Cada movimento uma pergunta, cada gemido uma resposta. Quando o orgasmo os atingiu, foi uma explosão silenciosa e profunda que parecia sacudir os alicerces do pequeno apartamento.

Eles ficaram deitados depois, entrelaçados na cama pequena, o suor secando em seus corpos. O mundo lá fora – os shows, as turnês, a fama – parecia um milhão de milhas de distância.

"O que é isso, Iz?" Axl sussurrou, seu rosto enterrado no pescoço do mecânico.

"Eu não sei," Izzy respondeu, sua mão traçando padrões nas costas de Axl. "Mas não tem que ser nada. Pode ser só isso."

Pela primeira vez em muito, muito tempo, Axl sentiu que "só isso" era mais do que suficiente.

---

O Bentley foi consertado. O mundo exterior, com suas demandas e expectativas, bateu à porta na forma de um manager ansioso e uma limusine preta.

Axl estava vestido novamente com suas roupas de rockstar, mas algo em sua postura havia mudado. Sua arrogância habitual estava ausente.

"O show é hoje à noite," ele disse, parado na oficina, suas chaves na mão.

"Boa sorte," Izzy disse, enxugando as mãos em um pano. Ele estava de volta ao seu macacão, ao seu mundo.

"Eu... poderia te deixar ingressos. Passes de backstage."

Izzy balançou a cabeça. "Não é meu mundo, Axl."

Axl deu um passo à frente. "E daí? Você poderia... você poderia fazer parte dele."

"Como? Sendo seu segredo? O mecânico que você come quando está em LA?"

A dor na voz de Izzy era palpável. Axl sentiu como um soco.

"Não é isso que você é," Axl protestou, mas sua voz falhou. Porque, no fundo, ele sabia que era exatamente isso que seria. Um segredo sujo. Uma fuga da sua realidade.

Eles se encararam, o abismo entre seus mundos mais vasto do que nunca.

"Obrigado pelo conserto," Axl finalmente disse, sua voz formal, a máscara do rockstar escorregando de volta ao lugar.

"É o meu trabalho," Izzy respondeu, virando as costas e pegando uma ferramenta.

Axl ficou parado por um momento mais longo, olhando para as costas de Izzy, memorizando a cena. Então ele se virou e entrou na limusine.

O carro desapareceu no tráfego. A oficina estava silenciosa novamente.

Izzy ficou parado, a ferramenta pesada em sua mão, sentindo o eco do toque de Axl em sua pele, o gosto de seus beijos ainda em sua boca.

No Staples Center naquela noite, Axl Rose performou para dezenas de milhares de pessoas. Ele gritou, ele cantou, ele comandou o palco como o rei que era. Mas seus olhos, repetidamente, procuravam nas sombras da plateia, esperando, sem esperança, ver um rosto familiar sob um boné de baseball.

E em um apartamento acima de uma oficina, Izzy Stradlin pegou sua guitarra e tocou acordes suaves e melancólicos para a noite silenciosa, a música uma oração para algo que não poderia ser.

Dois homens. Dois mundos. Uma chama que queimou intensamente e brevemente no calor de Los Angeles, deixando para trás as cinzas do que poderia ter sido.

---

Duas semanas se passaram. A poeira do show no Staples Center havia baixado, as críticas eram favoráveis, o Bentley estava impecável. Mas algo dentro de Axl estava desalinhado, como uma engrenagem que saltou do lugar e agora rangia a cada movimento.

Ele estava em sua mansão em Malibu, cercado por vidro, aço e solidão. A vista para o oceano era espetacular, mas vazia. Tudo parecia vazio depois da oficina de Izzy Stradlin. Depois daquele apartamento modesto que cheirava a verdade.

Seu manager entrou, carregando uma pasta com contratos. "Axl, a turnê europeia... os promotores estão ansiosos por confirmação."

Axl não olhou para os papéis. Ele estava olhando para suas próprias mãos – mãos que seguravam microfones, que assinavam autógrafos, que nunca consertaram nada.

"Cancelem," ele disse, sua voz ecoando no vasto espaço.

"Cancelem? Axl, pelo amor de Deus, são 25 datas! Milhões de dólares!"

"Eu disse para cancelarem." A voz de Axl não era um grito. Era mais perigoso que isso – era plana, final. "Eu tenho algo para resolver."

Naquela mesma tarde, a limusine preta parou novamente em frente à "Stradlin & Sons". Desta vez, não havia Bentley destruído. Apenas um homem vestindo jeans simples e uma camiseta preta, sem jaqueta de couro, sem óculos escuros.

Izzy estava debaixo de um Ford Mustang 68, cantarolando baixo para si mesmo. Ele ouviu a campainha da oficina tocar, mas ignorou. Os clientes sabiam que ele viria quando terminasse.

Mas então ele ouviu passos se aproximando, um ritmo que ele reconheceu instantaneamente, que havia ecoado em seus sonhos nas últimas duas semanas.

Ele deslizou para fora debaixo do carro e se viu cara a cara com Axl Rose.

O silêncio foi profundo, quebrado apenas pelo tilintar de uma ferramenta que Izzy deixou cair no chão de concreto.

"Seu carro quebrou de novo?" Izzy perguntou, sua voz mais áspera do que pretendia.

"Não," Axl respondeu, suas mãos enfiadas nos bolsos. "Desta vez, acho que fui eu."

Ele parecia diferente. Menos... ampliado. Mais real. A postura de rockstar havia sido deixada na limusine.

"Por que você está aqui, Rose?" Izzy cruzou os braços, uma defesa automática.

"Porque eu não consigo parar de pensar naquele beijo, daquela noite ," Axl disse, a honestidade crua da declaração pairando no ar entre eles. "E porque eu cansei de viver uma vida onde um beijo real é a coisa mais rara que existe."

Izzy ficou parado, imóvel. Ele podia sentir o eco daqueles lábios nos seus, o fantasma das mãos de Axl em sua pele.

"O seu mundo... eu não me encaixo nele."

"E se eu não quiser mais aquele mundo?" Axl deu um passo à frente. "E se eu quiser este mundo? O cheiro de gasolina, o café queimado, o silêncio... você."

Era uma declaração tão monumental, tão impossível, que Izzy quase riu. Quase chorou.

"Você não sabe o que está dizendo. Você é Axl Rose."

"E você é Izzy Stradlin. E suas mãos consertam coisas. E eu... eu acho que preciso ser consertado."

A vulnerabilidade naquela afirmação foi a coisa mais poderosa que Izzy já testemunhou. Mais poderosa que qualquer acorde em qualquer estádio.

Ele não respondeu com palavras. Ele fechou a porta da oficina e girou a placa para "FECHADO". Então, ele se virou para Axl, pegou seu rosto entre suas mãos ásperas e beijou-o.

Era um beijo de posse, de aceitação, de resposta. Um beijo que dizia sim, mesmo sabendo que era uma loucura.

---

Os dias que se seguiram foram um experimento estranho e maravilhoso. Axl não voltou para Malibu. Ele ficou no apartamento acima da oficina. Ele aprendeu a fazer café na velha cafeteira de Izzy, a lavar sua própria xícara. Ele assistiu Izzy trabalhar, não como um observador, mas como um aprendiz.

"Segura isso," Izzy diria, entregando-lhe uma chave inglesa.

"Qual é a diferença entre isso e aquela?" Axl perguntou, segurando duas chaves idênticas para seus olhos.

Izzy sorriu, um daqueles raros sorrisos que iluminavam seu rosto. "Essa é métrica. Essa é polegada. Mundos diferentes, Rose."

"Me chama de Axl," ele pediu, suavemente.

"Axl," Izzy testou o som, e seu nome naquela voz rouca soou como uma música nova.

À noite, eles cozinhavam juntos, comiam na pequena mesa da cozinha, e Axl contava histórias de turnês que soavam como contos de fadas distantes e caóticos. Izzy falava de motores, de seu pai, da sensação de fazer algo quebrado funcionar novamente.

Foi durante uma dessas noites, com os pratos lavados e a luz suave da lua entrando pela janela, que a atração que sempre fervilhava sob a surface explodiu.

Eles estavam no sofá, sentados perto demais, o calor do corpo do outro uma presença constante e consciente. Axl estava falando sobre a pressão de escrever um novo álbum quando sua voz falhou. Ele olhou para Izzy, e o desejo nos seus olhos era tão cru que Izzy sentiu o ar sair de seus pulmões.

Sem uma palavra, Axl se ajoelhou no chão diante do sofá, suas mãos encontrando o zíper da calça de trabalho de Izzy.

"Izzy," ele sussurrou, seu nome uma prece. "Deixa-me."

E Izzy, com um gemido de rendição, deixou. Sua cabeça caiu para trás contra o sofá enquanto a boca de Axl – a boca que cantou para milhões – o envolvia com uma devoção que era quase religiosa. As mãos de Izzy enterraram-se nos cabelos de Axl, não guiando, apenas segurando, ancorando-se naquele turbilhão de sensação.

Foi a coisa mais íntima que ele já experimentou. Mais do que sexo, era adoração. Era entrega.

Quando a onda de prazer atingiu Izzy, foi com uma força que o cegou. Seus dedos se contraíram nos cabelos de Axl, um grito rouco escapando de seus lábios.

Axl olhou para cima, seu rosto uma mistura de triunfo e ternura. "Eu quero fazer você se sentir assim sempre," ele disse, sua voz rouca. "Só eu."

E então, naquele pequeno apartamento, eles fizeram amor. Foi lento, profundo, olhos abertos. Cada toque era uma promessa, cada beijo um contrato não escrito. Axl traçou cada centímetro do corpo de Izzy com suas mãos e lábios, como se estivesse memorizando um mapa para casa.

"Você é meu refúgio," Axl respirou, movendo-se dentro de Izzy com uma reverência que fazia o mecânico tremer. "Minha única coisa verdadeiramente real."

E Izzy, preso sob o peso e a verdade daquela declaração, apenas se entregou, permitindo que aquela sensação de pertencimento o inundasse, sabendo que, independentemente do que acontecesse a seguir, nada mais seria igual.

Eles adormeceram entrelaçados na cama pequena, o mundo lá fora esquecido, dois homens encontrando paz nos braços um do outro, no lugar mais inesperado.

---

Seis semanas se passaram. O que começara como uma atração proibida transformara-se em algo profundamente enraizado. Axl praticamente morava no apartamento acima da oficina. Seus guarda-roupas em Malibu estavam cheios de roupas de grife, mas ele vivia de jeans baratos e camisetas que cheiravam a gasolina e a Izzy.

E com a intimidade veio um humor peculiar, uma leveza que nenhum dos dois esperava. E a descoberta de que, longe dos holofotes, Axl Rose era um palhaço escondido com um lado sutilmente pervertido, e Izzy Stradlin escondia uma ternura secreta.

A cena começou em uma tarde de sábado. A oficina estava oficialmente fechada, mas Izzy estava terminando um trabalho no motor de uma Dodge Challenger 70. Ele estava debaixo do capô, concentrado, quando um par de mãos o agarrou por trás, cobrindo seus olhos.

"Pega num negócio aqui pra mim, mecânico," sussurrou uma voz áspera e familiar em seu ouvido.

Izzy sorriu contra as mãos de Axl. "Estou ocupado, Rose. Alguns de nós trabalham para viver."

"Eu também trabalho," Axl argumentou, esfregando seu corpo pau ereto contra as costas de Izzy. "Tô trabalhando duro pra te corromper."

Izzy riu, um som raro e livre. Ele se virou dentro do abraço de Axl. O rockstar estava vestindo apenas uma das regatas velhas de Izzy, que ficava justa em seus músculos, e um shorts de jeans surrado. Seus pés estavam descalços no chão de concreto sujo.

"Você é um perigo público," Izzy murmurou, suas mãos sujas de graxa encontrando a cintura de Axl.

"Só para você," Axl respondeu, antes de capturar seus lábios em um beijo profundo e lascivo. Sua língua invadiu a boca de Izzy com uma familiaridade ousada.

O beijo rapidamente se tornou mais intenso. As mãos de Axl desceram, abrindo o macacão de Izzy, puxando-o para baixo dos seus quadris.

"Axl... aqui não..." Izzy protestou, fraco, enquanto a boca de Axl encontrava seu pescoço.

"Por que não? É a sua oficina. Suas regras." Axl se ajoelhou, seu rosto nivelado com a cintura de Izzy. Ele puxou a cueca para baixo, libertando o pau já semi-ereto de Izzy. "Além disso, eu preciso de uma inspeção completa."

Izzy soltou um gemido quando a boca quente de Axl o envolveu. Suas mãos agarram a borda do capô do carro, seus joelhos amolecendo. "Porra... alguém pode ver..."

"Deixa eles verem," Axl rosnou, sua voz vibrando contra a pele sensível de Izzy. "Deixa todo mundo saber que o grande Axl Rose sabe engolir como um profissional."

A imagem obscena e a declaração arrogante foram a combinação perfeita. Izzy riu, um som ofegante e incrédulo, mesmo enquanto o prazer o dominava. "Seu... seu idiota... narcisista..."

"Seu idiota," Axl corrigiu, antes de afundar mais fundo, fazendo Izzy arquear as costas e gritar.

Foi rápido, sujo e incrivelmente excitante. A sensação de estar sendo desejado tão abertamente, tão irreverentemente, fez Izzy explodir na boca de Axl em questão de minutos, seu corpo tremendo contra o para-choque do carro.

Axl engoliou com um sorriso triunfante, limpando a boca com as costas da mão. "Serviço completo. Aceita cartão de crédito?"

Izzy, ainda ofegante, puxou Axl para cima por sua regata e o beijou com força, provando seu próprio gosto na boca do rockstar. "Você é insuportável."

"Você adora." Axl o virou e o dobrou sobre o capô quente do Challenger. "Minha vez."

O que se seguiu foi uma sessão de sexo que era igual partes comédia e pornografia. Axl, descobrira-se, era um tagarela obsceno durante o ato.

"Você gosta disso, não é, seu mecânico safado?" ele rosnou, lubrificando-se rapidamente com cuspe antes de pressionar a entrada de Izzy. "Gosta de ser comido no capô do seu carro?"

"Sim, porra, Axl, apenas... cala a boca e me come!" Izzy gemeu, suas mãos espalmadas no metal quente, seu corpo se curvando para encontrar o empurrão de Axl.

Mas Axl não calou a boca. Ele era um narrador pervertido de sua própria performance.

"Tão apertado... sempre tão apertado para mim... você guarda isso só para mim, Izzy? Essa quentinha... ah, porra..." Ele mudou o ângulo, buscando o ponto que fazia Izzy ver estrelas.

Izzy gritou, um som agudo e quebrado, quando Axl acertou em cheio. "Aí! Ai, caralho, Axl, aí mesmo!"

"É aqui que o meu mecânico gosta?" Axl bombou, cada investida profunda e precisa. "É aqui que você sente o rockstar te fodendo?"

"Sim! Seu egocêntrico... filho da puta... não para!" Izzy estava perdendo o controle, sua linguagem normalmente contida abandonada sob a investida de Axl e suas palavras sujas.

Axl riu, um som rouco e vitorioso. Ele se curvou sobre as costas de Izzy, sua boca perto de seu ouvido. "Quer que eu goze dentro de você, Iz? Quer que eu marque o meu território? Deixa você pingando de mim o dia todo enquanto conserta carros?"

A crueza das palavras, combinada com o prazer avassalador, foi demais para Izzy. Ele gritou o nome de Axl enquanto seu próprio orgasmo o atingia, seu sêmen espirrando no capô limpo do Challenger.

O espasmo interno de Izzy foi o gatilho para Axl. Com um rosnado gutural, ele enterrou-se até o fundo e despejou-se dentro de Izzy, seu corpo tremendo violentamente contra as costas do mecânico.

Eles desabaram juntos sobre o capô, ofegantes, suados, rindo entre respirações ofegantes.

"Você... você é a pior coisa que já me aconteceu," Izzy gemeu, seu rosto contra o metal.

Axl beijou seu ombro, suave agora. "Você mente tão mal, Stradlin." Ele fez uma pausa, olhando para a bagunça que fizeram. "Vamos precisar de um pano."

Izzy riu, um som exausto e feliz. "Você vai limpar."

"Justo." Axl deu um tapa leve na sua nádega antes de se levantar. "Mas só porque eu gosto de ver você de quatro."

Eles passaram a tarde rindo, limpando o carro (e a si mesmos), e descobrindo que, no final das contas, o amor podia ser tão leve, sujo e hilário quanto era profundo e intenso. Dois homens de mundos diferentes, encontrando não apenas paixão, mas também alegria, no lugar mais inesperado – e nos corpos um do outro.

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Dois anos se passaram desde que o mundo do rock e o mundo das ferramentas colidiram de forma permanente. A oficina "Stradlin & Sons" ainda cheirava a gasolina e óleo, mas agora também tinha um violão caro encostado no canto e, às vezes, o som de vocais de ensaio ecoando do apartamento acima.

A mudança não foi fácil. Houve manchetes – "AXL ROSE SOME COM MECÂNICO MISTERIOSO" – e um frenesi da mídia que durou meses. Axl, para surpresa de todos, incluindo ele mesmo, lidou com isso com uma serenidade inédita. Ele deu uma entrevista, apenas uma, para a Rolling Stone. A capa era uma foto dele e de Izzy, tirada no pátio da oficina, ambos de macacões sujos, segurando xícaras de café. A manchete: "ENFIM, MINHA REALIDADE".

Dentro, ele simplesmente disse: "Encontrei alguém que me ama pelo silêncio, não pelos gritos. E eu descobri que prefiro o silêncio."

Izzy, por sua vez, aprendeu a navegar nas bordas da fama. Ele não ia a eventos, não dava entrevistas. Sua vida ainda era a oficina. A diferença era que agora, às vezes, ele fechava mais cedo para voltar para casa – seu verdadeiro lar, uma casa modesta no vale que ele e Axl compraram juntos – onde um rockstar reformado o esperava, geralmente tentando (e falhando) cozinhar o jantar.

A dinâmica sexual deles havia evoluído. A paixão inicial e desesperada transformara-se em uma intimidade profunda e brincalhona. Eles se conheciam – cada curva, cada ponto fraco, cada som que o outro fazia no auge do prazer.

Foi nesse contexto que, em uma noite de terça-feira comum, a cena aconteceu.

Izzy chegou em casa exausto depois de um dia lutando com a transmissão de um caminhão velho. A casa cheirava a lasanha (queimada, provavelmente, obra de Axl) e a velas (que Axl acendia para disfarçar o cheiro da lasanha queimada).

Ele encontrou Axl no quarto, sentado na cama com um sorriso de orelha a orelha que era pura travessura.

"O que você fez?" Izzy perguntou, desconfiado, tirando a jaqueta.

"Nada!" Axl respondeu, muito rápido. "Só... pensei que a gente podia... inovar."

"Inovar," Izzy repetiu, deadpan. "A última vez que você 'inovou', eu quase precisei de um quiroprata."

"Essa foi diferente! E você gostou no final."

"Eu gostei de você parar," Izzy retrucou, mas ele estava se aproximando da cama, um sorriso pequeno brincando em seus lábios.

Axl pegou uma caixa discreta de embaixo da almofada. Era pequena, de papelão simples. "É para você."

Izzy abriu a caixa com cautela. Dentro, sobre um tecido preto, estava um estimulador de próstata. Era elegante, de silicone preto, com uma forma sinuosa e... intimidante.

Izzy ficou paralisado, olhando para o objeto, depois para o rosto animado de Axl. "O que... é isso?"

"É um massificador prostático de alta precisão!" Axl anunciou, como se estivesse apresentando um novo solo de guitarra. "Tem dez configurações de vibração e a ponta é anatomicamente projetada para..."

"Pare de falar como um manual de instruções," Izzy interrompeu, jogando a caixa na cama como se estivesse quente. "Eu não vou usar isso."

"Ah, vamos! É tecnologia, Iz! Avanço científico! Pense nisso como... uma ferramenta nova. Para o seu... você sabe." Axl gesticulou vagamente em direção à região inferior de Izzy.

"Minha 'oficina interna' não precisa de uma ferramenta elétrica, Axl."

"Mas eu quero ver!" Axl implorou, ajoelhando-se na cama. Sua expressão era de pura curiosidade lasciva. "Quero ver o que isso faz com você. Quero ver você perdendo o controle por causa de um pequeno... aparelho."

Izzy cruzou os braços. "Não."

"Por favor?" Axl puxou o cartão da culpa. "Lembra quando eu cantei 'Sweet Child O' Mine' inteiro no jantar de família da sua tia Edna?"

Izzy franziu o cenho. Foi um momento vergonhoso e, secretamente, um dos favoritos dele. "Isso é chantagem emocional de baixo nível."

"Funciona?" Axl perguntou, suas mãos já abrindo o botão da calça de Izzy.

"Talvez," Izzy murmurou, sua resistência diminuindo à medida que os dedos de Axl desciam pelo seu zíper.

Dez minutos depois, Izzy estava deitado de costas na cama, completamente nu, com um travesseiro sob os quadris. Ele estava corado, seus olhos fechados.

"Axl, isso é ridículo," ele resmungou, enquanto Axl lubrificava o brinquedo com um gel comestível de morango ("É temático!" Axl insistira).

"É ciência," Axl corrigiu, solene. Ele ligou o dispositivo. Um zumbido baixo preencheu o quarto. "Pronto para o lançamento, Sr. Engenheiro."

"Vou te matar," Izzy prometeu, mas seu protesto foi interrompido quando a ponta fria e lubrificada do brinquedo tocou sua entrada.

"Relaxa, querida," Axl sussurrou, sua voz suave e encorajadora. "Apenas... aceite a tecnologia."

Ele empurrou gentilmente. O brinquedo deslizou para dentro, sua forma curvada encontrando um caminho familiar. Izzy prendeu a respiração. Era uma sensação estranha – não era Axl, não era humano, mas era... intenso.

"E agora..." Axl anunciou, como um mágico no palco, "...o grande finale!" Ele girou o botão.

O zumbido tornou-se uma vibração profunda e penetrante que fez com que todo o corpo de Izzy se estremecesse. Seus olhos se arregalaram.

"Porra!"

"Bom?" Axl perguntou, seu rosto iluminado com pura alegria maliciosa.

"Desliga isso!" Izzy tentou se afastar, mas Axl segurou seus quadris.

"Espera, espera, só... deixa eu ver." Axl ajustou a configuração. A vibração mudou, tornando-se mais rápida, mais focada.

Um gemido longo e involuntário escapou dos lábios de Izzy. Suas mãos agarraram os lençóis. "Axl... isso é... ah, caralho..."

"É o ponto G, seu idiota genial!" Axl exclamou, triunfante. "Eu li sobre isso! É uma coisa real!"

Izzy não conseguia mais falar. A sensação era incrível – uma pressão e vibração constantes e precisas que atingiam um nervo que ele nem sabia que tinha com tanta clareza. Seu próprio membro, que estava flácido de ceticismo, estava agora completamente ereto e latejante contra sua barriga.

Axl observou, fascinado, enquanto o corpo de Izzy se contorcia no colchão. "Você é tão lindo assim," ele murmurou, sua voz cheia de admiração. "Olha para você, todo entregue a um pedaço de silicone. Eu devia ter ciúmes."

"Se você... parar... eu te mato... devagar," Izzy gemeu entre respirações ofegantes.

Axl riu e, então, decidiu se juntar à festa. Ele se posicionou entre as pernas abertas de Izzy, substituindo o brinquedo pela ponta de seu próprio membro, já duro e pronto.

A sensação de trocar a vibração constante pela carne quente e familiar de Axl foi avassaladora. Izzy gritou quando Axl penetrou, a sensação amplificada mil vezes pela estimulação anterior.

O sexo que se seguiu foi caótico e hilário. Axl não conseguia parar de rir, maravilhado com a reação hiper-sensível de Izzy. Cada investida era recebida com um gemido abafado e um contra-ataque de xingamentos criativos.

"Tão... tão sensível," Axl rosnou, maravilhado, sentindo o corpo de Izzy contrair around dele de uma maneira nova e louca.

"Cala a boca e me come, seu... seu cientista louco!" Izzy ordenou, suas pernas envolvendo a cintura de Axl com força.

O orgasmo de Izzy foi tão intenso que foi quase violento. Ele gritou, um som rouco e quebrado, enquanto jorrava entre seus estômagos. A visão foi o suficiente para levar Axl junto, ele desabando sobre Izzy com um último empurrão profundo e um gemido de pura felicidade.

Eles ficaram deitados depois, um emaranhado de suor, risadas e gel de morango.

"Okay," Izzy admitiu, ofegante, seu rosto enterrado no pescoço de Axl. "Talvez... talvez a tecnologia tenha seus usos."

Axl beijou seu ombro, seu corpo ainda tremendo de riso e prazer. "Eu te disse. Próxima vez, compro um que seja controlado por um app no meu telefone."

Izzy levantou a cabeça, alarmado. "Você não faria isso."

Axl apenas sorriu, seus olhos brilhando com promessas de futuras travessuras. E no fundo, mesmo exausto e levemente traumatizado, Izzy sabia que não trocaria aquela vida por nada no mundo. Ele tinha um rockstar aposentado, um brinquedo sexual e uma oficina. Era bagunçado, era engraçado, era real.

Era tudo que ele sempre quisera, sem nunca saber.

 

💫 Fim.

Chapter 4: Avisos de Sangue

Summary:

Ano de 1996. Izzy vive isolado, tentando encontrar a paz longe de tudo e de todos. Mas a paz vira pesadelo quando visões de um Axl do passado começam a assombrar sua casa no interior... visões reais, com um toque gelado e um desespero que avisa: um acidente mortal está prestes a acontecer.

Será que Izzy está enlouquecendo? Ou será que o amor deles é forte o suficiente para cruzar a linha entre a vida e a morte e evitar uma tragédia?

Notes:

✨ Oii gente!

Que frio na barriga liberar esse capítulo! "Avisos de Sangue" foi uma história muito intensa de escrever, mergulhando no terror psicológico e nesse amor gótico e atormentado do Izzy e do Axl.

Contem pra mim: qual foi a parte que mais mexeu com vocês? Ficaram com medo? Torceram pelo reencontro deles?

Como sempre, cada comentário de vocês é um combustível enorme para minhas próximas histórias!

Amo vocês! 😘

Chapter Text

O suor escorria da nuca de Izzy, frio como lâmina, mesmo antes de seus olhos se abrirem para a escuridão opressora do quarto. O sonho – não, o pesadelo – se desfez em farrapos, mas a sensação permaneceu: uma mão gelada em seu peito, afundando através das costelas, apertando-lhe o coração até que a dor o arrancasse daquele torpor. Ele se sentou na cama, ofegante, o ar do quarto noturno mordendo sua pele úmida. A casa de madeira, herdada de um tio que ele mal conhecia, rangia com a sinfonia habitual dos assombrados: o estalo de uma viga contraindo-se com o frio, o sussurro do vento cortando as frestas, o cheiro onipresente de mofo e terra úmida.

Indiana, em 1996, era o fim do mundo. E era exatamente por isso que ele estava aqui. Longe de Los Angeles, longe das memórias incandescentes, longe de tudo que pudesse lembrá-lo do buraco negro que ele e Axl haviam cavado juntos. A sobriedade era uma lâmina de dois gumes: trazia uma clareza cruel para todas as feridas que ele tentara afogar em químicos.

Ele desceu as escadas, os pés descalços contraindo-se no assoalho gelado. A sala estava mergulhada em sombras, iluminada apenas pela luz fantasmagórica da lua que filtrada pela janela suja. E foi então que ele viu.

Não era uma lembrança. Era uma presença.

Sentado no velho sofá de veludo, com a postura desleixada e familiar que cortou a respiração de Izzy, estava Axl. Mas não o Axl de agora, seja lá como ele fosse. Era o Axl de 1987, o de cabelos ruivos flamejantes caindo sobre os ombros, o rosto ainda suave, mas com um brilho de fúria contida nos olhos claros. Usava a jaqueta de couro rasgada que Izzy lembrava de ter cheirado, uma vida atrás – tabaco, uísque barato e a eletricidade estática da juventude.

"Izzy," a voz saiu dele, mas não era o som que Izzy guardava na memória. Era um sussurro rouco, arrastado, como se viesse de um lugar sem ar.

Izzy paralisou, os dedos se enterrando na madeira áspera do batente da porta. Não é real. É a abstinência. É a loucura finalmente vindo me buscar. Ele repetiu o mantra interno, mas seu corpo não acreditava. O ar ao redor da figura baixara vários graus; uma geada invisível formava um halo ao redor do fantasma no sofá.

O fantasma de Axl se levantou, o movimento fluido e irreal. Ele cruzou a sala sem fazer um único ruído, seus passos não perturbando a poeira no chão. O frio que emanava dele era uma parede viva, atingindo Izzy em ondas. Ele parou a centímetros, tão perto que Izzy podia ver os detalhes impossíveis: os fios de cabelo, a textura do couro, a sombra de cansaço sob aqueles olhos que o fitavam com uma intensidade devastadora.

"Tem que ouvir," o fantasma sussurrou, e sua mão se ergueu.

Izzy recuou instintivamente, mas foi tarde demais. Os dedos de Axl, ou a ilusão deles, tocaram sua face.

O contato foi uma punhalada de gelo. Não era o toque de um homem, era o toque da morte, do tempo congelado. Uma dor aguda, profunda, percorreu a mandíbula de Izzy, tão real quanto a madeira sob seus pés. Ele gritou, um som abafado de pavor, mas não conseguiu se afastar. A mão fantasmagórica estava grudada em sua pele, queimando com um frio absoluto.

"Algo... ruim," o Axl jovem sussurrou, seu rosto se contorcendo em agonia. Os olhos claros pareciam implorar, suplicar por algo que Izzy não conseguia compreender. "A estrada... o vidro... tanto sangue, Iz. Tanto sangue."

Cada palavra era um fragmento de gelo cravado em sua mente. Estrada. Vidro. Sangue. Imagens caóticas surgiram: faróis cegantes no escuro, o brilho mortal de cacos no asfalto, um vermelho vivo e escorrendo.

"O que? Que acidente?" Izzy perguntou, sua voz trêmula, as mãos tremendo violentamente. O toque frio estava se espalhando, entorpecendo o lado do seu rosto. "É com você? É comigo?"

O fantasma não respondeu. Em vez disso, sua expressão mudou, a fúria dando lugar a um desespero profundo, uma solidão que parecia engolir a sala. A mão gelada deslizou da face de Izzy para a nuca, puxando-o para frente. Era um movimento de intimidade brutal, possessivo. Izzy sentiu o cheiro fantasma dele – suor, pólvora e algo metálico, como o ferro do sangue.

Os lábios de Axl se aproximaram do seu ouvido. "Você tem que parar. Tem que me encontrar."

O frio da respiração fantasma fez Izzy estremecer dos pés à cabeça, uma reação visceral de medo e uma saudade tão profunda que doía mais que o gelo. Era um desespero sensual e agonizante, a caricatura de um afeto que outrora queimava.

E então, como um fio desfiando, a figura começou a perder a substância. O Axl jovem, o fantasma de sua própria raiva e paixão, dissolveu-se no ar. A pressão gelada na nuca de Izzy desapareceu, deixando para trás apenas uma dormência dolorosa e a memória vívida do toque.

Izzy caiu de joelhos no chão frio da sala, o corpo tremendo incontrolavelmente. Ele levou a mão ao rosto, esperando encontrar gelo, mas havia apenas sua própria pele, quente e suada. O cheiro de mofo e terra agora carregava um vestígio fantasma de pólvora e desespero.

Ele não estava enlouquecendo. A loucura não doía daquela forma, não cheirava daquela maneira. Algo estava errado. Algo estava terrivelmente errado com Axl. E o fantasma do seu passado, carregando o peso gelado de uma eternidade de avisos, tinha vindo até ele para contar.

A noite se arrastou, pesada e impenetrável como alcatrão. Izzy não conseguiu retornar ao quarto. Ficou enrolado no sofá velho – o mesmo onde a aparição se sentara –, envolto em um cobertor que não conseguia dissipar o frio que havia se instalado em seus ossos. Cada som da casa, cada estalo, era o regresso daquele espectro. Seu coração martelava contra as costelas, um tambor primitivo de pavor. A dormência no lado do rosto onde os dedos gelados de Axl o tocaram havia cedido, mas uma sensação residual permanecia, como uma queimadura de gelo. Real. Foi real. A negação, seu escudo frágil, rachara.

A madrugada trouxe um cinza sujo pela janela, mas não trouxe alívio. A luz do dia não conseguia penetrar a sombra que a visita havia deixado para trás. Izzy vagou pela casa, um fantasma ele mesmo, os sentidos aguçados até o limite do suportável. A xícara de café tremia em sua mão, o líquido amargo e quente não conseguia aquecer o gelo interno. "Tem que me encontrar." A voz sussurrada ecoava em sua mente, mesclando-se com o rangido da madeira e o assovio do vento.

Foi no porão, mais tarde, buscando uma garrafa de água que não precisava, que a segunda manifestação o encontrou.

O ar no porão era ainda mais frio, carregado do cheiro de terra e umidade. A única luz vinha de uma lâmpada fraca pendurada por um fio. Ele se virou e lá, encostado na prateleira de mantimentos enlatados, estava outro Axl.

Este era mais velho, consumido. O rosto estava marcado por linhas de amargura e excesso, a pele pálida e suada. Os olhos, afundados nas órbitas, ardiam com uma febre doentia. Era o Axl do colapso, da raiva que virou veneno. Ele usava uma camisa suada de um palco imaginário, e seus punhos estavam cerrados.

"Izzy," a voz dele era um rosnado, rouca e cheia de desdém, mas o desespero por trás era o mesmo. "Você sempre foi covarde. Fugindo para este buraco."

Izzy encostou-se na parede fria, as pernas amolecendo. "Você não está aqui," ele sussurrou, mas as palavras soaram vazias. O frio emanava do espectro, mais intenso que o do porão.

"Eles vão te quebrar de novo," o fantasma cuspiu, avançando. O cheiro que vinha dele era acre, de uísque barato e vômito. "A estrada... a curva é muito fechada. Os pneus... não aguentam."

Ele estendeu a mão, e Izzy, paralisado, viu os dedos fantasmagóricos se fecharem em torno de seu pulso.

A dor foi instantânea e agonizante. Não era apenas frio; era uma sensação de congelamento profundo, como se seus tendões e ossos estivessem sendo transformados em gelo. Izzy gritou, tentando se libertar, mas a força do fantasma era irreal, inumana.

"Você vai ficar sozinho no escuro," o Axl doente sussurrou, seu rosto a centímetros do de Izzy. O hálito era um sopro gélido do túmulo. "Vai sangrar sozinho na vala. *Eu* vou sangrar sozinho."

A imagem explodiu na mente de Izzy: uma curva fechada em uma estrada escura, um guardrail torcido, o brilho sinistro de vidros quebrados espalhados como diamantes sob a luz da lua. E o vermelho. Muito vermelho.

Assim como o primeiro, este fantasma começou a se desfazer, mas a dor no pulso de Izzy persistiu, uma faixa de gelo vivo em sua pele. Quando a visão se foi completamente, ele deslizou pela parede até o chão de concreto, segurando o pulso ferido. A pele estava normal ao toque, mas a sensação de congelamento interno latejava, uma lembrança física inegável.

Agora ele tinha mais peças do quebra-cabeça aterrorizante. *Estrada. Curva fechada. Pneus. Vidro. Sangue.* E o aviso era para os dois. O acidente, seja ele qual fosse, os envolvia. O Axl do passado, o Axl doente... eles estavam tentando evitar um futuro sangrento.

O pavor inicial começou a se transformar em algo diferente: uma determinação desesperada. A loucura não deixava marcas físicas. A loucura não sussurrava avisos coerentes. Algo horrível estava prestes a acontecer, e os ecos de Axl, de seu amor e de sua dor, haviam cruzado o tempo e o espaço para alertá-lo.

Izzy subiu as escadas do porão, o corpo doendo como se tivesse sido espancado. Ele olhou para o telefone na cozinha, um aparelho bege e empoeirado. A última vez que falara com Axl, anos atrás, as palavras tinham sido facas. Agora, o silêncio entre eles era uma entidade viva, um abismo que precisava ser atravessado.

O fantasma disse: "Tem que me encontrar."

Era um aviso. Era um pedido de socorro.

Com uma mão ainda tremendo, Izzy pegou o telefone. A discagem pareceu ecoar pela casa silenciosa, cada clique um passo em direção ao abismo. Ele não sabia o que diria. Não sabia se Axl atenderia, ou se ele mesmo não estava, de fato, louco. Mas o frio no seu pulso era real. A mensagem era real.

O telefone do outro lado tocou uma, duas vezes. E então, uma voz áspera, desconfiada, que ele não ouvia há uma eternidade, atendeu.

"Alô?"

E Izzy, com o coração na garganta e o gelo do toque de um fantasma ainda fresco em sua pele, respirou fundo.

"Axl?" sua voz saiu quebrada, um sussurro rouco. "É o Iz. Preciso... preciso te ver."

O silêncio do outro lado da linha era pesado, carregado de anos de mágoa. Mas então, a voz de Axl respondeu, mais suave do que ele esperava, mas com uma tensão subjacente que ecoava seu próprio desespero.

"Iz? Que diabos... Está tudo bem?"

Izzy fechou os olhos, a imagem da curva fechada e dos cacos de vidro brilhando em sua mente. "Não," ele disse, a verdade saindo como um suspiro. "Não está. Acho que... acho que nenhum de nós está. Preciso te ver, Axl. Agora."

Era um risco. Era um salto no escuro, guiado pelos sussurros de fantasmas e pelo frio persistente de um aviso do além. Mas pela primeira vez em anos, o medo de Izzy não era mais da loucura, ou do passado. Era do futuro que esses fantasmas estavam desesperados para evitar. E ele não ia deixar que isso acontecesse. Não desta vez.

O encontro foi marcado para um bar de estrada a meio caminho entre a solidão de Indiana e a cidade onde Axl estava. Um lugar neutro, anônimo, onde ninguém olharia duas vezes para dois homens com o peso de uma história difícil estampada no rosto. A viagem foi um blur de paisagens monótonas e a tensão latejante no pulso de Izzy, onde a memória do toque gelado do fantasma persistia como uma neuropatia fantasma.

Ele chegou primeiro. O bar era tão sombrio e impregnado de cheiro de cerveja azeda e desinfetante barato quanto ele imaginara. Escolheu um booth no fundo, de costas para a parede, instinto antigo de um homem que sempre se sentiu mais observado do que deveria. As mãos, envoltas nas mangas de sua jaqueta, tremiam ligeiramente. Ele as esfregou na mesa de fórmica pegajosa, tentando se aquecer, tentando se ancorar.

A porta do bar se abriu, deixando entrar uma lança de luz do fim de tarde. E lá estava ele.

Axl.

Não um fantasma, não uma memória, mas um homem de carne e osso. Mais velho, visivelmente. O rosto estava mais marcado, os ombros um pouco mais curvados sob a jaqueta de couro, mas os olhos... aqueles olhos claros ainda tinham a mesma intensidade, agora temperada por uma cautela profunda. Ele varreu o bar com o olhar até encontrar Izzy no booth. Por um momento, parecia hesitar, um pé ainda no mundo de fora. Então, ele se moveu, seu andar ainda carregando um eco daquela ginga arrogante, mas mais contido.

Sentou-se do outro lado da mesa. O silêncio entre eles era físico, um bloco de granite.

"Iz," Axl cumprimentou, a voz mais baixa e rouca do que a lembrança de Izzy, sem a agulha no vinil de sua raiva juvenil.

"Axl," Izzy respondeu, o nome saindo estranho na sua boca, como uma língua que ele não falava há anos.

Mais silêncio. Um garçon cansado veio, anotou seus pedidos – um café para Izzy, uma água com gás para Axl – e foi embora, indiferente ao drama silencioso que se desenrolava em sua mesa.

"Você parece... sóbrio," Axl disse finalmente, os olhos escaneando o rosto de Izzy, procurando algo, talvez os mesmos fantasmas que assombravam Izzy.

"Estou tentando," Izzy respondeu, evitando o olhar. "Você... você parece cansado."

Axl soltou um riso curto, sem humor. "É o que o tempo faz, não é?" Ele girou o copo de água na mesa. "Por que, Iz? Depois de todos esses anos. Por que agora?"

Izzy respirou fundo. Por onde começar? Por favor, não me leve para um hospício."Eu... eu não sei como dizer isso." Ele olhou para suas próprias mãos. "Tenho tido... sonhos. Visões."

Axl ficou imóvel. "Visões."

"De você," Izzy confirmou, ousando um olhar rápido. A expressão de Axl era indecifrável. "Não são só lembranças, Axl. É... diferente. É como se... como se você estivesse lá. Na minha casa. Me tocando." A palavra "tocando" saiu como um sussurro. Ele instintivamente esfregou o pulso.

O rosto de Axl se contraiu. Ele olhou para as mãos de Izzy, então de volta para seu rosto. "Tocando você?"

"Estão tentando me avisar sobre algo," Izzy continuou, a voz ficando mais urgente. "Sobre um acidente. Na estrada. Uma curva fechada, pneus, vidro... muito sangue." Ele fechou os olhos, as imagens invadindo. "Eles dizem que vai acontecer com a gente. Com você. Comigo. Que vamos sangrar sozinhos naquela vala."

Quando ele abriu os olhos, a expressão de Axl havia mudado. A cautela dera lugar a algo mais profundo, mais cru. Um reconhecimento alarmado.

"Pare," Axl disse, sua voz um fio de ameaça. "Pare com isso."

"Eu não estou inventando!" Izzy insistiu, a frustração e o medo borbulhando. "É real, Axl! Eu sinto o frio deles. Eles me tocam e é como ser tocado por um cadáver. O jovem você, o você doente... eles estão desesperados!"

Axl se inclinou para frente, seus olhos fixos em Izzy com uma intensidade quase física. "Como você sabe?" ele sussurrou, a voz áspera. "Sobre a curva? Sobre os pneus?"

Izzy sentiu um frio que não era de fantasma algum. "O que você quer dizer?"

"Eu..." Axl pareceu lutar com as palavras, seu orgulho se debatendo contra algo mais primitivo. "Eu tenho um show. Daqui a duas noites. A estrada para o local... há uma curva. Uma curva de merda. Meus pneus traseiros... estão carecas. Eu sei que estão. Eu vi. E eu sonhei... caramba, eu também sonhei." Ele passou uma mão pelo rosto, e pela primeira vez, Izzy viu o verdadeiro medo nele. "Sonhei com você. Parado na beira da estrada, coberto de sangue, me olhando. E eu estava no carro, tentando frear, mas não conseguia..."

O ar saiu dos pulmões de Izzy. Não era apenas ele. O aviso era uma via de mão dupla, um eco entre eles, uma ressonância do desastre que se aproximava.

"É real," Izzy repetiu, mas agora era uma constatação, não uma defesa.

Os olhos de Axl se encontraram com os dele, e pela primeira vez em uma década, não havia barreiras entre eles. Apenas o puro, cru e aterrorizante entendimento.

"O que a gente faz, Iz?" Axl perguntou, a voz dele soando jovem, vulnerável, como na época em que confiavam um no outro.

Izzy olhou para o homem do outro lado da mesa. Não um fantasma, mas a fonte de todos eles. Seu maior amor e sua maior dor. E ele sabia a resposta. O aviso não era para aterrorizá-los. Era para uni-los.

"A gente conserta os pneus," Izzy disse, a voz firme pela primeira vez naquela noite. "E a gente não pega aquela estrada sozinho. A gente vai junto."

Axl o fitou, e uma lenta, trêmula compreensão começou a brilhar em seus olhos. Era um plano simples. Era um começo. O peso da eternidade, carregado por fantasmas do passado e do futuro, parecia um pouco mais leve, compartilhado entre os dois naquele bar sujo, sob a luz fraca de um novo começo.

---

A estrada era uma serpente negra sob um céu sem lua. A picape velha de Izzy rugia, um som rouco e familiar que preenchia o silêncio tenso dentro da cabine. Dois dias se passaram desde o bar. Dois dias de telefonemas truncados, de ajustes de logística, de uma trégua frágil construída sobre a base de um terror compartilhado.

Axl estava ao seu lado, um vulto imóvel encostado na porta do passageiro. Ele olhava a estrada que se desenrolava à frente, seus dedos batendo um ritmo nervoso no joelho. Não era o Axl dos palcos, nem o fantasma raivoso do porão. Era um homem cansado, assustado, com o peso de um presságio nos ombros.

"Você tem certeza que trocou os pneus?" Izzy perguntou, a voz soando áspera no espaço confinado. Era a terceira vez que ele fazia a mesma pergunta.

"Sim, Izzy. Troquei os pneus dianteiros e traseiros. O mecânico achou que eu estava louco," Axl respondeu, sem virar a cabeça. "A curva é daqui a uns vinte minutos. Depois do posto de gasolina abandonado."

Izzy assentiu, os nós dos dedos brancos no volante. A informação do "posto abandonado" era nova, um detalhe que não havia surgido nas visões. Um frio que não era do ar-condicionado pobre do carro correu sua espinha. Os fantasmas estavam certos. Cada detalhe se encaixava como um parafuso em uma tampa de caixão.

O silêncio retornou, mais pesado desta vez. A paisagem era um vazio escuro, pontuado apenas pelos olhos amarelos de refletores quebrados. O cheiro de mofo do carro de Izzy se misturava com o restolho do perfume amadeirado que Axl ainda usava, uma âncora sensorial de um passado que não queria ficar para trás.

"Lembra daquele lugar em Lafayette?" Axl disse de repente, sua voz um baixo sussurro quase engolido pelo ruído do motor. "O backstage fedendo a cerveja e suor. E a gente dividiu aquele último gole de uísque... antes de tudo ir para o inferno."

Izzy sentiu um aperto no peito. "Lembro." Ele se lembrava do sabor acre na língua, do calor do corpo de Axl encostado no seu, da frágil ilusão de invencibilidade. "Você jogou a garrafa contra a parede depois."

"Você me olhou como se eu tivesse matado o seu cachorro," Axl riu, um som seco e vazio.

"Eu estava cansado, Axl. Cansado da bagunça. Cansado de... de nos machucarmos."

O ar entre eles pareceu vibrar com as palavras não ditas. O carro passou por uma placa oxidada anunciando o posto de gasolina abandonado. Um esqueleto de concreto e metal contra o céu noturno. O coração de Izzy acelerou.

"A curva é depois daquele morro," Axl disse, a voz agora tensa, todo o seu corpo alerta.

Izzy reduziu a velocidade, as luzes da picape cortando a escuridão. A estrada subia suavemente e então descia, e lá estava ela. Uma curva fechada à direita, mais apertada do que parecia nas visões, ladeada por uma vala profunda e um guardrail retorcido e enferrujado como os ossos de um animal morto.

E então, por uma fração de segundo, as luzes do carro captaram algo. Um vulto. Parado no acostamento, exatamente no ponto onde a curva era mais traiçoeira.

Era ele.

O seu fantasma. O Izzy do futuro, o que sangraria sozinho na vala. Estava pálido, ensanguentado, os olhos cavos e cheios de um terror infinito. Ele fitava o carro que se aproximava, e sua boca se abriu em um grito silencioso.

Izzy gritou e instintivamente virou o volante para a esquerda, para o lado oposto ao fantasma, para o lado oposto da vala.

"IZZY!" Axl berrou, agarrando o painel.

Os pneus novos chiaram, morderam o asfalto. O carro fez uma travagem violenta, balançando, a traseira ameaçando escorregar. Por um instante eterno, tudo pareceu pairar no limbo – o cheiro de borracha queimada, a respiração presa de Axl, a imagem do seu próprio rosto ensanguentado fixa na retina de Izzy.

E então, o carro parou. De forma abrupta e antideslumbrante. O para-choque dianteiro estava a centímetros do guardrail enferrujado.

A escuridão e o silêncio desceram como um cobertor.

A respiração ofegante dos dois era o único som. Izzy estava encolhido sobre o volante, todo o seu corpo tremendo violentamente. Ele esperava sentir o impacto, o estilhaçar de vidro, a dor.

"Não... não aconteceu," ele gaguejou, levantando a cabeça.

Axl estava encarando o lugar onde o fantasma estivera. Não havia nada lá. Apenas a escuridão vazia.

"Eu vi," Axl sussurrou, sua voz rouca com o choque. "Eu vi você ali. Sangrando."

Eles saíram do carro, as pernas bambas. O ar noturno era frio e doce. Izzy encostou-se na lateral quente da picape, as pernas cedendo. Ele olhou para a vala, para o guardrail que teria rasgado o carro deles. A imagem do fantasma ainda queimava em sua mente, mas o pavor agora se misturava com um alívio tão profundo que doía.

Axl veio até ele. Sem uma palavra, ele estendeu a mão e tocou o rosto de Izzy. A mão estava quente. Viva. Nada daquela morte gelada das visões.

O toque foi um choque. Foi um rompimento. Todos os anos de raiva, de mágoa, de solidão, pareceram rachar naquele único contato. Izzy fechou os olhos, deixando aquele calor banhar sua pele, lavando o resíduo fantasmagórico do frio.

"Porra, Iz," Axl disse, sua voz embargada. "Quase... quase perdemos tudo. De novo."

Izzy abriu os olhos e viu que os de Axl estavam brilhando com lágrimas não derramadas. Ele colocou sua própria mão sobre a de Axl, pressionando-a contra seu rosto.

"Mas não perdemos," Izzy respondeu, a voz firme, limpa. "Os fantasmas... eles não vieram para nos assombrar. Eles vieram para nos dar outro chance."

Eles ficaram ali, na beira da estrada escura, os dois encostados um no outro, o calor de seus corpos afastando o frio da noite e o gelo do passado. O peso da eternidade, aquele fardo de amor e dor que eles carregavam, não havia desaparecido. Mas agora, finalmente, era compartilhado. E no silêncio que se seguiu, quebrado apenas pelo suspiro do vento na vala, não havia mais sussurros de fantasmas. Apenas a promessa pesada, dolorosa e feliz de um novo amanhecer.

O amanhecer encontrou-os ainda na estrada, encostados no capô da pickup, envoltos em um silêncio que não era mais incômodo, mas compartilhado. O primeiro raio de sol cortou a neblina matinal, iluminando o guardrail amassado e a vala profunda que agora parecia menos uma sepultura e mais um marco. Um marco de uma vida que não foi vivida.

"Preciso cancelar o show," Axl disse, sua voz rouca pela noite sem dormir. Ele não olhou para Izzy, mas para o horizonte que se coloria de laranja e rosa.

Izzy simplesmente assentiu. Não era uma discussão. Era um fato. A estrada que levava ao show era esta, e esta estrada agora estava impregnada de um fantasma que ambos haviam visto. Nenhum deles tinha estômago para encarar palcos e multidões. Não ainda.

A viagem de volta para a casa de Izzy foi feita em um silêncio contemplativo. A tensão havia se dissolvido, substituída por uma exaustão profunda e uma estranha serenidade. O perigo havia passado. O aviso fora atendido.

Ao entrar na casa, o cheiro de mofo e isolamento pareceu diferente para Izzy. Já não era o cheiro de sua fortaleza solitária, mas o cheiro de um lugar que precisava ser arejado. Axl parou no meio da sala, seus olhos percorrendo as estantes empoeiradas, o sofá gasto, a janela suja que mostrava o campo cinza de inverno.

"Porra, Iz. Você vive mesmo no fim do mundo," ele comentou, mas não havia julgamento em sua voz. Havia uma ponta de preocupação.

"Era o que eu precisava," Izzy respondeu, deixando as chaves em uma tigela sobre a mesa. "Ou o que eu pensava que precisava."

Eles passaram o dia naquele espaço confinado, dois fantasmas se reacostumando à carne e ao osso. A conversa era hesitante no início, evitando os abismos do passado, focando no presente imediato – a comida enlatada que Izzy tinha, o café forte que ele preparou, o frio que insistia em entrar pelas frestas.

Mas à medida que a noite caía, trazendo de volta a escuridão que tanto temiam, as barreiras começaram a ruir. Sentados no sofá, com apenas a luz de uma lâmpada de chão, as palavras vieram. Primeiro, sobre os fantasmas.

"O primeiro que eu vi era você, de cabelo ruivo, com a jaqueta de couro rasgada," Izzy confessou, olhando para as próprias mãos. "Ele tocou meu rosto. Foi o mais frio que já senti na vida."

Axl ficou em silêncio por um longo momento. "Eu... eu tive pesadelos. Por anos. Sempre a mesma estrada, a mesma curva. Mas nos últimos meses... eram mais vívidos. Eu te via, mas você estava longe. E eu gritava, mas você não ouvia." Ele olhou para Izzy, seus olhos carregados de uma vulnerabilidade crua. "Acho que eu estava com medo de que você não se importasse mais. De que eu gritasse e só houvesse silêncio."

"Eu sempre me importei," a voz de Izzy saiu como um fio, carregada de uma verdade que doía para admitir. "Foi mais fácil fingir que não."

A conversa fluiu então, lenta e dolorosamente, como limpar uma ferida infectada. Falaram da briga, das palavras que não podiam ser retiradas, do caminho separado que parecia o único possível na época. A raiva de outrora havia se transformado em uma tristeza profunda, um luto pelo que haviam perdido.

E então, no ápice daquela noite de confissões, Axl se moveu. Ele se levantou e se ajoelhou na frente de Izzy, no chão áspero da sala. Suas mãos, aquelas mesmas mãos que Izzy vira cerradas em fúria em suas visões, envolveram o rosto de Izzy com uma delicadeza devastadora.

"Iz," ele sussurrou, seu olhar percorrendo cada linha do rosto do outro homem como se estivesse vendo-o pela primeira vez. "Eu sinto muito. Por tudo."

Izzy fechou os olhos, afundando naquele toque. A mão de Axl estava quente. Viva. Nada da morte gelada dos espectros. Era a calorosa, trêmula e real prova de que eles haviam sobrevivido. Ele colocou sua mão sobre a de Axl, sentindo os nós dos dedos, as veias, a vida pulsando sob a pele.

Quando se encontraram no beijo, foi como um suspiro longo e contido sendo finalmente liberado. Não era o fogo devorador de sua juventude, mas algo mais profundo, mais duradouro. Era um beijo de perdão, de reconhecimento, de um amor que, contra todas as probabilidades, não havia sido erradicado pelo tempo, pela raiva ou pela dor. Era salgado com o gosto de lágrimas que nenhum deles sabia de quem eram.

Naquela noite, na cama estreita de Izzy, sob o cobertor que finalmente conseguia aquecê-los, eles se redescobriram. A intimidade foi lenta, tátil, carregada de uma reverência solene. Cada toque era uma pergunta, cada resposta um suspiro de alívio. As mãos de Axl percorreram as costas de Izzy, sentindo as cicatrizes velhas e as novas tensões, traçando o mapa de sua solidão. E Izzy, por sua vez, enterrou o rosto no pescoço de Axl, respirando fundo o cheiro dele – não mais o fantasma de pólvora e desespero, mas o aroma terroso e real de suor, pele e uma paz duramente conquistada.

Não havia fantasmas no quarto. Apenas dois homens, quebrados e remendados, encontrando refúgio um no outro. O toque frio das visões foi substituído pelo calor compartilhado sob os lençóis, um calor que afastou o último resquício de gelo que habitava seus ossos.

Pela primeira vez em anos, Izzy dormiu. E não houve sonhos.

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O inverno rigoroso de Indiana começou a ceder, lentamente, para uma primavera tímida. A neve suja derreteu, revelando a terra marrom e promissora sob o sol pálido. Na casa de Izzy, algo igualmente profundo estava descongelando.

Os primeiros dias após a noite no sofá foram estranhos, um delicado equilíbrio entre a velha familiaridade e o medo de estragar a frágil paz que construíram. Axl não falou em ir embora. Izzy não sugeriu que fosse. Foi um entendimento tácito, tão natural quanto a mudança das estações do lado de fora. Eles estavam se reerguendo, tijolo por tijolo, palavra por palavra silenciosa.

Uma semana depois, Axl chegou da cidade com sacolas de supermercado. "Você vive de comida enlatada e café, Iz. Um de nós precisa sobreviver para contar a história," ele disse, um quase-sorriso brincando em seus lábios. Ele cozinhou um ensopado, algo simples, mas o aroma de alho e cebola refogando preencheu a casa com um calor que ela nunca tinha conhecido.

Eles começaram a trabalhar. Foi Axl quem puxou o primeiro martelo, batendo em uma prateleira solta na sala com uma energia concentrada que não era raiva, mas propósito.
"Essa casa vai desabar na nossa cabeça se a gente não fizer alguma coisa," ele disse, suando apesar do frio.

Izzy, inicialmente relutante, logo se juntou a ele. Consertar a cerca quebrada no fundo do terreno tornou-se uma metáfora. Cada estaca cravada no solo úmido era um pedaço de seu território compartilhado sendo reivindicado. Pintar a porta da frente de um verde escuro e forte foi um ato de rebeldia contra a penumbra. Eles trabalhavam em silêncio, a maioria das vezes, o som de suas ferramentas e sua respiração ofegante formando uma nova sinfonia para a casa. O trabalho físico, longe dos holofotes e das crises, era um bálsamo. Drenava a ansiedade, cansava os corpos de uma forma que o vício e a paranoia nunca conseguiam.

As conversas vinham em pedaços, entre uma pausa para água e o início de uma nova tarefa.

"Lembra daquele riff? Aquele da 'Bad Obsession'?" Izzy perguntou uma tarde, lixando um pedaço de madeira para uma janela.

Axl parou, uma chave inglesa na mão, seu rosto iluminado por um verdadeiro sorriso. "Porra, lembro. Você veio com aquilo no fundo do ônibus, fedendo a cigarro e insônia."

"E você odiou de primeira," Izzy lembrou, um sorriso raro tocando seus próprios lábios.

"Eu era um idoso," Axl admitiu, o sorriso se transformando em uma expressão mais pensativa. "Eu odiava tudo que não vinha direto da minha própria cabeça na época."

Era assim que eles navegavam pelo passado. Não com acusações, mas com um reconhecimento melancólico de suas próprias falhas. As memórias, antes armas, tornaram-se artefatos de uma civilização extinta que eles estavam estudando juntos.

Uma noite, sentados na varanda recém-consertada, olhando as primeiras estrelas piscarem na escuridão limpa, Axl quebrou o silêncio mais longo do dia.

"Eu tive um pesadelo de novo," ele disse, sua voz calma.

Izzy olhou para ele, uma pontada de velho medo perfurando seu novo manto de paz.

"Mas desta vez era diferente," Axl continuou, girando uma garrafa de água entre as mãos. "Era a mesma curva. A mesma estrada. Mas o carro passou por ela. Sem problemas. E a gente estava dentro, rindo de alguma coisa. Eu não me lembro do quê." Ele olhou para Izzy, seus olhos refletindo o céu estrelado. "A gente estava rindo."

Izzy sentiu uma onda de alívio tão forte que suas mãos tremeram ligeiramente. Os fantasmas não estavam apenas silenciosos; eles estavam se transformando. O aviso havia dado lugar a uma bênção.

Naquela noite, na cama, o toque deles era diferente. Não era mais o desespero sensual da reconciliação, nem a reverência cautelosa dos primeiros dias. Era uma familiaridade reconquistada. A mão de Axl encontrou a de Izzy no escuro, seus dedos se entrelaçando naturalmente, como se nunca tivessem se soltado. O corpo de Izzy se encaixou contra as costas de Axl, seu rosto enterrado na nuca do outro homem, respirando o cheiro de sabão em pó e do suor limpo do dia de trabalho.

Era um toque de pertencimento. De lar.

O amanhecer os encontrou ainda entrelaçados. A luz da manhã fluía pela janela da sala de estar que eles haviam consertado, iluminando o pó de serra no chão e as latas de tinta vazias. A casa ainda estava longe de ser perfeita. Ainda cheirava a mofo e tinta nova, e o vento ainda assobiava em alguns cantos. Mas não era mais uma prisão. Era um refúgio. Um projeto.

Izzy acordou primeiro. Ele observou Axl dormindo, o rosto finalmente relaxado, sem os rastros de fúria ou medo. O amor que ele sentiu então não era uma chama devoradora. Era algo sólido e pesado, como uma boa ferramenta na mão. Era o peso da eternidade, sim, mas não mais um fardo. Era uma âncora. Eles haviam enfrentado os fantasmas do passado e do futuro, e os haviam vencido não com força bruta, mas com a coragem frágil e teimosa de se reconstruir, juntos. E pela primeira vez, a eternidade não parecia uma sentença. Parecia uma promessa.

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O verão chegou com um sopro quente e úmido, transformando os campos ao redor da casa em um mar verde e dourado. A casa de Izzy, outrora um refúgio espartano contra o mundo, agora respirava. As janelas estavam abertas, deixando entrar o zumbido dos insetos e o cheiro de terra quente e alfazema que Izzy plantara ao longo da cerca. A tinta verde da porta estava firme, e o telhado não pingava mais nas noites de chuva.

A rotina deles era um bálsamo. As manhãs eram para o trabalho – não mais consertos desesperados, mas melhorias. Axl, com uma paciência que surpreendia a ambos, estava construindo um banco de madeira para debaixo da velha árvore no quintal. Izzy cuidava de uma pequena horta, suas mãos, outrora ágeis com palhetas e cordas, agora sujas de terra, aprendendo a paciência diferente que as sementes exigiam.

As tardes eram para a música. Não a música deles, não no início. Axl trouxera um violão velho da cidade, e às vezes, quando a luz da tarde ficava dourada e longa, ele tirava acordes suaves da madeira. Não eram os riffs distorcidos de outrora, mas melodias folk antigas, ou simples progressões que ele inventava no momento. Izzy ouvia, às vezes fechando os olhos, deixando as notas preencherem os espaços que antes eram ocupados pelo silêncio ou pelos sussurros paranóicos. Uma vez, ele pegou sua guitarra, a poeira do case há muito tempo intocada. Os dedos dele estavam desajeitados, a memória muscular enferrujada, mas o som que saiu do amplificador pequeno não era uma explosão, era um suspiro. Era um começo.

Foi em uma dessas tardes, com o som do violão de Axl se misturando com o farfalhar das folhas, que Izzy percebeu que os fantasmas haviam partido. Não com um estrondo, mas com um suspiro de alívio. O toque frio era uma memória distante, uma fotografia desbotada de uma dor que não conseguia mais penetrar sua pele. O aviso havia sido atendido. O futuro sangrento havia sido desviado.

Axl olhou para ele através da sala, seus dedos parando nas cordas. "O que foi?" ele perguntou, sua voz calma, desprovida da urgência antiga.

Izzy sacudiu a cabeça, um sorriso real e desimpedido tocando seus lábios pela primeira vez em talvez uma década. "Nada," ele disse. "É só... está quieto."

Axl entendeu. Seu próprio rosto relaxou em resposta. O silêncio deles não era mais vazio. Era cheio da presença um do outro, do zumbido da vida ao seu redor, da música que estavam reaprendendo a fazer, juntos.

Naquela noite, sentados no banco novo sob a árvore, olhando as luzes dos vaga-lumes pontilhando a escuridão, Axl falou sobre o futuro.

"Eu não quero voltar para aquela vida, Iz. A estrada, a circo... não daquele jeito," ele admitiu, sua voz um baixo sussurro contra o coro noturno.

"Eu também não," Izzy concordou, seu ombro encostando no de Axl. O contato era fácil, natural. "Mas a música..."

"A música é diferente," Axl completou seu pensamento. "Podemos... escrever algo. Só para nós. Sem pressão. Sem ninguém gritando nosso nome."

A ideia pairou no ar quente da noite, não como um plano, mas como uma possibilidade. Uma semente. Era assustador, mas o medo era de crescer, não de desmoronar.

Mais tarde, na cama, com a brisa morna do verão dançando as cortinas e pintando suas peles nuas com listras de luz lunar, a necessidade que surgiu entre eles foi diferente de tudo. Já não era o desespero por afogar fantasmas, nem a reverência de redescobrir um território perdido. Era uma fome mais profunda, uma celebração do presente.

Axl rolou sobre ele, seu corpo um peso familiar e bem-vindo, e o beijo que compartilharam foi lento, profundo, embebido no sabor do café da noite e da doce languidez do dia. As línguas se encontraram sem pressa, reconhecendo cada contorno, revivendo cada memória de prazer. As mãos de Izzy subiram pelas costas de Axl, sentindo a textura da pele, a cordilheira da coluna, os músculos que se flexionavam sob seus dedos. Era um mapa que ele estava recompondo, uma geografia da paz que haviam conquistado.

"Te amo," Axl sussurrou contra seus lábios, a voz um rosnado baixo e carregado de uma verdade que já não doía. "Sempre, porra."

Izzy não respondeu com palavras. Sua resposta foi arquear o corpo, pressionando-se contra o quadril de Axl, deixando a rigidez quente de seu próprio desejo falar por ele. Suas mãos desceram, agarrando as nádegas firmes do outro homem, puxando-o mais para perto, fundindo-os da cintura para cima.

Axl deslizou para baixo, sua boca traçando um caminho de fogo lento pelo pescoço de Izzy, pelo osso do seu peito, parando para saborear um mamilo até ele endurecer como uma pedra sob sua língua. Izzy gemeu, seus dedos se enterrando nos cabelos ruivos, agora mais escuros com o suor e a sombra. Cada toque era uma afirmação, cada beijo uma promessa renovada.

Quando a boca de Axl desceu mais, envolvendo-o com uma devoção úmida e ardente, Izzy soltou um grunhido abafado, seus quadris se erguendo involuntariamente. A língua de Axl era uma tortura deliberada e habilidosa, explorando cada centímetro de sua pele sensível, sugando com uma força que fazia as coxas de Izzy tremerem. A visão da cabeça ruiva entre suas pernas, a sensação inebriante, era quase demasiada depois de tantos anos de solidão e toques frios. Ele estava transbordando, cada nervo em chamas.

"Ax... para... eu vou..." ele gemeu, puxando seus cabelos.

Axl soltou-o com um sorriso sombrio e autoconfiante, subindo para encontrá-lo novamente nos lábios. Izzy pode saborear a si mesmo nos lábios do outro, um sabor salgado e íntimo que o fez estremecer. As mãos de Axl encontraram as dele, entrelaçando os dedos e pressionando-as contra o travesseiro de cada lado de sua cabeça. O olhar que trocaram foi intenso, cru, desprovido de qualquer barreira.

"Me vê, Iz," Axl ordenou, sua voz um sussurro áspero. "Só me vê."

E então, com um movimento fluido e certeiro, Axl o penetrou. A entrada foi uma queima lenta e profunda, uma expansão que fez Izzy prender a respiração, seus olhos arregalados. Não era dor, era preenchimento. Era a sensação de uma parte faltante sendo finalmente encaixada. Axl parou, completamente dentro dele, e eles ficaram imóveis por um momento eterno, apenas respirando juntos, fundidos.

Quando Axl começou a se mover, foi com uma cadência hipnótica e profunda. Cada investida era um ritmo antigo e esquecido sendo relembrado por seus corpos. O som de suas peles se encontrando, de sua respiração ofegante, preencheu o quarto. Izzy envolveu as pernas em torno da cintura de Axl, puxando-o mais fundo ainda, querendo sentir cada centímetro, querendo que aquela conexão os fundisse em um só ser.

As mãos de Axl soltaram as dele e seguraram seu rosto, forçando-o a manter o contato visual. No olhar vidrado e vulnerável de Axl, Izzy viu tudo: os anos perdidos, o arrependimento, o amor teimoso, o medo daquela estrada, a alegria brutal de terem se encontrado do outro lado. Era uma intimidade mais violenta e mais doce do que qualquer ato físico.

O orgasmo se construiu como uma maré, inexorável. Começou na base da espinha de Izzy e se espalhou, incandescente, até as pontas dos dedos. Ele gritou, um som rouco e quebrado, enquanto jorrava entre seus corpos suados, suas contrações apertando Axl dentro de si como um último e desesperado abraço. O choque do seu prazer foi a deixa para Axl, que enterrou o rosto no pescoço de Izzy com um gemido longo e gutural, seu próprio corpo arqueando em um êxtase final, preenchendo-o com um calor que banhou o frio remanescente de todas as memórias fantasmagóricas.

Eles desmoronaram juntos, um emaranhado de membros e respiração ofegante. O suor esfriava em suas peles sob a brisa noturna. Axl rolou para o lado, mas manteve um braço e uma perna jogados sobre Izzy, uma âncora no mar calmo de seus corpos satisfeitos.

Não havia palavras. Nenhuma era necessária. O toque dizia tudo: Estou aqui. Você está aqui. Estamos seguros. Estamos vivos.

O peso da eternidade, aquele fardo de amor e dor que uma vez ameaçou esmagá-los, não desaparecera. Mas ele se transformara no peso do corpo de Axl sobre o seu, no calor compartilhado entre suas coxas, no suspiro tranquilo que sussurrava em seu ouvido. Era o peso do chão que pisavam, das paredes que construíram, do futuro que agora ousavam imaginar. E pela primeira vez, sob o céu estrelado de Indiana, a eternidade parecia não uma sentença, mas um refúgio. E ela estava, finalmente, plenamente habitada.

O silêncio que se seguiu foi denso, mas de uma qualidade totalmente nova. Não era o vazio assustador que Izzy conhecera por anos, nem a trégua tensa dos primeiros dias. Era um silêncio preenchido até a borda pelo eco da respiração ofegante, pelo baque lento e cadenciado de seus corações se acalmando em uníssono, pelo cheiro acre e doce do sexo que impregnavam os lençóis.

Axl não se afastou. Seu braço, pesado e relaxado, permaneceu sobre o peito de Izzy, a palma da mão aberta sobre seu esterno, como se sentindo o martelar final da vida sob a pele. A perna de Axl estava jogada sobre as coxas de Izzy, um peso âncora, grounding, real. O calor do corpo dele era uma fornalha contra o lado de Izzy, afastando o último resquício de qualquer memória de frio fantasmagórico.

Izzy fechou os olhos, concentrando-se na sensação. A fina camada de suor que os cobria começava a esfriar sob a brisa noturna, causando pequenos arrepios em sua pele. Ele sentia cada ponto de contato: o quadril de Axl encostado no seu, o sopro quente em seu pescoço, a textura áspera dos pelos das pernas de Axl contra sua coxa lisa. Era uma colagem de sensações, um mosaico de realidade tátil que era mais potente que qualquer sonho ou pesadelo.

Aos poucos, a respiração ofegante de Axl se transformou em um ritmo profundo e uniforme. Izzy sentiu os músculos do braço sobre seu peito relaxarem completamente, o peso se tornando ainda mais pesado, mais dependente. Ele estava caindo no sono.

Izzy não se mexeu. Permitiu o peso, a proximidade, a vulnerabilidade total. Ele olhou para o perfil de Axl contra o travesseiro, os traços afiados suavizados pelo descanso, a boca ligeiramente entreaberta. Nos cantos dos olhos, ele podia ver as finas linhas que os anos de raiva e excessos tinham cavado, mas agora elas pareciam marcas de sobrevivência, não de destruição.

Sua própria pele ainda formigava com o eco do orgasmo, uma sensação quente e dormente que emanava da sua virilha e se espalhava por todo o corpo. A lembrança da penetração, daquela sensação de ser preenchido e visto de uma forma tão completa e brutal, fez um último tremor percorrer suas pernas. Não era desejo novamente, não ainda. Era o eco, a reverberação de uma intimidade que havia refeito algo quebrado dentro dele.

Com cuidado, para não acordá-lo, Izzy levantou a mão que estava livre e a pousou sobre o braço de Axl. Sentiu a pele quente, a textura ligeiramente áspera, os pulsos dos pequenos ossos sob a pele. Era real. Tudo era real.

O quarto estava escuro, mas seus olhos já se haviam acostumado. Ele podia ver o contorno do corpo de Axl contra os lençóis claros, a curva de suas costas, a desordem de seus cabelos no travesseiro. Uma paz profunda, daquelas que ele só conhecia nos primeiros e raros momentos de sobriedade, desceu sobre ele. Era um cansaço limpo, um esgotamento que vinha não da luta, mas da rendição.

Ele ficou ali, acordado, por um longo tempo. Ouvindo a respiração de Axl, sentindo o calor dele, o peso. Cada pequeno ruído da casa – o rangido da madeira, o farfalhar de uma árvore lá fora – já não eram ameaças. Eram apenas os sons de uma estrutura se acomodando, da mesma forma que eles estavam se acomodando, um no outro.

Antes que o sono finalmente o levasse, uma última e clara verdade se formou em sua mente, desprovida de qualquer dúvida ou medo: eles não estavam apenas seguros. Estavam enraizados. O passado e seus fantasmas podiam assombrar as bordas de sua memória, mas aqui, nesta cama, neste quarto, naquele silêncio pós-clímax, eles haviam plantado algo novo. E, pela primeira vez, Izzy acreditou, com cada fibra de seu ser cansado e satisfeito, que aquilo iria crescer.

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O amanhecer não os encontrou separados. A brisa noturna dera lugar a um sopro quente que agitava as cortinas, trazendo o cheiro de terra molhada e grama cortada. Os primeiros raios de sol filtravam-se pela janela, pintando listras douradas sobre a pele nua e os lençóis amarrotados.

Izzy acordou com o peso do braço de Axl ainda sobre seu peito. Desta vez, não era uma âncora de emergência, mas um pertencimento calmo. O calor do corpo do outro homem era uma fornalha constante, e o cheiro deles – suor seco, sexo e a assinatura terrosa do sabonete de Axl – impregnava o ar. Era um aroma primitivo e reconfortante.

Ele ficou imóvel, observando Axl dormir. Na luz suave da manhã, os vestígios de tensão que normalmente habitavam seu rosto haviam desaparecido completamente. Sua boca estava relaxada, seus cílios lançando sombras suaves sobre as maçãs do rosto. Ele parecia jovem. Mais jovem do que Izzy o via em anos. Era a paz do alívio, a rendição total de uma vigília constante.

Aos poucos, a respiração de Axl mudou. Um suspiro mais profundo, um leve tremor nos dedos que repousavam no peito de Izzy. Ele estava emergindo. Seus olhos se abriram, lentamente, pesados de sono. Por um breve instante, houve apenas confusão neles, o desorientar-se de acordar em um lugar desconhecido. Então, seu olhar encontrou o de Izzy, e a confusão dissolveu-se, substituída por um reconhecimento tão profundo que era quase físico.

Um sorriso lento e desajeitado tocou os lábios de Axl. Era um sorriso desarmado, raro.

"Ei," ele rouquejou, sua voz grossa de sono.

"Ei," Izzy respondeu, sua própria voz suave.

Nenhum deles se moveu. A perna de Axl ainda estava jogada sobre as coxas de Izzy, seu braço ainda sobre seu peito. A intimidade não era mais sobre sexo ou consolo; era sobre existência compartilhada. Era o conforto silencioso de não precisar se explicar, de não precisar se desculpar, de simplesmente ser.

Finalmente, Axl moveu a mão. Não para se afastar, mas para traçar um caminho lento e preguiçoso pelo esterno de Izzy, subindo até seu ombro, descendo pelo braço. Seus dedos exploravam a pele como se estivessem memorizando uma nova topografia. Cada toque era uma afirmação silenciosa. *Ainda estou aqui. Você ainda está aqui.*

"Tenho cãibra," Axl murmurou, seu sorriso se tornando um pouco mais malicioso.

"Então se mexe," Izzy retruou, sem nenhuma pressa.

Em vez disso, Axl se inclinou para frente e pressionou os lábios contra o ombro de Izzy. Não era um beijo de paixão, mas de afeto puro, doméstico. Era um beijo que dizia bom dia. Era um beijo que dizia esta é a minha cama agora também.

Axl riu, um som baixo e rouco que vibrou através do corpo de Izzy. Ele finalmente se moveu, rolando para fora da cama com um grunhido exagerado, esticando o corpo como um grande felino. Os ossos estalaram. A luz da manhã banhava completamente sua nudez, iluminando as cicatrizes antigas, a palidez da pele não exposta ao sol, a realidade visceral dele. Izzy não desviou o olhar. Já não havia fantasma ali. Apenas um homem. *Seu* homem.

"Café," Axl declarou, como se estivesse anunciando um decreto real, e saiu do quarto, nu e sem cerimônia, seus pés fazendo um som suave no assoalho de madeira.

Izzy ficou deitado por mais um momento, ouvindo os sons dele na cozinha: o baque da cafeteira no fogão, o tilintar de uma colher, o ruído da torneira. Eram sons domésticos. Sons de vida. Eles preenchiam os espaços vazios da casa de uma forma que o silêncio e o medo nunca conseguiriam.

Ele se levantou, puxando uma calça jeans suja do chão e vestindo-a sem cuecas. Ao passar pela sala, seus olhos pousaram no violão de Axl, encostado no sofá. Havia uma folha de papel pautado em cima do banco, com anotações rabiscadas – letras, acordes. Era um trabalho em andamento. A semente que haviam plantado na noite anterior estava germinando.

Na cozinha, o aroma do café fresco era intenso e convidativo. Axl estava diante da janela, olhando o campo banhado pelo sol da manhã. Ele segurava duas xícaras fumegantes. Estava ainda nu, sua figura uma silhueta forte contra a luz. Era uma imagem de uma vulnerabilidade e uma confiança profundas. Ele se virou e entregou uma xícara a Izzy.

"O banco está pronto," Axl disse, acenando com a cabeça em direção ao quintal. "Debaixo da árvore. Preciso lixar umas arestas, mas está sólido."

Izzy pegou a xícara, seus dedos se encontrando brevemente com os de Axl. O contato era quente, carregado do café e da pele dele.

"Vamos testá-lo depois," Izzy sugeriu, um canto de sua boca se erguendo.

O olhar de Axl encontrou o dele, e ninguém precisou dizer o que "testar" significava. Havia a promessa de música, sim, mas também a promessa de silêncio compartilhado, de toques casuais sob a sombra, de beijos roubados com gosto de café.

Eles beberam em silêncio, parados na cozinha, o sol aquecendo seus pés descalços no chão. O mundo lá fora continuava, mas dentro daquelas paredes, o tempo parecia ter encontrado um novo eixo, um novo ritmo. O peso da eternidade não era mais uma carga a ser carregada, mas o chão firme sob seus pés, o teto sobre suas cabeças, o sabor amargo e bom do café em suas línguas. Era o peso de uma vida compartilhada. E, finalmente, era leve.

 

💫 Fim.

Chapter 5: O Amante que Nunca Fui

Summary:

Uma traição durante os primeiros grandes shows da turnê despedaça Izzy, levando-o ao fundo do poço. Para reconquistá-lo, Axl precisará enfrentar seus próprios demônios e provar que seu amor, embora imperfeito, é a única verdade que importa. Uma história crua sobre perdão, sexo como guerra e reconciliação nos anos de formação do Guns N' Roses.

Notes:

Oi, pessoal! Tudo bem com vocês? 💔🔥

Nosso cenário agora é a turnê de 1986 - quando a fama começava a chegar e os demônios do road life também. Aqui exploramos o preço de estar no topo e o que acontece quando o amor vira um campo de batalha.

Espero que vocês sintam toda a intensidade e a evolução do Axl e do Izzy nessa jornada!!🔥💖

Beijos e até a próxima! 🖤🎸

Chapter Text

Indiana 1986

O ar no quarto de hotel barato em Indiana estava pesado, carregado do mofo do ar-condicionado e do fantasma de milhares de histórias não contadas. Izzy Stradlin encostava a testa no vidro frio da janela, observando os neons piscarem na rua molhada lá embaixo. Do andar de cima, o baixo surdo de uma festa após o show vibrava através do piso, um batimento cardíaco artificial que ecoava o vazio que ele sentia no peito.

Algo não estava certo.

Axl tinha estado estranho o dia todo – muito energético, seus olhos brilhando com um fogo que não era só para o palco. Um fogo que, Izzy suspeitava com um nó no estômago, não era destinado apenas a ele.

Ele subiu as escadas de incêndio, movido por um instinto venenoso. A porta para a suíte estava entreaberta, derramando luz, música alta e risadas para o corredor escuro. Izzy parou na soleira, seu corpo tornando-se uma sombra imóvel.

E então ele viu.

No centro do redemoinho de fumaça e corpos suados, estava Axl. Envolvendo uma mulher – uma morena de cabelos cacheados e vestido vermelho que grunhia nos quadris dele no ritmo de "Welcome to the Jungle". Os braços dela estavam entrelaçados atrás de seu pescoço, e o rosto de Axl estava enterrado no pescoço dela. Mas foram as mãos dele que prenderam o ar nos pulmões de Izzy. Uma mão espalmada, possessiva, na curva inferior das suas costas, puxando-a contra sua própria excitação. A outra, perdida nos cabelos dela, guiando sua boca para um beijo profundo e lascivo que parecia durar uma eternidade.

Foi um soco no estômago. O mundo de Izzy desabou em câmera lenta. O barulho da festa se transformou em um zumbido abafado. Ele conseguia ver o sorriso vitorioso e embriagado de Axl quando eles se separaram, um sorriso que costumava ser só seu. Conseguiu ver a mulher sussurrar algo no ouvido dele, e Axl rir, uma risada fácil e aberta que ele não ouvia há semanas.

Uma onda de calor subiu do peito de Izzy para seu rosto, seguida por um frio cortante. Ciúmes, agudos e venenosos, misturaram-se com uma dor tão profunda que era quase física. Ele se sentiu pequeno. Invisível. Substituível. Suas mãos tremeram e ele as enfiou nos bolsos do jeans, os punhos cerrados tão forte que as unas cravaram sua palma. Ele queria gritar. Queria avançar e arrancar aquela mulher de cima dele. Queria que Axl olhasse para ele e visse a ruína que estava causando.

Mas ele não fez nada. Apenas ficou parado, congelado em sua própria angústia, até que a visão se tornou insuportável. Ele se virou e desceu as escadas, cada passo um esforço monumental contra o peso esmagador no seu peito.

O quarto deles estava escuro e silencioso quando ele entrou. O cheiro doce e enjoativo do perfume da mulher ainda estava lá, impregnado na jaqueta de Axl jogada sobre uma cadeira. Era o cheiro da traição. Izzy sentou-se na beira da cama, seu corpo um fio esticado à beira do rompimento. A imagem do sorriso de Axl, da sua mão nas costas daquela mulher, queimava atrás de seus olhos fechados.

A porta se abriu. Axl entrou, cambaleante, seu rosto ainda iluminado pela euforia da festa e do álcool. "Iz? amor? A festa tá foda, você devia—"

Ele parou ao ver a expressão de Izzy no escuro.

A linha entre a euforia e a culpa no rosto de Axl era tênue. "O que foi?" sua voz tinha uma aresta defensiva.

Izzy se levantou. Sua voz saiu como um sussurro áspero, carregado de uma emoção contida que ameaçava engoli-lo. "Eu te vi."

Axl congelou por uma fração de segundo. Então ele encolheu os ombros, um movimento forçado e desdenhoso. "Ah, para com isso, Iz. Era só uma fã. Não significa nada." Ele deu um passo à frente, o cheiro do whisky e do perfume estranho pairando em torno dele como uma nuvem tóxica. "Você sabe como é. É a turnê."

"Não significa nada?" A voz de Izzy quebrou, a fachada de frieza se desintegrando para revelar a ferida sangrando por baixo. "Eu estava lá, Axl. Eu te vi... beijando ela. Tocando ela." Seus olhos estavam marejados, sua vulnerabilidade exposta, crua e feia. "Você prometeu."

A expressão de Axl mudou. A defensiva deu lugar a algo mais sombrio, mais possessivo. Ver Izzy assim – frágil, machucado, deles – acendeu um fio diferente nele. Ele fechou a distância entre eles em dois passos largos.

"Prometi o quê?" ele sussurrou, sua voz baixa e perigosamente suave. Sua mão se prendeu no queixo de Izzy, forçando-o a olhar para cima. "Que eu seria só seu?" Seus dedos apertaram. "Eu sou seu, Iz. Isso aqui?" Ele fez um gesto vago em direção à porta, à memória da festa. "Isso é ar. É nada."

"Parece", Izzy tentou se soltar, mas a força dele estava drenada, sua resistência quebrada pela dor.

Axl não soltou. Em vez disso, ele usou seu peso, empurrando Izzy para trás até que a parte de trás de suas pernas atingiu a cama e ele caiu sobre o colchão. Axl ficou sobre ele, seus joelhos flanqueando os quadris de Izzy, prendendo-o no lugar. Seus olhos queimavam com uma intensidade que fez o fôlego de Izzy falhar.

"Você quer saber o que significa algo?" Axl rosnou, suas mãos agarrando os pulsos de Izzy e prendendo-os acima de sua cabeça contra a cabeceira da cama. A madeira era dura e impiedosa contra seus ossos. "Isso significa algo."

Ele não beijou Izzy. Ele o consumiu. Era um beijo de posse, de punição, de uma raiva que vinha do medo. Seus lábios eram ásperos, seus dentes batendo, sua língua invadindo sem pedir licença. Izzy tentou virar o rosto, um último e fraco protesto, mas Axl segurou seu queixo com mais força, mantendo-o no lugar.

"Você é meu", Axl sussurrou contra sua boca, o hálito quente e embriagado. "Só meu. Entende?"

Suas mãos soltaram os pulsos de Izzy apenas para rasgar a camisa preta que ele vestia. Os botões voaram, fazendo um som de estalo contra o chão. O ar frio atingiu o peito de Izzy, fazendo sua pele arrepiar. Axl desceu, sua boca encontrando um mamilo, mordiscando e sugando com uma força que beirava a dor, marcando-o como seu.

Izzy gemeu, um som de agonia e rendição. A raiva havia se dissipado, substituída por uma terrível e familiar necessidade. Ele odiava isso. Odiava como o corpo dele respondia, como o toque brutal de Axl ainda conseguia acender um fogo dentro dele mesmo quando seu coração estava em pedaços.

"Axl... por favor..." ele suplicou, não sabendo mais se estava pedindo para parar ou para continuar.

"Shhh", Axl sussurrou, subindo novamente para capturar seus lábios em outro beijo profano. Sua mão desceu, abrindo os botões do jeans de Izzy com movimentos bruscos. "Eu vou mostrar pra você. Vou lembrar você."

A preparação foi áspera, apressada, com os dedos de Axl untados com cuspe e um pouco do lubrificante que sempre carregavam. Não havia cuidado, apenas a intenção clara de tomar posse. Izzy cerrou os dentes, seu corpo arqueando na cama quando os dedos de Axl se enterraram nele, alongando, preparando-o com uma urgência que não admitia delicadeza.

"Pronto para mim?", a voz de Axl era um rosnado next to seu ouvido.

Antes que Izzy pudesse responder, Axl estava sobre ele. A entrada foi um preenchimento abrupto e doloroso, uma queimadura familiar que fez os olhos de Izzy se arregalarem. Ele gritou, um som abafado contra o ombro de Axl, seus dedos se enterrando nos cabelos longos e suados dele.

Axl não esperou que a dor passasse. Ele começou a se mover, estocadas fortes e profundas que faziam a cama de metal velho gemer e bater contra a parede com um barulho metálico e ritmado. *Bang. Bang. Bang.*

Era um som primal, o som da sua raiva, do seu ciúme, do seu amor doentio se manifestando fisicamente. A cabeça de Izzy batia contra a cabeceira da cama a cada investida, uma dor surda que se misturava com a sensação de estar sendo possuído, aberto, reivindicado.

"É meu?", Axl rosnou, sua respiração ofegante e quente contra o pescoço de Izzy. Suas mãos seguravam os quadris de Izzy com tanta força que certamente deixariam hematomas.

"Seu!", Izzy gritou de volta, suas unhas arranhando as costas de Axl através da camisa suada. Era uma confirmação e uma maldição. Cada estocada era um "eu te vi", cada gemido abafado era um "eu ainda estou aqui".

O ritmo de Axl se tornou mais frenético, mais descontrolado. Os gemidos dele se tornaram mais altos, guturais. Izzy podia sentir a própria tensão se acumulando, uma espiral apertando em seu baixo-ventre, impulsionada pela dor, pela raiva e pela adição inegável que seu corpo tinha por aquele homem.

"Vem comigo, Iz", Axl ordenou, sua voz uma vibração rouca contra seu peito. Sua mão desceu entre seus corpos, fechando-se em torno da ereção de Izzy com um toque áspero e familiar.

Foi o suficiente. A onda quebrou, e Izzy caiu sobre ela, seu corpo se contorcendo em um clímax violento que foi tanto liberação quanto rendição. Um grito rouco e quebrado escapou de seus lábios. Sentir o corpo de Izzy estremecendo sob o seu foi o estímulo final para Axl. Com um último e profundo empurrão, um gemido longo e gutural foi arrancado dele, e ele desabou sobre Izzy, seu peso quente e suado um fardo esmagador e familiar.

O silêncio desceu sobre o quarto, quebrado apenas pelo som ofegante e ofegante deles. O rangido da cama havia parado. O cheiro de sexo suado, whisky e perfume barato era sufocante.

Axl rolou para o lado, deixando Izzy sentir o frio repentino. Ele ficou deitado de costas, olhando para o teto manchado, sentindo a dor latejante entre as pernas e o vazio ainda maior em seu peito. A fúria havia ido embora, mas a dor... a dor ainda estava lá, agora acompanhada pela vergonha por ter cedido, por ter se deixado ser possuído daquela maneira.

Então, ele ouviu. Um som baixo e trêmulo.

Ele virou a cabeça. Axl estava de lado, seu rosto enterrado no travesseiro, mas seus ombros estavam tremendo. Soluços silenciosos, abafados, sacudiam seu corpo.

"Izzy...", a voz de Axl estava irreconhecível, fraturada pela emoção crua. "Me perdoa. Por favor. Eu não... eu não sei viver sem você."

Izzy fechou os olhos. A luta havia saído dele. Lentamente, com uma mão que tremia, ele alcançou através do vazio entre eles. Seus dedos encontraram os de Axl na superfície áspera do lençol. Eles se entrelaçaram, fracos, sujos de suor e lágrimas.

Não havia palavras. Apenas o toque. Apenas a dor compartilhada. A batalha havia terminado, deixando para trás um campo de batalha devastado e a frágil, trêmula, possibilidade de reconstruir a partir dos escombros.

Os dedos de Izzy entrelaçaram-se com os de Axl na superfície áspera do lençol. Não era um aperto de força, mas de agarrar-se à beira de um precipício. O silêncio no quarto era espesso, pesado, carregado do cheiro doce do perfume estranho que ainda pairva no ar, agora misturado de forma obscena com o odor acre do suor, sexo e whisky.

Os soluços abafados de Axl contra o travesseiro eram a única coisa que quebrava a quietude. Cada tremor que percorria o corpo dele ecoava através do ponto de contão das suas mãos, reverberando no peito vazio de Izzy.

"Eu te vi", a voz de Izzy saiu como um sussurro roto, não mais um acusação, mas uma constatação dolorosa, uma ferida que ele não conseguia deixar de cutucar. "Ela te tocou... onde eu toco."

Axl estremeceu como se tivesse levado um choque. Ele virou o rosto, enterrado no travesseiro, para olhar para Izzy. Seus olhos, normalmente tão cheios de fogo e desafio, estavam vermelhos, inchados, nadando em uma dor genuína e aterrorizada que raramente permitia que alguém visse.

"Ela não é você", a voz de Axl estava rouca das lágrimas e dos gritos. "Ninguém é você, Iz. Foi... foi um buraco. Foi nada." Ele engasgou, sua mão apertando a de Izzy com força desesperada. "Eu estava com medo."

"Medo do quê?", Izzy perguntou, sua própria voz um fio de som. Ele se sentia exausto, um boneco de pano esvaziado de toda a sua fúria e resistência.

"Disso!", Axl gestou com a mão livre entre eles, para os corpos marcados, para a intimidade violenta que havia acabado de acontecer. "Dessa coisa que a gente tem. Que me consome. Às vezes... às vezes parece que eu vou morrer se eu não conseguir respirar outro ar, mas quando respiro, é veneno. E eu só quero voltar pra você."

Era a confissão mais honesta que Izzy já ouvira dele. Não era uma desculpa, era uma admissão de uma fraqueza compartilhada. A mesma fraqueza que fazia o estômago de Izzy se contorcer de ciúmes doentios, que o mantinha preso a esse furacão chamado Axl Rose.

Izzy puxou a mão dele. Axl prendeu a respiração, seu rosto se contorcendo em pânico, como se esperasse ser rejeitado, empurrado para longe. Mas Izzy apenas levou a mão dele ao próprio rosto, pressionando a palma daquela mão – a mesma mão que havia tocado a mulher de vestido vermelho – contra sua própria bochecha. Era um gesto de perdão doentio, de posse reconquistada. A pele de Axl estava quente e salgada de lágrimas.

"Você me machucou", Izzy sussurrou, fechando os olhos, suas próprias lágrimas finalmente escapando e escorrendo pelo rosto, misturando-se ao toque de Axl. "Dessa vez, você me machucou de verdade."

"Eu sei", Axl chorou, seu polegar acariciando a maçã do rosto de Izzy com uma reverência repentina. "Meu Deus, Iz, eu sei. Eu vou... eu vou consertar. Eu juro. Eu faço qualquer coisa."

Ele se moveu então, lento e hesitante, como se se aproximasse de um animal assustado. Ele se curvou sobre Izzy, e desta vez, seus lábios não foram de posse ou violência. Eram suaves, um beijo de lágrimas e arrependimento que sabia a sal e dor. Beijou as pálpebras fechadas de Izzy, a testa, as bochechas molhadas, antes de encontrar seus lábios novamente num toque tão terno que fez o coração de Izzy se contorcer de uma maneira completamente nova.

"Deixa eu cuidar de você", Axl sussurrou contra seus lábios, sua voz um voto solene. "Por favor."

Sem esperar uma resposta, ele deslizou para baixo na cama. Suas mãos, que momentos antes haviam agarrado e marcado com força brutal, agora tocavam com uma delicadeza que era quase inacreditável. Ele examinou os pulsos de Izzy, onde a pele estava vermelha e irritada de ter sido imobilizada. Seus lábios tocaram levemente cada marca.

Ele desceu mais, suas mãos percorrendo as laterais do torso de Izzy, onde os hematomas começavam a se formar. Sua boca seguiu o caminho, beijando cada mancha roxa que ele mesmo havia feito, como se seus lábios pudessem absorver a dor. Cada toque era um pedido de desculpas silencioso, um ritual de limpeza.

Quando seus lábios encontraram a parte interna das coxas de Izzy, onde a pele era mais sensível e as marcas da sua posse mais evidentes, um tremor percorreu o corpo de Izzy. Não era de medo ou repulsa, mas de uma vulnerabilidade extrema. Axl beijou aquela pele dolorida com uma devoção que beirava o sagrado, murmurando "sinto muito" contra sua carne, uma litania de arrependimento.

Então, ele se moveu para o centro, para a própria essência da sua transgressão. Ele não tomou Izzy pela força. Ele o reverenciou com a boca. Foi lento, meticuloso, incrivelmente gentil. Um contraste tão gritante com a violência de antes que fez Izzy gemer, seus dedos se enterrando nos cabelos de Axl, não para puxar, mas para se agarrar. Era um perdão sendo administrado através do corpo, uma promessa sendo selada. A dor latejante começou a se transformar em algo diferente, em um calor que se espalhava, em uma aceitação profunda e exausta.

Quando a onda do clímax de Izzy veio, foi silenciosa, profunda, uma rendição completa que lavou parte da angústia, deixando para trás um cansaço limpo. Ele ofegou, seu corpo arqueando suavemente antes de desabar na cama, completamente esvaziado.

Axl subiu e se deitou ao seu lado, envolvendo-o em seus braços. Desta vez, o abraço não era para dominar, mas para proteger, para guardar. Ele puxou os cobertores sobre eles, criando um casulo no meio do caos do quarto de hotel.

"Eu te amo", Axl sussurrou no escuro, sua voz firme agora, carregada de uma convicção que não existia antes. "Só você. Sempre."

Izzy não respondeu com palavras. Ele se enterrou mais profundamente no abraço de Axl, sua cabeça encontrando o espaço familiar entre o pescoço e o ombro dele. O cheiro do perfume da mulher ainda estava lá, sutil, mas seria lavado. A dor ainda estava lá, e levaria tempo para cicatrizar. Mas naquele casulo, com o coração de Axl batendo forte e constante sob seu ouvido, pela primeira vez desde que ele o vira naquela festa, Izzy sentiu que talvez, apenas talvez, eles pudessem encontrar um caminho de volta um para o outro. O amante que Axl tinha sido naquela noite era um estranho. Mas o homem que o segurava agora era a sua única casa.

——

O amanhecer chegou tímido, filtrando-se por entre as frestas das cortinas grossas do motel. A luz cinzenta revelou o cenário da noite anterior: roupas espalhadas pelo chão, a garrafa de whisky vazia tombada sobre a mesa, a cama um caos de lençóis revirados.

Izzy acordou com a sensação de estar emergindo de um mar profundo. Cada músculo do seu corpo doía, um testemunho mudo da fúria que os consumira. As marcas nos pulsos, nas coxas, no pescoço, latejavam com uma dor surda. Mas o peso no seu peito, aquele vazio gelado que o consumira na festa, havia se transformado. Não sumira, mas agora era uma coisa mais quente, mais pesada, como chumbo fundido.

Ele estava de costas, e Axl estava de lado, voltado para ele. Um dos braços de Axl estava jogado sobre sua cintura, possessivo mesmo no sono. Seu rosto, livre da maquiagem de palco e da máscara de bravata, parecia incrivelmente jovem. Mais jovem. As marcas de lágrimas ainda eram visíveis em seus cílios claros.

Izzy ficou ali, imóvel, observando. A raiva não existia mais. Havia apenas um cansaço ossudo e uma pergunta pairando no ar abafado do quarto: E agora?

Foi então que Axl mexeu-se. Um pequeno estremecimento, um suspiro mais profundo. Seus olhos se abriram lentamente, e ele encontrou o olhar de Izzy imediatamente. Não houve surpresa. Apenas um reconhecimento instantâneo, seguido por uma onda de dor tão crua que Izzy quase pôde senti-la fisicamente.

Axl não disse nada. Ele apenas levantou a mão que estava sobre a cintura de Izzy e tocou seu rosto, seus dedos tremendo levemente ao traçar a linha de sua mandíbula, o arco de sua sobrancelha. Seu toque era uma pergunta. Ainda me suporta?

Izzy fechou os olhos, inclinando a cabeça para o toque. Era a sua resposta. Um sim frágil, cheio de rachaduras, mas ainda um sim.

"Vou cancelar a entrevista de rádio de hoje", Axl disse, sua voz áspera pelo sono e pelo choro. Não era uma sugestão. Era uma declaração.

"Você não pode", Izzy murmurou, os olhos ainda fechados. "A gravadora..."

"Que se foda a gravadora", Axl cortou, sua voz baixa mas feroz. Sua mão parou de acariciar e se firmou no rosto de Izzy, segurando-o com uma seriedade absoluta. Izzy abriu os olhos. A vulnerabilidade da noite anterior ainda estava lá, mas agora misturada com uma determinação de aço. "Hoje é sobre você. Sobre a gente. Só isso."

Ele se moveu antes que Izzy pudesse protestar. Sentou-se na cama, as costas marcadas com arranhões vermelhos, e alcançou o telefone no criado-mudo. Sua voz, quando discou o número do empresário, era a do Axl Rose, a estrela de rock, mas sem a habitual arrogância. Era plana, firme, inegociável.

"Steve. É o Axl. Cancela minha agenda hoje... Não, não estou doente. É pessoal... Eu não me importo com o contrato, Steve. Cancela." Ele desligou o telefone sem cerimônia e olhou para Izzy. "Pronto."

Axl não parou por aí. Ele saiu da cama, nu e imponente na penumbra, e foi até a pequena pia do canto do quarto. Encheu uma bacia com água morna, pegou uma toalha limpa. Voltou e, ajoelhando-se ao lado da cama como um devoto, começou a limpar Izzy.

Seus movimentos eram meticulosos, reverentes. Ele passou a toalha morna pelo torso de Izzy, pelos braços, lavando o suor seco e as marcas da noite. Quando chegou às pernas, às partes mais íntimas e doloridas, sua mão estava incrivelmente suave. Ele limpou os vestígios do seu próprio desejo e violência, e depois secou Izzy com a mesma ternura, como se estivesse manuseando algo precioso e quebradiço.

Izzy permitiu, seu corpo inerte, sua mente um turbilhão de emoções contraditórias. Era estranho. Era humilhante. Era a coisa mais amorosa que alguém já havia feito por ele.

Depois, Axl se vestiu com roupas simples – um jeans e uma camiseta preta – e saiu do quarto sem dizer para onde ia. Izzy ficou deitado, ouvindo a porta se fechar, sentindo o eco do silêncio. A solidão começou a se insinuar, mas antes que pudesse se agarrar a ela, a porta se abriu novamente.

Axl voltou carregando dois copos de café fresco da máquina do corredor e um pacote de sanduíches embalados. Ele sentou-se na cama ao lado de Izzy e simplesmente ficou ali, em silêncio, bebendo seu café, sua presença um fato sólido e imutável naquele quarto de motel barato.

Eles não falaram sobre a traição. Não falaram sobre o futuro. Naquele dia, as palavras eram armas muito perigosas. Em vez disso, eles existiram. O som baixo de um velho western na TV de tubo preto e branco preencheu o quarto. Axl, em algum momento, pegou sua guitarra acústica e começou a dedilhar acordes suaves, uma melodia que Izzy não reconheceu, mas que soava como um lamento e um acalento.

Era a humilhação mais estranha e poderosa. Não a humilhação da raiva ou do sexo violento, mas a humilhação de ser visto, totalmente e completamente, em sua dor mais profunda, e ainda assim ser escolhido. De ver o furacão chamado Axl Rose se acalmar, cancelar o mundo e se ajoelhar, não por piedade, mas por necessidade. Porque Axl precisava que Izzy soubesse que ele era a âncora, mesmo quando o mar estava furioso.

Quando a noite caiu novamente, trazendo de volta os sons abafados da cidade, Axl colocou a guitarra de lado. Ele se deitou de frente para Izzy, seus narizes quase se tocando.

"Eu não mereço você", Axl sussurrou.

"Não", Izzy concordou, sua voz rouca pelo silêncio do dia todo.

"Mas eu não vou te deixar ir", disse Axl, e era um juramento, não uma ameaça.

"Eu sei", disse Izzy.

E quando Axl se inclinou para beijá-lo desta vez, foi lento. Foi doce. Foi um começo. A dor ainda estava lá, uma sombra que provavelmente nunca iria embora completamente. Mas naquele quarto de motel, entre os lençóis sujos e os restos do seu amor dilacerado, eles começaram a dolorosa, lenta e meticulosa tarefa de juntar os cacos. Não para serem os mesmos de antes, mas para se tornarem algo novo. Algo que carregasse as cicatrizes, mas que pudesse, finalmente, ser chamado de inteiro.

A luz da manhã seguinte já era diferente. Mais forte, mais decidida. Ela entrava pelas frestas das cortinas como um intruso, iluminando a poeira que dançava no ar e os vestígios da guerra que haviam travado entre aquelas quatro paredes.

Izzy acordou sozinho na cama.

Por um instante, um frio cortante percorreu sua espinha. A imagem de Axl saindo pela porta, para nunca mais voltar, passou pela sua mente como um filme de terror. Ele se sentou de repente, o corpo protestando com dores agudas e surdas. O espaço ao lado dele na cama estava vazio, mas a almofada ainda tinha a marca da cabeça de Axl e o cheiro dele – suor, cigarro e aquele fundo amadeirado que era só seu – ainda estava lá, mais forte que o perfume fantasma da mulher.

Então ele ouviu. Um ruído baixo e rítmico vindo do banheiro. O som de alguém escovando os dentes. Alguém assoando o nariz. Sons domésticos. Sons normais.

A porta do banheiro se abriu e Axl surgiu, vestindo apenas a calça jeans do dia anterior, aberta na cintura. Seu torso pálido estava à mostra, os arranhões de Izzy agora marcas roxas e vermelhas contra a pele. Ele parou ao ver Izzy sentado, seus olhos – mais claros hoje, menos tempestuosos – examinando-o.

"Te acordei?", a voz de Axl era áspera, mas suave.

Izzy balançou a cabeça, negando. Ele não conseguia falar. O alívio de ver Axl ainda ali era uma coisa física, um peso quente no seu peito que substituía o gelo do dia anterior.

Axl se aproximou e sentou na beira da cama. Ele não tentou tocar Izzy. Apenas ficou ali, seu joelho quase tocando o de Izzy sob o lençol.

"Eu liguei para a gravadora de novo", Axl disse, olhando para as próprias mãos. "Cancelei a gravação do clipe que ia ser hoje. Falei que a gente precisava de um dia de ensaio fechado. Ninguém vai encher o nosso saco."

Ele estava construindo um forte em torno deles. Cancelando o mundo externo. Izzy entendia a linguagem. Era a maneira de Axl dizer Você é a minha única prioridade.

"Preciso fumar", Izzy murmurou, sua voz ainda um fio de som.

Axl acenou com a cabeça e se levantou. Ele pegou o maço de cigarros de Izzy na mesa, tirou um, colocou entre seus próprios lábios e acendeu. Deu duas tragadas profundas, acendendo-o properamente, antes de entregá-lo a Izzy. Era um ritual antigo. Um gesto de cuidado que ia além das palavras.

Izzy levou o cigarro aos lábios, os dedos tremendo levemente. A fumaça quente queimou seus pulmões, uma sensação familiar e ancoradora.

"Eu não vou dizer que não vai acontecer de novo", Axl disse de repente, sua voz baixa, mas clara. Ele olhava fixamente para o chão. "Eu sou um merda, Iz. Você sabe disso. Eu vou tentar te machucar de novo, de uma maneira ou de outra. É o que eu faço."

Izzy parou de fumar, o cigarro suspenso no ar. Aquela brutal honestidade era mais chocante do que qualquer promessa vazia.

"Mas", Axl continuou, erguendo os olhos. E seus olhos estavam limpos, sem defesas. "Eu quero que você me pare. Quero que você me mostre as marcas. Que você me faça lembrar do buraco que eu fico quando acho que posso te perder." Ele engoliu seco. "Eu preciso que você me ensine a ser melhor. Porque eu não sei ser eu sem você."

Era o oposto de um pedido de desculpas. Era um pedido de ajuda. Um reconhecimento de sua própria natureza falha e um apelo para que Izzy fosse sua bússola moral. Era assustador. Era a coisa mais íntima que Axl já lhe dissera.

Izzy baixou o cigarro. Ele estendeu a mão, lentamente, e tocou uma das marcas de arranhão no peito de Axl. A pele estava quente. Ele podia sentir o coração batendo forte debaixo de seus dedos.

"Tá doendo?", Izzy perguntou, sua voz rouca.

"Sim", Axl respondeu, sem hesitar. "Bastante."

"Bom", sussurrou Izzy.

Um sorriso triste e torto apareceu nos lábios de Axl. Ele cobriu a mão de Izzy com a sua, pressionando-a contra seu peito, contra o osso, contra a vida que pulsava ali.

"Vamos sair daqui", Axl disse. "Vamos pegar o carro e só dirigir. Não para um show. Não para uma gravação. Só nós e a estrada. Que se foda tudo."

Era uma fuga. Como sempre era. Mas desta vez, não era uma fuga de algo. Era uma fuga para algo. Para um espaço onde eles pudessem se reaprender.

Izzy assentiu. "Tá."

Enquanto se vestiam em silêncio, dobrando o pouco que tinham, uma nova dinâmica nascia. Não era a do rockstar e seu guitarrista. Não era a do amante possessivo e seu objeto de desejo. Era a de dois homens profundamente feridos, um admitindo sua própria toxicidade, o outro encontrando força em sua própria resistência. O perdão não era um ponto de chegada, era uma estrada que eles decidiam percorrer juntos, sabendo que haveria mais curvas fechadas, mais tempestades.

Axl pegou a chave do carro e abriu a porta do quarto. A luz do corredor invadiu o espaço sombrio. Ele olhou para trás, para Izzy, que estava parado no meio do quarto, uma mochila nas costas, o rosto marcado pela fadiga, mas os olhos limpos.

"Vem", Axl disse, e estendeu a mão.

Izzy olhou para a mão estendida. Então ele caminhou até a porta e a tomou. Sua mão se encaixou na de Axl, não com a fúria da posse, mas com a firmeza de uma escolha.

A porta do quarto se fechou atrás deles, trancando o cheiro do perfume, do sexo e do desespero no passado. Lá fora, o sol da manhã de Los Angeles os atingiu em cheio, cegante e quente. O carro estava à espera. A estrada, um convite em aberto.

Eles entraram no carro, e Axl ligou o motor. O rádio sussurrava uma música country antiga, triste e esperançosa. Axl não mudou a estação. Ele simplesmente colocou a mão no joelho de Izzy, um ponto de contato sólido e constante, e colocou o carro em movimento.

O amante que Axl tinha sido naquela noite da traição estava morto e enterrado. O homem ao volante, com seus olhos fixos na estrada e sua mão ancorada no único porto seguro que ele conhecia, era uma promessa. Uma promessa frágil, feita de cicatrizes e arrependimento, mas uma promessa nonetheless. E para Izzy, naquele momento, sob a luz crua do dia, isso era o suficiente. Era um começo.

A estrada era uma fita de asfalto cinzenta serpenteando entre colinas áridas. O silêncio dentro do carro não era pesado, mas carregado. Um vácuo onde as palavras não ditas podiam respirar. Izzy encostou a cabeça no vidro da janela, sentindo a vibração do motor percorrer seu corpo. Cada solavanco na pista era um lembrete sutil das dores que ainda carregava, mas a mão de Axl em seu joelho era um contrapeso constante, um ponto de ancoragem no universo em realinhamento.

Depois de uma hora, Axl saiu da interestadual e pegou uma estrada secundária, sem placas, que subia em direção a um cume. Ele não disse para onde estavam indo, e Izzy não perguntou. A confiança era um músculo atrofiado que eles estavam reaprendendo a usar.

Finalmente, ele parou o carro em um mirante de terra batida, vazio exceto por algumas árvores retorcidas. Lá embaixo, o mundo se abria em um vale imenso, banhado pela luz dourada do fim da tarde.

"Saí", Axl disse, desligando o carro.

O silêncio do lugar era absoluto, quebrado apenas pelo vento sibilando através dos pinheiros. Axl saiu do carro e foi até a beira do penhasco, suas costas largas uma silhueta solitária contra o céu em chamas. Izzy saiu mais devagar, sentindo a brisa limpa em seu rosto, lavando o resto da podridão do motel de seus pulmões.

Ele se posicionou ao lado de Axl, seus braços quase se tocando. O vale era uma imensidão de tons de ocre, verde e roxo. De cima, tudo parecia em paz. Tudo parecia ter seu lugar.

"Eu nunca trouxe ninguém aqui", Axl disse, sua voz baixa, carregada pelo vento. "Nem oSlash. Nem o Duff. Só você."

Era um presente. Um pedaço de sua solidão, oferecido a Izzy como um tesouro.

Izzy sentiu um nó na garganta. Ele olhou para o perfil de Axl, iluminado pelo pôr do sol. A fama, a arrogância, a persona – tudo isso havia sido deixado para trás na cidade. O que restava era apenas um homem, assustado e determinado, tentando encontrar o caminho de volta para casa.

"É bonito", Izzy disse, sua voz soando áspera na vastidão.

Axl finalmente se virou para encará-lo. Seus olhos refletiam o céu em fogo.

"Eu não sei ser o que você precisa que eu seja, Izzy", ele admitiu, sua vulnerabilidade exposta como uma ferida aberta sob a imensidão do céu. "Não sei ser estável. Não sei ser seguro. Mas eu olho para você... e eu quero tentar. Pela primeira vez na minha vida, eu quero tentar ser melhor do que eu sou."

Ele não estava pedindo perdão. Estava pedindo paciência. Estava oferecendo uma jornada, não uma promessa.

Izzy olhou para o vale, para as sombras longas que se estendiam, engolindo a paisagem. Ele pensou na dor, na raiva, no ciúme corrosivo. E então ele pensou na mão de Axl segurando a sua no carro, na voz quebrada pedindo para ser ensinado, no silêncio compartilhado que era mais reconfortante do que qualquer palavra.

Ele se virou para Axl, enfrentando-o totalmente. O vento agitou seus cabelos escuros.

"Eu não preciso que você seja perfeito, Axl", Izzy disse, e pela primeira vez desde a festa, suas palavras não tinham o gosto amargo da mentira ou da desilusão. "Eu só preciso que você continue tentando. E que você me deixe tentar também."

Era um acordo. Um contrato selado não com um beijo, mas com um olhar que carregava o peso de todos os erros passados e a frágil semente do futuro.

Axl exalou profundamente, como se tivesse segurando a respiração por uma década. Seus ombros, usualmente tensos, desceram um centímetro. O alívio em seu rosto era uma coisa palpável.

"Eu posso fazer isso", ele sussurrou.

O sol mergulhou atrás das montanhas, pintando o céu com tons de púrpura e laranja. A escuridão começou a descer, mas não era a escuridão sufocante do quarto de motel. Era uma escuridão tranquila, acolhedora, pontilhada pelas primeiras estrelas.

Axl estendeu a mão novamente, não como uma ordem, mas como um convite.

"Vamos para casa?", ele perguntou.

Izzy olhou para a mão estendida, depois para o rosto de Axl, agora iluminado apenas pela luz prateada das estrelas nascentes. Ele colocou sua mão na de Axl. O toque era firme. Era uma escolha refeita a cada instante.

"Vamos", Izzy respondeu.

E quando eles entraram no carro e as portas se fecharam, o mundo lá fora não parecia mais tão hostil. A estrada de volta não era uma fuga, mas um retorno. Eles não estavam consertados. Estariam quebrados de maneiras que talvez nunca sarassem completamente. Mas naquele carro, naquela estrada escura, com as mãos entrelaçadas sobre o câmbio, eles não estavam mais sozinhos em sua ruína. Eles eram dois fantasmas aprendendo a habitar os mesmos corpos de novo, duas almas perdidas traçando um novo mapa um do outro. E para aquela noite, para aquele começo, isso era mais do que suficiente. Era tudo.

——

A viagem de volta foi um bálsamo. O ronco constante do motor e o asfalto escuro iluminado apenas pelos faróis criavam uma bolha no tempo, um espaço neutro onde nada do lado de fora podia penetrar. A mão de Axl permaneceu sobre o joelho de Izzy, um peso quente e constante, como se temesse que ele se dissolvesse no ar se o contato fosse quebrado.

Izzy adormeceu em algum momento, a exaustão física e emocional finalmente vencendo sua vigília. Ele sonhou com estradas vazias e silêncio. Um silêncio que não era assustador, mas pacífico.

Ele acordou com o carro parando suavemente. Não era o motel barato, nem um hotel de luxo. Era a casa alugada nos canyons, longe dos holofotes, que Axl usava como refúgio nos raros dias de folga. Um lugar que poucos conheciam.

"Chegamos", Axl disse, sua voz um sussurro no escuro do carro.

Izzy assentiu, esfregando o rosto. Sua boca estava pastosa, seu corpo ainda dolorido, mas a névoa de desespero havia se dissipado. Havia apenas um cansaço profundo e uma estranha calma.

Eles entraram na casa. Era escura e cheirava a pinho e poeira. Axl acendeu algumas luzes baixas, revelando um living espaçoso com janões que, de dia, deviam revelar uma vista deslumbrante. Naquele momento, mostravam apenas o reflexo deles mesmos – dois homens fantasmas em uma sala silenciosa.

Sem uma palavra, Axl pegou a mão de Izzy e o levou até o banheiro principal. Era grande, com uma banheira de hidromassagem de canto. Ele começou a encher a banheira com água quente, derramando sob ela um óleo de banho que cheirava a sândalo e cedro. Um cheiro terroso, masculino, calmante.

Ele se virou para Izzy, seus olhos pedindo permissão. Izzy, sentado na tapa do vaso sanitário, assentiu lentamente.

Com uma paciência que era quase inumana vinda dele, Axl ajudou Izzy a tirar a roupa. Ele ajoelhou-se e desamarrou os cadarços das botas de Izzy, puxando-as gentilmente. Desabotoou seu jeans e o ajudou a tirá-lo, evitando tocar nas áreas mais sensíveis. Cada gesto era um pedido de desculpas silencioso, um ato de devoção.

Quando Izzy entrou na água quente, um gemido baixo escapou de seus lábios. O calor envolveu suas dores, amaciando os músculos tensos e as marcas roxas. Ele fechou os olhos, deixando a água levar o peso do mundo.

Então ele sentiu Axl entrando na banheira atrás dele. O deslocamento da água, o calor de outro corpo. Axl se sentou, e puxou Izzy para trás, fazendo com que ele se recostasse contra seu peito. A pele de Axl era quente e sólida contra suas costas. Seus braços envolveram a cintura de Izzy, não com posse, mas com apoio, segurando-o à tona.

Izzy deixou a cabeça recostar no ombro de Axl. As lágrimas vieram então. Silenciosas, quentes, misturando-se à água da banheira. Não eram lágrimas de raiva ou de tristeza. Eram lágrimas de alívio. De uma batalha terminada. De um porto seguro finalmente alcançado após uma tempestade que quase o destruiu.

Axl não disse nada. Ele apenas segurou Izzy mais forte, seu rosto enterrado nos cabelos escuros e molhados dele. Ele podia sentir os soluços silenciosos abalando o corpo de Izzy e cada tremor era um golpe em seu próprio coração, um lembrete do estrago que havia causado.

Depois de um longo tempo, quando a água começou a esfriar e as lágrimas de Izzy secaram, Axl pegou uma esponja macia e sabonete. Ele começou a lavar Izzy. Passou a esponja por seus ombros, suas costas, seus braços. Lavou o suor da estrada, os vestígios da sua própria violência, a memória do perfume daquela mulher. Ele estava lavando-o simbolicamente, purificando-o de toda a dor que ele mesmo havia infligido.

Izzy permitiu, seu corpo plácido e entregue na água. Era uma rendição total, uma confiança que estava sendo reconquistada gota a gota.

Quando Axl terminou, ele saiu da banheira primeiro, enrolando uma toalha na cintura. Estendeu a mão para Izzy e o ajudou a sair, envolvendo-o em uma toalha grande e fofa, esfregando-o gentilmente para secá-lo.

Na suíte, a cama de casal estava feita com lençóis limpos. O cheiro de limpeza e do óleo de sândalo enchia o ar. Axl puxou os lençóis e Izzy se deitou. Ele esperava que Axl se deitasse ao seu lado, mas Axl fez algo diferente.

Ele se ajoelhou ao lado da cama, como um cavaleiro perante seu rei. Ele pegou a mão de Izzy e a pressionou contra sua própria testa, num gesto de submissão e arrependimento absolutos.

"Eu vou merecer você", Axl jurou, sua voz sussurrando contra os nós dos dedos de Izzy. "Eu vou passar a minha vida toda tentando merecer você."

Izzy olhou para ele, para aquele homem orgulhoso e quebrado de joelhos, e seu coração, tão cheio de fissuras, pareceu se expandir em seu peito. Ele puxou a mão para trás e tocou o rosto de Axl.

"Deita aqui", Izzy ordenou, suavemente. "Comigo."

Axl olhou para ele, surpreso. Então, uma esperança frágil acendeu em seus olhos. Ele se levantou e deitou na cama, virando-se de lado para enfrentar Izzy. Eles ficaram de frente um para o outro, seus rostos separados por centímetros, sua respiração se misturando no espaço entre eles.

Desta vez, quando Axl se inclinou para beijá-lo, não havia pressa. Não havia desespero. Era um beijo lento, exploratório, um redespertar. O gosto era de água limpa e de paz. Era um beijo de chegada em casa.

Quando se separaram, Axl envolveu Izzy em seus braços, puxando-o contra seu corpo, como se quisesse fundi-lo a si mesmo. Izzy enterrou o rosto no pescoço de Axl, respirando seu cheiro verdadeiro, sem a contaminação do whisky ou de perfumes alheios.

Lá fora, o mundo com suas turnês, fãs e tentações ainda existia. A dor ainda estava lá, uma cicatriz que sempre estaria presente. Mas naquela cama, naquela casa no topo do canyon, eles não eram Guns N' Roses. Eles eram apenas Axl e Izzy. Do homens que haviam quase se perdido no furacão que eles mesmos criaram, mas que haviam encontrado o caminho de volta um para o outro através dos escombros.

E enquanto Izzy adormecia, ouvindo o coração constante de Axl batendo sob seu ouvido, ele soube. A estrada pela frente ainda seria longa e acidentada. Mas eles a percorreriam juntos. E isso, no fim de tudo, era a única verdade que importava.

O despertar foi diferente. Não havia o som abafado de uma festa no andar de cima, nem o rangido de uma cama de motel. Havia o canto de um pássaro lá fora e o cheiro de café fresco pairando no ar.

Izzy abriu os olhos. A luz da manhã entrava suavemente pelos pesados cortinas da suíte, iluminando a poeira dançando no ar. Ele estava deitado de lado, e o espaço atrás dele estava quente. O braço de Axl estava jogado sobre sua cintura, a respiração profunda e regular dele soprando suavemente em seus cabelos.

Ele não se mexeu. Permaneceu imóvel, saboreando a rara sensação de paz. A dor nas suas costas e pulsos havia se transformado num latejar surdo, um lembrete distante da tempestade. O corpo de Axl contra o seu era uma âncora, pesada e real.

Axl mexeu-se, um pequeno estremecimento que percorreu seu corpo antes de ele despertar completamente. Izzy sentiu a mão em sua cintura se apertar levemente, como se Axl, ainda semiadormecido, estivesse se certificando de que ele ainda estava lá.

"Iz?", a voz de Axl era áspera de sono, um sussurro contra sua nuca.

"Estou aqui", Izzy respondeu, sua própria voz surpreendentemente suave.

Axl deu um suspiro profundo, um som de alívio absoluto. Ele se aproximou mais, enterrando o rosto entre os ombros de Izzy. "Bom."

Eles ficaram deitados assim por um tempo que pareceu não ter fim. Não havia pressa para sair da cama, para enfrentar o mundo. Aquele quarto, aquela casa, era um universo completo.

Finalmente, Axl se levantou. Ele estava nu, e a luz da manhã pintava seu corpo pálido, destacando os arranhões e as marcas roxas que as unhas de Izzy haviam deixado. Em vez de vergonha, havia uma estranha reverência em seu olhar ao observar as marcas, como se fossem talismãs, lembretes físicos de que ele ainda podia ser sentido, de que suas ações tinham consequências.

"Fique aí", Axl ordenou suavemente, vestindo um roupão de seda escura que estava pendurado atrás da porta.

Izzy ouviu ele descer as escadas, seus passos ecoando na casa silenciosa. Minutos depois, ele voltou, carregando uma bandeja. Havia dois copos de suco de laranja, uma torrada e, no centro, um único café preto, do jeito que Izzy gostava.

Ele colocou a bandeja na cama e se sentou de frente para Izzy, suas pernas cruzadas. Era um gesto tão domesticado, tão longe do rockstar diva e do amante possessivo, que Izzy quase não conseguia processar.

"Come", Axl disse, simplesmente, empurrando o café em direção a Izzy.

Eles comeram em silêncio. O som da mastigação, dos goles de café, era íntimo. Axl observava Izzy comer com uma intensidade que era quase desconfortável, como se estivesse memorizando cada movimento, cada expressão.

Quando Izzy terminou, Axl pegou a bandeja e colocou-a no chão. Ele então se ajoelhou novamente ao lado da cama, mas desta vez, ele tinha uma pequena caixa de madeira escura na mão. Era velha, com dobradiças de latão.

"Eu... eu comprei isso há meses", Axl admitiu, sua voz hesitante. "Nunca tive a coragem de te dar." Ele abriu a tampa.

Dentro, sobre um veludo preto, não havia um anel. Era um pingente de prata, um símbolo antigo e intrincado que lembrava um nó sem fim.

"É um símbolo celta", Axl explicou, seus dedos tremendo levemente ao tocá-lo. "Significa... laço eterno. Dois caminhos que se entrelaçam para sempre, sem começo nem fim." Ele ergueu os olhos, e eles estavam vulneráveis, suplicantes. "Como a gente. Mesmo quando a gente se perde, nosso caminho... ele sempre encontra um jeito de se entrelaçar de novo."

Izzy olhou para o pingente, depois para o rosto de Axl. Ele viu a esperança e o medo lutando ali. Isso não era um pedido de desculpas barato. Era um símbolo. Uma promessa feita de metal e intenção.

"Você não precisa—", Izzy começou, mas Axl o interrompeu.

"Eu preciso", ele insistiu, sua voz firme. "Eu preciso que você use isso e se lembre. Eu preciso me lembrar. Toda vez que eu olhar para você, eu preciso ver que eu te escolhi. E que você me escolheu de volta."

Izzy ficou em silêncio por um longo momento, o peso daquele gesto pairando entre eles. Então, ele se inclinou para frente, oferecendo a nuca a Axl.

Um suspiro de alívio tremulo escapou dos lábios de Axl. Suas mãos, que antes haviam agarrado e marcado com tanta violência, estavam incrivelmente suaves ao abrir o fecho da corrente fina de prata e prendê-la ao redor do pescoço de Izzy. O metal frio repousou sobre sua clavícula, um peso pequeno, mas significativo.

Axl ajustou o pingente, seus dedos acariciando a pele de Izzy por um segundo a mais do que o necessário.

"Lindo", ele sussurrou, e a palavra estava carregada de tanto significado que Izzy sentiu seu estômago se contrair.

Naquele momento, de joelhos diante de Izzy, com o símbolo do seu laço eterno repousando sobre a pele daquele que ele quase perdeu, Axl não era um deus do rock. Era apenas um homem. Um homem profundamente falho, profundamente arrependido e profundamente apaixonado.

E Izzy, ao deixar que aquele símbolo repousasse sobre seu corpo, não estava apenas aceitando um presente. Ele estava aceitando a jornada. A jornada de se reconstruir, juntos. Com todas as cicatrizes, todas as memórias dolorosas e todas as promessas frágeis para o futuro.

O amante que Axl nunca foi capaz de ser estava morto. O homem que estava ajoelhado diante dele agora, no entanto, prometia ser algo diferente. Algo mais real. Algo que valia a pena tentar salvar.

——
Alguns Anos Depois

O avião particular cortava as nuvens, um zumbido constante e suave. Lá embaixo, as luzes de Tóquio cintilavam como um tapete de diamantes jogado sobre a escuridão.

Dentro da cabine, o clima era tranquilo. Slash dormia com o chapéu cobrindo o rosto, um braço pendendo do assento. Duff lia uma revista, um copo de uísque balançando levemente em sua mão. A turnê mundial de 1991 era um furacão de estádios lotados, caos e glória. Mas neste voo noturno, havia uma rara calma.

Axl estava sentado perto da janela, seus cabelos ruivos presos em um rabo de cavalo baixo. Ele não olhava para as luzes da cidade. Seus olhos, mais serenos do que há cinco anos, estavam fixos em Izzy, que dormia do outro lado do corredor.

Izzy estava encostado na janela, um casaco dobrado servindo de travesseiro. A camiseta preta dele havia subido um pouco, revelando a cintura da sua calça jeans. E lá, descansando sobre a pele pálida, estava o pingente de prata. O símbolo do nó sem fim.

Axl observou a suave subida e descida do peito de Izzy, a maneira como seus dedos longos e ossudos repousavam relaxados no colo. A visão fez algo dentro dele se acalmar, um sentimento que ele ainda estava aprendendo a nomear. Não era mais a posse desesperada de outrora, nem a obsessão tóxica. Era uma certeza. Uma âncora.

De repente, como se sentindo observado, Izzy abriu os olhos. Seu olhar escuro, ainda carregado daquela melancolia natural, encontrou o de Axl instantaneamente. Não houve surpresa. Apenas um reconhecimento profundo, um fio de comunicação silenciosa que havia se fortalecido com os anos.

Seus olhos baixaram para o pingente em seu próprio pescoço, e então voltaram para Axl. Um quase sorriso tocou seus lábios – um gesto raro e precioso.

Axl não sorriu de volta. Em vez disso, ele fez algo que se tornara um ritual nos últimos anos. Ele levou a mão ao próprio pescoço e puxou para fora uma corrente idêntica, que sempre usava escondida sob as roupas. O mesmo pingente de prata, o mesmo nó sem fim, repousava sobre o osso do seu peito, bem acima do coração.

Eles não trocaram palavras. Não era necessário. O gesto dizia tudo: Ainda aqui. Ainda te escolhendo. Ainda amarrado a você.

Izzy fechou os olhos novamente, um suspiro quase inaudível escapando de seus lábios. Era um som de paz.

O intercomunicante da cabine estalou. "Senhores, começaremos nossa descida para o Aeroporto de Narita em aproximadamente vinte minutos."

O anúncio quebrou o feitiço. Slash resmungou em seu sono, Duff fechou sua revista. A máquina de rock and roll estava se preparando para engrenar novamente.

Axl guardou seu pingente sob a camisa, sentindo o metal frio contra a pele. Ele olhou para fora, para as luzes de Tóquio que se aproximavam. Havia uma arena cheia de 50.000 pessoas esperando por eles. Havia entrevistas, fotógrafos, fãs frenéticas. Havia tentações em cada esquina, o mesmo velho ciclo.

Mas quando ele olhou para Izzy mais uma vez, agora se espreguiçando e colocando os pés no chão, ele soube que era diferente. O fantasma da traição em Indianapolis nunca havia desaparecido completamente. Ele era uma cicatriz, uma lembrança da pessoa que ele poderia se tornar se perdesse o controle. Mas a cicatriz não doía mais. Era apenas uma parte da história deles.

Izzy se levantou e se aproximou do assento de Axl, inclinando-se sobre o encosto.

"Pronto para fazer aquela cidade tremer, Rose?", ele perguntou, sua voz um pouco rouca do sono.

Axl olhou para ele, para o homem que havia visto seu pior e ainda assim escolhera ficar. O homem que carregava o símbolo do seu laço eterno como uma segunda pele.

"Sempre", Axl respondeu, e pela primeira vez em muito, muito tempo, a palavra não veio carregada do peso esmagador da fama, mas com a leveza de quem tinha um porto seguro para onde voltar, não importa o caos que encontrasse lá fora.

O amante que ele nunca fora havia se transformado no parceiro que ele sempre precisou. E a estrada à frente, por mais selvagem que fosse, não era mais um lugar solitário. Era um caminho que eles percorriam lado a lado, seus passos entrelaçados, seus destinos irrevocavelmente unidos pelo nó de prata que cada um carregava consigo. O passado estava perdoado. O presente era uma escolha. E o futuro era, finalmente, deles.

 

——
A cabine do ônibus da turnê, algum lugar na estrada entre duas cidades, 1992.

A estrada era um sussurro constante sob as rodas. Dentro do ônibus, a penumbra era quebrada apenas pela luz de um abajur baixo. Slash e Duff já haviam descido em seus beliches, o som do ronco de Slash um ruído familiar de fundo.

No fundo do ônibus, em um pequeno sofá, Axl e Izzy estavam entrelaçados. Axl estava deitado de costas, e Izzy estava deitado sobre ele, a cabeça repousada no peito de Axl, ouvindo o batimento cardíaco constante sob a camiseta de algodão.

A mão de Axl traçava círculos lentos e hipnóticos nas costas de Izzy. Seus dedos encontravam, através do tecido, o contorno do pingente de prata que Izzy sempre usava. Ele não dizia nada. Izzy também não.

Era nesses momentos que o mundo exterior – os gritos das fãs, a pressão da gravadora, o caos dos shows – simplesmente evaporava. O toque era sua linguagem. A respiração sincronizada, sua conversa. O peso um do outro, sua âncora.

Izzy fez um som baixo na garganta, quase um ronronar, quando os dedos de Axl encontraram um nó de tensão entre seus ombros e começaram a massageá-lo com uma pressão perfeita. Axl sorriu no escuro, um sorriso pequeno e privado. Ele conhecia aquele corpo melhor do que conhecia o próprio. Conhecia cada cicatriz, cada curva, cada ponto de tensão.

"Durma", Axl sussurrou, sua voz um baixo vibrante contra o ouvido de Izzy.

Izzy não respondeu. Apenas se enterrou mais profundamente contra ele, seu braço envolvendo a cintura de Axl. Em minutos, sua respiração ficou profunda e regular. Axl continuou seu movimento suave nas costas de Izzy, vigiando seu sono, protegendo aquele pedaço de paz que eles haviam conquistado a duras penas. O amor deles nem sempre era feito de fogo. Às vezes, era feito de silêncio. E era tão poderoso quanto.

——

No estúdio de gravação caseiro de Izzy, Los Angeles, 1993. Um raro dia de folga.

A luz da tarde entrava dourada pelo janão do estúdio improvisado, iluminando partículas de poeira que dançavam no ar. Havia guitarras encostadas nas paredes, fitas cassetes espalhadas, um velho sofá de couro rachado.

Izzy estava sentado no chão, encostado em um amplificador, dedilhando acordes suaves em uma violão acústico. Era uma melodia triste e bonita, algo que ele vinha trabalhando há semanas.

Axl entrou sem fazer barulho, parando na porta para observá-lo. Ele adorava ver Izzy assim – imerso na música, longe dos holofotes, em seu elemento. Seu rosto ficava mais jovem, menos carregado.

Ele se aproximou e sentou no chão, de frente para Izzy, suas costas encostadas no sofá. Ele não interrompeu. Apenas ouviu, seus olhos fechados, absorvendo cada nota.

Quando a música chegou ao fim, Axl abriu os olhos.

"É linda", ele disse, sua voz suave. "Triste, mas linda."

Izzy encolheu os ombros, um gesto tímido. "É só um rascunho."

"É você", Axl corrigiu. Ele se inclinou para frente, seu joelho tocando o de Izzy. "Deixa eu ouvir de novo."

Izzy começou a tocar novamente. Desta vez, Axl se juntou a ele. Não com sua voz de rock estridente, mas com um sussurro rouco e suave, improvisando uma letra sobre estradas vazias, segundas chances e o conforto do silêncio compartilhado. Sua voz se entrelaçava com o violão de Izzy, criando uma harmonia perfeita e íntima.

Eles não estavam compondo para um álbum. Não estavam ensaiando para um show. Estavam apenas criando juntos, para si mesmos. Quando a última nota morreu, o sorriso no rosto de Izzy era mais amplo agora, genuíno.

"Você roubou a minha música, Rose", ele disse, sem nenhum rancor.

"A gente compartilha tudo, lembra?", Axl respondeu, seu olhar caindo no pingente de prata no peito de Izzy. Ele estendeu a mão e tocou o símbolo, seu dedo passando sobre o metal. "Até as músicas tristes."

Ele então se inclinou e beijou Izzy. Era um beijo lento e doce, que sabia a café e inspiração. Um beijo que dizia *eu te entendo* melhor do que qualquer palavra poderia.

——

No camarim, depois de um show esgotado no estádio, 1994.

O barulho ainda ecoava em seus tímpanos. A adrenalina da performance ainda fazia suas mãos tremerem. O camarim estava cheio de gente – membros da equipe, amigos, fãs sortudas que conseguiram acesso. Era o auge do caos.

Axl, suado e com o rosto ainda pintado, estava no centro, sendo puxado para todos os lados. Mas seus olhos procuravam incessantemente por uma única pessoa.

Ele o viu encostado na porta dos fundos, longe da multidão. Izzy, com sua jaqueta de couro e um baseado entre os dedos, observando a cena com sua expressão habitual de distanciamento cansado.

Sem hesitar, Axl se desvencilhou de um produtor que tentava falar com ele e cruzou o quarto. Ele ignorou os olhares, os sussurros. Tudo o que importava estava naquela porta.

Quando ele chegou perto de Izzy, ele não disse nada. Simplesmente colocou a testa no ombro de Izzy, fechando os olhos. Seu corpo, ainda elétrico do palco, parecia desligar naquele contato.

Izzy não se surpreendeu. Ele apagou o baseado na sola da bota e ergueu os braços, envolvendo Axl em um abraço firme. Sua mão encontrou a nuca de Axl, os dedos se enterrando nos cabelos molhados de suor.

"Foi um bom show", Izzy murmurou perto de seu ouvido.

Axl apenas balançou a cabeça, esfregando a testa no ombro de couro de Izzy. Ele não precisava de elogios. Precisava disso. Deste silêncio. Deste porto seguro no meio do furacão que eles próprios criavam.

As pessoas no camarim os observavam, mas ninguém ousou se intrometer. Havia uma intimidade naquele abraço que era quase sagrada. Era a imagem de um furacão encontrando sua calmaria. De uma estrela de rock encontrando seu único e verdadeiro lar.

E ali, naquele camarim barulhento e lotado, com o cheiro de cerveja e fumaça no ar, eles estavam mais sozinhos e mais conectados do que em qualquer outro lugar do mundo. O amor deles não era um segredo, mas sua profundidade era um território que apenas eles dois podiam habitar. E era tudo o que precisavam.

 

💫 Fim.

Chapter 6: Marcas do Passado

Summary:

Quando os fantasmas do passado de Izzy ameaçam destruir sua intimidade, Axl precisa aprender uma nova linguagem do amor - uma onde cada toque é uma pergunta, cada beijo é uma permissão, e o sexo se torna não sobre posse, mas sobre cura. Uma jornada dolorosa sobre como o amor paciente pode ser a chave para libertar até os traumas mais profundos.

Notes:

Queridos leitores! Tudo bem com vocês? ❤️‍🩹
O capítulo 6 chegou e, aviso logo, é diferente de tudo que já escrevi. Decidi explorar um lado mais vulnerável do Izzy - as marcas que carregamos mesmo quando ninguém vê.

⚠️ AVISO SENSÍVEL: Esta história aborda trauma de abuso sexual do passado. Se este é um gatilho para você, pule este capítulo ou leia com cuidado.

Escrever isso foi desafiador e emocionante. Espero que toque o coração de vocês da mesma forma que tocou o meu.😔💔

Boa Leitura!!💖

Chapter Text

A luz do fim de tarde entrava alaranjada e poeirenta pela janela suja do apartamento em Los Angeles. Dois dias em casa. Para Izzy Stradlin, esses intervalos entre as turnês eram uma faca de dois gumes. Uma trégua da loucura, sim, mas também um convite para os demônios que o barulho e a agitação costumavam afugentar.

Ele estava no sofá, um baseado já quase no fim entre seus dedos, o corpo pesado da letargia pós-show. Na TV muda, imagens de um desenho animado se moviam sem sentido. Ele focava naquilo, tentando esvaziar a mente, manter as sombras à distância. Era uma prática antiga, quase uma meditação forçada.

O som dos passos de Axl ecoou no corredor. Mesmo descalço, ele tinha uma presença que preenchia os espaços. Izzy não precisava virar para senti-lo se aproximando por trás do sofá. Sentiu o calor do corpo dele antes mesmo dos braços o envolverem.

"Afundando aí sozinho, Stradlin?" a voz de Axl era um sussurro rouco e familiar contra seu ouvido, carregada da euforia residual do palco.

Izzy sentiu os lábios de Axl no seu pescoço, um beijo leve e possessivo. Era um gesto comum. Um que, em dias normais, ele até gostava. Mas hoje, a fadiga tinha deixado suas defesas baixas. Sua mente estava borrada, seus sentidos, crus.

Então, a mão de Axl deslizou. Deslizou para dentro da sua camisa aberta, a palma larga e quente se espalmando contra seu peito nu, os dedos se fechando levemente sobre suas costelas.

E o mundo desabou.

Não foi um pensamento. Foi uma reação física, visceral, um curto-circuito entre o presente e um passado que ele trancara a sete chaves.

Um cheiro invadiu suas narinas – não o cheiro de Axl, de suor e cigarro e couro, mas um fantasma de tabaco mais barato, uísque velho e um leve odor de mofo. O som da TV se transformou no zumbido de um ventilador velho. A textura do sofá sob ele não era mais veludo, era o tecido áspero e encardido de um colchão em um quarto que cheirava a solidão e perigo.

Pânico.

Um gelo que começou na base da espinha e se espalhou por todo o corpo em um segundo, paralisante. Seu coração disparou, batendo contra as costelas como um pássaro enjaulado e aterrorizado. O ar saiu de seus pulmões em um suspiro cortado.

Seu corpo reagiu antes que qualquer racionalidade pudesse intervir. Ele se contorceu para a frente com um movimento brusco e desengonçado, arrancando-se do abraço como se a pele de Axl estivesse em chamas.

"Não!"

A palavra jorrou de sua garganta, não como um protesto, mas como um grito de terror animal, gutural e cheio de um pavor que não pertencia àquela sala, àquele homem, àquela vida.

Ele caiu de joelhos no carpete, ofegante, o peito queimando. Seus braços se envolveram ao redor do próprio torso, apertando com tanta força que doía. Era uma tentativa desesperada de se manter inteiro, de não se despedaçar ali mesmo. O baseado havia caído, manchando o carpete com uma cinza escura. Ele tremia incontrolavelmente.

Axl recuou, seus olhos arregalados primeiro em surpresa, depois em confusão, e por fim, em um lampejo de irritação ferida.

"Que porra foi essa, Iz?" a voz de Axl era cortante, a carícia do momento anterior completamente evaporada. "Eu só estava tentando... caralho, você quase me quebrou o nariz!"

Izzy não ouvia. Um zumbido agudo enchia seus ouvidos, abafando o mundo exterior. Ele podia sentir. Sentir o peso esmagador de outro corpo sobre o seu, muito maior, muito mais pesado. Sentir a pressão de joelhos forçando suas pernas a se abrirem. Os dedos – não os dedos longos e de músico de Axl, mas dedos mais grossos, ásperos, com um anel de metal frio – agarrando seus pulsos, imobilizando-o.

Não, por favor, não. Já passou. Isso já passou. Ele pressionou os olhos com tanta força que viu explosões de luz. Você não está lá. Você está em L.A. Com Axl. Você está seguro.

Mas a memória do corpo era mais forte que a lógica da mente. O pavor era uma maré, afogando-o.

"Izzy?" A voz de Axl chegou até ele, mais suave agora, mas ainda carregada de uma confusão que doía. "Fala comigo, cara. O que eu fiz?"

Izzy abriu os olhos. A sala voltou a se focar lentamente. Ele ainda estava ajoelhado no carpete. Axl estava parado a alguns metros de distância, seu rosto uma máscara de perplexidade e preocupação.

"É... é nada", Izzy conseguiu forçar as palavras para fora, sua voz um fio trêmulo e irreconhecível. Ele se levantou, as pernas tão fracas que mal o sustentavam. O quarto girou levemente. "Preciso... preciso de ar."

Ele não esperou por uma resposta. Virou-se e quase correu para o quarto, trancando a porta atrás de si com um clique que ecoou como um tiro na quietude do apartamento. Deslizou pelo chão até sentar, suas costas pressionadas contra a madeira sólida da porta, como se pudesse bloquear fisicamente o passado que acabara de invadir seu presente.

Enterrou o rosto nos joelhos, seus braços envolvendo a cabeça. A vergonha chegou então, uma onda quente e sufocante. Queimou seu rosto, seu pescoço, seu peito. Estúpido. Idiota. É tudo passado. Por que você não consegue superar? Por que tem que ser assim?

Ele era um homem adulto. Um rockstar, porra. Um guitarrista de uma das bandas mais fodas do planeta. E ali estava ele, tremendo no chão como uma criança assustada por causa de um toque. O toque de alguém que ele amava.

As lágrimas, então, vieram. Silenciosas e amargas. Não eram lágrimas de tristeza, mas de raiva. Raiva de si mesmo. Raiva daquele fantasma que insistia em assombrá-lo. Raiva por ter reagido daquela forma com o Axl, por tê-lo afastado, por não conseguir ser normal.

Ele ouviu os passos hesitantes de Axl do lado de fora da porta. Uma pausa. Depois, um suspiro baixo. Os passos se afastaram.

O alívio foi quase tão avassalador quanto o pânico. E isso só fez a vergonha aumentar.

A noite se arrastou, pesada e opressiva. Ele não conseguiu sair do quarto. Axl não tentou forçar. O silêncio entre eles era uma entidade viva, se espalhando pelo apartamento.

Quando a exaustão finalmente o venceu e ele adormeceu no carpete, encolhido, os pesadelos vieram.

Eles nunca eram narrativas lineares. Eram sensações. O aperto no estômago. A incapacidade de gritar, a voz presa na garganta como um pedaço de osso. A escuridão absoluta, interrompida apenas pela brasa laranja de um cigarro pairando no escuro. O som de uma respiração ofegante e rouca que não era a sua. O terror gelado de se sentir preso, impotente, um objeto.

Ele acordou com um sobressalto, o suor frio encharcando sua camiseta, o coração martelando suas costelas. A escuridão do quarto era hostil, cheia de sombras ameaçadoras. Ele ofegou, procurando por uma âncora.

Axl estava na cama, de costas para ele. O ritmo regular de sua respiração indicava que ele estava dormindo. Um braço estava jogado sobre o travesseiro de Izzy, um gesto inconsciente de posse, de busca por proximidade.

Izzy olhou para aquele braço, para a curva familiar do ombro de Axl sob o lençol, e uma dor tão profunda e aguda o perfurou que ele quase gemeu em voz alta. Como ele podia explicar? Como podia colocar em palavras algo que ele mesmo mal conseguia encarar nos recessos mais sombrios de sua própria mente? Algo que o envergonhava tanto que ele preferia ser visto como um viciado, um idiota, qualquer coisa, menos aquilo.

A distância que ele criou nos dias seguintes não foi calculada, foi instintiva. Um instinto de sobrevivência.

Ele se tornou um fantasma dentro da própria casa. Se Axl entrava na cozinha, Izzy saia pela porta dos fundos. Se Axl se sentava perto dele no sofá durante um ensaio, Izzy se levantava para "ajustar o amplificador". Ele começou a dormir no estúdio improvisado, enrolado em um casaco velho, o corpo dolorido do chão duro, mas a mente um pouco mais quieta longe da cama compartilhada.

Sua frieza habitual, que sempre fora uma parte de sua persona, agora tinha uma borda afiada de medo puro. Ele via a confusão nos olhos de Axl se transformar em frustração, depois em uma raiva silenciosa e contida. Era um ciclo familiar, um que eles haviam dançado antes, mas desta vez a música era diferente, e Izzy não sabia os passos.

A explosão era inevitável.

Foi na manhã em que Axl o encurralou no banheiro. Izzy estava escovando os dentes, o sabor mentolado da pasta uma tentativa fraca de limpar o gosto amargo da culpa na boca. Axl apareceu na porta, seu corpo preenchendo o vão, seus olhos, normalmente tão brilhantes, estavam sombrios e carregados.

"Izzy, chega." A voz de Axl era plana, perigosamente controlada. "Que porra está acontecendo com você? Você está me tratando como se eu fosse um estranho. Como se eu tivesse feito alguma merda colossal."

Izzy cuspiu na pia, evitando seu olhar no espelho. "Não é você."

"Então o que é?!" a voz de Axl estalou, subindo de volume, ecoando nos azulejos pequenos do banheiro. A raiva, finalmente, irrompeu. "Fala logo, caralho! Você está me evitando há uma semana! Você some à noite, não me toca... É droga? Você tá usando de novo e esta com vergonha de contar?"

A acusação, tão distante da verdade e ainda assim tão crível, atingiu Izzy com a força de um trem. Ele sentiu o chão ceder sob seus pés. A raiva de Axl era um fogo que ele entendia, um território familiar em meio ao caos inexplicável de seus próprios demônios. Mas agora, aquela raiva apenas alimentava o pânico, soprando nas brasas do seu terror.

"É melhor eu ir", ele murmurou, tentando passar por Axl, seu corpo já se encolhendo em antecipação ao toque.

Axl agarrou seu braço, acima do cotovelo. A pressão não era brutal, mas era firme. Decidida. Restritiva.

"Não, você não vai a lugar nenhum. Não até você me dizer o que eu fiz!"

O toque no seu braço, a sensação de estar sendo segurado, de não ter escolha... foi o gatilho final. A última pá de terra sobre o caixão de sua racionalidade.

" Me Solta!!!"

O grito que saiu de Izzy foi de um desespero primal, uma fera encurralada. Ele se debateu com uma força que não sabia que tinha, seus movimentos descoordenados e violentos. Sua cotovelada acertou o peito de Axl, que soltou um grunhido de surpresa e dor, recuando instantaneamente.

Os dois ficaram parados, ofegantes, no pequeno espaço do banheiro. A raiva havia se dissipado do rosto de Axl, substituída por um choque absoluto. Ele olhou para sua própria mão, que havia segurado Izzy, e então para o rosto de Izzy, que era uma máscara pálida de horror e pânico.

E naquele momento, vendo a compreensão lenta e devastadora começar a brilhar nos olhos de Axl, algo dentro de Izzy quebrou. A barreira que ele construíra com tanto cuidado ao longo de anos rachou, e o mar de segredo e vergonha que ela continha transbordou.

As palavras não saíram como uma confissão organizada. Saíram como os cacos de um vaso quebrado, cortantes e desconexos.

"Eu... eu não... não era você", ele começou, sua voz um fio quebrado, enquanto deslizava pela parede até sentar no chão frio do banheiro. As lágrimas que ele tentara conter por uma semana, por uma vida, começaram a rolar, silenciosas e implacáveis. "É que... às vezes... quando você me toca... de repente..."

Ele engasgou, fechando os olhos com força. "Havia um... um tio. Nas férias. Em Indiana." As palavras eram difíceis, pesadas, como pedras que ele tinha que carregar para fora de si. "O quarto de hóspedes... ele cheirava a mofo. Ele... ele me segurava. Assim."

Ele não olhava para Axl. Olhava para suas próprias mãos trêmulas no colo.

"Eu não podia me mexer. Não podia gritar. Ele dizia que... que se eu contasse... ninguém acreditaria em mim." Um soluço sacudiu seu corpo. "E eu não contei. Nunca contei para ninguém."

Ele finalmente ergueu os olhos, e a dor que viu no rosto de Axl era quase física. A raiva havia se dissipado completamente, deixando para trás uma paisagem arrasada de compreensão e uma dor profunda, solidária.

"Às vezes", Izzy sussurrou, sua voz quase inaudível, "quando você me segura de repente, ou vem por trás... é como se eu não estivesse mais aqui. Meu corpo... ele acha que é ele. Que eu sou aquele garoto de novo. Assustado. Preso. E eu... eu desligo. Sinto que vou morrer."

Axl não disse uma palavra. Ele simplesmente desabou no chão em frente a Izzy, suas pernas dobradas sob seu corpo. Seu rosto estava pálido, seus lábios levemente entreabertos. Ele estendeu a mão, mas parou a centímetros do joelho de Izzy, seus dedos tremendo no ar. Um gesto que pedia permissão. Um pedido de desculpas mudo.

Izzy, após um longo momento em que apenas o som de sua própria respiração ofegante preenchia o espaço, assentiu. Um pequeno, quase imperceptível movimento de cabeça.

Axl tocou seu joelho, não com posse, não com desejo, mas com uma reverência tão profunda que fez os olhos de Izzy marejarem novamente. Seus dedos traçaram levemente o osso através do tecido do jeans.

"Meu Deus, Izzy", a voz de Axl saiu rouca, quebrada, carregada de uma angústia que não era dele, mas que ele agora carregava por Izzy. "Eu... eu não sabia. Eu nunca... eu nunca quis te fazer sentir assim. Nunca."

"Eu sei", Izzy interrompeu, fechando os olhos e deixando a cabeça recostar na parede. A exaustão era total, absoluta. "Eu sei que não sabia."

O perdão não estava nas palavras. Estava naquele toque gentil no joelho. No silêncio pesado e compartilhado no chão frio do banheiro. No fato de Axl não ter tentado abraçá-lo, não ter tentado consertar com grandiosidade. Ele apenas ficou ali, presente, ancorando Izzy no agora, respeitando a dor que ele finalmente revelara.

A batalha mais difícil havia sido travada. A guerra, Izzy sabia, ainda não estava ganha. Mas pela primeira vez, ele não estava mais lutando sozinho nas trincheiras de sua própria mente. Alguém finalmente sabia o inimigo que ele enfrentava. E esse alguém, contra todas as probabilidades, era o furacão humano chamado Axl Rose, que naquele momento, no chão de um banheiro sujo, havia se transformado em seu porto seguro mais improvável e mais necessário.

Os dias que se seguiram foram um território estranho e novo. Uma névoa de vulnerabilidade pairou sobre o apartamento, tornando o ar pesado, mas também mais limpo, como após uma tempestade.

Axl, o furacão, aprendeu a ser a calmaria. Foi uma transformação quase física de vê-lo. Sua energia, normalmente tão expansiva e demandante, agora se recolhia. Ele se movia pela casa com uma consciência renovada, seus olhos sempre buscando Izzy, não com posse, mas com uma pergunta silenciosa: Você está bem?

A primeira vez que Axl tentou tocá-lo depois da confissão foi três dias depois. Eles estavam na cozinha, passando um pelo outro no espaço apertado. Axl parou, seu corpo bloqueando levemente a passagem de Izzy. Ele não agarrou, não puxou. Apenas ergueu a mão, palma para cima, um convite suspenso no ar entre eles.

"Posso?" a voz de Axl era um sussurro rouco.

Izzy olhou para a mão, depois para o rosto de Axl. Viu a vulnerabilidade lá, o medo de errar. Seu próprio coração acelerou, mas não com pânico. Com algo mais complexo: medo, sim, mas também uma centelha de esperança. Ele assentiu, um movimento quase imperceptível.

Os dedos de Axl tocaram seu braço, logo abaixo da manga da camisa. O toque era leve, quase evanescente, como se temesse quebrá-lo. Durou apenas um segundo antes que Axl recuasse, mas o contato ecoou por todo o corpo de Izzy. Não foi um gatilho. Foi... um toque. Apenas um toque.

Era um começo.

Axl começou a aprender uma nova linguagem do amor. Uma linguagem de pausas e perguntas. Seus beijos, que antes eram tomadas de poder, agora se aproximavam lentamente, dando a Izzy tempo para se afastar se precisasse. Suas mãos, que antes marcavam posse, agora sussurravam perguntas mudas sobre a pele de Izzy: Posso estar aqui? Você me permite?

A intimidade, outrora um incêndio que eles ateavam com facilidade, tornou-se um terreno a ser redescoberto. Lentamente. Dolorosamente, às vezes.

Numa noite, sob a luz baixa do abajur no quarto, Axl o beijou. Foi um beijo profundo, mas infinitamente paciente. Quando suas mãos começaram a descer, ele parou, seus lábios ainda sobre os de Izzy.

"Posso?" ele respirou contra sua boca.

Izzy, com o coração batendo forte, assentiu.

Axl foi lento. Meticuloso. Suas mãos percorreram o torso de Izzy como um cartógrafo mapeando terras desconhecidas e sagradas. Ele nomeava as partes do corpo de Izzy em sussurros, não como um possessivo, mas como uma afirmação.

"Seus ombros", ele sussurrou, beijando-os. "Seus. Seu peito. Seu." Cada palavra era um prego cravarndo Izzy no presente, reassociando sua anatomia com sua própria agência, e não com a violação do passado.

Izzy sentiu as lágrimas caindo de seus olhos, mas desta vez não eram de medo ou vergonha. Eram de um alívio tão profundo que doía. Era como se alguém estivesse finalmente lavando uma sujeira antiga que ele carregava por tanto tempo que nem sabia mais que estava lá.

Quando a conexão final veio, foi diferente de tudo que eles já haviam experimentado. Axl não se moveu até que Izzy deu permissão com um aceno de cabeça e um sussurro de "sim". E mesmo então, foi devagar. Seus olhos permaneceram abertos, trancados, mantendo Izzy ancorado no agora, no quem, e não no quem do passado.

Não foi sobre êxtase selvagem. Foi sobre algo mais profundo. Foi sobre confiança. Foi sobre Izzy se sentir, pela primeira vez em sua vida, completamente dono de seu próprio corpo enquanto o compartilhava com outro. A entrega não era uma rendição; era uma escolha. Poderosa. Libertadora.

Quando a onda do clímax os atingiu, foi silenciosa e profunda, um tremor que parecia vir das fundações de seus seres. Izzy não gritou. Ele gemeu, um som baixo e quebrado de libertação, suas lágrimas misturando-se com o suor no rosto de Axl.

Depois, deitados entrelaçados sob os lençóis, Axl não falou. Ele apenas segurou Izzy, seus braços envolvendo-o não como uma gaiola, mas como um santuário. Seus lábios encontraram a testa suada de Izzy e ficaram lá, um selo de proteção.

"Você é o homem mais forte que eu conheço", Axl sussurrou finalmente, sua voz vibrando através do crânio de Izzy.

E Izzy, pela primeira vez desde que conseguiu se lembrar, acreditou que talvez isso pudesse ser verdade.

O passado não desapareceu magicamente. Às vezes, um cheiro ou um som ainda fazia seu estômago se contrair. Às vezes, ele ainda acordava no meio da noite, o coração acelerado. Mas agora, quando isso acontecia, havia uma mão para segurar a sua no escuro. Uma voz para sussurrar "Está tudo bem. Você está comigo. Você está seguro."

Eles não estavam curados. A cicatriz sempre estaria lá, uma textura diferente na tapeçaria de quem Izzy era. Mas ela não doía mais da mesma forma. Agora, ela era um lembrete, não da dor, mas de que ele havia sobrevivido. E de que, nas ruínas de seu segredo mais sombrio, ele e Axl haviam construído algo mais forte e mais resiliente do que qualquer paixão desenfreada que haviam conhecido antes.

O amor deles já havia sido muitas coisas: fogo, guerra, obsessão. Agora, era isso. Era um porto seguro. Era cura. E para Izzy Stradlin, que passou a vida inteira se sentindo um estrangeiro em seu próprio corpo, isso era mais milagroso do que qualquer música que eles já haviam escrito, qualquer estádio que já haviam lotado. Era, finalmente, o suficiente.

——

A luz da manhã entrava suave pela janela do quarto, iluminando a poeira que dançava no ar. Izzy estava acordado há algum tempo, deitado de lado, observando Axl dormir. A paz no rosto dele era uma coisa rara, quase sagrada. Os eventos das últimas semanas haviam esculpido novas linhas de preocupação ao redor de seus olhos, mas também haviam suavizado algo em sua expressão, algo que sempre fora duro e defensivo.

Ele sentiu o movimento antes de ver. Axl mexeu-se, um suspiro profundo escapando de seus lábios antes que seus olhos se abrissem lentamente. Eles encontraram os de Izzy imediatamente, sem surpresa, como se ele soubesse, mesmo no sono, que Izzy estaria ali, vigiando.

Por um longo momento, eles apenas se olharam. O silêncio entre eles era confortável agora, um casulo que eles haviam tecido juntos.

Então, Axl falou, sua voz ainda áspera do sono. "Iz?"

"Mm?"

Axl engoliu seco, seus dedos traçando um padrão aleatório no lençol entre eles. Ele parecia estar escolhendo as palavras com um cuidado que era visceralmente estranho nele.

"Naquela época... em Indiana." Ele fez uma pausa, e Izzy sentiu todos os músculos do seu corpo se contraírem involuntariamente. "A gente... a gente já se conhecia. Eu ia pra sua casa. Você vinha pra minha."

Izzy ficou imóvel, o coração batendo forte contra as costelas. Ele sabia onde isso estava indo.

Axl ergueu os olhos, e a dor neles era quase insuportável. "Por que você nunca me contou? Eu estava lá, Iz. Eu podia... eu não sei. Eu podia ter feito alguma coisa. Ter te protegido."

A pergunta pairou no ar, carregada de uma década de história não dita. Não era uma acusação. Era uma lamentação. A dor de um protetor que falhou sem nem mesmo saber que havia uma batalha sendo travada.

Izzy fechou os olhos por um momento, sentindo o peso daqueles anos. Quando os abriu, sua voz saiu suave, mas clara.

"Como, Axl?" ele perguntou, não com amargura, mas com uma tristeza resignada. "Como eu ia te contar? O que eu ia dizer?"

Ele virou-se e olhou para o teto, como se as respostas estivessem escritas lá.

"Você era o William Bailey. O garoto mais fodão, mais cheio de si de toda Lafayette. Você tinha seus próprios demônios, sua própria bagagem. E eu... eu era só o Izzy. O quieto. O que fumava um na esquina e tentava passar despercebido."

Ele fez uma pausa, engolindo em seco. "Contar aquilo... era me fazer pequeno. Era me fazer quebrado. E eu não podia ser quebrado, não naquela época. Eu precisava ser forte. Ou pelo menos, fingir que era."

Axl permaneceu em silêncio, seu olhar fixo em Izzy, absorvendo cada palavra.

"E se você não acreditasse em mim?" A voz de Izzy quebrou levemente no final. Era o medo mais profundo, aquele que o assombrava desde o início. "Se você riesse? Ou achasse nojento? Ou... ou pior, se você olhasse para mim com pena? Eu não aguentaria, Axl. Teria me destruído mais do que qualquer coisa que aquele velho nojento fez."

Ele finalmente se virou para enfrentar Axl novamente. "Não era sobre não confiar em você. Era sobre... sobre não conseguir confiar em ninguém. Era sobre carregar aquele segredo ser a única coisa que me mantinha são. Se eu soltasse, eu achava que iria desmoronar e nunca mais me levantar."

As lágrimas cairam dos olhos de Axl, mas ele não as deixou cair. Ele entendeu. Finalmente, ele entendeu a imensidão da solidão que Izzy carregou. Eles tinham crescido lado a lado, compartilhado sonhos, cigarros, primeiras músicas. E ainda assim, havia um abismo entre eles que Axl nunca soube que existia.

"Eu sinto muito", Axl sussurrou, sua voz carregada da dor de uma culpa que não era dele, mas que ele agora carregava voluntariamente. "Sinto muito por você ter se sentido sozinho. Sinto muito por não ter visto. Por não ter percebido."

Izzy alcançou e pegou a mão de Axl, entrelaçando seus dedos com os dele. "Não havia nada para ver. Eu me certifiquei disso." Ele apertou a mão de Axl. "E você está vendo agora. É o que importa."

Axl puxou a mão de Izzy para seus lábios e pressionou um beijo contra seus nós dos dedos, um gesto de promessa e devoção.

"Nunca mais", ele jurou, seus olhos queimando com uma intensidade que não deixava espaço para dúvidas. "Nunca mais você vai se sentir sozinho naquilo que carrega. Você me ouviu, Izzy Stradlin? Suas sombras são minhas sombras agora. Eu as carrego com você."

E naquele momento, sob a luz pálida da manhã, com as feridas do passado finalmente expostas e sendo tratadas não com vergonha, mas com uma coragem recém-descoberta, Izzy sentiu o último resquício do segredo que ele carregou por tanto tempo se dissolver. Não desaparecer, mas se transformar. De uma fonte de vergonha solitária em uma parte compartilhada de quem eles eram, individualmente e juntos.

O garoto assustado de Indiana finalmente tinha alguém para contar. E o homem em que ele se tornou finalmente tinha a coragem para falar.

Axl não podia voltar no tempo e proteger o garoto que Izzy foi. Mas ele podia, e faria, dedicar sua vida a proteger o homem que Izzy era. E para ambos, naquele amanhecer tranquilo, isso era uma redenção mais poderosa do que qualquer outra que eles poderiam ter imaginado.

O dia seguiu seu curso, mas a conversa da manhã permaneceu com eles, um eco silencioso que mudou a qualidade do ar entre eles. Era como se um último muro tivesse caído, não com estrondo, mas com um suspiro de alívio final.

Enquanto Izzy preparava café na cozinha, ele sentiu os olhos de Axl sobre ele. Desta vez, não era um olhar de preocupação ou posse, mas de uma reavaliação profunda. Ele estava vendo todas as memórias de sua adolescência compartilhada através de uma nova lente, reinterpretando cada momento de quietude excessiva de Izzy, cada surto de autodestrição, cada decisão de se esconder atrás de uma cortina de fumaça e desdém.

"Lembra daquela vez", Axl começou, sua voz cuidadosamente casual, "no verão de 81, quando você sumiu por uma semana inteira? Disse que foi visitar um primo em Indianapolis."

Izzy paralisou, a colher de café ainda na mão. Ele se virou lentamente. Os olhos de Axl estavam sérios.

"Foi... foi naquela época?" Axl perguntou, sua voz suave.

Izzy segurou o olhar dele por um momento, então desviou os olhos, assentindo quase imperceptivelmente. "Sim."

Ele não precisava dizer mais nada. A confirmação era suficiente. Axl fechou os olhos por um breve momento, uma onda de dor passando por seu rosto. Ele se lembbra daquela semana. Lembrava de ter ficado irritado com o sumiço de Izzy, de ter causado confusão na cidade, procurando por ele em todos os lugares, sentindo-se traído por sua partida sem explicação.

Agora, ele entendia. Izzy não estava fugindo dele. Estava fugindo de si mesmo. Do horror que o aguardava na casa de um parente.

"Merda", Axl sussurrou, esfregando o rosto com as mãos. "Eu fiquei tão puto com você naquela época."

"Eu sei", Izzy respondeu calmamente. "Você me encarou por uma hora quando eu voltei, lembra? Até eu te dar um baseado e você cuspir um monte de merda sobre lealdade."

Um sorriso triste e torto apareceu nos lábios de Axl. "Eu era um idiota."

"Éramos todos", Izzy encolheu os ombros, voltando a preparar o café. Mas seus movimentos estavam mais suaves agora. Um peso que ele nem sabia que ainda carregava havia sido levantado. Alguém finalmente sabia a verdade por trás de todos aqueles pequenos mistérios, todas aquelas ausências.

Mais tarde, naquele dia, sentados no sofá com guitarras no colo, algo mudou na maneira como eles faziam música. Sempre houve uma química visceral entre eles, uma maneira quase telepática de se conectar musicalmente. Mas agora, havia uma nova camada de compreensão.

Axl começou a dedilhar uma sequência de acordes, uma melodia triste e resiliente que ele vinha trabalhando. Era diferente do hard rock agressivo que os definia. Era introspectiva. Vulnerável.

Izzy ouviu por um momento, sua cabeça inclinada. Então, ele se juntou, sua guitarra entrelaçando uma linha melódica simples, mas profundamente comovente, em torno dos acordes de Axl. Não era uma competição. Era uma conversa. Uma música sobre dor, sim, mas também sobre sobrevivência. Sobre a luz teimosa que persiste mesmo na escuridão mais profunda.

Eles não precisavam de letras. A música dizia tudo o que precisava ser dito. Axl estava, através dos acordes, pedindo desculpas por todos os anos que não viu, por toda a dor que não impediu. E Izzy, através de sua melodia, estava aceitando essas desculpas, não como um perdão, mas como um reconhecimento de que eles estavam juntos agora. Que o presente era o único lugar onde a cura podia acontecer.

Quando a última nota morreu, o silêncio que se seguiu não era pesado. Era pacífico. Completo.

Axl baixou a guitarra e olhou para Izzy. "Nós devíamos gravar isso."

Izzy balançou a cabeça. "É só nossa."

E era. Algumas músicas não eram para o mundo. Eram apenas para duas almas que, depois de uma vida inteira, finalmente se encontravam completamente, sem segredos, sem sombras entre elas.

Naquela noite, quando se deitaram, Axl puxou Izzy para mais perto, seu corpo um contorno quente e sólido contra as costas dele. Seu braço estava envolto around da cintura de Izzy, sua mão espalmada sobre seu estômago, não como uma restrição, mas como uma âncora.

"Eu te vejo, Iz", Axl sussurrou no escuro, sua voz um voto solene. "Eu te vejo todo."

Izzy colocou sua mão sobre a de Axl, apertando-a. Ele não disse nada. Não precisava. Pela primeira vez em sua vida, ele se sentia completamente visto. E, contra todas as probabilidades, não era aterrador. Era a coisa mais libertadora que ele já havia experimentado.

O passado ainda estava lá. Sempre estaria. Mas ele não era mais uma prisão solitária. Era um território que eles agora caminhavam juntos, de mãos dadas, transformando os demônios de um em uma força compartilhada. E naquele espaço, entre o que foi e o que poderia ser, eles encontraram um novo tipo de amor. Mais forte. Mais resiliente. Eterno.

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O nascer do sol em Los Angeles tingiu o céu de tons de rosa e laranja, pintando listras de luz através das persianas fechadas. Izzy acordou primeiro, como sempre. Mas pela primeira vez em semanas – talvez em anos – não foi com um sobressalto ou com o peso imediato da ansiedade nos ombros. Foi com uma calma estranha e nova.

Ele estava de costas, e o corpo de Axl estava curvado ao seu lado, um braço jogado sobre seu peito, a mão aberta e relaxada sobre seu coração. O peso era reconfortante. Grounding. Ele podia sentir a respiração lenta e constante de Axl contra seu ombro.

Ele ficou ali por um longo tempo, apenas sentindo. Sentindo a segurança do toque. Sentindo a ausência do frio familiar do pânico. O quarto não estava mais cheio de sombras ameaçadoras; estava cheio do cheiro deles – cigarro, café, o sabonete barato que ambos usavam e o musk distinto de Axl que era, para Izzy, o cheiro de casa.

Axl mexeu-se, um pequeno ruído na garganta. Seus dedos se contraíram levemente sobre o peito de Izzy antes de relaxarem novamente. Mesmo no sono, seu corpo parecia sintonizado com o de Izzy, buscando contato, garantindo que ele ainda estivesse lá.

Izzy levantou a mão e cobriu a de Axl com a sua, sentindo os ossos, as veias, a força latente naquela mão que sabia ser tão gentil quanto podia ser destrutiva. Ele pensou na jornada deles. Do caos e fogo do início, através da traição e do desespero, até este lugar estranho e tranquilo. Eles estavam calejados, marcados por dentro e por fora, mas ainda estavam juntos. E de alguma forma, o amor deles não estava enfraquecido por tudo isso. Estava diferente. Mais profundo. Enraizado em algo que não podia ser facilmente abalado.

Axl acordou devagar. Izzy podia sentir a mudança em sua respiração, o gradual despertar da consciência. Ele virou a cabeça e encontrou os olhos de Axl já abertos, observando-o no crepúsculo do quarto.

"Não teve pesadelo", Axl sussurrou, sua voz áspera de sono. Não era uma pergunta. Era uma observação cheia de esperança.

Izzy balançou a cabeça. "Não."

Um sorriso, lento e genuíno, iluminou o rosto de Axl. Era um daqueles raros sorrisos que alcançava seus olhos, afastando as nuvens de tempestade que normalmente residiam lá. Era um sorriso só para Izzy.

Ele se moveu, não para cima de Izzy, mas para mais perto, enterrando o rosto no pescoço dele. Seus lábios pressionaram contra a pele sob a orelha de Izzy, um beijo de bom dia que era mais um suspiro do que um toque.

"Bom", Axl murmurou contra sua pele.

Eles ficaram deitados assim enquanto o quarto ficava mais claro, o mundo lá fora começando a rugir para a vida. Era um ritual silencioso, um reconhecimento diário de sua nova realidade. A cura não era um destino, Izzy percebeu. Era isso. Era acordar e escolher ficar. Era confiar que o toque não traria fantasmas. Era a coragem de ser visto, realmente visto, em toda a sua bagunça quebrada.

Finalmente, Axl se levantou para fazer café. Izzy o observou sair do quarto, seu andar descontraído, o jeito como ele passou a mão pela guitarra encostada na parede como um cumprimento familiar. Ele era um furacão que havia aprendido a conter seus ventos, não por ter sido domado, mas por ter encontrado um lugar onde valia a pena ficar calmo.

Quando Axl voltou, segurando duas xícaras de café preto, ele parou na porta, seus olhos percorrendo Izzy ainda deitado na cama.

"O que foi?" Izzy perguntou, seu canto da boca se curvando levemente.

"Nada", Axl disse, entregando-lhe uma xícara. "Só... gostando da vista."

Era uma piada, mas carregada de tanta verdade que fez o coração de Izzy apertar. Ele aceitou a xícara, seus dedos se encontrando brevemente com os de Axl. O café estava quente e amargo em sua língua. Perfeito.

O passado ainda estava com eles, é claro. Ele sempre estaria. Mas naquela manhã tranquila, parecia menos um pesadelo e mais um lembrete distante. Uma cicatriz que não doía mais, mas que provava que ele havia sobrevivido. E que não havia sobrevivido sozinho.

Axl se sentou na beira da cama, seu ombro pressionado contra o de Izzy. Eles beberam seu café em silêncio, observando a luz do sol se fortalecer. O dia traria ensaios, talvez uma discussão, sem dúvida algum novo caos. Mas eles enfrentariam juntos. Sem segredos. Sem sombras.

Para Izzy Stradlin, isso era mais do que um final feliz. Era um começo.

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A tranquilidade da manhã se dissolveu no caos organizado que sempre precedia um show. O ônibus da turnê era um organismo vivo, pulsando com energia nervosa. Slash estava no fundo, afundado no sofá, dedilhando um riff sem fim em sua guitarra acústica, seu chapéu cobrindo a maior parte do rosto. Duff revisava a lista de setlist com o técnico, sua expressão séria, profissional.

E Axl... Axl era um leão enjaulado. Ele percorria o corredor estreito do ônibus, sua energia um campo de força quase palpável. O foco intenso já estava lá, os olhos um pouco mais distantes, a postura mais rígida. A transformação de Willian Bailey, o homem, para Axl Rose, o frontman, estava em andamento.

Izzy observava de seu assento perto da janela, um baseado não aceso girando entre seus dedos. Ele conhecia esse ritual melhor do que ninguém. Antes, ele se afastaria, mergulharia em seu próprio casulo de fumaça e quietude, deixando Axl navegar sozinho na tempestade interior que o consumia antes de subir no palco.

Mas hoje foi diferente.

Axl parou sua marcha, seus olhos pousando em Izzy. Em vez do olhar distante e interiorizado que Izzy esperava, havia um lampejo de reconhecimento. Um fio de conexão no meio do turbilhão. Ele se aproximou e se deixou cair no assento ao lado de Izzy, seu corpo grande e inquieto pressionado contra o dele do ombro ao joelho.

Ele não disse nada. Apenas inclinou a cabeça para trás, fechou os olhos e soltou um longo suspiro.

Izzy entendeu. Ele ergueu a mão e a pousou na nuca de Axl, seus dedos encontrando os músculos incrivelmente tensos lá. Ele começou a massagear com uma pressão firme e constante, os movimentos que Axl lhe ensinara em suas próprias costas tantas vezes.

Axl gemeu baixinho, um som de alívio puro. Sua cabeça caiu para a frente, cedendo ao toque.

Slash, do outro lado do ônibus, observou por cima do braço de sua guitarra. Um sorriso quase imperceptível tocou seus lábios sob a sombra do chapéu antes que ele voltasse a atenção para seus acordes. Duff trocou um olhar breve com o técnico e um quase imperceptível aceno de cabeça. A banda inteira sentiu a mudança. A tempestade ainda estava chegando, mas o leão tinha um porto seguro. E isso tornava a tempestade muito mais fácil de navegar.

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O rugido da multidão era um animal vivo, um ser de cinquenta mil vozes que respirava fogo. No palco, sob as luzes cegantes, Axl era o mestre daquele animal. Ele corria, girava, seu voice um uivo que cortava o ar, alimentando a frenesia.

Izzy estava em seu lugar habitual, um pouco afastado, ancorando o ritmo. Sua guitarra era uma extensão de seu corpo, seus movimentos econômicos e precisos. Seus olhos, porém, não estavam fixos na multidão ou em suas próprias mãos. Eles seguiam Axl.

Ele viu o momento. O momento em que a adrenalina pura começou a se transformar em algo mais escuro, mais autodestrutivo. A fúria que sempre esteve no cerne da performance de Axl começando a ferver, ameaçando transbordar. Antes, Izzy teria simplesmente observado, talvez com uma pontada de preocupação, mas aceitando como uma parte inevitável do show.

Não esta noite.

Enquanto Axl passava por ele, suor voando de seus cabelos, Izzy estendeu a mão. Não para pará-lo, não para restringi-lo. Sua mão tocou levemente a parte inferior das costas de Axl, um toque rápido, quase imperceptível para qualquer um além deles. Um toque que dizia: Estou aqui. Respira.

Axl não parou. Não olhou para trás. Mas Izzy viu a mudança imediata em sua postura. Os ombros, que estavam subindo em direção às orelhas, abaixaram-se um centímetro. A fúria em seus olhos não diminuiu, mas ganhou foco. A energia não se dissipou, foi canalizada. O uivo que se seguiu foi mais limpo, mais potente, menos um grito de agonia e mais um grito de triunfo.

Era uma dança que só eles conheciam. Uma simbiose que ia além da música. Axl comandava a multidão, e Izzy, silenciosamente, ancorava Axl.

De volta ao camarim, o ar estava carregado do cheiro de cerveja, suor e energia gasta. A banda estava no auge, rindo alto, contando histórias. Axl estava no centro, elétrico e tagarela, a queda pós-adrenalina ainda não o atingira.

Izzy estava encostado na mesa de bebidas, observando. Ele estava exausto, seu corpo pesado da performance, mas era uma boa exaustão.

Axl se desvencilhou do grupo e se dirigiu a ele. Seus olhos ainda estavam brilhantes, suas bochechas coradas. Ele parou na frente de Izzy, bem perto, invadindo seu espaço como sempre fizera. Mas desta vez, não havia desafio na invasão. Havia familiaridade. Pertencimento.

"Você viu aquele idiota na primeira fila tentando fazer um stage dive?" Axl riu, pegando uma garrafa de água.

"Vi", Izzy respondeu, seu canto da boca se curvando. "O segurança pegou ele fácil."

Axl tomou um gole de água, seus olhos percorrendo o rosto de Izzy sobre a garrafa. O barulho ao seu redor parecia desaparecer. "Aquele solo em 'Rocket Queen'... você o mudou. Ficou mais sujo. Eu gostei."

Era um elogio raro. Um reconhecimento musical que significava mais para Izzy do que qualquer crítica positiva.

Ele se inclinou para a frente, seu rosto a centímetros do de Izzy. "Preciso de um banho. E de você."

A declaração não era lasciva. Era um fato. Uma necessidade declarada com uma honestidade crua que só Axl poderia conseguir.

Izzy manteve seu olhar. "O banho primeiro."

Um sorriso lento se espalhou pelo rosto de Axl. Ele fechou a mão around da nuca de Izzy, puxando-o para frente até que suas testas se tocassem. Foi um gesto íntimo, possessivo de uma maneira que não apertava, mas sim afirmava. Meu. Você é meu. E eu sou seu.

"Te encontro no ônibus", Axl sussurrou, sua respiração quente contra os lábios de Izzy.

Ele então se virou e mergulhou de volta na multidão, deixando Izzy parado ali, com o calor do toque dele ainda em sua pele e a promessa do que estava por vir pairando no ar.

Mais tarde, no quarto escuro de outro hotel, com os corpos limpos do suor do palco e o som da cidade uma serenata distante, eles se encontraram. Não com a fúria de outrora, nem com a cautela tateante das semanas anteriores, mas com uma confiança profunda e recém-descoberta.

Era um amor que havia sido forjado no fogo e temperado com perdão e compreensão. E naquela noite, com os ecos do show ainda reverberando em seus ossos e a certeza um do outro ancorando suas almas, eles sabiam que nenhum palco, nenhuma turnê, nenhum fantasma do passado poderia separá-los. Eles eram, finalmente, uma equipe. Em todos os sentidos da palavra.

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A turnê seguia seu curso, um turbilhão de cidades, hotéis e arenas barulhentas. A nova dinâmica entre eles era um porto seguro, mas o mundo exterior ainda estava cheio de armadilhas.

Foi em um camarim apertado e superlotado depois de um show particularmente intenso. O ar estava carregado de suor, fumaça e o cheiro adocicado de champanhe. Fãs, amigos da gravadora, estranhos com passes especiais – todos se aglomeravam, tentando um pedaço da glória da banda.

Izzy estava encostado em um canto, tentando se fazer pequeno, buscando na sua xícara de whisky uma barreira contra o excesso. Foi quando ele o viu.

Um homem, mais velho, com um suéter de gola alta e óculos de aro grosso, rindo com um dos roadies. Não era o tio. Logicamente, Izzy sabia disso. Mas a postura, a maneira como ele segurava o copo, o formato do queixo... era uma semelhança passageira, um eco fantasmagórico que atingiu Izzy com a força de um soco no estômago.

O mundo desfocou. O barulho do camarim se transformou no zumbido de um ventilador velho. O gosto do whisky na sua boca tornou-se o gosto do medo, metálico e enjoativo. Seus pulmões pareciam de repente muito pequenos, incapazes de puxar ar suficiente.

Ele se afastou da parede, suas pernas bambas. Precisava sair. Precisava de espaço. De silêncio.

"Iz? Tudo bem?" A voz de Axl, próxima e carregada de preocupação imediata, cortou através do pânico crescente.

Izzy virou-se. Axl estava a poucos metros, seu rosto ainda brilhante do show, mas seus olhos já escaneando Izzy, lendo a angústia nele como um livro aberto.

A vergonha chegou então, quente e sufocante. Eles haviam passado por isso. Eles superaram isso. E agora ele estava aqui, prestes a desmoronar por causa de um estranho que lembrava um fantasma. Ele não podia ser aquele homem frágil de novo. Não na frente de Axl. Não depois de tudo.

"Tá... tá tudo", Izzy forçou as palavras para fora, sua voz soando estranha e distante até para seus próprios ouvidos. Ele evitou o olhar de Axl. "Só... o calor. Tô com uma dor de cabeça fudida. Vou pro ônibus."

Ele viu a dúvida nítida nos olhos de Axl. Axl conhecia cada nuance dele, cada mentira, cada evasão. Ele sabia que aquilo era mais do que uma dor de cabeça.

"Izzy...", Axl começou, estendendo a mão.

"É sério, Axl. Só preciso de um minuto sozinho", Izzy interrompeu, sua voz mais áspera do que ele pretendia. Era uma defesa, um muro sendo erguido às pressas. "Me deixa em paz."

Ele não esperou por uma resposta. Virou-se e abriu caminho pela multidão, seu corpo uma linha tensa de pânico contido. Ele sentiu o olhar de Axl queimando em suas costas, uma mistura de preocupação e mágoa.

O ônibus estava escuro e vazio, um santuário de silêncio depois do barulho do camarim. Izzy trancou a porta e desabou no sofá mais longe, enterrando o rosto em um travesseiro. Os tremores começaram então, incontroláveis. A respiração ofegante, o coração batendo como se quisesse escapar do seu peito. A imagem do homem no camarim se misturava com memórias mais antigas e escuras, uma enxurrada de sensações que ele não conseguia controlar.

Ele estava lá por um tempo que poderia ter sido minutos ou horas quando a porta do ônibus se abriu e fechou. Os passos de Axl eram pesados, deliberados.

Izzy não se moveu. Fingiu estar dormindo. Era covarde, ele sabia, mas a vergonha era uma gaiola muito forte.

Os passos de Axl se aproximaram e pararam diante do sofá. Izzy podia senti-lo olhando para ele, sentia o peso do seu julgamento, da sua decepção.

Ele esperou que Axl dissesse algo. Que o confrontasse. Que o chamasse de mentiroso, de fraco.

Em vez disso, ele sentiu o sofá ceder suavemente quando Axl se ajoelhou no chão ao lado dele. Ele não tocou em Izzy. Apenas ficou ali. Presente.

A voz de Axl veio baixa, um sussurro no escuro que não era para Izzy, mas que ele ouviu mesmo assim.

"Eu te disse, suas sombras são minhas. Você não precisa carregá-las sozinho. Nem mesmo quando você acha que precisa."

As palavras quebraram algo dentro de Izzy. A tentativa fracassada de força, a fachada de normalidade. Um soluço abafado escapou do travesseiro.

Imediatamente, a mão de Axl encontrou sua nuca, não para puxá-lo, mas para descansar lá, um peso quente e sólido.

"Eu não... não queria...", Izzy tentou explicar, sua voz embargada e abafada pelo tecido.

"Eu sei", Axl interrompeu suavemente. "Você não quer se sentir frágil. Mas é okay ficar quebrado às vezes, Iz. Comigo, é sempre okay."

Axl então se deitou no chão, nas suas costas, no carpete do ônibus, sua cabeça perto do sofá onde Izzy estava encolhido. Ele não tentou abraçá-lo, não tentou forçar contato. Ele apenas... ficou. Como um guardião. Como um lembrete vivo de que Izzy não precisava se esconder, nem mesmo de si mesmo.

E lentamente, com a respiração constante de Axl como um metrônomo no escuro, a onda de pânico em Izzy começou a recuar. A vergonha se dissolveu em exaustão, e depois, em uma gratidão profunda e silenciosa.

Ele não precisava ser forte o tempo todo. Ele só precisava ser honesto. E Axl, em sua fúria e seu amor igualmente intensos, sempre encontraria uma maneira de alcançá-lo, mesmo quando Izzy tentava com todas as suas forças se perder.

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A luz da manhã entrou no ônibus, revelando a realidade prosaica de garrafas vazias e roupas espalhadas. Izzy acordou de um sono pesado e sem sonhos, seu corpo pesado da exaustão pós-crise. Por um momento, ele ficou desorientado, até que se lembrou.

Ele se virou no sofá e olhou para baixo. Axl ainda estava lá. Deitado de costas no carpete, um braço jogado sobre os olhos para bloquear a luz. Ele parecia ter dormido ali a noite toda, no chão duro, de guarda.

Um nó de emoção – vergonha, gratidão, amor – apertou a garganta de Izzy. Ele se moveu, o rangido do sofá acordando Axl instantaneamente.

Axl baixou o braço, seus olhos encontrando os de Izzy. Não havia reprovação neles. Apenas uma preocupação tranquila e vigilante.

"Você tá...?", Axl começou, sua voz áspera do sono.

"Tô", Izzy interrompeu, sua própria voz um fio de som. Ele se sentou, esfregando o rosto. "Eu... desculpa. Por ontem. Por ter mentido."

Axl sentou-se também, encostando as costas no sofá, seu ombro pressionado contra o joelho de Izzy. "Você não precisa se desculpar por ter medo, Iz. Só precisa... não me afastar quando ele vier." Ele olhou para cima, seu olhar sério. "É isso que dói. Quando você se esconde de mim."

Izzy balançou a cabeça, olhando para as próprias mãos. "É difícil. É... um hábito antigo. Mais forte que eu, às vezes."

"Então a gente quebra o hábito", Axl disse, como se fosse a coisa mais simples do mundo. "Juntos."

Ele se levantou, estalando as costas, e estendeu a mão para Izzy. "Vem. Vamos tomar um café que não seja uma merda, por uma vez. Achar um lugar que não seja um fucking hotel."

Era um convite. Uma volta à normalidade, mas uma normalidade nova, onde a fragilidade era permitida e a cura era um processo contínuo, não um destino.

Eles encontraram um pequeno diner afastado, com cheiro de bacon gorduroso e café forte. Sentaram-se em um booth no fundo, longe das janelas. O silêncio entre eles era cômodo, preenchido pelo tilintar de talheres e o murmúrio baixo de outras conversas.

Foi Axl quem quebrou o silêncio, seu olhar fixo na xícara de café entre suas mãos.

"Na próxima vez", ele disse, sem olhar para cima, "em vez de dizer que é uma dor de cabeça... só me dá um sinal. Qualquer sinal. Um toque no pulso. Um olhar. Qualquer coisa. E eu saio com você. Sem perguntas. Sem te expor."

Izzy olhou para ele, para a profunda seriedade em seu rosto. Era um plano. Um código. Uma maneira de Izzy pedir ajuda sem ter que usar palavras, sem ter que admitir a derrota em voz alta.

"Um toque no pulso", Izzy repetiu, testando a ideia.

Axl finalmente olhou para cima, e um pequeno sorriso tocou seus lábios. "Funciona. Discreto. Só eu vou saber."

Era tão simples. Tão engenhoso. Um salva-vidas silencioso que Axl estava lhe jogando.

"Okay", Izzy concordou, seu próprio alívio tão intenso que era quase físico. "Um toque no pulso."

Axl assentiu, satisfeito, e mergulhou em seu café. O acordo estava selado.

Mais tarde, a caminho do próximo show, no ônibus em movimento, Izzy observou Axl rir de algo que Slash dissera, sua cabeça jogada para trás, o som de sua risada enchendo o espaço. Ele era um furacão, sim. Mas era o furacão dele. Aquele que, em vez de destruir, havia aprendido a construir abrigos. Que conhecia a geografia de suas cicatrizes melhor do que ninguém e escolhia caminhar sobre elas com uma reverência que fazia o coração de Izzy doer de uma maneira boa.

Ele sentiu o peso do pingente de prata contra seu peito. O nó sem fim. Os caminhos que se entrelaçavam. Axl estava certo. Suas sombras eram deles agora. E talvez, Izzy pensou, enquanto fechava os olhos e se deixava levar pelo movimento do ônibus, a verdadeira força não estava em nunca cair, mas em saber que havia sempre uma mão estendida para ajudá-lo a se levantar. A mão certa.

Nos dias que se seguiram, uma nova sutileza se entrelaçou na dinâmica deles. Era como se o episódio no ônibus, em vez de criar uma fenda, tivesse polido ainda mais o canal de comunicação entre eles. Izzy, sempre o mestre do distanciamento, começou a buscar ativamente o que antes apenas tolerava ou evitava.

Era sutil. Um toque que não era necessário.

Durante um ensaio entediante, com Slash e Duff discutindo interminavelmente sobre a mudança de um acorde, Izzy se aproximou de Axl, que estava sentado na beira do palco, balançando as pernas impacientemente. Sem uma palavra, Izzy se encostou de costas contra as pernas de Axl, seu corpo encontrando o contato sólido. Axl, sem interromper seu balanço irritado, baixou instintivamente a mão e a pousou no ombro de Izzy, seus dedos encontrando o ponto onde o pescoço encontra o ombro e começando a massagear suavemente. Era um gesto de posse e conforto, uma âncora no tédio.

Izzy fechou os olhos, um suspiro quase inaudível escapando de seus lábios. Ele não precisava dizer que estava sobrecarregado pelo barulho, pela discussão inútil. Axl simplesmente sabia.

Outra vez, em um voo noturno, com a cabine escura e a maioria da banda dormindo, Izzy acordou de um sono agitado. Em vez de ficar paralisado na escuridão, ele se virou para o lado. Axl estava ao lado dele, os fones de ouvido no lugar, os olhos fechados, mas Izzy sabia que ele não estava dormindo.

Ele se moveu lentamente, fechando a pequena distância entre seus assentos, e encostou a testa no ombro de Axl.

Axl não se surpreendeu. Ele simplesmente levantou o braço, criando um espaço para Izzy se aconchegar, e o puxou para mais perto. Ele não tirou os fones de ouvido, não fez perguntas. Apenas envolveu Izzy com o braço, sua mão descansando firmemente em seu lado, e continuou a ouvir sua música. O corpo de Izzy, inicialmente tenso, relaxou contra o dele, a respiração ofegante se acalmando, sincronizando com a respiração lenta de Axl. Era um abraço que dizia *eu te guardo*, mesmo no meio do céu escuro, cercado por outras pessoas.

E os beijos... os beijos mudaram.

Já não eram apenas sobre desejo ou reconciliação. Tornaram-se pontuações. Um beijo rápido e seco nos lábios antes de Axl subir no palco, um selo de boa sorte. Um beijo suave e demorado na têmpora quando Izzy ficava muito quieto, um questionamento silencioso. Você está bem? Estou aqui.

Uma noite, no quarto de hotel, Izzy estava sentado na cama, tentando escrever algo em um caderno espiral, sua expressão fechada em frustração. Axl saiu do banho, o cabelo ainda molhado, e parou para observá-lo. Ele viu a tensão na mandíbula de Izzy, o jeito que ele apertava a caneta.

Ele se aproximou e se ajoelhou na cama atrás de Izzy, envolvendo-o com os braços, seu queixo repousando no ombro dele.

"Travou?" Axl sussurrou, seus lábios tocando a pele logo abaixo da orelha de Izzy.

Izzy soltou um suspiro, deixando o caderno cair no colo. "Sim."

Axl não pediu para ver. Não deu conselhos. Ele simplesmente inclinou a cabeça e começou a plantar uma série de beijos leves e lentos ao longo do ombro tenso de Izzy, subindo pelo seu pescoço, até a linha de seu queixo. Cada beijo era uma tentativa de dissolver um nó de frustração, de lembrar a Izzy que seu valor não estava naquela página em branco.

Izzy inclinou a cabeça, dando mais acesso, um gemido baixo de rendição escapando quando os lábios de Axl encontraram um ponto particularmente tenso. Sua mão encontrou a nuca de Axl, segurando-o lá, não para guiá-lo, mas para se agarrar àquela sensação de estar sendo curado, peça por peça, através de algo tão simples quanto um toque.

Era uma inversão poderosa. O homem que sempre carregou suas dores em silêncio agora as oferecia em gestos mudos, e o homem que sempre exigia com fúria agora sabia responder com uma gentileza infinita.

Quando Axl finalmente chegou aos seus lábios, o beijo foi profundo, mas incrivelmente doce. Era um beijo de compreensão. De paciência. Um beijo que dizia eu não preciso das suas palavras. Eu só preciso de você.

E para Izzy, que passou a vida acreditando que a força era sinônimo de solidão, descobrir que podia ser forte porque tinha alguém em quem se apoiar era a revelação mais libertadora de todas. O conforto não era mais um sinal de fraqueza; era a linguagem do seu amor, e eles estavam se tornando fluentes nela.

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A luz do abajur banhava o quarto em âmbar, tingindo cada superfície de um dourado profundo. As cortinas grossas isolavam-nos do mundo, transformando o espaço num santuário privado onde o único som era o sussurro compartilhado de suas respirações. O ar carregava o cheiro deles — suor seco da estrada, o sabonete barato do hotel e algo mais profundo, musk íntimo e familiar.

Izzy estava deitado de costas sobre os lençóis desarrumados, seu corpo uma linha pálida contra o tecido escuro. Axl pairou sobre ele, sustentado pelos braços, seus músculos tensos como cordas sob a pele suada. A luz modelava as curvas de seus ombros, as escavações profundas de suas clavículas, o suor escorrendo em trilhas brilhantes pelo seu peito.

Ele não se moveu. Seus olhos, de um azul intenso e quase negro na penumbra, percorriam cada centímetro do rosto de Izzy com uma devoção avassaladora.

"Deixa eu te ver", Axl sussurrou, sua voz um arranhão áspero que fez a pele de Izzy arrepiar. "Deixa eu te tocar."

Izzy engoliu em seco, seu peito subindo e descendo num ritmo acelerado. Ele assentiu, um movimento quase imperceptível, mas Axl captou. Sempre captava.

A descida de Axl foi uma rendição. Seus lábios encontraram os de Izzy não como uma tomada, mas como uma pergunta. Eram macios, inesperadamente suaves, e se moveram com uma paciência hipnótica. Ele não beijou; ele provou. A língua de Axl lambeu o sulco do lábio superior de Izzy, um pedido de entrada que Izzy concedeu com um gemido baixo, seus próprios lábios se separando.

O gosto era complexo — o amargor residual do uísque, a doçura única da pele de Axl, o sal do suor. Izzy afundou as mãos nos cabelos molhados de Axl, sentindo os fios grossos e sedosos entre seus dedos, puxando-o para mais perto, mais fundo no beijo.

As mãos de Axl começaram sua peregrinação. Seus dedos, calosos nas pontas das cordas da guitarra, eram surpreendentemente suaves nas pontas quando traçaram as têmporas de Izzy, contornaram a concha de seus ouvidos, desceram pela coluna tensa de seu pescoço. Cada toque era um registro, uma memorização tátil.

"Tão lindo", Axl respirou, quebrando o beijo para sussurrar contra seus lábios. "Cada pedaço de você."

Sua boca seguiu o caminho de suas mãos. Beijou as pálpebras fechadas de Izzy, sentindo os olhos se moverem rapidamente por baixo da pele fina. Beijou a pequena cicatriz sobre sua sobrancelha, um presente de uma briga de rua esquecida. Sua língua desenhou o contorno da orelha de Izzy antes de ele morder suavemente o lóbulo, fazendo um estremecimento percorrer todo o corpo debaixo dele.

Axl desceu. Seus lábios encontraram o ponto onde o pescoço de Izzy encontra o ombro, e ele beijou lá, depois abriu a boca e provou a pele, salgada e viva. A sensação da língua áspera, quente e úmida fez Izzy arquear as costas da cama, um suspiro rouco escapando de sua garganta.

"Shhh", Axl sussurrou contra sua pele, suas mãos deslizando para baixo, palmas abertas sobre o torso pálido de Izzy. Ele sentiu as costelas, a batida rápida do coração contra as suas mãos, a contração involuntária dos músculos abdominais quando seus polegares traçaram o sulco raso entre eles.

Ele estava adorando. Cada centímetro. Sua boca encontrou um mamilo, e ele o levou para dentro da boca, não com voracidade, mas com uma sucção lenta e ritmada que fez o ar sair dos pulmões de Izzy em um suspiro trêmulo. A sensação era aguda, quase dolorosa em sua intensidade, uma corrente elétrica de prazer direto do mamilo inchado e sensível até o seu próprio sexo, que latejava pesadamente contra a coxa de Axl.

"Por favor", Izzy gemeu, suas mãos se agarrando aos cabelos de Axl, não sabendo se queria puxá-lo para longe ou para mais perto.

Axl entendeu. Ele sempre entendia. Sua boca continuou sua descida, beijando o esterno, a suave depressão do estômago, os ossos salientes dos quadris. Ele parou, sua respiração quente soprando sobre a pele sensível da parte inferior da barriga de Izzy, fazendo os músculos se contorcerem.

Ele olhou para cima, seus olhos encontrando os de Izzy, que estavam escuros, a pupilas dilatadas, cheios de uma confiança vulnerável que parou o coração de Axl.

"Tudo seu", Axl sussurrou, sua voz carregada de uma promessa solene. "Só seu."

E então ele desceu. Suas mãos abriram as coxas de Izzy com uma reverência infinita. Seu hálito quente foi a primeira sensação, um contraste com o ar frio do quarto. E então, a língua.

O primeiro contato foi uma revelação. Macio, quente, incrivelmente íntimo. Axl não se apressou. Ele explorou, lambeu, provou, como se estivesse aprendendo a textura, o sabor, a própria essência de Izzy. Seus lábios envolveram, sugando com uma pressão perfeita, e suas mãos seguraram os quadris de Izzy, firmes, ancorando-o enquanto a onda de prazer começava a subir.

Izzy gritou, um som rouco e quebrado que não reconheceu como seu. Seu corpo não era mais seu; era um instrumento que Axl tocava com maestria. Cada movimento da língua, cada sucção, era uma nota numa sinfonia de sensações que ele nunca imaginou possíveis. A vergonha, o medo, o passado — tudo se dissolveu no calor avassalador que se acumulava em seu ventre, puxando-o para um abismo de puro sentimento.

Ele estava perto. Tão perto. Suas pernas tremiam, suas mãos se enterravam nos lençóis.

"Axl... eu vou...", ele gemeu, um aviso, uma súplica.

Axl não parou. Ele aprofundou o contato, e foi o suficiente. O mundo de Izzy explodiu em branco. Um grito foi arrancado dele, um som primal de pura entrega, enquanto seu corpo se contorcia, ondas de prazer tão intensas que beiravam a dor percorrendo cada nervo, cada fibra muscular. Ele jorrou na boca quente de Axl, seu corpo arqueando da cama, mantido no lugar apenas pelas mãos firmes de Axl.

Ele desabou, ofegante, o corpo coberto de um suor frio e quente ao mesmo tempo, tremendo incontrolavelmente. Axl subiu por seu corpo, sua boca, seu queixo, molhados, e capturou seus lábios num beijo profundo e salgado. Izzy podia provar a si mesmo nos lábios de Axl, uma intimidade tão profunda que doía.

"Eu preciso de você", Izzy suplicou, sua voz um fio de som, seus olhos implorando. "Agora."

Axl não precisou de mais. Ele se posicionou entre as pernas ainda trêmulas de Izzy. A ponta de seu sexo, dura e quente, pressionou a entrada.

"Olha para mim", Axl ordenou suavemente.

Izzy abriu os olhos, ofegante, e prendeu o olhar nos de Axl.

A penetração foi lenta. Inexorável. Uma invasão que era tudo, menos violenta. Era um preenchimento, uma conclusão. Axl entrou centímetro por centímetro, seus olhos fixos nos de Izzy, observando cada nuance de sensação que cruzava seu rosto. Quando ele estava completamente dentro, parou, enterrado até o fim, seus quadris pressionados contra as nádegas de Izzy.

Eles ficaram assim por uma eternidade, respirando juntos, conectados da maneira mais profunda possível. Izzy sentiu-se completo. Invadido, possuído, mas de uma forma que não tirava, e sim dava. Dava um senso de pertencimento, de casa.

Então Axl começou a se mover. E não eram estocadas. Eram rotações profundas e fluidas dos quadris, uma dança íntima que massageava algo profundo dentro de Izzy. Cada movimento era calculado para maximizar o contato, para esfregar contra aquele ponto interior que fazia os olhos de Izzy revirarem e gemidos contínuos e roucos escaparem de seus lábios.

Axl se curvou, seus lábios encontrando os de Izzy novamente, e o beijo tornou-se sujo, desesperado, suas línguas se entrelaçando no mesmo ritmo que seus corpos. O som da pele úmida batendo, os gemidos abafados, a respiração ofegante — era a música deles, crua e não filtrada.

Izzy envolveu as pernas ao redor da cintura de Axl, puxando-o para mais fundo, querendo mais, querendo tudo. Suas mãos percorreram as costas suadas de Axl, sentindo os músculos se flexionando sob a pele, as antigas cicatrizes que ele conhecia tão bem.

"Eu te amo", Izzy chorou, as palavras saindo entre gemidos. "Deus, eu te amo."

A expressão no rosto de Axl foi de rendição total. Seu ritmo quebrou, tornando-se mais errático, mais urgente. Seus dedos se entrelaçaram com os de Izzy, apertando com força contra o lençol.

"Izzy...", ele rosnou, um aviso, um pranto.

"Junto", Izzy suplicou. "Vem comigo."

Foi o que Axl precisava ouvir. Com um último empurrão profundo e um grito gutural que era o nome de Izzy, ele caiu sobre a beira. A sensação de Axl pulsando dentro dele, quente e profunda, foi o gatilho para o segundo clímax de Izzy, uma onda menor, mas não menos intensa, que o percorreu com espasmos suaves, extraindo um último gemido trêmulo de exaustão.

Axl desabou sobre ele, seu peso uma cobertura pesada e bem-vinda. Ele rolou para o lado depois de um momento, ofegante, mas puxou Izzy com ele, envolvendo-o em seus braços, suas pernas se entrelaçando, suas peles quentes e suadas colando-se uma na outra.

Nenhum deles falou. Não havia palavras. O ar cheirava a sexo, suor e sal. O coração de Izzy batia forte contra o peito de Axl, e ele podia sentir o coração de Axl respondendo no mesmo ritmo acelerado, lentamente diminuindo.

Axl pegou a mão flácida de Izzy e a pressionou contra seu próprio peito, sobre o coração.

Izzy fechou os olhos, sentindo a batida forte e constante sob sua palma. Ele estava esgotado, limpo, *são*. Cada toque, cada beijo, cada penetração havia sido um ato de redenção, não apenas do corpo, mas da alma. Axl não havia apenas feito amor com ele; ele havia remendado as partes quebradas de Izzy com sua própria devoção, costurando-as com fios de paciência e um amor tão feroz que era indestrutível.

E naquele silêncio pós-sexual, envolto nos braços de seu amante, Izzy Stradlin soube, sem sombra de dúvida, que estava finalmente, completamente, curado.

A primeira luz da manhã filtrou-se pelas cortinas, pintando listras pálidas sobre os corpos entrelaçados. O quarto ainda cheirava intensamente a eles – sexo, suor e a doçura terrosa do sândalo do sabonete do hotel. Era o perfume da sua noite, íntimo e pesado no ar.

Izzy acordou devagar, a consciência voltando em camadas. Primeiro, o peso familiar do braço de Axl sobre sua cintura, a mão aberta e relaxada contra seu estômago. Depois, a sensação de seu próprio corpo – não dor ou tensão, mas uma languidez profunda e satisfeita, como se cada músculo tivesse sido alongado e aquecido. Uma sensação de paz tão completa que era quase estranha.

Ele não se moveu. Permaneceu deitado de lado, encaixado contra a curva do corpo de Axl, suas costas aquecidas pelo peito quente dele. A respiração de Axl era um sopro constante e calmante em seu pescoço. Pela primeira vez em talvez toda a sua vida, não havia um pingo de ansiedade pairando sobre ele ao acordar. Apenas quietude.

Ele fechou os olhos novamente, não para dormir, mas para saborear a sensação. A memória da noite passada desfilou por sua mente não como um furacão de sensações, mas como uma tapeçaria rica e detalhada. O toque reverente de Axl. A paciência devastadora. A profundidade da conexão que foi além do físico e tocou em algo primordial dentro dele.

Axl mexeu-se em seu sono, um murmúrio incompreensível escapando de seus lábios. Seu braço se apertou around da cintura de Izzy, puxando-o para mais perto, mais fundo em seu abraço, como se mesmo inconsciente, seu corpo soubesse que aquele era o seu lugar.

Izzy sentiu um sorriso, pequeno e real, tocar seus próprios lábios. Era um gesto tão raro, tão não praticado, que quase doía. Ele cobriu a mão de Axl com a sua, sentindo os nós dos dedos, as veias salientes. Esta mão, que podia ser tão destrutiva, havia sido o instrumento de sua maior reconstrução.

O despertador do rádio-relógio do hotel irrompeu com um estaticismo barulhento, cortando o silêncio. Axl estremeceu e gemeu, enterrando o rosto entre os ombros de Izzy em protesto.

"Desliga essa porra", ele rosnou, sua voz áspera e carregada de sono.

Izzy, para sua própria surpresa, riu. Um som baixo e rouco que veio de um lugar há muito não visitado. Ele se virou dentro do abraço de Axl, enfrentando-o. Os olhos de Axl estavam semiabertos, turvos e irritados.

"Bom dia para você também", Izzy murmurou, sua voz ainda rouca da noite.

A expressão de Axl suavizou ao ver o rosto de Izzy. A irritação dissipou-se, substituída por algo quente e possessivo. Ele ergueu a mão e tocou o rosto de Izzy, seu polegar passando sobre a maçã do rosto.

"Você riu", Axl observou, seu canto da boca se curvando.

"Foi um acidente", Izzy retruou, mas não conseguiu conter outro pequeno sorriso.

Axl olhou para ele, e o amor em seus olhos era tão nu, tão não filtrado, que Izzy sentiu seu coração dar um solavanco. Ele se inclinou e beijou Izzy. Era um beijo de bom dia, lento e preguiçoso, cheio do gosto do sono e da promessa do café. Diferente de todos os beijos da noite anterior, mas não menos significativo.

"Como você está?", Axl perguntou contra seus lábios, sua pergunta carregada de um significado mais profundo.

Izzy pensou por um momento, vasculhando seu interior. Sem medo. Sem a fria pontada de pânico. Apenas uma fadiga satisfeita e uma calma que parecia ter se enraizado em seus ossos.

"Estou", ele respondeu, e a simplicidade da palavra dizia tudo.

Axl pareceu entender. Ele assentiu, seu olhar suave. Então, com um suspiro dramático, jogou as cobertas para trás. "Café. Agora. Muito café."

Ele saiu da cama, seu corpo nu e pálido glorioso na luz fraca. Izzy o observou se vestir com suas roupas do dia anterior – jeans e uma camiseta preta – sem nenhuma cerimônia. Ele era tão lindo que doía, não por causa da simetria ou das linhas musculares, mas por causa da verdade brutal e descomplicada dele.

Enquanto Axl vasculhava a mesa em busca do cartão do café do quarto, Izzy se sentou na cama, os lençóis caindo em volta de sua cintura. Ele pegou o pingente de prata que repousava sobre seu esterno – o nó sem fim – e o passou entre seus dedos. O metal estava quente de seu corpo.

Axl voltou, segurando a pequena cafeteira de plástico como um troféu. Ele parou ao ver Izzy sentado ali, a luz da manhã agora mais forte iluminando as linhas de seu torso, o pingente brilhando em sua mão.

Seus olhos encontraram os de Izzy, e um entendimento silencioso passou entre eles. A noite não havia sido um ponto final. Havia sido uma nova fundação. Mais forte. Mais resiliente.

"Você vai ficar aí admirando a si mesmo o dia todo, Stradlin, ou vai me ajudar a fazer esse café de merda funcionar?" Axl disse, quebrando o momento com sua brandura habitual.

Mas seus olhos sorriram. E Izzy, sentindo um surpreendente e estranho lampejo de leveza em seu próprio peito, descobriu que sorria de volta.

"Tô chegando, Rose. Tenha paciência."

E pela primeira vez, a ideia de um novo dia, com todos os seus desafios e caos potenciais, não pareceu um fardo. Pareceu uma promessa. Porque eles enfrentariam juntos. Como sempre deveriam ter feito.

 

💫 Fim.

Chapter 7: O Dia Em Que O Céu Desabou

Summary:

Izzy carrega um diagnóstico que parece uma sentença: uma doença degenerativa rara que ameaça apagar suas memórias. Em segredo, ele começa uma lista - pequenos momentos que quer viver com Axl antes que o tempo acabe. Do nascer do sol ao som de uma guitarra no silêncio da noite, cada riso esconde uma despedida. Até que o destino prega uma peça... e o céu que desabou pode se reconstruir de forma inesperada.

Notes:

Oi, gente! Tudo bem com vocês? 🌧️

Venho aqui com um capítulo DIFERENTE e bem emocional!

⚠️AVISOS SENSÍVEIS: Esta história aborda diagnóstico de doença degenerativa e luto antecipatório. Se este é um gatilho para você, por favor, cuide de si mesmo e pule este capítulo!

Pesquisei sobre algumas condições, mas obviamente adaptei para o universo ficcional - deixei mais "romântico" e dramático, sem intenção de romantizar doenças reais. É uma história sobre valorizar o tempo e o amor, mesmo quando tudo parece perdido.

E sobre o final... bem... será que o céu desabou de vez? Ou será que depois da tempestade sempre vem o sol? ☀️

Espero que gostem (e tenham lenços por perto)! Comentem me contando o que acharam!

Beijos e até a próxima! 💔✨

Chapter Text

O ar do consultório cheirava a antisséptico e menta falsa. Uma tentativa fracassada de mascarar o cheiro do medo que Izzy Stradlin sentia entranhado nas paredes, nas cadeiras de plástico duro, até no diploma emoldurado do médico na parede. Ele estava sentado, os dedos entrelaçados no colo, as pontas dos dedos dormentes. Do lado de fora, a chuva de Los Angeles começava a cair, pingos gordurosos escorrendo pelo vidro como lágrimas sujas.

O médico, um homem de meia-idade com óculos de aro fino e uma expressão de preocupação estudada, segurava uma prancheta. Os lábios se moviam, formando palavras que, inicialmente, não fizeram sentido. Ecos distantes em uma caverna: "...degenerativa... rara... progressão rápida... memória... funções motoras..."

Izzy não ouvia mais. O mundo havia se reduzido a um zumbido agudo em seus ouvidos e ao peso repentino de um tijolo de chumbo que se alojara no seu peito, expulsando todo o ar. Ele olhou para suas próprias mãos pousadas no jeans gasto. As mãos que sabiam encontrar cada traste de uma guitarra no escuro, que conseguiam enrolar um baseado com os olhos fechados. O médico estava dizendo que, em um ano, talvez dois, essas mãos poderiam tremer incontrolavelmente. Que poderiam esquecer o peso de uma palheta, a textura das cordas.

"Existe algum tratamento?", ouviu-se perguntar, sua voz soando estranha e distante, como se pertencesse a outra pessoa.

"Podemos tentar controlar os sintomas, retardar um pouco a progressão...", o médico disse, seus olhos evitando os de Izzy com uma pena profissional que era quase pior que o desdém. "Mas não há cura."

A palavra ecoou na sala silenciosa. Cura. Uma palavra que pertencia a outras pessoas. A fãs com febres passageiras, a cortes que cicatrizavam. Não a ele. Não agora.

Ele saiu do consultório com um maço de papéis na mão – laudos, explicações técnicas, uma sentença escrita em linguagem médica estéril. A chuva o acertou em cheio, encharcando sua jaqueta de couro em segundos, mas ele mal sentiu. Caminhou até seu carro, um velho Mustang que de repente parecia um caixão sobre rodas, e sentou-se ao volante, as mãos ainda trêmulas.

Não chorou. O choque era grande demais para isso. Em vez disso, uma calma estranha e aterrorizante desceu sobre ele. O tipo de calma que precede uma decisão irrevogável.

Ele não podia contar para a banda. Não ainda. Eles tinham uma turnê marcada, contratos, expectativas. Slash ficaria bêbado por uma semana. Duff tentaria encontrar soluções práticas, impossíveis. E Axl... Axl desabaria. Axl, com seus demônios pessoais e sua tempestade interior, não suportaria o peso disso. Izzy o conhecia como ninguém. Sabia que a notícia iria consumi-lo, transformá-lo em algo ainda mais autodestrutivo.

Não. Ele carregaria isso sozinho. Por um tempo.

Naquela noite, no silêncio opressivo de seu apartamento, com a chuva batendo nas janelas como dedos insistente, Izzy pegou um caderno velho, daqueles de capa preta e páginas amarelas pelo tempo. Na primeira página, em letras cuidadosas, ele escreveu:

Coisas para fazer antes que eu me esqueça.

A caneta pairou sobre o papel. O que se coloca em uma lista dessas? Grandes feitos? Lugares distantes? Não. Quando o tempo é curto, o que importa são as pequenas texturas da vida. Os cheiros. Os sabores. Os silêncios compartilhados.

Ele escreveu o primeiro item, sua letra firme traindo a turbulência interior:

1. Ver o nascer do sol de mãos dadas com ele.

E então, as palavras começaram a fluir, cada uma uma facada, cada uma um tesouro:

2. Ouvir ele cantar "Patience" só para mim, sem microfone, sem plateia.
3. Revisitar o primeiro palco onde toquei com ele – o The Troubadour – à meia-noite.
4. Fazer amor no escuro total, onde o toque é a única linguagem.
5. Ver ele dormindo até o sol nascer, sem medo de que o dia comece.
6. Dizer tudo que eu guardei por medo – todas as palavras não ditas.
7. Passear de carro sem destino, com os rádios desligados, só o som do motor.
8. Beijá-lo na chuva.
9. Gravar sua voz contando uma história qualquer.
10. Fingir, por um dia inteiro, que somos apenas dois homens comuns, se amando.

A lista cresceu, preenchendo páginas. Era seu testamento silencioso, seu mapa para o fim do mundo. E no fundo de seu coração, Izzy Stradlin, o homem que sempre enfrentara a vida com cinismo e distância, sabia que estava prestes a travar a batalha mais difícil de todas: a de se despedir sem que ninguém soubesse que era um adeus.

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Os dias seguintes foram um exercício de atuação. Izzy se moveu pelos ensaios como um fantasma, seus dedos encontrando os acordes por memória muscular, suas respostas às provocações de Slash sendo monossilábicas e distantes. Ele era um especialista em se fazer pequeno, em desaparecer dentro de sua própria pele, mas agora essa habilidade tinha um sabor amargo e urgente.

Ele observava Axl com uma intensidade que beirava a dor. Observava a maneira como seus braços se moviam quando ele cantava, a sombra que seus cílios longos projetavam sob as luzes do palco, o jeito que sua boca se curvava em um sorriso raro e verdadeiro. Cada detalhe era uma facada e um bálsamo. Ele estava se despedindo de tudo, em câmera lenta, e ninguém sabia.

A lista tornou-se sua bíblia secreta. Ele a mantinha escondida sob uma prancha de floor solta em seu quarto, um segredo enterrado como um corpo.

A primeira vez que ele riscou um item foi uma semana depois do diagnóstico.

Eles tinham um dia raro de folga. Axl estava agitado, a energia contida da turnê iminente fazendo-o percorrer o apartamento como um tigre enjaulado.

"Vamos dar um volta", Izzy disse, sua voz soando estranhamente suave.

Axl parou, surpreso. Izzy nunca sugeria nada. "Aonde?"

"Sem destino. Só andar."

Eles pegaram o Mustang e dirigiram para fora da cidade, com os rádios desligados. O silêncio dentro do carro era pesado, mas não desconfortável. A paisagem urbana deu lugar a estradas secundárias, depois a colinas áridas banhadas pela luz âmbar do fim de tarde. Izzy manteve as mãos firmes no volante, sentindo o ronco do motor como um batimento cardíaco constante. Ele sentia o olhar de Axl sobre ele, questionador, mas não disse nada.

Pararam no topo de um mirante, o vento frio da noite soprando seus cabelos. A cidade lá embaixo era um tapete de luzes tremeluzentes.

"Por que hoje, Iz?" Axl perguntou, seu ombro pressionado contra o de Izzy.

Izzy encarou o horizonte, o item número sete queimando em sua mente. Passear de carro sem destino.

"Só precisava de ar", ele mentiu, sua voz quase sussurrada contra o vento.

Axl não pressionou. Em vez disso, sua mão encontrou a de Izzy no capô do carro, seus dedos se entrelaçando com os dele. O toque era quente, familiar, e doeu mais do que Izzy poderia ter imaginado. Era a primeira coisa da lista, e também a última. Mãos dadas. Ele fechou os olhos, memorizando o peso, a textura, o calor.

Naquela noite, de volta ao apartamento, ele pegou o caderno e, com uma caneta tremula, riscou o item número sete. O traço na página pareceu um corte em sua própria pele.

O segundo item veio alguns dias depois, depois de um show particularmente brutal. A energia de Axl estava no limite, seus olhos queimando com um fogo que ameaçava consumi-lo. Em vez de se afastar, como faria normalmente, Izzy o seguiu até o camarim vazio.

Axl estava encostado na parede, a cabeça baixa, a respiração ofegante.

"Canta", Izzy pediu, sua voz baixa na sala silenciosa.

Axl ergueu a cabeça, confuso. "O quê?"

"Patience. Canta para mim."

Por um momento, Axl pareceu prestes a recusar, a raiva ainda pulsando nele. Então, algo na expressão de Izzy – uma vulnerabilidade que ele raramente permitia transparecer – o fez hesitar. Ele olhou para a porta, garantindo que estivessem sozinhos.

E então, ele cantou.

Não foi o performance do palco, o uivo potente que arrepiava multidões. Foi um sussurro rouco, quebrado, a melodia saindo de um lugar profundo e cansado dentro dele. "All we need is just a little patience..."

Izzy ficou parado, imóvel, cada sílaba entalhada em seu coração. Ele não ouvia apenas a música; ouvia a dor por trás dela, a beleza crua da voz de Axl sem adornos, sem amplificação. Era um presente. Um fardo. O item número dois.

Quando a última nota morreu, o silêncio que se seguiu foi sagrado.

"Por que?" Axl perguntou, sua voz ainda rouca da canção.

Izzy apenas sacudiu a cabeça, incapaz de falar. Ele se virou e saiu, deixando Axl sozinho na sala, a pergunta pairando no ar como fumaça.

A lista continuou. Ele levou Axl ao The Troubadour numa noite de terça-feira, convencendo o segurança a deixá-los entrar por cinco minutos. Ficaram parados no palco vazio e escuro, a poeira dançando nos feixes de luz das ruas.

"Lembra da primeira vez?" Izzy sussurrou.

"Você estava com uma ressaca do caralho e quase errou o solo de 'Nightrain'", Axl riu, o som ecoando no salão vazio.

Izzy sorriu, um gesto triste e torto. Então, sem aviso, ele se aproximou e girou Axl, pressionando suas costas contra o amplificador empoeirado. Seus dedos tremulos começaram a abrir os botões da calça de Axl.

"Axl..." sua voz era um sopro rouco.

"Que porra você está fazendo, Iz?" Axl perguntou, mas já estava respondendo ao toque, suas mãos agarrando os quadris de Izzy.

"Aqui. Agora," Izzy ordenou, sua voz carregada de uma urgência que fez Axl estremecer.

Enquanto Izzy terminava de abrir a calça de Axl, suas próprias mãos trabalhavam freneticamente em seu jeans. O som dos zíperes ecoou no palco vazio. Axl puxou Izzy para um beijo brutal, seus dentes batendo contra os lábios de Izzy enquanto suas mãos agarravam suas nádegas através do tecido.

"Você tá doido, Stradlin," Axl rosnou contra sua boca, mas já estava empurrando as roupas de Izzy para baixo.

Izzy gemeu quando a mão de Axl o tocou, já duro e pronto. "Preciso... preciso que você me lembre..."

Sem mais cerimônia, Axl cuspiu em sua própria mão e lubrificou a si mesmo antes de posicionar a ponta na entrada de Izzy. Ele olhou nos olhos de Izzy por um segundo, vendo a dor e a necessidade misturadas, antes de empurrar para dentro com um movimento firme.

Izzy gritou, suas unhas cavando os ombros de Axl através da camisa. "Mais... porra, Axl..."

Axl não precisou de mais incentivo. Ele agarrou os quadris de Izzy com força, enterrando-se até o fim em um só movimento. O amplificador rangiu contra a parede com a força do impacto.

"É isso que você quer?" Axl rosnou no ouvido dele, começando a se mover com estocadas profundas e rítmicas. "Ser fodido no mesmo palco onde começamos tudo?"

"Sim!" Izzy gritou, sua cabeça jogando para trás. "Me marca, Axl... faz eu lembrar..."

Axl aumentou o ritmo, cada empurrão uma afirmação de posse. Suas mãos seguravam Izzy com força brutal, mantendo-o no lugar enquanto o corpo de Izzy se curvava sob a força das estocadas.

"Você é meu," Axl sussurrou, seus lábios percorrendo o pescoço suado de Izzy. "Nunca vai esquecer isso."

Izzy gemeu em resposta, suas próprias mãos agarrando o amplificador atrás dele para se sustentar. O som da pele batendo e dos gemidos abafados ecoava no salão vazio, uma sinfonia privada de desespero e paixão.

Quando a mão de Axl fechou em torno da ereção de Izzy, foi demais. Izzy gritou, seu corpo se contorcendo violentamente enquanto o clímax o atingia, jorrando entre seus corpos suados. A visão foi o suficiente para fazer Axl seguir, seus próprios gemidos ecoando no The Troubadour vazio enquanto ele despejava tudo em Izzy.

Eles ficaram parados por um longo momento, ofegantes, ainda conectados. A poeira do palco grudava em suas peles úmidas.

"Por que aqui, Iz?" Axl perguntou finalmente, sua voz ainda rouca.

Izzy não respondeu imediatamente. Em vez disso, ele se afastou suavemente e começou a se vestir com movimentos mecânicos.

"Porque foi aqui que tudo começou", ele sussurrou, sua voz tão baixa que Axl quase não ouviu. "E eu precisava me lembrar."

Fazer amor no escuro total, onde o toque é a única linguagem. Item número quatro, riscado com lágrimas secas no caderno.

As noites eram as piores. Era quando os medos sussurravam mais alto. Ele começou a acordar no meio da noite, seu coração batendo forte, e ficava observando Axl dormir. A luz da lua pintava listras prateadas em seu rosto, iluminando a paz rara em seus traços. Izzy contava suas respirações, memorizava o som de seus suspiros, a maneira como seus lábios se moviam levemente em sonhos.

*Ver ele dormindo até o sol nascer.* Item número cinco. Ele o riscou uma manhã, com os primeiros raios de sol entrando pela janela, iluminando o rosto de Axl como uma benção. Uma benção que ele não merecia.

A tensão dentro dele crescia. As palavras não ditas queimavam em sua garganta, o item número seis um peso constante em seu peito. *Dizer tudo que eu guardei por medo.* Como dizer "eu te amo" quando soa como um adeus? Como confessar medos quando você é a âncora de alguém que está constantemente à beira do naufrágio?

A turnê começou. O caos foi um alívio e uma tortura. Os palcos eram brilhantes e barulhentos o suficiente para afogar os sussurros em sua mente por algumas horas. Mas depois, nos ônibus escuros, nos quartos de hotel anônimos, a realidade voltava a se fechar sobre ele.

Ele quase cumpriu o item número oito em Chicago. A chuva caía em cortinas cinzentas, e eles corriam do ônibus para a entrada dos fundos do hotel. Axl estava à sua frente, seus cabelos ruivos escurecidos pela água, suas roupas grudadas em seu corpo. A vontade de pegá-lo e beijá-lo ali, sob a chuva gelada, foi tão forte que Izzy parou, ofegante.

"O que foi?" Axl gritou sobre o barulho da chuva.

Izzy apenas balançou a cabeça, incapaz de falar, e correu para dentro, seu coração doendo como se tivesse sido esfaqueado.

Ele começou a gravar. Pequenos fragmentos. A risada de Axl durante uma entrevista. Seus passos no corredor do ônibus. O som de sua guitarra quando ele afinava sozinho no camarim. *Gravar sua voz contando uma história qualquer.* Item número nove. Ele guardava as fitas com o caderno, seu tesouro de despedida.

A doença, é claro, começou a dar seus sinais. Ou pelo menos, sua paranoia fez com que ele os visse em todo lugar. Um tremor na mão ao acender um cigarro. Um momento de confusão com a letra de uma música que ele conhecia há uma década. Um cansaço profundo que ia além da exaustão da turnê.

Ele começou a se afastar. Fisicamente. Emotionalmente. Era uma preparação. Um treino para o grande abandono. Ele via a confusão nos olhos de Axl, a mágoa que se transformava em raiva. Eles brigavam, discussões feias e cortantes sobre coisas insignificantes. Era mais fácil deixar Axl odiá-lo do que vê-lo despedaçado pela verdade.

Uma noite, após uma briga particularmente cruel, Axl o encostou na parede do camarim.

"O que está acontecendo com você, Izzy?!" ele gritou, seus olhos ardendo com fúria e dor. "Você está me evitando como se eu tivesse a peste! Você mal me toca, mal fala comigo!"

Izzy olhou para ele, para o homem que amava, e viu o sofrimento que estava causando. O item número seis pulsou em sua mente. *Dizer tudo que eu guardei por medo.*

Ele abriu a boca. As palavras estavam lá, na ponta da língua. A verdade. A doença. A lista. O fim.

"Eu...", ele começou, sua voz um fio quebrado.

E então, ele viu. Viu o pânico nos olhos de Axl. O medo absoluto de ser abandonado. E ele não conseguiu. Não conseguiu colocar aquele peso sobre ele. Não ainda.

"É a turnê", ele mentiu, desviando o olhar. "Só estou cansado."

A expressão de Axl se fechou. A raiva voltou, um escudo contra a rejeição. Ele soltou Izzy com um empurrão.

"Vá para o inferno, então", ele rosnou, e saiu, batendo a porta.

Izzy deslizou pela parede até o chão, seu corpo tremendo. Ele havia falhado. Falhado em dizer a verdade. Falhado em proteger Axl da dor que ele mesmo estava causando.

O tempo estava se esgotando. Ele podia sentir. Como areia entre seus dedos. Cada grão, um momento perdido. Cada respiração, uma a menos.

E no fundo de seu coração, Izzy Stradlin começou a se pergter se, quando o céu finalmente desabasse de vez, sobraria alguma coisa para enterrar, ou se ele simplesmente se dissiparia no ar, um fantasma de um amor que não teve tempo de viver completamente.

----

O mundo havia se tornado uma névoa cinzenta. Izzy funcionava por instinto, seus movimentos tão automatizados quanto os acordes de "Paradise City". Os palcos eram um purgatório – o barulho ensurdecedor afogava seus pensamentos por noventa minutos abençoados, mas a queda do pano-tração era sempre mais brutal. A cada show, ele se perguntava: *será o último?*

Axl estava se tornando um estranho. A distância que Izzy criara havia se solidificado em uma parede de gelo entre eles. Axl agora o tratava com uma frieza profissional, suas interações limitadas ao necessário para a música. Nos ônibus, ele sentava com Slash e Duff. Nos hotéis, pegava uma chave separada. O olhar que antes queimava com paixão ou fúria agora era vazio, resignado.

Era o que Izzy quisera, não era? Protegê-lo. Mas a dor de ser um fantasma na vida do homem que amava era um preço mais alto do que ele imaginara possível.

Os "sintomas" pioravam. Seus dedos escorregavam nas cordas durante um solo simples. Ele esquecia a letra de "Think About You", uma música que escrevera. Uma tarde, no ônibus, o rosto de Duff ficou borrado por um momento, seu nome fugindo da memória de Izzy por um pânico de cinco segundos intermináveis.

Era hora. O medo de ser descoberto, de se tornar um fardo, superou seu desejo egoísta de mais tempo.

Ele marcou a consulta com um novo neurologista, um especialista renomado que a gravadora indicara – um último ato de desespero antes da rendição final. Seria sua última viagem sozinho. Depois, ele contaria. Ele prometeu a si mesmo. Depois da confirmação, ele sentaria com Axl e mostraria a lista. E então, desapareceria antes de se tornar um peso.

O dia da consulta chegou. Um sol cruelmente brilhante iluminava Los Angeles. Izzy dirigiu até o consultório com as mãos suadas no volante, o coração batendo como um tambor de desgraça. O prédio era moderno, impessoal. O ar dentro cheirava a limpeza, não a morte.

A recepcionista sorriu. Ele se sentou na sala de espera, olhando pessoas com andarores, com expressões vazias. *Esse será eu*, pensou, *em breve.*

"Sr. Stradlin?" Uma enfermeira chamou.

Ele se levantou, suas pernas de algodão. O caminho até a sala de exames pareceu uma marcha fúnebre.

O neurologista era diferente – mais jovem, seus olhos eram astutos, mas não condescendentes. Ele cumprimentou Izzy com um aperto de mão firme.

"Vejo aqui seus exames anteriores", o médico disse, folheando o prontuário. "Uma condição degenerativa rara... síndrome de Hallervorden-Spatz."

Izzy assentiu, incapaz de falar.

"Estranho", o médico murmurou, seus olhos percorrendo a ressonância magnética. "Muito estranho."

Izzy se preparou para o golpe final. *Sim, é estranho como a vida é cruel.*

"Sr. Stradlin", o médico disse, erguendo os olhos. "Posso ser perfeitamente franco?"

Aqui vinha. Izzy fechou os olhos por um segundo. *Aceita. Apenas aceita.*

"Seus sintomas... eles não batem. Nem de longe. E esses exames..." Ele balançou a cabeça, um franzir de sobrancelhas. "Há algo profundamente errado aqui."

Izzy abriu os olhos. "O que... o que você quer dizer?"

"Quero dizer que o senhor não tem síndrome de Hallervorden-Spatz. Na verdade, duvido muito que o senhor tenha qualquer condição degenerativa."

O mundo parou. O zumbido nos ouvidos de Izzy voltou, mas desta vez, era diferente. Era o som do universo desabando e se reconstruindo ao mesmo tempo.

"O quê?" a voz de Izzy saiu como um sopro.

"Os sintomas que o senhor descreve – tremores, lapsos de memória, fadiga – são reais, sem dúvida. Mas eles são inconsistentes com a doença diagnosticada. E, se me permite dizer, a ressonância magnética que tenho aqui... ela é perfeitamente normal. Não há os depósitos de ferro no cérebro que são a marca registrada da síndrome."

O médico inclinou-se para a frente, suas mãos entrelaçadas sobre a mesa. "Sr. Stradlin, acredito que houve um erro. Um erro catastrófico. Houve uma confusão de prontuários com outro paciente. O senher foi diagnosticado com a doença de outra pessoa."

A sala girou. Izzy agarrou a borda da cadeira, suas articulações fracas. Ar. Ele precisava de ar.

"Um... erro?" ele repetiu, as palavras sem significado.

"Sim. Um erro administrativo monstruoso. O senhor não está morrendo, Sr. Stradlin. O senhor não vai perder suas memórias. Seus tremores, seus lapsos... eu apostaria que são ansiedade severa. Talvez ataques de pânico. Induzidos, sem dúvida, pelo trauma de receber um diagnóstico tão horrível."

O médico continuou falando, explicando sobre estresse psicossomático, sobre como a mente pode criar sintomas físicos de tanto temê-los. Mas Izzy não ouvia mais.

Ele não estava morrendo.

O céu não havia desabado. Era um blecaute. Um mal-entendido.

A primeira sensação foi um alívio tão avassalador que foi quase uma nova forma de agonia. Ele sentiu cada músculo do seu corpo desistir de uma tensão que carregava há meses. Então, veio a raiva. Uma raiva branca e quente contra o primeiro médico, contra o destino, contra si mesmo por ter acreditado, por ter se preparado para desistir.

E então, veio a imagem de Axl. Axl e seu olhar vazio. Axl e sua dor. Axl, que ele havia machucado, afastado, torturado com seu segredo estúpido e covarde.

Ele se levantou tão abruptamente que a cadeira caiu para trás com um baque.

"Preciso ir", ele disse, sua voz trêmula, mas já com uma centelha da velha força.

"Sr. Stradlin, precisamos fazer mais exames, confirmar...", o médico tentou.

"Já está confirmado", Izzy cortou, pegando sua jaqueta. Ele não estava morrendo. Ele tinha uma vida para consertar.

Ele saiu do consultório num estado de choque e euforia. O sol do lado de fora não era mais cruel; era glorioso. O ar não cheirava a fim; cheirava a começo. Cada cor era mais vibrante, cada som, mais nítido. Ele estava vivo. Verdadeiramente vivo.

Seus pés o levaram até o carro, mas em vez de ligar o motor, ele sentou-se ao volante, o corpo tremendo de adrenalia e incredulidade. Ele pegou o celular – um tijolo pesado e raro na época – e discou o número do hotel onde a banda estava hospedada. Ele precisava ouvir sua voz. Agora.

A linha tocou uma, duas vezes.

"Alô?" a voz de Axl do outro lado era áspera, cautelosa.

Izzy fechou os olhos, a simples palavra sendo um bálsamo.

"Axl", ele disse, e sua voz quebrou no nome.

Houve um silêncio. "O que foi, Iz? Tô ocupado."

"Izzy? Que foi? Você tá bem?" A cautela na voz deu lugar a uma preocupação instantânea, automática, apesar de tudo.

Izzy respirou fundo, as lágrimas finalmente chegando, quentes e libertadoras. Ele não estava morrendo. Ele tinha tempo. Todo o tempo do mundo.

"Preciso te ver", ele disse, sua voz carregada de uma emoção crua que ele não tentou conter. "Agora. É... é importante."

Do outro lado da linha, o silêncio foi diferente. Mais pesado. Mais esperançoso.

"Onde você está?" Axl perguntou, sua voz mais suave.

"Estou a caminho", Izzy disse. "Fica aí. Por favor, fica aí."

Ele desligou o telefone, ligou o carro e pôs o pé no acelerador. A cidade passava por ele em um borrão. Ele não estava fugindo mais. Estava indo em direção. Em direção à vida. Em direção ao homem que amava. E pela primeira vez em meses, o futuro não era uma linha reta em direção ao fim. Era uma estrada aberta, cheia de possibilidades, e ele não podia esperar para percorrê-la.

O carro pareceu voar pelas ruas de Los Angeles. Cada semáforo era uma eternidade, cada curva uma demora insuportável. Izzy não pensava, apenas sentia – o volante sob suas mãos firmes, o ronco do motor, a batida acelerada do seu próprio coração ecoando no espaço apertado do carro. *Não estou morrendo. Não estou morrendo.* A frase girava em sua mente como um mantra, dissolvendo meses de escuridão.

Ele estacionou o Mustang de qualquer jeito em frente ao hotel, ignorando a placa de proibido, e atravessou o saguão num turbilhão. Os elevadores eram muito lentos. Ele subiu as escadas de incêndio de dois em dois degraus, sua respiração ofegante ecoando no concreto.

Quando chegou à porta do quarto, parou por um segundo, a mão pairando sobre a madeira. O que ele ia dizer? Como explicar meses de segredo, de distância, de dor?

Ele não bateu. Girou a maçaneta – destrancada – e entrou.

Axl estava em pé no meio da sala, de costas para a porta, olhando pela janela. Seus ombros estavam tensos, seus braços cruzados. Ele se virou lentamente, e a expressão em seu rosto era uma mistura de raiva, preocupação e uma esperança tão frágil que partiu o coração de Izzy.

"O que foi tão importante que não podia esperar?", a voz de Axl era áspera, um disfarce para o tremor que Izzy conseguia ouvir por baixo.

Izzy fechou a porta atrás de si. O quarto estava em silêncio, a apenas luz da tarde entrando pelas cortinas abertas. Ele conseguiu enxergar agora, de perto, o cansaço nos olhos de Axl, as novas linhas de tensão ao redor de sua boca. Linhas que ele havia colocado ali.

Axl olhou para ele, realmente olhou, e seu rosto se alterou. Ele deve ter visto algo no olhar de Izzy – a névoa de desespero havia se dissipado, substituída por algo luminoso e cru.

"Iz?", o nome saiu como um sussurro, uma pergunta.

Izzy não conseguiu mais conter. As palavras saíram em um turbilhão, desordenadas, quebradas pelas lágrimas que finalmente fluíam livremente.

"Eu... eles erraram, Axl. O diagnóstico. Era de outra pessoa. Eu não estou... não é degenerativo. Eu não vou... não vou esquecer." Ele engasgou, ofegante. "Eu não estou morrendo."

A expressão de Axl se desfez. A raiva se dissolveu em pura confusão, depois em um entendimento lento e devastador. Seus olhos se arregalaram, percorrendo o rosto de Izzy como se estivesse vendo um fantasma.

"O quê?", ele sussurrou, incrédulo. "O que você está dizendo?"

"O primeiro médico... confundiu os prontuários. Eu tenho os novos exames... está tudo normal." Izzy sacou os papéis do bolso de trás, suas mãos tremendo tanto que mal conseguia segurá-los. "Eu pensei que... eu achei que tinha talvez um ano. No máximo."

A compreensão finalmente atingiu Axl como um choque físico. Ele cambaleou um passo para trás, seu rosto perdendo toda a cor. Os meses de distância, o afastamento, a frieza de Izzy – tudo se encaixou de repente em um quadro horrível e claro.

"Meu Deus", ele respirou, a voz um fio de horror. "Você... você estava se preparando para morrer. Sozinho."

Izzy assentiu, as lágrimas escorrendo por seu rosto, salgadas e libertadoras. "Eu não queria... não queria que você visse. Não queria ser um fardo. Eu... eu fiz uma lista."

Ele não sabia por que disse aquilo. Talvez porque fosse a parte mais importante de toda a loucura.

Axl olhou para ele, seus próprios olhos começando a brilhar. "Uma lista?"

"Coisas para fazer antes que eu me esquecesse." A voz de Izzy quebrou. "Ver o nascer do sol de mãos dadas com você. Ouvir você cantar 'Patience' só para mim. Revisitar o Troubadour..."

Ele viu o momento em que cada item atingiu Axl como um golpe físico. O beijo na chuva que nunca aconteceu. O sexo no escuro. As palavras não ditas.

"Por que você não me contou?!" a voz de Axl explodiu, cheia de uma angústia raw. "Izzy, por que caralho você não me contou?!"

"Porque te conheço!", Izzy gritou de volta, a emoção tomando conta dele. "Você teria desmoronado! Você teria queimado o mundo inteiro para tentar consertar algo que não tinha conserto! E eu... eu não aguentaria ver você se destruindo por minha causa."

Axl ficou parado, ofegante, as lágrimas agora escorrendo livremente por seu rosto. Ele olhou para Izzy, para a verdade crua e dolorosa de seu sacrifício falho, e algo dentro dele pareceu se romper.

Ele fechou a distância entre eles em dois passos e puxou Izzy para um abraço tão forte que quase os derrubou. Não era um abraço suave ou curativo; era um abraço de desespero, de raiva, de alívio avassalador. Seus dedos se enterraram nas costas de Izzy, segurando-o como se temesse que ele se desfizesse em átomos.

"Seu idiota", Axl chorou contra seu ombro, seu corpo tremendo violentamente. "Seu maldito idiota egoísta. Você não carrega essas coisas sozinho. Você nunca carrega sozinho."

Izzy enterrou o rosto no pescoço de Axl, cheirando o cheiro familiar dele – suor, cigarro, e a essência pura de Axl – e pela primeira vez em meses, sentiu-se em casa. Realmente em casa. Seus próprios soluços sacudiam seu corpo, uma tempestade de meses de medo contido e solidão sendo finalmente liberada.

Eles ficaram ali, no meio do quarto de hotel anônimo, entrelaçados como náufragos, chorando até não restarem mais lágrimas. A raiva e a culpa se dissolveram no calor compartilhado de seu abraço, lavadas pelo alívio catártico da verdade.

Quando finalmente se separaram, seus rostos estavam inchados e marcados, mas os olhos... os olhos estavam limpos.

Axl ergueu a mão e tocou o rosto de Izzy, seu polegar passando sobre a pele molhada sob seus olhos.

"Você riu hoje", Axl observou, sua voz rouca das lágrimas.

Izzy olhou para ele, e um sorriso trêmulo, real, nasceu em seus lábios. "Acho que ri."

"Nunca mais", Axl disse, sua voz carregada de uma seriedade absoluta. "Nunca mais você esconde algo assim de mim. Suas sombras são minhas, Izzy Stradlin. Suas batalhas são minhas. Até o fim."

"Até o fim", Izzy concordou, sua voz um sussurro.

E então, Axl o beijou. Não foi um beijo de paixão ou de reconciliação. Foi um selo. Uma promessa. Um recomeço. Sabia a lágrimas e a verdade, e era o beijo mais doce que Izzy já experimentara.

Mais tarde, sentados no chão, encostados na cama, com os papéis do diagnóstico errado espalhados ao seu redor, Izzy pegou o caderno preto de sua mochila. Ele o entregou a Axl.

"Minhas despedidas", ele disse simplesmente.

Axl abriu o caderno. Sua expressão mudou enquanto lia cada item, sua respiração ficando mais pesada. Quando chegou ao fim, ele fechou o caderno com cuidado, como se manuseasse algo precioso e perigoso.

"Nós vamos riscar todos", Axl disse, sua voz firme. "Mas juntos. E não como despedidas. Como promessas."

Izzy olhou para ele, para o homem que era um furacão e um porto seguro, e sentiu um amor tão vasto e profundo que não havia medo que pudesse caber nele.

O céu não havia desabado. Ele havia se aberto. E sob aquele céu novo e infinito, eles tinham uma vida inteira pela frente. Desta vez, juntos.

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Um mês se passou. A turnê continuava, mas algo fundamental havia mudado no ar entre eles. O peso que Izzy carregara nos ombros havia se dissipado, substituído por uma leveza que às vezes ainda o surpreendia. Ele acordava e, por um breve momento, ainda esperava o aperto do medo no peito. Em vez disso, encontrava apenas a calma silenciosa do novo dia.

Eles estavam em um hotel diferente, em uma cidade cujo nome Izzy já havia esquecido. Isso não importava mais. O que importava era que Axl estava ao seu lado na cama, seu braço jogado sobre a cintura de Izzy mesmo no sono, um hábito que retornara com uma ferocidade renovada.

A luz da manhã entrou suavemente, e Izzy não se moveu. Ele apenas observou Axl dormir, mas desta vez não era um vigilante se despedindo. Era um homem se reconectando com um milagre. A curva do nariz de Axl, a textura de seus cílios contra a pele, o som suave de sua respiração – cada detalhe era um presente, não uma perda iminente.

Axl acordou devagar, seus olhos se abrindo e encontrando os de Izzy imediatamente. Um sorriso lento e despreocupado se espalhou por seu rosto.

"Te peguei me encarando de novo, Stradlin", ele murmurou, sua voz áspera de sono.

"É meu direito", Izzy respondeu, seu próprio sorriso surgindo com uma facilidade que ainda era nova.

Era essa a maior mudança. Os sorrisos. Eles vinham mais fáceis agora, para ambos. As piadas durante os ensaios, os olhares cúmplices no palco, a mão de Axl encontrando a dele nos corredores do ônibus – cada toque era uma afirmação, não um presságio.

Axl se virou e pegou algo na mesa de cabeceira. Era o caderno preto. Ele o abriu em uma página específica.

"Item número oito", ele leu, seu tom de voz jogando. "Beijá-lo na chuva." Ele olhou para Izzy, um brilho travesso em seus olhos. "O tempo previsto para hoje é de chuva à tarde."

Izzy riu, um som verdadeiro e despreocupado que fez o coração de Axl se apertar de uma maneira boa. "Você está planejando meu romance agora, Rose?"

"Alguém tem que fazer", Axl retrucou, fechando o caderno. "Já que você é péssimo em se declarar."

Eles cumpriram a promessa naquela tarde. A chuva caiu sobre Berlim como cortinas de prata, e Axl, sem cerimônia, puxou Izzy para fora do abrigo do ônibus, no estacionamento vazio do estádio. A água encharcou seus cabelos e roupas em segundos, gelada e revigorante.

"É agora, Iz!" Axl gritou sobre o barulho da chuva, seus olhos brilhando com pura alegria.

E ele o beijou. Ali, sob a chuva torrencial, com a água escorrendo por seus rostos, seus corpos encostados, o mundo lá fora pouco mais que um borrão cinza. O beijo era frio e molhado, e ao mesmo tempo, o mais quente que Izzy já sentira. Não era sobre despedida. Era sobre celebração. Era sobre estar vivo, e molhado, e ridiculamente apaixonado.

Mais tarde, secos e envoltos em toalhas em seu quarto, Axl pegou uma caneta e, com um gesto teatral, riscou o item número oito do caderno.

"Próximo", ele anunciou, folheando as páginas.

E eles cumpriram. Um por um. Não com a urgência desesperada de antes, mas com a doçura deliberada de quem sabe que tem todo o tempo do mundo.

Levaram um vinho barato e sentaram-se no palco vazio do estádio em Munique à meia-noite, relembrando histórias antigas, seus ecos se perdendo nas arquibancadas desertas. Fizeram amor com as luzes acesas, e Izzy não fechou os olhos, encarando Axl com uma coragem que vinha da gratidão, não do medo. Ele disse as palavras que guardara – "eu te amo" sussurrado não como um adeus, mas como um fato, como "o céu é azul" ou "a guitarra tem seis cordas".

A lista, que começara como um testamento de desespero, tornou-se um diário de sua redenção. Cada item riscado era uma vitória contra o fantasma que nunca deveria ter existido.

Numa manhã tranquila, em um raro dia de folga, Izzy pegou o caderno. Ele não olhava mais para ele com dor, mas com uma espécie de afeição. Ele o abriu na última página e escreveu, com uma caligrafia cuidadosa:

*Coisas para fazer agora que me lembro que tenho uma vida:*

*1. Aprender a cozinhar algo que não seja macarrão instantâneo.*
*2. Ensinar Axl a pescar (e rir quando ele se irritar com o silêncio).*
*3. Escrever uma música sobre a luz da manhã.*
*4. Envelhecer.*

Axl, que espiava por cima de seu ombro, riu quando leu o segundo item, mas seu rosto ficou sério no último. Ele pegou a caneta da mão de Izzy e, ao lado de "Envelhecer", escreveu:

*Juntos.*

E foi essa a única promessa que realmente importava. O diagnóstico errado não os curou de todos os seus demônios. Ainda havia brigas, ainda havia os velhos hábitos tóxicos, as inseguranças, a pressão da fama. Mas a sombra do fim iminente havia se dissipado, e em seu lugar havia uma luz clara e implacável que mostrava a preciosidade do agora.

Izzy ainda tinha seu caderno preto. Mas agora, ele não o escondia sob uma prancha de chão. Ele o mantinha na mesa de cabeceira, ao lado de sua guitarra. Não era mais um segredo. Era um lembrete. De que o céu poderia ter desabado, mas eles o reconstruíram, tijolo por tijolo, beijo por beijo, com as próprias mãos.

E naquela manhã, com a luz do sol entrando no quarto e o som da respiração de Axl ao seu lado, Izzy Stradlin soube, com uma certeza que vinha dos seus ossos, que a vida não era sobre o tempo que você tinha, mas sobre o amor que você escolhia viver dentro dele. E ele, finalmente, estava vivendo.

 

💫 Fim.

Chapter 8: O Reflexo No Vidro

Summary:

Izzy sempre soube que o reflexo no espelho não coincidia com quem era por dentro. Quando finalmente começa sua transição, encontra em Axl um porto seguro inesperado. Da primeira dose de testosterona aos primeiros passos como seu verdadeiro eu, eles redescobrem que o amor não habita um corpo, mas uma alma.

Notes:

⚠️ IMPORTANT WARNINGS: This story contains: Gender transition (FTM) — Body dysphoria — Hormone treatment / first dose of testosterone — Emotional hurt/comfort — Unconditional love & acceptance — 1980s setting / Rockstar AU. If any of these topics are triggering for you, please prioritize your emotional well-being

Oii, pessoal!! 🖤✨

Este capítulo é muito especial e sensível, pois aborda temas como transição de gênero, disforia corporal e hormonização. Escrevi com muito cuidado e carinho, tentando mostrar amor, aceitação e apoio incondicional em cada momento.

Quero que vocês leiam com o coração aberto 💞
Sintam a coragem, a vulnerabilidade e a força dos personagens, mas sempre cuidando de si mesmos. Se algum tema for gatilho, priorize seu bem-estar emocional 🖤

Obrigada por estarem aqui, acompanhando e apoiando cada passo dessa história. Vocês são incríveis 💫

P.S: Escrevi essa história sem a intenção de ofender ninguém. Tomei muito cuidado para que isso não acontecesse, e foi incrível poder desenvolver cada parte dela!

P.S.S: Eu quis me aventurar e fazer esse desenho 🫣🫣… e eu não desenho! Mas fiquei com tanta vontade que acabei fazendo uma borboleta, que é mais fácil de desenhar. Espero que vocês gostem! Não é nada profissional, gente — é só algo que eu realmente queria criar.
Escrever tem me ensinado tantas coisas e, ao mesmo tempo, me incentivado a experimentar outras.

Quem sabe no futuro eu não faço uma obra só de desenhos inspirados nas minhas fanfics? 🌸

🌸 Com carinho, Mid 🌸

Chapter Text

Uma MulherUma mulherOlhosOlhosUma borboleta roxa

 

Gente 💜🌸🦋
O primeiro desenho foi o meu primeiro , e demorei MUITO, MUITO TEMPO para terminar!!!! Tentei tantas vezes que acabei adicionando o esboço também — que é o segundo desenho 🦋💜

A terceira imagem mostra alguns desenhos feitos pela minha irmã e outros por mim, que são os olhos!!! Eles não têm muita relação com o capítulo, mas mesmo assim quis compartilhar com vocês 💜🌸

E a quarta foto mostra os olhos do Izzy , exatamente como eu os imagino!!! Bem estilo anime, assim como a segunda foto 🦋💜✨ Não sei porquê, mas quando imagino o Izzy como uma mulher, ele me lembra alguns personagens de anime rsrsrs 💜🌸 Até tentei me inspirar um pouco na Yumeko — não sei se vocês a conhecer, mas eu a adoro!!!

A última imagem é da minha borboleta roxa 💜🦋
Não ficou tão boa assim rsrsr, mas com esse desenho eu queria mostrar um novo começo, mudança, esperança, amor e felicidade !!! Eu sei, é muita coisa, mas veio do coração 💜🌸🦋

Quero deixar claro que não sou profissional , sou super amadora mesmo, rsrsrs. Mas este capítulo foi um dos mais importantes para mim, e também o que me deu mais trabalho para criar!!! Claro, tive a ajuda da minha irmã — ela é realmente uma profissional 💜🌸

Ah! E eu estava pensando em criar uma página de arte NSFW e postar esses desenhos e outros também!!! Tipo desenhar a Izzy grávida usando lingerie, ou fazer arte dos personagens das minhas histórias 🦋💜

Bom, já falei demais rsrsrs
Espero que gostem!!! 💜🦋🌸

PS: Gente, é por isso que demorei tanto para postar este capítulo!!!! 💜✨ E me desculpe por quaisquer erros de ortografia ou palavras repetidas — não tive muito tempo para revisar com cuidado!!!! 🦋🌸💜

P.S.S: Meu nome é Gabrielle !!!! Podem me chamar assim ou de Mid 💜
Amo vocês todos!!! Amo vocês!!! 💜🦋🌸💞

P.S.S.S: Guys, I really recommend you listen to the song Grimes — Genesis, it’s incredible!!!! You can listen to it while reading the whole story, or during the part where I’ll mention it!!! But if you don’t want to listen, no problem — it’s just that I wrote this chapter while listening to it!!!!! 💗🌸

"O reflexo que o mundo viu – Izzy Stradlin, 1988."

"O mundo viu um ícone. O espelho viu uma prisão. Izzy Stradlin, 1988."

 

Los Angeles, 1988. O Guns N' Roses foi um furor de sucesso, drogas e caos. E no olho desse furacão, havia uma anomalia: Izzy Stradlin, a única mulher na formação, um guitarrista que arrancava acordes sujos com dedos finos, a namorada de Axl Rose. Para o mundo, ela era um ícone - uma mulher alta de cabelos negros como asas de corvo até a cintura, curvas generosas que preenchiam as saias de couro e jaquetas justas que eram sua marca registrada nos palcos. Seus seios, volumosos sob as camisetas rasgadas, e suas coxas fortes, envolvidas em meias arrastão e botas de couro, eram objeto de desejo de milhões de fãs.

Mas dentro desse corpo que todos cobiçavam, habitava um segredo agonizante....

A noite estava quente e molhada no backstage do Fórum. O som da multidão ainda ecoava nos ouvidos de Izzy enquanto ela tentava se livrar da maquiagem pesada no espelho iluminado. Sua imagem refletida parecia uma piada cruel - uma mulher bonita, sim, mas uma mulher que não era ela.

"Pronta, linda?" Axl entrou no camarim, suado e elétrico, envolvendo-a por trás. Suas mãos desceram naturalmente para seus quadris largos, puxando-a contra seu corpo. "Você estava incrível hoje."

Izzy forçou um sorriso sem reflexo. As palavras doíam. "Linda". "Incrível" . Eram elogios para uma pessoa que não existia.

Mais tarde, na suíte do hotel, Axl beijou com a fome habitual do pós-show. Os lábios dele estavam quentes e urgentes contra os dela, a língua invadindo com vontade, enquanto as mãos grandes subiam direto para os seios dela. Ele os abriu com força, sentindo o peso macio e cheio que transbordava pelas palmas, os mamilos já rígidos roçando o tecido da blusa fina. Axl gemeu baixo dentro da boca dela, os investigadores circulando os bicos duros, puxando-os de leve até Izzy sentiu um arrepio involuntário percorrendo o corpo.

“Você é a mulher mais fodida que já conheci”, ele rosnou entre beijos, a voz rouca de desejo, enquanto desabotoava o jeans dela com dedos ansiosos.

Axl avançou a boca só o suficiente para agarrar a barra da camiseta e arrancá-la por cima da cabeça dela num movimento rápido. Os seios grandes saltaram livres, pesados, balançando um pouco com o movimento. Ele olhou para eles como se fosse a primeira vez, os olhos escurecendo de desejo. Inclinou-se e beijou a bochecha esquerda dela, depois à direita, carinhos suaves que contrastavam com o que vinha a seguir. Em seguida, abaixou a cabeça e tomou o seio direito na boca.

Izzy sentiu o calor úmido da língua dele circundando o mamilo, chupando forte, sugando como se quisesse arrancar algo dali. Os dentes roçaram de leve, depois morderam com cuidado, puxando o bico até ele ficar ainda mais inchado e vermelho. A outra mão apertava o lado esquerdo, os dedos afundando na carne macia, moldando, massageando, o interrogando roçando o mamilo sem parar. Ela sentiu os seios latejarem, pesados, sensíveis demais, e um calor involuntário se espalhou pelo ventre.

O tecido pesado deslizou lentamente pelas coxas grossas de Izzy, caindo no chão e deixando à mostra a cueca boxer preta que ela sempre usava. Axl deu aquela risada baixa e familiar, os olhos brilhando de tesão e um pouco carinhoso.

“Sempre com essas cuecas de homem, Iz”, ele disse, como se fosse um foco atraente, não um grito de socorro silencioso, enfiando as mãos por dentro do elástico e puxando para baixo devagar, revelando tudo.

O ar frio do quarto bateu na pele exposta, mas logo foi substituído pelo toque dos dedos de Axl. Ele separou os lábios da boceta dela com calma, como se estivesse admirando. Izzy sabia o que ele via: os lábios já inchados, rosados, brilhando de umidade; o clitóris duro, protuberante, pulsando visivelmente. Dois dedos entrem devagar, abrindo caminho no canal apertado e escorregadio, as paredes internas se contraindo em volta deles. Ela sentia cada centímetro sendo invadido, o calor, a pressão, o som molhado que os dedos faziam ao se mover.

Axl se ajoelhou. Abriu mais as coxas dela com as mãos grandes, expondo tudo. A boca dele desceu direto. A língua grossa lambeu de baixo para cima, longa, lenta, coletando todo o líquido que escorria. Depois se concentrou no clitóris: chupou com força, sugando como se quisesse engolir, a ponta da língua batendo rápido, depois circulando devagar, depois sugando de novo. Izzy sentindo as pernas tremerem, os joelhos quase cedendo. Os seios balançavam pesados ​​a cada movimento da cabeça dele entre suas pernas, os mamilos ainda úmidos da saliva dele, frios agora que o ar os tocava, latejando de tão sensíveis.

Quando Axl se declarou, o pau já estava duro, grosso, a cabeça vermelha e molhada de pré-gozo. Ele virou de costas com cuidado, empurrou o tronco dela para baixo até ela se apoiar nos antebraços na beirada da cama. Abriu as nádegas dela, cuspiu na mão, passou no próprio pau e começou a entrar.

Izzy sentiu cada centímetro dele forçando caminho: a cabeça grossa abrindo a entrada, depois o corpo inteiro do pau esticando as paredes internas, preenchendo-a completamente. Ele foi até o fundo, parou um segundo quando sentiu o útero, depois começou a se mover. Primeiro lento, quase torturante, depois mais rápido, as bolas batendo de leve no clitóris a cada estocada profunda.

Os seios dela balançavam com violência agora, batendo um contra o outro, os mamilos roçando o lençol áspero, enviando faíscas de prazer-dor pelo corpo inteiro. A mão de Axl desceu até o clitóris dela, esfregando em círculos rápidos, firmes, enquanto metia sem parar. O som era molhado, obsceno, o pau entrando e saindo da boceta encharcada.

O orgasmo foi forte, resultado. A boceta dela se contraiu em espasmos longos, apertando o pau dele com força, esguichando em volta da base. Ela sentiu ele inchar ainda mais dentro dela, depois do jato quente e grosso enchendo-a por dentro enquanto Axl grunhiu contra o ombro dela.

Mas Izzy… Izzy não estava ali.
Ela fechou os olhos com mais força ainda, se afastando de tudo: do peso dos seios balançando, do calor do pau latejando dentro dela, do cheiro de sexo que enchia o quarto.

O prazer físico estava lá, mas era como assistir a outra pessoa sentindo-o.

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Os flashbacks a assombravam. Lembranças de uma infância em Indiana onde ela preferia jogar baseada com os meninos do que brincar de boneca. Lembranças da primeira menstruação aos doze anos - o pânico, a repulsa, a sensação de que seu corpo havia cometido uma traição. Lembranças de vestir as roupas do irmão mais velho em segredo, olhando no espelho e pensando, por breves momentos, que o reflexo fazia sentido.

Agora, aos vinte e seis anos, o disfarce havia se tornado sua prisão. Nos ensaios, ela observou Slash, Duff, Steven e até o próprio Axl com uma inveja dolorosa. A maneira como eles se movem no mundo, a liberdade de serem homens, a falta de expectativas sobre seus corpos. Ela queria aquilo. Queria ser um deles, não a "garota" da banda.

Nos mostramos, enquanto milhares de olhos devoravam seu corpo feminino, ela sentia náuseas. As saias de couro que referiam-se a disfarces ridículas. Os tops que mostravam seu decote eram como exibições de algo que não lhe pertencia.

"Por que você sempre usa minhas jaquetas?" Axl disse uma manhã, vendo a vestida em uma de suas jaquetas de couro largas.

"São confortáveis", ela mentia, quando a verdade era que usar suas roupas a fazia sentir-se mais perto de ser quem realmente era.

A ideia de gravidez a aterrorizava. Quando Axl falou casualmente sobre "talvez um dia ter filhos", ela sentiu pânico. Não consegui se imaginar como mãe - a ideia era grotesca. Mas pai... pai ela poderia entender.

Nos camarins lotados após os shows, cercados por groupies e outros músicos, ela se sentia como uma impostora. As outras mulheres falavam de menstruação, de sutiãs, de maquiagem, e ela se sentia uma estrangeira. Os homens falavam como se ela não estivesse totalmente lá, como se fosse algo frágil que precisasse ser protegido.

"Deixa eu te ajudar com esse amplificador, Iz", Duff disse uma vez, e a humilhação queimou seu rosto.

Ela era mais forte que a maioria dos homens da equipe, conseguia carregar seu próprio equipamento, mas ainda era tratada como "a garota".

O pior eram as manhãs após os shows, quando acordava com as dores nas costas de carregar seios que não queria, sentindo o tecido do sutiã como uma algema, olhando no espelho e vendo um estranho com seu rosto.

Ela começou a fazer pesquisas em segredo na biblioteca, palavras raras como "transexualismo", "disforia de gênero". Cada página que lia era um rompimento e um terror - rompimento por saber que não estava louca, terror por entender o que isso fez.

Em 1988, ser transgênero era praticamente invisível. Não havia representação, não havia comunidades visíveis, apenas histórias clínicas patologizantes e piadas cruéis.

Uma noite, em um bar sujo no Sunset Strip, ela viu um homem que parecia diferente. Alguém sussurrou "é um trapezista", com desdém. Izzy comentou, fascinada, vendo alguém que parecia estar no limiar entre gêneros. Foi a primeira vez que viu uma possibilidade concreta.

Mas o medo era paralisante. Como explicar para Axl, que amava seu corpo feminino? Como enfrentar a mídia sensacionalista? Como lidar com os fãs que se sexualizavam? Como aguentar as piadas que certamente viriam da própria banda?

O segredo cresceu dentro dela como um tumor. Cada "ela" , cada "linda", cada olhar masculino em seu corpo era um golpe pequeno, constante. Ela começou a beber mais, a usar mais drogas, qualquer coisa para amortecer a dor de habitar a pele errada.

Até aquela manhã, após outra noite de sexo onde ela se desconectou completamente de seu próprio corpo, ela olhou no espelho do banheiro e viu as lágrimas silenciosas escorrendo por seu rosto.

"Eu não aguento mais", ela sussurrou para o reflexo. "Eu não sou uma mulher."

A confissão, feita em voz alta para o vazio do banheiro, foi ao mesmo tempo aterrorizante e libertadora. A jornada para se tornar Izzy - o verdadeiro Izzy - havia começado. E ela sabia, com uma certeza ossuda, que seria a batalha mais difícil de sua vida. Mais difícil do que qualquer turnê, qualquer vício, qualquer relacionamento tempestuoso com Axl Rose.

O reflexo no vidro finalmente estava pronto para ser quebrado.

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A primeira pontada no baixo ventre foi como um golpe baixo. Izzy estava no meio de um ensaio, seus dedos percorrendo as cordas da guitarra em um riff sujo de "It's So Easy", quando a dor familiar a atingiu. Ela parou de repente, os dedos congelando nos trastes.

"Que foi, Iz?" Slash disse, tirando o chapéu por um momento para enxugar o suor.

"Nada", ela mentiu, a voz mais rouca que o normal. "Só um espasmo."

Mas ela sabia. Conhecia aquele peso incômodo na barriga, a sensação de inchaço que nada tinha a ver com comida ou bebida. Era a maldita visita mensal, uma lembrança mais visceral de que seu corpo era uma traição ambulante.

No banheiro do estúdio, trancada, a confirmação veio em um vermelho vibrante e odioso. Ela olhou para o sangue no papel higiênico com uma raiva tão profunda que suas mãos tremeram. Era como se seu próprio corpo cuspisse em seu rosto todo mês, lembrando-a da prisão biológica em que estava trancada.

Ela tropeçou até a pia e encarou seu reflexo pálido no espelho manchado. Por quê? ela pensou, os punhos cerrados contra a porcelana fria. Por que caralho isso tem acontecido que COMIGO?

Viver com quatro homens – Axl, Slash, Duff e, até recentemente, Steven – tornou o processo dez vezes mais humilhante. Ela era a única que eu precisava esconder absorventes no fundo da mala, a única que tinha que disfarçar cólicas como "dores nas costas", a única que precisava lidar com a bagunça sangrenta em um apartamento onde a única coisa vermelha deveria ser o vinho barato ou o sangue de algum ferimento de briga de bar.

Lembrou-se de uma vez, alguns meses atrás, quando uma mancha escarlate havia escapado para suas calças jeans claras durante um ensaio. Duff, com sua falta crônica de filtro, mencionou: "Ei, Iz, você se enviou em algo?" O constrangimento queimou seu rosto como ácido. Ela inventou uma história sobre ter derramado ketchup, mas o olhar de Axl – uma mistura de preocupação e um estranho desconforto masculino – fez se sentir como uma aberração.

Era diferente da disforia diária. A disforia diária era um zumbido de fundo, um ruído branco de inadequação. A menstruação era um grito. Um lembrete sangrento e doloroso de que, não importa o quanto ela se sente um homem, seu corpo insistia em sussurrar "mulher" a cada contração uterina.

Ela abriu uma torneira com tanta força que a água respingou em sua camisa. Lavou o rosto, a água fria misturando-se com lágrimas de raiva e frustração que ela não permitiu que ninguém visse. Como poderia explicar para eles? Para eles, que reclamavam de azar ou de ressaca, mas nunca do próprio tecido de sua existência fosse uma mentira?

Como explicar para Axl, que perdeu "fofo" quando ela usava suas cuecas ou suas camisas largas, que não era uma preferência, era uma necessidade? Que cada vez que ele a chamava de "minha rainha" ou "garota", era como uma faca torcida em uma ferida que ninguém sabia que ela carregava?

Ela pegou um comprimido de analgésicos da pia – comprimidos para "cólicas menstruais" que ela escondeu em um frasco de vitaminas – e os engoliu sem água. O gosto amargo na língua era protetor.

Saiu do banheiro, seu corpo já está se preparando para a dor que viria. O ensaio continuava, Slash e Duff rindo de algo, Axl anotando uma letra em um caderno espiral. Eles não sabiam. Eles nunca saberiam, a menos que ela contasse. E como poderia? Em 88, em meio ao caos misógino do rock 'n' roll, quem entendia que a única mulher da banda mais selvagem do mundo, na verdade, não era uma mulher?

A noite cairia, e as cólicas piorariam. Ela se encolheria em sua cama, fingindo estar bêbada ou drogada demais para fazer nada, enquanto ondas de dor a fariam suar frio. E ela suportaria sozinha, como sempre faria. Porque o segredo era seu fardo, e a raiva – contra seu corpo, contra o mundo, contra a biologia – era o único combustível que a impulsionou para o próximo show, para o próximo dia, para a próxima respiração em uma vida que não era, mas que um dia, ela jurou para si mesma, seria.

---

A dor era uma serpente de fogo enroscada em seu ventre. Cada contração a faz arquear as costas na cama suada, um gemido abafado escapando por entre seus dentes cerrados. Ela havia se trancado no quarto que dividia com Axl, as cortinas puxadas, mergulhando o espaço em uma penumbra que combinava com a agonia interna.

Os analgésicos não foram feitos feitos nada. Nada além daquela névoa distante ao redor de uma dor que insistia em ser central, dominante. Ela pressionou o punho contra o baixo ventre, como se pudesse esmagar fisicamente o útero que tanto odiava. Pára. Pára. Por favor, para, ela se submeteu em silêncio, não a qualquer deus, mas ao próprio corpo que a traía.

A porta do quarto varia ao ser aberta. Um raio de luz do corredor cortou a escuridão, revelando Axl de pé no vão, sua silhueta familiar.

"Iz? Você está aí dentro de faz horas." Sua voz era áspera, mas com uma nota de preocupação genuína. "Slash disse que você parecia uma merda antes de sumir."

Ele acendeu a luz do abajur. Izzy encolheu-se, virando o rosto para o travesseiro. A última coisa que ela queria era que ele visse assim – pálida, suada, encolhida em volta de uma dor que ele nunca entenderia.

"Estou bem", ela mentiu, sua voz abafada pelo tecido. "Só... cansada. Bebi demais."

Ela sentiu o colchão ceder sob o peso dele quando ele se sentou na beira da cama. Sua mão, grande e quente, tocou sua testa.

"Você está gelada. E suando." Sua voz perdeu a aspereza, ficando suave. "Fala a verdade pra mim, Izzy. Você está doente?"

Ela abanou a cabeça contra o travesseiro, enquanto lágrimas de dor, raiva e impotência brotavam em seus olhos. "É só... cólica." A palavra saiu como uma confissão suja. "Vai passar."

Um silêncio pesado caiu sobre eles. Ela poderia sentir uma hesitação dele. Cólica era território feminino, um país estrangeiro para um homem como Axl Rose, cujo mundo era feito de whisky, guitarra e testosterona.

Em vez de se afastar, como ela esperava, como a maioria dos homens faria, sua mão não saiu de sua testa. Em vez disso, desceu suavemente, seus dedos afastando os fios de cabelo molhados de suor de seu rosto.

"Porra, Iz", ele sussurrou, e não havia nojo ou desconforto em sua voz. Havia apenas uma dor solidária. "Dói muito?"

Ela não conseguiu responder. Outra onda de dor a atingida, fazendo-a encolher e prender a respiração. Seus dedos se enterraram no lençol.

Ela esperou que ele saísse. Que dissesse que ia buscar outra cerveja, ou que tinha uma ligação para fazer. Qualquer desculpa para fugir do desconforto da biologia feminina.

Ele não saiu.

Em vez disso, ele se deitou na cama atrás dela, seu corpo quente e sólido se moldando contra suas costas. Sua mão desceu de seu ombro, passou por seu braço trêmulo, e encontrou seu punho cerrado contra sua própria barriga.

"Deixa", ele sussurrou perto do seu ouvido.

Lentamente, com uma paciência que ela nunca lhe conheceria, ele abriu sua mão e substituiu seu punho pela sua própria palma larga e quente. Ele pressionou firmemente contra o ventre dolorido de Izzy.

O calor foi um rompimento imediato. Um contraste divino com a dor fria e cortante por dentro.

"Minha mãe... ela tinha umas dores fodidas também", Axl disse, sua voz um murmúrio baixo contra seus cabelos. "Ela dizia que calor ajudava."

Ele começou a fazer círculos lentos e firmes com a palma da mão, uma pressão perfeita para afastar um pouco da agonia. Izzy soltou um suspiro trêmulo, seu corpo começando a relaxar contra o dele, contra sua vontade. As lágrimas, agora, não eram só de dor. Foi de uma gratidão avassaladora e complicada.

Aqui estava ele. Axl Rose. O furacão em forma de homem. O egoísmo profissional. E ele ficou deitado com ela na cama escura, segurando sua barriga enquanto ela sangrava, fazendo algo que nenhum outro homem em sua vida jamais havia feito: ficar. Sem fazer piada. Sem nojo. Apenas... ficando.

Ela fechou os olhos, sentindo o calor de sua mão penetrar através do tecido da camiseta, afastando a dor física um centímetro de cada vez. Mas a dor emocional, a raiva do próprio corpo, a disforia – isso ainda estava lá, latejante.

Ele não entendeu. Ele descobriu que estava ajudando com uma "cólica de mulher". Ele não sabia que estava confortando um homem preso, acalmando a fúria de um espírito que se via refém da própria carne.

Mas naquele momento, no quarto escuro, com a respiração constante de Axl em seu pescoço e sua mão quente como um salva-vidas em seu ventre, pela primeira vez em muito tempo, Izzy não se sentia completamente sozinho. O segredo ainda a sufocava, a raiva ainda a consumir, mas aquele pequeno ato de pura, a simples humanidade era um farol na escuridão.

O calor da mão de Axl era um bálsamo, mas a dor insistia em latejar em ondas surdas. Após um longo silêncio, ele se moveu com cuidado.

"Fica aí", ele sussurrou, levantando-se da cama.

Izzy ouviu seus passos saindo do quarto e uma pontada de pânico confuso com problema a queda. Ele estava indo embora. Era compreensível. Ninguém queria lidar com isso.

Mas minutos depois, ele voltou. Na penumbra, ela viu que ele trazia uma toalha de rosto enrolada, fumegando levemente.

"Minha mãe faz isso com água quente", ele disse, sua voz estranhamente vulnerável. Sem cerimônia, ele colocou uma compressa quente sobre a barriga de Izzy, por cima da camiseta.

O calor úmido foi mil vezes melhor que o calor seco de sua mão. Penetrou profundamente nos músculos contraídos, dissolvendo um nó de dor que ela carregava há horas. Um gemido de intervalo genuíno escapou de seus lábios.

"Melhor?" Axl disse, deitando-se novamente atrás dela, seu braço envolvido sua cintura para segurar a compressa no lugar.

Ela apenas assentiu, sem fala, as lágrimas escorrendo silenciosamente pelo rosto e molhando o travesseiro. Era um cuidado tão íntimo, tão doméstico, tão longe do caos que era a vida deles. Era uma coisa mais amorosa que alguém já havia feito por ela.

E foi justamente esse bem-estar momentâneo que fez com que ela percebesse uma nova sensação, uma umidade diferente e familiar entre suas pernas. O absorvente estava cheio. O pânico, então, foi instantâneo e gelado.

Merda.

Ela ficou na cama. Se ela se levantasse, poderia vazar no lençol. Se ela ficasse, era questão de tempo. A vergonha queimou seu rosto, muito pior que qualquer febre. Ela não podia. Não na frente dele. Não com ele tocando nela.

"Preciso ir... no banheiro", ela disse, sua voz estrangulada.

Ela se movia com cuidado, evitando disfarçar o constrangimento, e se fazia ao banheiro com passos rápidos, causando a umidade perturbadora a cada movimento. Trancou a porta e encostou-se nela, ofegante. O rompimento foi imediato, seguido por um novo terror.

Ela havia pegado um absorvente limpo? Ela olhou freneticamente ao redor do pequeno banheiro. Nada. A caixa estava no armário do quarto. Do lado de fora. Onde Axl estava.

Agora ela estava trancada no banheiro, com um absorvente usado e nenhum limpo. A situação era tão humilhante que ela quase riu, um som de desespero.

"Is?" A voz de Axl do outro lado da porta fez saltar. "Tudo bem aí?"

Ela engoliu seco, o rosto em chamas. "Axl, eu...", a voz falhou. Ela não consegue. Como pedir aquilo?

"Fala, Izzy. O que foi?"

"Eu... esqueci de pegar um... um absorvente." A palavra saiu como uma inspiração de derrota. "Está no armário."

Houve um silêncio do outro lado. Um silêncio que para Izzy durou uma eternidade. Ela imaginou o nojo no rosto dele, o constrangimento, a repulsa.

Em vez disso, ela escolheu seus passos se afastando e, menos de um minuto depois, voltando.

"Abra a porta", ele disse, sua voz calma.

Hesitante, mortificada, ela destrancou a porta e abriu apenas uma fresta, o suficiente para estender a mão. Em vez de apenas entregar o pacote, Axl empurrou a porta suavemente e entrou no banheiro.

Izzy recuou, cruzando os braços sobre o torso, sentindo-se mais exposto do que se estivesse nua.

Axl fechou a porta atrás de si. Ele não estava olhando para ela com nojo. Seus olhos estavam sérios, mas suaves. Ele segurava não apenas o absorvente, mas também uma calça limpa de pijama.

"Aqui", ele disse, entregando os itens. "E troca essa calça também. Você deve estar se sentindo uma merda."

"Izzy", ele interrompeu, sua voz firme, mas não dura. "Olha para mim."

Ela forçou-se a erguer os olhos, sentindo as lágrimas de vergonha se acumularem de novo.

"Nós somos namorados", ele disse, como se estivesse declarando um fato simples, como o cor do céu. "Isso... isso é só uma coisa que acontece. Não tem problema. Não fica com vergonha comigo, tá?"

Ele não esperou uma resposta. Ele se virou e saiu do banheiro, fechando a porta atrás de si e deixando-a sozinha com as palavras dele e o pacote de absorventes em suas mãos trêmulas.

Izzy escorregou pela porta até o chão frio do banheiro, o pacote apertado contra o peito. A dor física ainda estava lá, mas era ofuscada por um turbilhão de emoções. Vergonha. Alívio. É uma gratidão tão profunda para aquele homem complicado e imprevisível que, no meio da noite, se tornou a pessoa mais segura do mundo para ela.

Ele não entendeu. Ele ainda via uma mulher com cólicas. Mas ele estava tentando. E naquele momento, tentei era tudo o que importava. Ela se começou e a se limpar, sua vergonha começando a se dissolver, permanece por um frágil fio de esperança. Talvez, um dia, ela pudesse contar a ele a verdade. E talvez, só talvez, ele ainda estivesse ali do outro lado da porta, pronto para entrar.

A porta do banheiro fechada-se com um clique suave, mas para Izzy, assim como o fechamento de uma tumba. O silêncio que se somou foi pesado, quebrado apenas pelo zumbido abafado do exaustor e pelo som ofegante de sua própria respiração. Ela deslizou pela porta até o chão de azulejos frios, as pernas cedendo completamente sob o peso da emoção.

O pacote de absorventes, ainda envolto em plástico, escorregou dos dedos trêmulos e caiu ao seu lado com um baque surdo. Ela não conseguia se mover. Não consigo pensar. Tudo o que conseguiu fazer era sentir – a onda avassaladora de vergonha, rompimento,gratidão e uma dor tão profunda que nem mesmo as cólicas puderam comparar.

As lágrimas surgiram então, não as silenciosas do sofrimento físico, mas soluções profundas e roucas que a sacudiram até o âmago. Ela enterrou o rosto nos joelhos, seus longos cabelos negros formando uma cortina ao redor do rosto, um refúgio miserável da realidade.

Cada palavra de Axl ecoava em sua mente, cada gesto. O calor da compressa. A firmeza de sua mão. A calma em sua voz quando ele pediu para ela abrir a porta. A naturalidade com que ele entrou, sem hesitar, sem nojo. "Nós somos namorados." A simplicidade afirma a destruição.

Porque ela não era a namorada que ele pensava que era. Ela era uma fraude. Um homem preso em um corpo que insistia em traí-lo mensalmente, sangrando, doendo, lembrando-o de uma prisão da qual ele não via escapatória. E Axl, com toda a sua crueldade ocasional e egoísmo monumental, havia sido mais gentil e abrangente com essa "mulher" que qualquer pessoa faz em sua vida inteira.

A ironia era um gosto amargo em sua boca salgada por lágrimas. Ele estava sendo perfeito, e cada ato de perfeição dele era um lembrete do segredo monstruoso que ela guardava. Como ela poderia algum dia olhar para aqueles olhos azuis intensos e dizer: "Tudo isso que você fez por mim? Toda essa gentileza? Foi para uma pessoa que não existe."

Ela imaginou o rosto dele mudando. O amor dando lugar ao nojo. A compreensão se transforma em repulsa. Uma confusão. Uma raiva. Ele poderia gritar. Poderia chamar-la de doente, de monstruoso. A imprensa teria um dia de campo. A banda se desintegraria. Tudo porque seu corpo era uma mentira.

Um novo tipo de dor abaixada, uma dor emocional tão aguda quanto qualquer cólica. Era o luto. O luto pelo relacionamento que eles tinham, pelo amor que ele sentiu por ela, pela pessoa que ele perdeu que ela era. Um amor que, ela sabia, não sobreviveria à verdade.

Suas soluções se intensificaram, deixando seu corpo já exausto. Ela se agarrou ao próprio estômago, como se pudesse segurar os pedaços de si mesma que estavam se desintegrando ali, no chão frio do banheiro de um apartamento de Los Angeles.

Ela não sabia quanto tempo ficou ali. O mundo lá fora havia desaparecido. Havia apenas o frio dos azulejos contra suas pernas, o gosto salgado de suas próprias lágrimas e o eco garantidor de seu próprio desespero.

A única coisa que a impedia de se fazer completamente era a memória da mão de Axl em sua barriga. Ó calor. Uma segurança. A tácita acessível, mesmo que baseada em uma mentira.

Finalmente, exausta, as lágrimas caíram a diminuir, deixando para trás um vazio dormente. Ela está exposta à cabeça, seus olhos inchados e ardentes encontrando seu próprio reflexo no espelho embaçado do banheiro. O rosto estava inchado, marcado pelo sofrimento, mas ainda assim... feminino. Ainda a máscara.

Com mãos trêmulas, ela pegou o pacote de absorventes e o abriu. O ato era mecânico, praticado, mas hoje parecia mais pesado, mais significativo. Cada movimento era uma representação ao corpo que a traía.

Quando ela finalmente saiu do banheiro, de pijama limpo, o rosto lavado, mas os olhos contando uma história diferente, ela encontrou Axl sentado na beira da cama, esperando. A compressa quente estava sobre o travesseiro dela, ainda fumegando levemente.

Ele não disse nada. Apenas a liberdade para a cama, a envolveu em seus braços e reposicionou a compressa em sua barriga. Ele não fez perguntas. Não pedi explicação.

E Izzy, envolta no calor dele e no silêncio que era ao mesmo tempo um conforto e uma reportagem, fechou os olhos e fingiu, por mais uma noite, que o reflexo no espelho era real.

A luz do abajur pintava listras douradas no corpo de Axl, iluminando os contornos familiares de seus ombros, a curva de seu pescoço enquanto ele se virava para pegar um copo d'água da mesa de cabeceira. Ele o entregou a Izzy sem uma palavra. Suas mãos são respondidas brevemente – os dedos dele, quentes e firmes, os dela, ainda frios e um pouco trêmulos.

Ela bebeu um gole, a água fresca um rompimento em sua garganta dolorida pelo choro. O silêncio entre eles não era vazio; era denso, carregado de tudo o que havia acontecido e de tudo o que não havia sido dito. Axl se deitou de lado, enfrentando-a, sua cabeça reforçada na mão. Seus olhos, normalmente tão cheios de fogo ou ironia, eram sérios, contemplativos.

Ele estende a mão e, com uma delicadeza que ainda apareceu a Izzy, moveu um fio de cabelo do rosto dela, colocando-o atrás de sua orelha. Seus dedos então traçaram a linha de sua sobrancelha, o arco de sua maçã, a curva de seu queixo. Era um toque de explorador, como se ele estivesse tentando decifrar um mapa que de repente parecia ter contornos diferentes.

"Você está tão longe às vezes, Iz", ele disse, sua voz um sussurro rouco no quarto quieto. "Mesmo quando você está aqui. Como se... como se uma parte de você estava em um lugar onde eu não posso entrar."

O coração de Izzy deu um solavanco. A percepção dele era como um raio-X, vendo através de suas paredes, sentindo o vazio que ela carregava dentro de si. Ela fechou os olhos, incapaz de suportar a intensidade desse olhar.

"É difícil", ela sussurrou, a verdade mais próxima que poderia dar. "Algumas coisas... são difíceis de carregar."

A mão de Axl parou em seu rosto, sua palma quente contra sua pele. "Você não precisa fazer upload sozinho. É pra isso que eu estou aqui. Pra isso que nós estamos aqui."

Mas você não entendeu, ela pensou, uma dor aguda cortando seu peito. Como você poderia entender?Ela abriu os olhos e encontrou os dele. Eles não mostraram pena, mas uma determinação obstinada, a mesma que ele dirigia para tudo na vida – suas músicas, suas brigas, seus amores.

"Eu sei", ela mentiu, porque era mais fácil fazer que a verdade.

Ele não pareceu totalmente concluído, mas não pressionou. Em vez disso, sua mão desceu do rosto dela, passou por seu ombro, e encontrou seu sob a coberta. Seus dedos se entrelaçaram com os dela, um gesto simples que fez os olhos de Izzy marejarem novamente. Era um contato que dizia que estou aqui, não importa o quanto você vai, não importa o que você carregou, eu ainda estou aqui.

Ele deixou a compressa, que começou a esfriar, e ajustou sobre sua barriga com a outra mão. "Dorme", ele experimentou suavemente. "Eu fico acordado."

E ele ficou. Izzy podia sentir o olhar dele sobre ela enquanto ela fechava os olhos, exausta. A dor física havia recuado para uma distância tardia, ofuscada pela tempestade emocional. Mas o peso no peito... esse ainda estava lá.

Enquanto a respiração de Izzy se aprofundava e se tornava mais regular, Axl continuava observando. Ele observava a tensão que ainda habitava os cantos de sua boca, mesmo no sono. Observava a maneira como seus dedos, entrelaçados com os dele, ocasionalmente se apertavam, como se segurassem a um pescoço.

Ele não sabia o que estava passando na cabeça dela. Não totalmente. Mas ele sabia da dor. Ele sabia do segredo. E ele sabia, com uma certeza que vinha de um lugar além do ego e da fama, que o que ele sentia por aquele ser humano complicado e fechado era maior do que qualquer verdade que pudesse ser revelada. O amor que ele sentiu não era pelo corpo que ele via, ou pela pessoa que o mundo via. Era pela alma teimosa e quebrada dentro daquele corpo. E qualquer que fosse a batalha que ela estava travando, ele não demorava muito. Mesmo que ela ainda não saiba disso.

E na quietude daquela noite, com a cidade de Los Angeles rugindo silenciosamente lá fora, Axl Rose fez uma promessa silenciosa para si mesmo. Ele descobriria o que estava machucando sua Izzy. E quando ele descobrisse, ele queimaria qualquer coisa ou qualquer um que causasse essa dor. Porque ela era dele. E ele protegeu o que era seu.

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O sol da manhã entrou implacável pelas frestas das persianas, cortando a penumbra do quarto como uma lâmina. Izzy acordou com o corpo pesado, a mente envolta nos resquícios de um sono agitado. A dor havia recuado para um latejar distante, mas uma fadiga mais profunda a dominava.

Ela viu duas coisas ao mesmo tempo: primeiro, a compressa ainda estava em sua barriga, agora fria e molhada. Segundo, a mão de Axl ainda estava entrelaçada com a sua. Ele estava sentado na beira da cama, na mesma posição da noite anterior, a cabeça inclinada para a frente, os ombros subindo e descendo em um ritmo lento e profundo. Ele havia dormido assim. Sentado. De vigia.

Um nó de emoção – gratidão, culpa, amor – abrir sua garganta. Ele havia ficado. Ele realmente havia ficado.

Como se sente seu olhar, Axl mexeu-se. Ele submeteu a cabeça, seus olhos vermelhos e pesados ​​de sono encontrando os dela. Um sorriso pequeno e cansado ao tocar seus lábios.

"Como está a dor?" sua voz era áspera, cheia do sono não reparada.

"Melhor", ela sussurrou, e era a verdade. O pior havia passado.

Ele concordou, soltando sua mão para esfregar o rosto. "Bom." Ele se declarou, estalando as costas. "Vou fazer café. Muito café."

Ele saiu do quarto, e Izzy ficou deitada, ouvindo os sons reconfortantes dele na cozinha – o tilintar da cafeteira, o ruído da torradeira. Era uma normalidade doméstica que parecia surreal depois da noite que eu tinha.

Ela se declarou e foi até o banheiro. Sua imagem no espelho a encarou – olhos inchados, rosto pálido, mas o corpo... o corpo ainda era o mesmo. As curvas, os seios, os quadris largos. A realidade física era uma âncora cruel, puxando-a de volta para a prisão de sua própria pele. A gentileza de Axl, a conexão da noite anterior, deixa claro um sonho distante diante da evidência concreta no espelho.

O cheiro do café encheu o apartamento. Quando ela saiu do banheiro, vestindo uma camiseta larga e um short, encontrou Axl na pequena cozinha, dois copos de café preto na mesa.

"Toma", ele disse, empurrando um deles em sua direção. "Você precisa."

Eles beberam em silêncio. O sol da manhã iluminava a poeira que dançava no ar entre eles. Axl a observava por cima da borda de seu copo, seus olhos analíticos.

“Iz”, ele começou, colocando o copo na mesa com um clique decisivo. "O que aconteceu ontem... isso é só... cólica? Ou tem algo mais?"

A pergunta que você não está fazendo, contém. Era a deixa. Uma oportunidade. Ela poderia contar. Podia soltar as palavras que a sufocavam há anos.

Ela abriu a boca. "Eu..."

Mas então a porta do apartamento se abriu e Slash entrou, desgrenhado e com óculos escuros, seguido por Duff, que carregava uma sacola de donuts.

"Que porra é essa, um funeral?" Slash resmungou, jogando suas chaves no balcão. "Axl, a gente tem que ensaiar aquela ponte nova de 'Rocket Queen' hoje. E Iz, a Rolling Stone quer fazer aquela entrevista com você, a da 'mulher no rock'."

As palavras de Slash atingiram Izzy como socos. "Mulher sem pedra." Uma pessoa. Uma fachada. O mundo lá fora ainda estava girando, e ele ainda tinha um papel a desempenhar. Um papel que, a cada dia, se tornava mais insuportável.

Ela viu a expectativa no rosto de Axl, esperando que ela terminasse sua frase. Mas o momento havia passado. A realidade havia sido invadida, brutal e comum.

"É só cólica, Axl", ela disse, sua voz plana, seus olhos se afastando dos dele. "Já passou."

Ela se declarou, pegou seu copo de café e foi para seu quarto, fechando a porta suavemente atrás de si. Ela se encostou na madeira, ouvindo os filhos da banda se reunindo na sala – as risadas de Slash, a voz grave de Duff, o tom irritado de Axl respondendo a algo.

Ela estava de volta na sua gaiola. A noite de vulnerabilidade e cuidado havia sido um parêntese. Agora, era hora de vestir a armadura novamente, de ser Izzy Stradlin, a guitarrista mulher do Guns N' Roses. Uma pessoa que o mundo via, mas que nunca existiu de verdade.

O segredo, mais uma vez, havia vencido. E o amor de Axl, por mais reconfortante que fosse, não era forte o suficiente, ela temia, para libertá-la dele.

A noite chegou trazendo o rugido familiar de cinquenta mil vozes. Sob os holofotes, Izzy Stradlin era um ícone. Seus dedos voavam sobre as cordas da guitarra com uma ferocidade que arrancava gritos da multidão. Sua saia de couro balançava com seus movimentos, as botas de cano alto batendo no palco em ritmo com a bateria. Seus cabelos negros, como um manto, escondiam parcialmente seu rosto, uma vitória disfarçada.

Axl se moveu dela durante "Sweet Child O' Mine", seu suor brilhando sob as luzes. Ele a retira para perto, como sempre fazia, suas quadris se movem contra os dela em uma dança de posse e paixão performática. A transmissão mais alta. Ele sussurrou algo em seu ouvido, perdeu no rugido, e então se demorou, correndo para a outra ponta do palco.

Izzy tocou o solo com resultados cirúrgicos, mas sua mente estava a quilômetros de distância. Ela sentiu o suor escorrer entre seus seios, o tecido do sutiã esportivo – uma concessão necessária sob os tops de renda – apertando seu torso. Cada olhar da plateia em seu corpo era como um inseto rastejando em sua pele. Cada movimento puramente sensual que ela fazia era uma traição a si mesma.

Ela olhou para Axl, que agora estava de joelhos, uivando os versos finais com uma devoção quase religiosa. Ele era livre em sua masculinidade, em seu corpo. Ele se sentiu em casa em sua própria pele. A inveja era um gosto amargo em sua boca.

O show terminou em um auge de feedback e glória. De volta ao camarim, a energia era de euforia e exaustão. Axl estava animado, falando sem parar sobre uma mudança de tom que ele havia feito em "Paradise City".

"E você, Iz?" Duff disse, passando uma garrafa de whisky para ela. "Você estava afiado pra caralho hoje."

Ela pegou uma garrafa e tomou um gole longo, sentindo o líquido ardente descer por sua garganta, anestesiando um pouco o ruído interno. "Tava ok", ela encolheu os ombros, o gesto típico dela.

Axl a colaboração, seu olhar intenso e perceptivo. Ele se mudou, seu corpo grande bloqueando o resto do camarim.

"Tudo bem?" ele disse, baixinho, só para ela.

Ela forçou um sorriso que não alcançou seus olhos. "Só cansada."

Ele hesitou, como se quisesse dizer mais, mas então Slash jogou um braço sobre os ombros de Axl, puxando-o para uma conversa sobre o setlist do próximo show.

Izzy se virou para o espelho iluminado do camarim e começou a remover a maquiagem pesada. Com cada pincelada que limpava o rímel e a base, ela sentia que estava removendo uma camada da pessoa, aproximando-se mais da superfície, mas nunca do núcleo. O rosto que a cirurgia era mais andrógino, mas ainda preso, ainda errado.

Naquela noite, no quarto de hotel, quando Axl tocou, foi diferente. Ele foi mais lento, mais questionador. Suas mãos percorreram seu corpo como se estivessem procurando por algo, tentando decifrar o enigma que ela era.

"Você está tão longe", ele sussurrou contra sua pele, e não era uma acusação, era uma observação triste.

Izzy não respondeu. Em vez disso, ela o manteve para um beijo mais profundo, tentando se perder no físico, no momento, em qualquer coisa que não fosse a verdade gritante em sua própria cabeça. Ela guiou sua mão, mostrando a ele o que fazer, controlando a narrativa do toque dele, garantindo que ele só sentisse o que ela queria que ele sentisse – a mulher que ele perdeu que ela era.

Quando foi feito, Axl adormeceu ao seu lado, ela ficou acordada, olhando para o teto. O zumbido do ar condicionado parecia sussurrar impostora, impostora, impostora.

Ela se lembrou de uma frase que leu em um dos livros raros da biblioteca: "Disforia de gênero é o sentimento de que seu próprio corpo é uma casa assombrada."

Sua mão desceu silenciosamente sob as cobertas, tocando a curva de seu quadril, a especial de sua coxa. Cada ponto de contato era um fantasma, um lembrete do habitante indesejado que era seu corpo. Ela imaginava, como fazia com frequência, como seria sentir os mesmos ossos, os mesmos músculos, mas desejoso de forma diferente. Mais planos. Mais angulares. Mais deles.

Ela olhou para o rosto tranquilo de Axl adornado. Ele a amava. Ela sabia disso. Mas ele amava um fantasma. E mais cedo ou mais tarde, os fantasmas sempre se revelam.

A questão não era seela contaria. A questão era quando o segredo a consumir seria tanto que não restaria outra escolha. E o que sobraria deles quando a poeira baixasse. Naquela noite, envolta na escuridão e no som da respiração de sua amante, Izzy Stradlin sentiu, com um frio na espinha, que o dia do julgamento estava se aproximando. E ela estava aterrorizada.

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A estilista da gravadora havia espalhado as opções para o próximo show sobre a cama do hotel como um leque de torturas coloridas. Havia um top de renda preta, transparente o suficiente para exigir um sutiã especial que realçaria cada curva. Uma saia de couro absurdamente curta. Até mesmo um espartilho que promete "afinar a cintura e levantar os seios".

Izzy ficou parado na frente daquelas peças, seus braços cruzados tão firmemente que seus músculos doíam. O sangue parecia zumbir em seus ouvidos, um ruído de fundo de raiva pura e não filtrada.

"O que você acha, querida?" a estilista pediu, animada. "Acho que o espartilho seria arrasador em você. Vai destacar essa sua silhueta incrível."

Silhueta incrível. A frase ecoou na cabeça de Izzy como um insulto. Sua “silhueta incrível” era a fonte de sua agonia diária.

"Eu não vou usar essa porcaria", a voz de Izzy saiu baixa e carrega de um veneno que fez a animação do estilista esmorecer.

Axl, que estava no canto da sala discutindo um setlist com o manager, olhou para cima. "Problema, Iz?"

"O problema", ela cuspiu, pegando o espartilho com dois dedos, como se estivesse segurando algo contaminado, "é que eu não sou uma boneca de vocês para vestir. Não vou usar essa merda que aperta, sufoca e me faz sentir... sentir..." Sua voz falhou, a raiva engolindo as palavras.

"Sentir o quê, Izzy?" Axl disse, sua voz mais suave agora, seus olhos analíticos fixos nela.

Como um homem vestido de mulher, ela pensou, a verdade queimando sua língua. Como uma fraude. Como uma piada.

"Me faz sentir desconfortável", ela finalizou, jogando o espartilho de volta na cama com desdém.

O estilista pareceu perplexo. "Mas é para o show, querida! Os fãs. É sua... marca."

Minha marca, Izzy pensou, uma onda de náusea a atingir. Sua marca era uma prisão.

"E o reforço?" um estilista contínuo, ignorando o aviso silencioso no ar. "Para o top de renda, temos aquele com bojo, que dá um decote perfeito..."

Foi a gota d'água. Algo dentro de Izzy estalou. Ela não pensou. Apenas agora. Com um movimento brusco, ela pegou o top de renda e, com as duas mãos, o rasgou ao meio. O som do tecido cedendo foi como um tiro no quarto silencioso.

"IZZY!" Axl concordou, levantando-se de seu assento.

A estilista deu um passo para trás,chocada.

"Chega", Izzy rosnou, sua respiração ofegante. "Chega de reforço. Chega de roupa justa. Chega de tentar me enfiar nessa caixa de 'mulherão do rock'." Ela pegou a saia curta e jogou contra a parede. "Eu vou vestir o que eu quiser. E eu quero é uma porra de uma camisa e uma calça de homem."

O silêncio que se abalou foi absoluto. Um estilista olhou para Axl, esperando uma ocorrência. O gerente parecia querer se fundir com a parede.

Axl comentou com Izzy, seu rosto é uma máscara de conflito. Ele viu a fúria genuína, a dor crua em seus olhos. Esta não era a Izzy teimosa que ele conhecia. Era algo mais profundo, mais desesperado.

Ele se tornou estilista, sua voz anormalmente calma. "Dá um tempo pra gente, Carol."

Um estilista não precisou ser mandado duas vezes. Ela saiu rapidamente, fechando a porta atrás de si.

Axl se mudou de Izzy, que agora tremia de adrenalina e raiva.

"Iz", ele começou, cautelosamente.

"Não, Axl!" ela interrompeu, suas mãos ainda cerradas. "Não me venha com discurso. Eu estou cansada. Cansada de fingir. Cansada de me encaixar. Cansada desse corpo... desse... desse tudo!" Ela gesticulou violentamente em direção ao próprio corpo, e o gesto era tão cheio de ódio que era doloroso de se ver.

Axl parou na frente dela. Ele não tentou tocá-la. Ele apenas olhou.

"Por que você nunca fala comigo?" ele disse, e sua voz estava relacionada a uma frustração genuína. "Por que explode assim? O que está acontecendo de verdade?"

Izzy olhou para ele, para a preocupação e a confusão em seus olhos, e uma parte dela quis desabar e contar tudo. Mas o medo era um bloqueio muito forte. O medo de perdê-lo. O medo do julgamento. O medo de que, se ela dissesse as palavras em voz alta, tudo desabaria.

"Você não entendeu", ela sussurrou, a raiva se dissipando e deixando para trás uma exaustão avassaladora. Ela se virou e caminhou até a janela, encarando a cidade lá fora. "Ninguém entenderia."

Ela sentiu Axl se aproximar por trás, mas ele não a tocou.

"Tenta me fazer entender, Izzy", ele disse, sua voz um sussurro próximo ao seu ouvido. "Por favor."

Mas as palavras não vieram. Elas foram presas atrás de anos de medo e vergonha. Então, ela apenas balançou a cabeça, os ombros curvados sob o peso do segredo.

Axl suspirou, um som de derrota. "Tudo bem", ele murmurou. "Você veste o que quiser no show. Eu cuido da gravadora."

Era uma vitória, pequena e insignificante, mas ainda assim uma vitória. Ela não teria que usar o espartilho. Não teria que usar o sutiã de sutiã. Mas ela ainda teria que ser Izzy Stradlin, uma mulher guitarrista. E naquele momento, isso parecia a sentença mais pesada de todos.

Na noite do show, Izzy vestiu o que queria: uma camisa xadrez de flanela masculina, desbotada e macia, com as mangas cortadas nos cotovelos. Por baixo, uma camiseta preta. Calças jeans largas, surradas, que escondiam completamente suas curvas. Botas de couro pesadas. Nada de maquiagem. Seus cabelos negros, lavados, soltos, formando uma cortina que ela podia usar para se esconder.

Ela se olhou no espelho do camarim. Pela primeira vez em semanas, sua respiração não ficou presa ao ver seu reflexo. Ainda não era ele, mas também não era a caricatura feminina que a gravadora insistia em importar. Era um meio termo. Um refúgio.

Axl entrou no camarim enquanto ela se preparava. Ele parou, seus olhos percorrendo sua figura de cima a baixo. Ele não disse nada por um momento, apenas inspirado.

"Você parece... você", ele finalmente comentou, sua voz neutra.

Ela se virou para enfrentá-lo. "É isso que importa, não é?"

Ele manteve seu olhar, e algo passou entre eles – um entendimento silencioso, uma trégua não declarada. Ele concordou, uma vez. "Sim. É isso que importa."

No palco, sob as luzes cegantes, a diferença era palpável. Os fãs gritaram seu nome da mesma forma, mas o olhar deles era diferente. Menos lascivo, mais respeitoso. Menos focados no corpo, mais na música. Ela não estava se oferecendo para eles da mesma maneira. Ela estava simplesmente... tocando.

Seus dedos encontraram os acordes com uma ferocidade renovada. Cada nota que ela arrancava da guitarra era um grito de liberdade, um protesto muito contra as expectativas. Ela se moveu pelo palco com uma energia contida, diferente da sensualidade performática de antes. Era mais cru, mais real.

Durante "Nightrain", ela se moveu do microfone para fazer os backing vocals, e seu olhar encontrou o de Axl no centro do palco. Ele a observava, e havia um novo brilho em seus olhos – não de posse, mas de curiosidade. Como se estivesse vendo uma camada dela pela primeira vez.

Mas a distância que ela sentiu dentro de si não desapareceu. Ela estava no palco, sim, vestida como queria, mas ainda era uma performance. Ainda era Izzy Stradlin, a mulher guitarrista do Guns N' Roses. A identidade ainda era um disfarce, apenas um disfarce mais confortável.

Enquanto Slash fazia um solo interminável, ela se apoiava em seu amplificador, observando a multidão. Milhares de rostos voltados para ela, mas ela se sentiu completamente sozinha. A camisa xadrez era um conforto tátil, o tecido áspero contra sua pele lembrança uma constante de sua pequena rebelião, mas não podia apagar a verdade fundamental.

Ela era um homem. E ninguém sabia.

Axl se moveu durante a ponte de "Patience", sua voz suave preenchendo o estádio. Ele cantou a linha – “Tudo o que precisamos é de um pouco de paciência” – e seus olhos encontraram os dela. Era como se ele estivesse cantando diretamente para ela, para a dor que ele não pudesse nomear.

Por um breve momento, ela permitiu que a música se envolvesse. Permita que a voz dele, aquele instrumento tão familiar, ancorasse no presente. Ela fechou os olhos e apenas tocou, sentindo as vibrações da guitarra percorrendo seu corpo.

Quando o show terminou e eles saíram do palco sob uma salva de aplausos, o colapso foi diferente. Ela não se sentiu esgotada pela performance de feminilidade, mas sim energizada por sua pequena vitória.

Não camarim, Slash deu de ombros. "Gostei do visual, Iz. Menos apropriado, mais atitude."

Duff chegou com um grunhido, já com uma cerveja na mão.

Axl não disse nada. Ele apenas pegou uma garrafa de água e entregou a ela, seus dedos se encontrando brevemente. Seu toque era quente, e seu olhar era intenso, cheio de perguntas não feitas.

Izzy bebeu a água, sentindo o líquido frio descendo por sua garganta. Ela havia conquistado um território hoje. Um pequeno pedaço de si mesmo. Mas a guerra ainda não estava nem perto do fim. Ela havia se vestido do seu jeito, mas o mundo ainda a via como uma mulher. E até que ela pudesse mudar isso, cada show, cada olhar, cada pronome ainda seria uma batalha.

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O camarim estava uma zona. Garrafas vazias rolavam no chão, o ar era pesado com fumaça de cigarro e um cheiro adocicado de erva. A energia pós-show era de euforia caótica. Slash já tinha um baseado na mão, rindo de algo que Duff dissera, enquanto Steven, visivelmente alterado, batia um ritmo errático na mesa com duas baquetas.

Izzy estava encostada em um canto distante, longe do epicentro do caos. Ela ainda sentia o zumbido do palco em seus ossos, a adrenalina lentamente se dissipando e deixando para trás a fadiga habitual. Ela observava a cena com uma distância que se tornaria sua segunda natureza. Ela estava lá, mas não estava. Um fantasma em seu próprio sucesso.

Foi então que as groupies invadiram. Um redemoinho de cabelos loiros platinados, pele bronzeada e shorts minúsculos. Elas eram altas, seus olhos brilhavam com a emoção de estar tão perto dos deuses do rock que adoravam. A energia no camarim mudou instantaneamente – a euforia da música foi aumentada por uma tensão sexual associada.

Uma delas, uma morena ousada com um top que mal continha seus seios, foi direto para Axl. Ela deslizou um braço em torno de sua cintura, fitando-o com olhos embaçados de desejo e uísque.

"Axl Rose", ela arrulhou, sua voz um sussurro sedutor. "Você estava incrível hoje. Aquele final de 'Rocket Queen'... quase me fez gozar só de ouvir."

Axl, ainda com a adrenalina do palco, riu, um som arrogante e familiar. Sua mão, quase por reflexo, pousou na cintura nua da garota. "É? E se eu te disser que posso fazer melhor?"

Izzy ficou imóvel no seu canto, observando. Ela deveria sentir ciúmes. Raiva. Algo. Era seu namorado. Mas em vez disso, uma sensação estranha e fria a envolvida. Ela observou a cena como se estivesse assistindo a uma peça de teatro. Uma garota, performando uma feminilidade hiper-sexualizada que era esperada dela. Axl, performando a masculinidade de rockstar predatória que era esperada dele.

Ela, Izzy Stradlin, a namorada, deveria estar performando o papel da mulher ciumenta. Mas ela não era uma mulher. E naquele momento, a farsa era tão óbvia, tão esmagadora, que ela quase riu. Era tudo tão... cercado.

A morena sussurrou algo no ouvido de Axl, e ele riu novamente, seu olhar percorrendo o corpo dela com aprovação. Seus olhos então, por um breve segundo, pousaram em Izzy no canto. Ele deve ter esperado ver ciúmes, um aviso, qualquer coisa. Mas o que ele viu foi um vazio. Uma indiferença que era mais assustadora que qualquer raiva.

O sorriso de Axl esmoreceu um pouco. Ele se atrasou da groupie de forma quase imperceptível.

"Algum problema?", a morena perguntou, sentindo a mudança.

"Nada", Axl disse, sua voz perdendo um pouco de brilho. "Só cansado."

Seus olhos focados em Izzy por um segundo a mais, uma pergunta clara neles. O que há de errado com você? Por que você não se importa?

Izzy desviou o olhar, focando em uma mancha de uísque no carpete. Ela não poderia explicar. Como explicar que ela não se sentiu a namorada ciumenta porque, no fundo, ela não se sentiu a namorada? Ela se sentia... um colega de banda. Um irmão. Alguém observando de fora enquanto o homem que ela amava flertava com uma fêmea da espécie, um ritual no qual ela, como "fêmea", deveria estar participando, mas do qual se sentia completamente alienada.

A groupie, sentindo que estava perdendo a presa, tentou novamente. "Você quer... dar um passeio? Encontrar um lugar mais tranquilo?"

Axl não respondeu imediatamente. Ele ainda estava olhando para Izzy, que agora fingia grande interesse em acender um cigarro, suas mãos notavelmente firmes.

"Não hoje, beleza?", Axl finalmente disse, sua voz distante. "A gente tem que... discutir um setlist."

A garota ficou irritada, mas foi claramente puxada por suas amigas na direção de Slash, que recebeu com os braços abertos e um sorriso largo sob seu chapéu.

Axl atravessou o camarim até a música de Izzy. Ele parou na frente dela, bloqueando a vista do resto da sala.

"O que foi?" ele disse, sua voz baixa e áspera.

"O que foi o quê?" ela respondeu, tragando o cigarro e soltando a fumaça lentamente.

"Você me viu ali com aquela garota. Você nem... piscou."

Izzy encarou ele, seus olhos escuros impenetráveis. "E o que você queria que eu fizesse, Axl? Cria uma cena? Puxa o cabelo dela? É isso que as namoradas fazem, não é?"

Havia uma amargura em sua voz que não era dirigida apenas a ele, mas a todo o roteiro ridículo que a vida lhe dera.

Axl pareceu confuso e frustrado. "Não, mas... caralho, Iz. Um pouco de... de algo. Não essa indiferença de merda."

"Desculpa te decepcionar", ela disse, virando o rosto. "Nem sempre consigo performar como você espera."

A palavra "performar" pairou no ar entre eles, fornecendo um significado que Axl não conseguiu decifrar totalmente, mas que soou como uma verdade fundamental.

Ele abriu a boca para dizer algo, mas então Duff chamou por ele, sua voz embriagada e animada. Axl hesitou, seus olhos ainda presos em Izzy, antes de soltar um resmungo de frustração e se virar, mergulhando de volta na multidão.

Izzy ficou sozinho em seu canto, a fumaça do cigarro formando uma barreira entre ela e o mundo. Ela conseguiu o que queria – ele não foi com uma groupie. Mas a vitória era amarga. Porque ela sabia que não era o ciúme de uma mulher que o impedia. Era uma confusão. A estranheza. A quebra do script.

E, de alguma forma, isso a fez sentir-se mais distante dele do que nunca. Ela estava se tornando um estranho para o homem que amava, e não havia um manual, nem uma música, nem uma performance no mundo que pudesse trazer isso.

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O ar no camarim estava ficando insuportável. Muito barulho, muito perfume barato, muito... performance. Izzy esmagou o cigarro em um cinzeiro transbordante e se desvencilhou do canto, deslizando pela borda da multidão sem fazer contato visual. Ela precisa de ar. De silêncio.

Ela saiu para o corredor semi-escuro dos fundos do estádio, onde o som era abafado e o ar cheirava a concreto e isolamento. Encostou-se na parede fria, fechando os olhos por um momento, tentando recuperar um pedaço de si mesma.

"Desculpa, é... Izzy, né?"

A voz era masculina, calma, sem a energia frenética de um fã ou a arrogância de alguém da indústria. Izzy abriu os olhos. Um homem estava parado a alguns metros de distância, hesitante. Ele era mais novo, talvez com vinte e poucos anos, vestido com jeans simples e uma jaqueta de couro não tão diferente do que ela gostava de usar. Seu cabelo era escuro, curto, e ele tinha um rosto aberto, sem a pose dura típica de Los Angeles.

“Sim”, ela respondeu, sua voz ainda rouca do show.

"Eu sou o Leo. Trabalho com a iluminação", ele explicou, fazendo um gesto vago em direção ao teto. "Só queria dizer... seu som hoje estava foda. Cru. Diferente."

Ele não estava olhando para seu corpo. Seus olhos estavam fixos nos dela, com um respeito que era puramente profissional, quase... camarada.

"Obrigada", Izzy disse, e surpreendeu-se por significar. Era um elogio à sua música, não à sua imagem.

Um silêncio confortável caiu entre eles. Diferente do silêncio pesado do Axl, isso era fácil.

"É estranho, né?" Leo disse de repente, encostando-se na parede oposta. "Todo esse circo. Às vezes você só quer tocar e ir pra casa, mas tem toda essa... teatralidade."

Izzy quase engasgou. Era exatamente isso. Ele havia colocado em palavras o que ela sentia há anos.

"É... uma performance", ela escolheu, escolhendo a palavra com cuidado.

"Pois é. E você... hoje você pareceu menos... performática. Mais você mesma. Ou você mesmo. Desculpa, não sei...", ele hesitou, parecendo genuinamente constrangido.

O sangue correu mais rápido nas veias de Izzy. Você mesmo. Ou você mesmo. A correção sutil, a abertura... foi um acidente? Ou...

Ela olhou para ele com mais atenção. Havia uma descoberta em seus traços, uma coisa na maneira como ele se segurava que não era totalmente... convencional.

"Tanto faz", ela disse, e sua voz saiu mais suave do que o pretendido. "A intenção é que importa."

Ele é gentil, um sorriso pequeno e verdadeiro. "É. A intenção."

Eles ficaram em silêncio por mais um momento, ouvindo o som abafado da festa no camarim.

"É foda", Leo continuou, olhando para suas próprias botas. "Trabalhar nesse meio. As caixinhas que eles tentam te enfiar. Você tem que ser de um jeito, parecer de outro... é cansativo ficar se espremendo em um espaço que não é seu."

Izzy se sentiu como se alguém tivesse ligado uma luz dentro de seu cérebro. Ela ficou paralisada, olhando para ele. Ele não estava falando apenas do trabalho. Ele não poderia estar.

"Sim", ela sussurrou, a voz quase sumindo. "É exaustivo."

Seus olhos se encontraram, e houve um reconhecimento instantâneo. Não é um reconhecimento de atração, mas de experiência compartilhada. Era o olhar de dois náufragos que haviam encontrado um ao outro no mar.

A porta do camarim se abriu com estrondo, derramando luz e música alta no corredor. Axl apareceu, seu rosto uma máscara de proteção.

"Iz! Onde você se meteu? A gente vai vazar!" Seus olhos fecharam em Leo, e seu rosto fechado. "Quem é você?"

Leo se endireitou imediatamente, a postura casual desaparecendo. "Só o técnico de luz, Sr. Rose. Tudo bem por aqui." Ele fez um aceno de cabeça para Izzy. "Até a próxima, Izzy. Foi um prazer."

Ele se virou e foi embora pelo corredor, desaparecendo na escuridão.

Axl olhou para Izzy, seus olhos estreitos. "O que aquele técnico queria?"

"Nada", Izzy disse, empurrando-se da parede.Uma conversa de dois minutos com Leo lhe deu mais paz do que a noite toda com Axl. "Só elogiei o show."

Axl não pareceu acreditar, mas pegou seu braço com um gesto possessivo. "Vamos. O carro está esperando."

Enquanto ele puxava de volta para o caos, Izzy lançou um último olhar para o corredor escuro onde Leo havia desaparecido. Pela primeira vez, alguém tinha visto. Não é uma mulher, não é uma rockstar, não é uma namorada de Axl Rose. Alguém já havia visto como uma pessoa que estava se espremendo em um espaço que não era seu. E naquele breve, precioso momento, ela não se sentiu sozinha. Ela se sentiu... sincera. E isso era um perigo maior para qualquer groupie. Porque era uma esperança.

O carro a caminho do hotel era uma cápsula de tensão silenciosa. Axl estava encostado no outro lado do banco de trás, olhando fixamente para a janela, sua mandíbula tensionada. A energia possessiva dele era um muro físico entre eles. Izzy se encolha em seu canto, o corpo ainda vibrando com o eco daquela curta conversa no corredor.

"É cansativo ficar se espremendo em um espaço que não é seu."

As palavras de Leo giravam em sua mente, um mantra de validação. Alguém sabia. Alguém, em algum nível, entendeu. Não totalmente, talvez, mas o suficiente para lançar uma corda salva-vidas em seu mar de solidão.

Ela fechou os olhos, não para evitar Axl, mas para se agarrar àquele sentimento. O jeito como Leo a olhou – não como um objeto, não como uma conquista, mas como... um igual. Um colega. Alguém que também lutava contra as expectativas.

"O que ele realmente queria?" A voz de Axl cortou o silêncio como um vidro quebrado.

Izzy abriu os olhos. Ele ainda estava olhando pela janela, mas sua postura era uma pergunta furiosa.

"Já te disse", ela respondeu, sua voz cansada. "Elogiou o som."

Axl riu, um som seco e sem humor. "Técnicos de luz não ficam nos corredores para elogiar guitarristas. Especialmente não meu guitarrista."

Minha. A palavra ecoou no espaço apertado do carro. Ela era uma turma. Parte do império Axl Rose. A ideia a enojou.

"Talvez ele só fosse educado, Axl. Nem todo mundo tem uma agenda."

Ele finalmente se virou para ela, seus olhos queimando no escuro do carro. "Eu conheço homens, Izzy. Eu sei como eles olham para você."

Mas ele não olhou, ela quis gritar. Foi diferente. Mas como explicar? Como explicar a nuance do reconhecimento entre dois espíritos que sabiam o que era viver uma mentira?

"Ele não deu em cima de mim", ela disse, a firmeza em sua voz uma surpresa até para ela mesma.

Axl estudou, sua raiva dando lugar a uma confusão profunda. Ele podia lidar com ciúmes, com birra, até com raiva. Mas essa calma, essa... distância serena era um território desconhecido e aterrorizante.

"Por que você está sendo assim?" ele disse, e pela primeira vez,ela enfrentou uma ponta de vulnerabilidade genuína sob a fúria.

"Como?" ela contra-atacou, sabendo muito bem o que ele queria dizer.

"Assim! Distante. Fria. Como se... como se você não se importasse mais." A entrada saiu como um puxão.

Izzy olhou para ele, para o homem cujo amor era como um furacão – intenso, consumidor e, em última análise, destrutivo. Ela o amava, Deus sabe que sim. Mas o amor dele era por um fantasma. E cada dia que passava, uma pessoa real dentro dela sufocava mais.

"Eu me importo, Axl", ela sussurrou, e era a verdade. "Só... cansei."

"Você pode fazer quê?" sua voz estava mais alta agora, cheia de frustração. "De mim? Da banda? Da porra toda?"

De mim mesma, ela pensou, a dor tão aguda que ela quase se dobrou. Canssei de tentar ser uma pessoa que você acha que eu sou.

"De tudo", ela disse em voz baixa, desviando o olhar para a cidade que passava pela janela. Era mais fácil fazer isso a verdade.

O resto da viagem foi em silêncio. Quando chegou ao hotel, Axl saiu do carro primeiro, batendo a porta com força. Izzy ficou para trás, olhando para o saguão iluminado, apontando o peso do segredo como uma pedra no estômago.

A conversa com Leo havia sido um raio de luz. Mas a ocorrência de Axl foi um lembrete brutal da escuridão que a aguardava se ela alguma vez tentasse seguir aquela luz. Ela estava presa entre a âncora de um amor que a sufocava e o mar tempestuoso de uma verdade que poderia destruir tudo. E naquela noite, afundando no colchão de outro hotel anônimo, ela não sabia para onde nadar.

Os dias seguintes foram um campo minado. Axl alternava entre tentativas de reconquistar sua atenção – presentes caros, sexo agressivo, declarações de amor possessivas – e explosões de ciúmes e frustração. Uma conversa com o técnico de luz havia tocado um nervo profundo nele, não por ciúmes românticos, mas porque ele sentiu que estava perdendo o controle sobre uma parte de Izzy que ele nem mesmo entendeu.

Izzy, por sua vez, se retraía cada vez mais. Ela passava horas trancada no quarto de hotel, não com drogas ou álcool, mas apenas em silêncio, olhando para o teto. A imagem do rosto compreensivo de Leo, a sensação de ser  vista  por dois minutos, havia desencadeado algo nela. Uma inquietação que não poderia mais ser contida.

Uma gota d'água caiu durante uma sessão de fotos para uma nova campanha publicitária. 

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O estúdio de fotos estava quente e abafado, cheirando fumaça de cigarro e suor. Holofotes cruzeiros iluminavam cada detalhe. O fotógrafo, um italiano excêntrico chamado Giovanni, gesticulava animadamente.

"Perfeito, Axl! Perfeito! Agora, Izzy mia bella, encoste seu rosto no dele... isso! Agora, Axl, sua mão na curva dela... sim, ali mesmo, molto bene!"

Axl estava sem camisa, seu torso pálido e suado sob as luzes. Um chapéu de cowboy foi enterrado em seus cabelos ruivos. Em uma mão, ele segurava um copo de plástico com uísque. A outra mão estava espalmada, possessiva e firme, na curva do quadril de Izzy, bem acima da bunda, puxando-a contra seu corpo.

Izzy estava usando apenas um short curto de couro e um top preto que a fazia sentir-se nua e grotescamente exposto. Seu rosto estava colado ao de Axl, sua boca a centímetros dele, como se estivessem querendo se beijar. Ela conseguia sentir o calor do seu corpo, o cheiro do uísque e do suor dele. A pose era íntima, sexual, tudo o que os fãs esperavam do casal selvagem do rock.

Por dentro, Izzy estava se despedaçando.

Cada toque da mão de Axl era um ferro em brasa marcando a propriedade dele sobre um corpo que não era seu. Cada suspiro quente dele contra seu rosto era um lembrete da intimidade que ela performava, mas não sentia completamente. Ela olhou nos olhos dele, e ele brilhante, um sorriso embriagado e vitorioso. Ele estava em seu elemento, o rei conquistando sua rainha para as câmeras.

"Sim! Isso! Agora olhem um para o outro como se quisessem devorar um ao outro!" Giovanni comentou, o clique da câmera um som mecânico e incessante.

Izzy forçou os olhos a permanecerem abertos, forçou os lábios a se curvarem em algo que se parecesse com um sorriso sedutor. Ela colocou uma mão no peito de Axl, perfurando os ossos de suas costelas sob a pele. Era um gesto que deveria ser sensual, mas suas pontas dos dedos estavam dormentes, desconectadas.

Agarre-se, ela tentou a mesma coisa. É só mais uma performance. É o que você faz.

Mas o cansaço era um peso de chumbo em seus ossos. A mentira era um gosto amargo em sua boca. A mão de Axl em seu quadril parecia pesar uma tonelada, esmagando-a, lembrando-a da prisão que era sua própria pele.

"Lindo! Maravilhoso! Agora, Izzy, um beijo no pescoço dele! Deixe ele com uma marca!"

Ela se moveu mecanicamente, pressionando os lábios contra o pescoço suado de Axl. Ele riu, um som baixo e satisfeito, e sua mão se abriu ainda mais em seu quadril.

"Você é toda minha, Iz", ele sussurrou, só para ela ouvir, sua voz contém de posse e uísque.

E foi aí que algo dentro dela cortes.

Ela congelou. Seus lábios ainda estavam contra a pele dele, mas ela não conseguia se mover. A raiva, a repulsa, o cansaço de anos de fingimento subiram como um maremoto, sufocando-a.

Ela se afastou bruscamente, quebrando a pose.

"Chega", a palavra saiu como um suspiro rouco, mas cortou o ar como um grito.

O clique da câmera parou. Giovanni ficou com a boca aberta. "*Che cosa?* Mas estava perfeito!"

Axl olhou para ela, confuso, a euforia do momento dissipando-se rapidamente."Iz? Que foi agora?"

Ela não olhou para ele. Ela olhou para o chão, seu corpo tremendamente incontrolavelmente. Ela não consegue mais. Não consegui sorrir, não consegui se encostar nele, não consegui fingir que aquela caricatura de feminilidade e paixão era real.

"Eu... não consigo", ela sussurrou, sua voz trêmula. "Só... não consigo mais."

Ela não deu explicação. Não podia. Apenas pegou sua jaqueta que estava em uma cadeira e caminhou em direção à saída, deixando Axl parado sob as luzes, sua mão ainda suspensa no ar onde o quadril dela estivera, seu rosto uma máscara de perplexidade e o início de uma fúria ferida.

A sessão de fotos estava arruinada. A imagem perfeita estava quebrada. E Izzy sabia, com uma certeza fria e clara, que nada mais seria o mesmo. Ela havia quebrado o personagem, e não havia como voltar atrás. O preço da verdade estava se tornando alto demais para pagar, mas o custo da mentira era insustentável.

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O motor do Mustang rugiu, um som animal e familiar que abafou o zumbido enlouquecedor na cabeça de Izzy. Ela pisou fundo no acelerador, as ruas de Los Angeles se tornando um borrão de luzes e sombras. A janela estava aberta, e o vento noturno entrava como um furacão, puxando seus longos cabelos negros, tentando arrancar a máscara que ela sentia grudada em seu rosto.

Ela não sabia para onde estava indo. Apenas dirigia, fugindo do estúdio, de Axl, aquela mão em seu quadril, da expectativa sufocante de ser Izzy Stradlin, a namorada de Axl Rose.

As palavras do fotógrafo ecoavam em sua mente. "Sua beleza feminina... a deusa do rock..." Cada sílaba era um golpe. Ela engatou uma marcha mais alta, o carro ganhou velocidade em uma estrada marítima agora vazia. O oceano lá embaixo era uma mancha escura e infinita, refletindo as estrelas fracas que conseguiam penetrar o brilho da cidade.

Quando achou que estava longe o suficiente, ela deixou o carro para um mirante deserto, o motor ainda roncando enquanto ela desligava a ignição. O silêncio foi arrependido e absoluto, quebrado apenas pelo vento e pelo som distante das ondas.

Ela saiu do carro e caminhou até a beira do penhasco, o vento uivando ao seu redor, enchendo suas roupas, fazendo-a sentir-se pequena e frágil. E então, ela abriu a boca e falou.

Não foi um grito de raiva, ou de medo. Era um grito de pura, crua agonia. Um som que vinha das profundezas de sua alma, da pessoa presa dentro dela, da verdade que ela era obrigada a calar todos os dias. Ela falou até sua garganta doer, até seus pulmões em, até as lágrimas que ela não permitiu no estúdio em a livremente começarem a correr, salgadas e quentes, levadas pelo vento.

Quando não conseguiu mais gritar, ela caiu de joelhos na terra úmida, ofegante. Suas mãos se enterraram na grama, sentindo a realidade sólida do chão. Ela olhou para o céu, para as estrelas distantes e indiferentes.

"Quem eu sou?" ela sussurrou para o vazio, sua voz rouca e quebrada. "Por que isso faz tanto?"

Ela começou a cantarolar, baixo a princípio, depois mais forte. Não era uma música dos Guns. Era uma melodia antiga, triste, que sua avó costumava cantar. Algo sobre um pássaro preso em uma gaiola, batendo as asas contra as grades. As palavras se perderam, mas a melodia era um lamento, uma oração.

Ela cantou até sua voz sumir, até só reiniciar o som do vento e das ondas. Sentada em privacidade na escuridão, com o rosto molhado de lágrimas e o corpo tremendo de frio e exaustão, Izzy Stradlin finalmente descobriu a verdade que vinha evitando há anos.

Ela não poderia continuar assim. A mentira estava matando, lentamente, todos os dias. A pessoa estava rachando, e em breve se despedaçaria completamente, não importa o quanto ela tentasse manter-la unida.

O caminho à frente era assustador. Inexplorado. Cheio de riscos e possibilidade de perder tudo – sua carreira, seus amigos, o homem que ela amava.

Mas ali, naquele mirante deserto, com o gosto de sal e verdade em seus lábios, uma pequena centelha de determinação nasceu dentro dela. Era uma chama fraca, tremulante, mas era dela. Não de Axl, não da banda, não dos fãs. Dela.

Ela se declarou, as pernas trêmulas, e olhou para a cidade adormecida lá embaixo. O mundo ainda esperava que ela fosse Izzy Stradlin, uma guitarrista mulher. Mas ela sabia, no fundo do seu ser, que uma pessoa que voltaria para a cidade naquela noite não era mais a mesma que havia saído. Algo havia mudado. Algo havia quebrado.

E talvez, apenas talvez, fosse necessário quebrar para que ela pudesse, finalmente, se reconstruir da maneira que sempre deveria ter sido.

A determinação que nasceu no penhasco não era barulhenta. Era uma coisa quieta e obstinada, um rio trecho começando a fluir sob a superfície de sua vida. Izzy não confrontou Axl. Não fez mais cenas. Em vez disso, ela começou a agir.

Sua primeira parada foi uma livraria especializada em um bairro distante de Hollywood, onde ninguém a consideraria. Entre as prateleiras empoeiradas, ela encontrou seu tesouro: um livro chamado "O Gênero da Angústia", uma publicação acadêmica e obscura que falava sobre transexualidade. Suas mãos tremeram ao segurá-lo. Ela o roubou escondido, como se estivesse comprando pornografia, seu coração batendo forte o tempo todo.

Em seu quarto de hotel, com a porta trancada, ela devorou ​​cada palavra. Termos como "disforia de gênero", "transição hormonal", "cirurgia de redesignação" saíram das páginas e se entrelaçaram com sua própria experiência de uma forma tão precisa que era assustadora. Ela não estava louca. Ela tinha uma condição. Havia um nome para o seu inferno.

A pesquisa levou mais tempo. Em um fórum de discussão online primitivo, acessado através de um BBS em um cibercafé discreto, ela encontrou histórias. Pessoas escrevendo sob pseudônimos, compartilhando suas lutas, suas transições, seu colapso em finalmente viver como seu verdadeiro eu. Ela lia essas histórias até altas horas da noite, os olhos ardendo da luz do monitor, sentindo uma conexão profunda e dolorosa com aqueles estranhos.

Foi lá que ela viu uma pequena mensagem, quase perdida: "Encontro de Apoio - Pessoas Transgênero. Segundas-feiras, 20h. Centro Comunitário de Silver Lake. Discrição garantida."

O endereço queimou em sua mente. Era um risco enorme. Se fosse descoberta... a imprensa teria um frenesi. A banda poderia ser ridicularizada. Axl...

Mas a necessidade era mais forte que o medo.

Na segunda-feira seguinte, ela estacionou seu carro em duas quadras do centro comunitário, o coração batendo como um tambor. Ela usava um capuz grande e óculos escuros, embora estivesse escuro. O ar dentro do centro era morno e cheirava a café velho. A sala era simples, com cadeiras de plástico dispostas em um círculo. Havia cerca de dez pessoas. Algumas com aparência andrógina, outras ainda claramente presas em um gênero que não pertencem. Todas compartilharam um mesmo olhar – uma mistura de medo, esperança e uma resiliência silenciosa.

Uma pessoa chamada Alex, que foi apresentada com um nome masculino, mas cuja voz ainda era suave, liderou o grupo. "Esta é uma sala segura. Vocês podem compartilhar o quanto quiserem, ou apenas ouvir."

Quando chegou a vez de Izzy, sua garganta ficou seca. "Eu... eu sou o IZ", ela mencionou, usando suas iniciais. "E eu... acho que sou um homem."

As palavras, ditas em voz alta para outras pessoas pela primeira vez, foram ao mesmo tempo aterrorizantes e libertadoras. Ninguém riu. Ninguém olhou com nojo. Alex apenas concordou. "Bem-vindo, IZ Conte-nos sobre isso."

Ela falou. Hesitante no início, depois com um fluxo constante. Ela falou sobre a infância, sobre a repulsa pela menstruação, sobre a inveja dos homens da banda, sobre a agonia de ser tratada como "a garota", sobre a mão de Axl em seu quadril como uma marca de propriedade sobre um corpo que não era seu. Ela não publicou nomes, mas a dor era universal.

Quando terminou, foi tremendo. Uma mulher mais velha, de cabelos grisalhos e olhos cansados, enviada para ela. "Eu me lembro da primeira vez que disse essas palavras em voz alta. É assustador, não é? Mas você está no caminho certo, filho."

Filho. A palavra ecológica ou dentro de Izzy, quente e certa, como um raio de sol em uma caverna escura.

Ela não falou muito durante o resto do encontro. Apenas ouvi. Ouviu sobre hormônios, sobre cirurgias, sobre a luta para conseguir documentos, sobre a retirada da família, sobre a alegria indescritível de ser chamado pelo nome correto pela primeira vez.

Ao sair, na calçada escura, Alex se moveu dela. "A primeira vez é a mais difícil. Volte na próxima semana. Você não está sozinho."

Dirigindo de volta para o apartamento que dividia com Axl, Izzy sentiu uma paz estranha. O mundo lá fora ainda era o mesmo. Ainda era Izzy Stradlin, uma estrela do rock. Mas dentro dela, algo fundamental havia mudado. Ela não era mais uma ilha de angústia isolada. Ela fazia parte de um arquipélago secreto de pessoas que, como ela, estavam se reinventando contra todas as probabilidades.

Ela olhou para o prédio onde Axl provavelmente estava esperando, impaciente e irritado. A batalha seria longa e feia. Mas pela primeira vez, ela tinha um vislumbre do que estava lutando. E, mais importante, ela sabia que não estava lutando sozinha. Havia um mundo inteiro de pessoas lá fora, na sombra, lutando a mesma guerra silenciosa. E ela era uma delas.

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A chave girou na fechadura com um clique que soou como um trovão no silêncio do corredor. Izzy empurrou a porta do apartamento, seu corpo ainda carregado da paz frágil que encontrou no centro comunitário. O ar dentro era pesado com cheiro de cigarro e barato.

Axl estava sentado no sofá, envolto na penumbra, uma garrafa meio vazia na mesa baixa à sua frente. Ele não se moveu quando ela entrou, mas ela podia sentir o peso do seu olhar mesmo no escuro.

"Onde você esteve?" Sua voz saiu áspera, um fio de controle prestes a se romper.

Ela deixou as chaves no pires da entrada, o som metálico anormalmente alto. "Sai para dirigir. Preciso pensar."

"Pensar." Ele repetiu a palavra como se fosse um insulto. Ele se clamou, sua silhueta alta e tensa se erguendo contra a luz fraca da janela. "Você some no meio de uma sessão de fotos, some por horas, e volta com um ar de... de paz? Que porra é essa, Izzy?"

Ele atravessou a sala até ela, parando tão perto que ela pudesse sentir o calor do seu corpo e o cheiro do álcool no seu hálito. Seus olhos, adaptados à escuridão, percorreram seu rosto, procurando por respostas que ela não podia dar.

"Eu só preciso de espaço, Axl", ela disse, sua voz mais calma do que ela se sentia. A serenidade do encontro ainda a envolvia como um escudo tênue.

"Espaço?" Ele deu uma risada amarga. "Espaço para quê? Para ficar remoendo qualquer merda que esteja na sua cabeça? Para encontrar alguém?" A insinuação era clara, venenosa.

Ela sentiu uma pontada de confiança, mas a sufocou. Brigar não levaria a lugar nenhum. Ela não tinha energia para a tempestade dele, não esta noite.

"Não é sobre você, Axl. É sobre mim."

"Isso sempre é sobre você ultimamente, não é?" Ele cuspiu as palavras. "Você tem a banda toda andando em cascatas de ovo. Eu não posso mais te tocar, não posso te elogiar, não posso nem tirar uma porra de foto de merda com você! O que eu fiz de errado?"

Nada , ela pensou, o coração pesado. Você apenas ama uma pessoa que não existe.

"Você não fez nada", ela disse em voz baixa, desviando para passar por ele em direção ao corredor que levava aos quartos.

Ele agarrou seu braço, não com violência, mas com uma força desesperada. "Então fala comigo, Iz! Porra, me fala o que tá acontecendo! Eu sou seu namorado, não há nada estranho que você possa ignorar!"

Seus olhos estavam implorando, cheios de uma confusão e uma dor sincera que fez o peito de Izzy apertar. Era a mesma dor que ela sentia toda vez que ele chamava de "linda" ou "minha garota". Dois navios perdidos na mesma tempestade, batendo um contra o outro porque não conseguiram ver que estavam tentando chegar a portos diferentes.

Ela olhou para a mão dele em seu braço, para os dedos que conheciam cada curva de um corpo que ela rejeitava. A verdade queimou sua língua. Eu não sou sua namorada. Sou um homem. E cada vez que você me toca, é como se estivesse tocando um cadáver.

Mas as palavras não saíram. O medo era uma gaiola de aço. O custo era alto demais.

"É a turnê, Axl", ela mentiu, a velha desculpa saindo de seus lábios como um reflexo condicionado. "A pressão. Só preciso de um tempo."

A expressão dele se fechou. A esperança se apagou, resgata por uma raiva resignada. Ele soltou o braço porque teria sido queimado.

"Vá então", ele disse, sua voz plana e vazia. "Vá para o seu 'tempo'. Mas não espere que eu fique aqui esperando para sempre, Izzy. Até minha paciência tem um limite."

Ele se virou e voltou para o sofá, pegando uma garrafa de uísque e tomando um gole longo, suas costas externas para ela, um lama e eloquente ponto final.

Izzy ficou parada por um momento, o braço onde ele a tocou ainda formigando. Ela havia acompanhada para a realidade – a realidade de Axl Rose, dos Guns N' Roses, da vida que havia construída sobre uma fundação de areia. A paz do centro comunitário já parecia um sonho distante.

Ela entrou em seu quarto e fechou a porta, encostando-se nela. Do lado de fora, ela podia ouvir o tilintar da garrafa contra o copo. Do lado de dentro, o silêncio era necessário pelo som de sua própria respiração trêmula.

Ela havia encontrado um porto seguro, mas ainda estava presa no mar aberto. E uma tempestade, ela sabia, estava apenas começando.

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A porta fechada não era suficiente para bloquear o silêncio carregado que vinha da sala. Izzy deslizou pelo chão até sentar, as costas contra a madeira, e enterrou o rosto nos joelhos. O cheiro do centro comunitário – café velho e esperança – ainda estava em suas roupas, um fantasma de um mundo possível.

Ela amava Axl Rose.

A verdade era simples e devastadora. Ela amava a tempestade que ele era, a intensidade crua, a lealdade feroz que ele reservava para poucos. Amava a maneira como ele a fitava no palco, como se ela fosse a única pessoa no mundo. Amava os momentos raros de vulnerabilidade, quando o deus do rock dava lugar a um homem assustado e frágil.

Mas esse amor era um quebra-cabeça com peças de dois conjuntos diferentes. Ele amava Izzy Stradlin, uma mulher. Um guitarrista de cabelos negros e curvas perigosas. Uma garota que completava sua imagem de rebelde.

E ela dissesse a verdade? Se ela se sentasse com ele e dissesse: "A pessoa que você ama não existe. Por dentro, eu sou um homem."

O que restaria desse amor?

Ela imaginou o rosto dele. A princípio, confusão. Depois, talvez agora. Axl Rose, o símbolo sexual heterossexual, o ídolo de milhões de garotas... namorando um homem? A imprensa o destruiria. Os fãs o abandonariam. Uma imagem cuidadosamente construída desmoronada como um castelo de cartas.

E ela seria culpada.

Além do preconceito público, havia a questão mais íntima, mais dolorosa: a atração. Axl era heterossexual. Ela sabia disso em seu âmago. Ele era atraído por mulheres, por corpos femininos, pela dinâmica que tinham. Se ela fez uma transição, se seu corpo se torna masculino, com barba, voz grossa, torso plano... o que sobraria para ele amar? Uma alma? Em um relacionamento tão visceralmente físico como o deles, isso seria o suficiente?

Ele havia dito uma vez, bêbado e sentimental: "Eu amo o cheiro de você, a atenção da sua pele, o jeito que seu corpo se encaixa no meu." Tudo coisas que ela odiava em si mesma. Tudo que ela queria erradicar.

Um soluço escapou de sua garganta, abafado pelos jeans. Ela estava presa em um paradoxo impossível. Para ser amada por Axl, ela tinha que continuar sendo uma mulher. Mas para ser fiel a si mesma, ela tinha que deixar de sê-lo. E nesse processo, você arriscaria perder tudo.

A década de 80 não era gentil com pessoas como ela. A AIDS alimentava um preconceito virulento contra qualquer coisa que desviasse da “norma”. Um relacionamento homossexual aberto seria um suicídio de carreira. E Axl... Axl valorizava sua imagem, seu poder, seu status de deus do rock acima de quase tudo.

Quase tudo.

Havia uma pequena, tênue esperança. Uma lembrança dele no banheiro, segurando uma compressa quente. A maneira como ele havia ficado, sentado na cama, vigiando seu sono. Havia um amor ali, real e profundo. Mas seria profundo o suficiente para atravessar o abismo que ela precisava cruzar?

Ela se declarou e foi até a janela, olhando para a cidade adorável. Los Angeles era um tapete de luzes, cada uma representando uma vida, uma história. Em algum lugar lá fora, no centro comunitário de Silver Lake, havia pessoas que entendiam sua dor. Pessoas que perderam tudo – família, empregos, amigos – pela chance de viver em sua verdade.

Ela amava Axl. Mas ela não podia mais viver essa mentira. A pessoa no espelho estava sufocando, e cada dia que passava, o abertura ficava mais forte.

Talvez o amor deles não fosse forte o suficiente para sobreviver à verdade. Talvez ela perca tudo. Mas se ela não tentasse, se ela continuasse fingindo, a pessoa que Axl amava desapareceria mesmo, consumida pela amargura e pelo desespero.

Ela olhou para a porta, imaginando-o do outro lado. O homem que ela amava. O obstáculo para sua própria existência.

A escolha era impossível. Mas não fazer uma escolha também era uma escolha. E ela estava ficando sem tempo.

A exaustão, mais mental do que física, finalmente venceu a vencedora. Izzy trocou de roupa mecanicamente e se enfiou debaixo dos cobertores, das costas para o lado vazio da cama. Ela fechou os olhos, fingindo um sono que sabia que não viria. A paz do encontro havia se dissipado, principalmente pela realidade esmagadora de sua vida.

Cerca de uma hora depois, a porta do quarto rangeu suavemente. Ela ficou imóvel, controlando a respiração, fingindo estar profundamente adormecida. Os passos de Axl eram pesados, mas contidos, como se ele estivesse querendo não acordá-la. Ela ouviu o som de ele se despir, a respiração um pouco ofegante – raiva ou uísque, provavelmente ambos.

O colchão afundou quando ele se deitou, mantendo uma distância respeitosa do seu lado da cama. O silêncio entre eles foi um terceiro ocupante no quarto, pesado e desconfortável. Ele não tentou tocá-la. Não disse uma palavra. Apenas deitou lá, e ela podia sentir a energia dele emanando através do espaço que os separava – uma mistura de mágoa, frustração e uma pergunta sem resposta.

Ela amava aquele homem. Aquele homem heterossexual, complicado e intenso, que amava uma mulher que não existia.

Sua mente voltou para o encontro. Para o rosto de Alex, para a mulher mais velha que a chamou de "filho". Aquelas pessoas entenderam. Elas eram um porto seguro. Um lugar onde ela poderia ser IZ, apenas IZ, sem expectativas, sem performances.

É só uma fuga, ela pensou, agarrando-se à ideia como um náufrago a uma tábua. Eu vou nesses encontros, tiro isso do meu sistema, e consigo aguentar.

A lógica era frágil, desesperada, mas era a única que impedia de entrar em pânico. Ela era o guitarrista de uma das maiores bandas de rock do mundo. Em 1988. A imprensa era voraz, os fãs, devotos e cruzeiros. A imagem deles foi construída sobre excesso, rebeldia, mas uma rebeldia aceitável. Um guitarrista transgênero? Isso iria além de qualquer rebeldia que o mundo estivesse preparado para aceitar. Seria um escândalo que pudesse destruir tudo – a banda, a carreira de Axl, a dela.

Não. Ela não podia. Era simples assim.

Os encontros seriam seu segredo. Sua válvula de escape. Lá, ela poderia falar, poderia ser a mesma, poderia se fortalecer com as histórias dos outros. E então, fortalecida, voltaria para sua vida e continuaria sendo Izzy Stradlin, a mulher. Continuaria amando Axl da única maneira que ele poderia aceitar. Talvez, com o tempo, a necessidade de transição se dissipe. Talvez ela aprenda a viver com a disforia.

Era uma mentira que ela contava a si mesma, e ela sabia. A disforia não era algo que se dissipava. Era como uma fome, só piorava com o tempo. Mas naquele momento, na cama escura, sentindo a presença do homem que amava a apenas alguns centímetros de distância, era a única mentira que o impedia de se despedaçar completamente.

Axl se virou de lado, de frente para suas costas. Ela sentiu o calor dele, um convite silencioso. Por um instante, uma parte dela desejou se virar, se encaixar contra ele, beijá-lo, perder-se na familiaridade daquele corpo, aquela dinâmica. Talvez, se ela tentasse com força suficiente, conseguisse afogar a voz que sussurrava o homem dentro dela .

Mas seu corpo não se moveu. Permaneceu rígido, fingindo um sono que estava a léguas de distância.

Ela ouviu um suspiro profundo e resignado atrás dela. Então, o colchão se moveu novamente quando ele se virou de costas.

Dois fantasmas numa cama, separados por um abismo de segredos não ditos.

Izzy abriu os olhos e encarou a escuridão. Os encontros seriam seu refúgio. Sua pequena resistência silenciosa. E por enquanto, isso teria que ser o suficiente. Ela continuaria a performance. Continuaria a ser a mulher que Axl amava. Porque a alternativa – a verdade nua e crua – parecia um preço alto demais a pagar, não apenas por sua carreira, mas por seu coração.

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A madrugada havia engolido a noite, pintando o quarto com tons de azul profundo. Izzy não havia dormido. A paz era um conceito distante. A necessidade de reconectar, de tocar algo real e verdadeiro entre eles, era um peso no peito. Ela não queria performance. Queria lembrar por que valeria a pena lutar.

Ela se virou silenciosamente. Axl dorme de costas, a respiração profunda. Com um cuidado infinito, ela se mudou, seu corpo se moldando contra as costas dele. Não como um prelúdio sexual, mas como uma busca por abrigo. Ela enterrou o rosto na nuca dele, cheirando seu aroma familiar. Meu, pensei, e a palavra doía.

Sua mão deslizou por seu braço, não em um gesto lascivo, mas de reconhecimento. Seus dedos encontraram os dele, entrelaçando-se. Um toque que costumava ser tão natural, mas que agora parecia carregado.

Ele mexeu-se, um murmúrio escapando. "Is?"

Ela não respondeu. Em vez disso, ela se moveu para enfrentá-lo. No escuro, seus olhos se encontraram. Havia uma ferida aberta no olhar dele, uma pergunta silenciosa.

Izzy estendeu a mão e tocou seu rosto. Seus dedos traçaram a linha de sua sobrancelha, o arco de sua maçã, a curva de seus lábios. Era um toque lento, exploratório, como se estivesse redesenhando sua memória dele.

Axl a inspira, respiração sua mais contida agora. Ele não a deixou para um beijo. Ele apenas permitiu.

Ela então guiou a mão dele, lentamente, até seu próprio rosto. Ela pressionou a palma dele contra sua bochecha, fechando os olhos. Era um gesto de rendição, de permissão. Estou aqui. Ainda estou aqui.

Sua mão, grande e quente, acariciou seu rosto antes de descer, com uma hesitação que partiu o coração de Izzy, até seu pescoço, seu ombro. Ele parou na alça da sua camisola.

"Posso?" ele sussurrou, a voz relatou uma vulnerabilidade que ela relatou ouvia.

Ela concordou, um movimento quase imperceptível.

Ele deixou a alça suavemente, deixando seu ombro exposto. Seus lábios encontraram a pele ali, não com a fome de antes, mas com uma ternura que fez os olhos de Izzy marejarem. Era um beijo de desculpas, de saudade.

Sua mão desceu mais, contornando a curva de seu seio por cima do tecido. Ele parou, seus olhos encontrando os dela no escuro, buscando permissão novamente. Ela pegou a mão dele e a colocou sobre o seio, sua própria mão cobrindo a dele. Era grande, macia, uma parte de seu corpo que sempre transmitia sentimentos conflitantes. Mas agora, sob o toque dele que era apenas carinho, sem a pressão performática do sexo, a sensação era apenas... carinho.

Axl se moveu, baixando a cabeça. Ele beijou a curva do seio através do tecido, depois deixou a camisola para baixo com uma reverência que faltava antes. Quando seus lábios fechavam suavemente em torno do mamilo, não era um ato de posse, mas de estímulo. Um gemido trêmulo escapou de Izzy, não de prazer performático, mas de um rompimento profundo. Era um toque que dizia eu te conheço, não eu te possuo.

Sua mão, enquanto isso, desceu por seu torso, lenta, dando a ela todo o tempo do mundo para recuar. Quando seus dedos encontraram a umidade entre suas pernas, ele não invadiu. Ele acariciou, um movimento circular e suave sobre a cueca de algodão que ela usava. Era uma masturbação, sim, mas não era sobre chegar a algum lugar. Era sobre reconexão. Sobre lembrar os caminhos um do outro.

Izzy deixou-se ir. Deixou as lágrimas escorrerem silenciosamente enquanto o corpo respondia ao toque familiar, gentil. O prazer veio, não como uma onda avassaladora, mas como um calor que se forneceu de dentro para fora, dissolvendo um pouco da fria distância que havia se instalado entre eles. Quando o clímax abatido, foi silencioso, profundo, um suspiro de entrega que era mais emocional do que físico.

Ele a segurou enquanto ela tremia, seus próprios suspiros quentes contra seu pescoço. Não houve penetração. Não houve o ritual performático do sexo. Apenas toque. Apenas cuidado.

Quando sua respiração se acalma, ele não diminui. Ele foi retirado para mais perto, seu rosto enterrado em seus cabelos.

"Eu sinto muita falta de você", ele confessou, com sua voz abafada.

Ela envolveu os braços ao redor dele, segurando-o firme. "Eu também sinto falta de mim", ela sussurrou, e pela primeira vez, a verdade daquela frase era sobre mais do que apenas a distância emocional.

Naquele momento, deitados entrelaçados no escuro, a ponte entre eles parecia um pouco mais sólida. Ela não havia nada consertado. A verdade ainda estava lá, um elefante na sala. Mas por algumas horas, eles se lembraram de como era simplesmente estarmos juntos. E para Izzy, que se sentia tão perdida, aquele porto seguro, por mais temporário que fosse, era tudo.

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O quarto estava em silêncio novamente, mas desta vez o silêncio era diferente. Menos pesado, mais contemplativo. O calor dos corpos deles ainda se misturava sob os lençóis, uma umidade reconfortante após uma intimidação. Axl a segurava de lado, seu braço envolvido em sua cintura, seu queixo relacionado em seus cabelos.

Izzy sentiu o coração dele batendo forte e constante contra suas costas. A vulnerabilidade do momento, a ternura que ele havia mostrado, abriu uma fenda em suas próprias defesas. Ela não podia contar a ele a verdade maior, a mais assustadora. Mas talvez você possa compartilhar um pedaço da dor.

"Axl?", sua voz saiu um sussurro rouco no escuro.

"Hum?"

Ela engoliu seco, seus dedos brincando com os dele em sua cintura. "Às vezes... eu me olho no espelho e não consigo ver o que você vê."

Ele ficou quieto por um momento. "O que você quer dizer?"

"Essas curvas", ela contínua, sua voz trêmula. "Esses... seios. Essa figura toda de 'rockstar sexy'. Às vezes parece... um disfarce. Algo que eu vi, não quem eu sou.E eu olho e não me sinto bonita. Me sinto... errado."

Era uma verdade, mas não toda a verdade. Era a ponta do iceberg, a parte mais segura de sua disforia para compartilhar.

Axl girou suavemente para enfrentá-lo. No escuro, ela podia ver a sombra do seu rosto, seus olhos sérios.

"Izzy", ele disse, sua voz grave e compartilhada. "Você é a pessoa mais linda que eu já vi. Dentro e fora."

"Você diz isso porque eu amo."

"Eu te amo porque é a verdade", ele insistiu, sua mão encontrando seu rosto. "Quando eu te vi naquele palco pela primeira vez, não foi só seu corpo, foi... sua energia. Sua ferocidade. A maneira como você segurava aquela guitarra como se fosse uma extensão de você. Foi a coisa mais sexy que eu já vi."

Ele fez uma pausa, seus dedos acariciando sua bochecha. "Essas curvas... elas são parte de você, sim. Mas elas não são você. Você é a mulher que enfrenta uma sala cheia de homens e toca melhor que todos eles. Você é uma pessoa que ri da minha própria merda. Que me entende nos meus piores dias." Sua voz cortesmente ligeiramente. "É isso que eu acho bonito, Iz. É isso que eu amo."

Izzy ficou sem palavras. As lágrimas voltaram, mas desta vez eram diferentes. Era uma tristeza profunda e complexa. Ele a amava por todas as razões certas – por sua força, seu talento, sua alma – mas ele atribuía essas coisas a uma identidade que não era dela. Ele amava uma “mulher” forte, uma “mulher” talentosa. Ele não sabia que estava amando um homem.

Ela se enterrou contra seu peito, escondendo o rosto, incapaz de enfrentá-lo.

"Eu só... quero me sentir confortável na minha própria pele", ela confessou, a voz abafada contra seu peito. "Hum dia."

Axl abriu com mais força. "Eu vou te ajudar a chegar lá, seja lá o que for. Você me ouviu? Nós vamos recuperar isso. Juntos."

Ela fechou os olhos, as palavras dele sendo ao mesmo tempo um bálsamo e uma tortura. Ele queria consertá-la. Mas ela não estava quebrada. Ela apenas... estava no corpo errado. E como você reconhece algo que não está quebrado, apenas errado?

"Obrigada", ela sussurrou, porque era a única coisa que podia dizer.

Ele a beijou no topo da cabeça. "Durma, Iz. Eu te guardo."

E ela o fez. Envolta em seus braços, com o som de seu coração como uma canção de ninar, Izzy adormeceu. A verdade ainda estava lá, um peso em seu peito, mas naquela noite, o amor dele foi suficiente para torná-lo um pouco mais leve. Ela sabia que não poderia carregar esse segredo para sempre, mas naquele momento, era o suficiente saber que, pelo menos por agora, ela não estava sozinha no escuro.

O sol da manhã entrou filtrado pelas persianas, pintando listras douradas no corpo entrelaçado delas. Izzy acordou primeiro, como sempre. A cabeça ainda relacionadava no peito de Axl, seu braço ainda envolvia sua cintura.A paz da noite ainda pairva sobre eles, frágil como orvalho.

Ela se moveu com cuidado, tentando não acordá-lo, mas seus desejos longos se abriram de qualquer maneira. Seus olhos azuis, ainda turvos de sono, encontraram os dela.

"Bom dia", ele murmurou, sua voz áspera, mas suave. Um pequeno sorriso para tocar seus lábios – um daqueles raros, genuínos, que não eram para as câmeras.

"Bom dia", ela respondeu, seu próprio sorriso surgindo com uma facilidade que surpreendeu.

Ele esticou os braços, os ossos estalando, e então deixou-a para um abraço rápido e apertado. "Vamos tomar um banho. A água quente do inferno."

O banheiro estava cheio de vapor, escondendo os contornos mais ásperos da realidade. Eles não falaram muito. Axl lavou o cabelo dela com um cuidado desajeitado, seus dedos massageando sua couro cabeludo de uma forma que a fez gemer de prazer. Ela, por sua vez, ensaboou as costas dele, dores musculares tensos sob sua palma. Era um ritual doméstico, íntimo de uma maneira que o sexo nunca conseguiu ser.

Eles estavam se vestindo – Izzy em seu jeans e camiseta larga de sempre, Axl reclamando da única camisa limpa que tinha – quando a porta do apartamento se abriu com estrondo.

"Ó, os noivos já estão de pé!" a voz de Slash ecoou pelo corredor, seguida por seu riso característico. Ele apareceu na porta do quarto, seu chapéu já no lugar, segurando duas sacolas de café e donuts. Duff estava atrás dele, parecendo mais humano do que deveria ser permitido a essa hora.

“Parece que alguém fez as pazes”, Duff comentou, um sorriso sardônico em seu rosto enquanto entregava um café para Axl.

Axl pegou o café e deu de ombros, mas não conseguiu disfarçar um certo orgulho no olhar. "Nada que um pouco de conversa não resolva."

Slash jogou um donut para Izzy, que o pegou no ar com um reflexo aprimorado por anos de turnê. "Conversa, hein? É isso que está tão chamando agora?" ele zumbiu, suas sobrancelhas subindo e descendo sob a aba do chapéu.

“Ah, cala a boca, Slash”, Axl resmungou, mas sem verdadeira raiva. Ele deu uma tapinha nas costas de Izzy. "A Izzy tá bem. É o que importa."

Izzy sentiu um calor que não tinha nada a ver com o café ou o vapor do banheiro. Era a acessível deles, despretensiosa e completa. Eles a zoavam, sim, mas era a zoeira da irmandade. Eles a tratavam como um deles. Um deles. A frase tinha um gosto agridoce.

"Claro que estou bem", ela disse, mordendo o donut. "Só tava com uma ressaca emocional de cuidar do drama queen aqui." Ela apontou o donut para Axl.

Duff riu, um som profundo e genuíno. "Bem-vinda de volta ao clube, Iz. É um trabalho em tempo integral."

Axl fez beicinho, mas seus olhos sorriram. Ele jogou um braço sobre os ombros de Izzy, puxando-a para perto. "Ela é paga em beijos e fama, McKagan. Não reclame."

A leveza do momento era um presente. Por alguns minutos, enquanto dividiam café e donuts no apartamento bagunçado, rindo das piadas uns dos outros, Izzy conseguiu esquecer o turbilhão interno. Ela era apenas Izzy, o guitarrista. Parte da banda. Parte daquela família disfuncional.

Mas quando seus olhos encontraram os de Axl sobre a borda de seu copo de café, e ela viu o amor e a satisfação lá, a verdade deu um nó em seu estômago. A leveza era uma trégua, não um tratado de paz. A guerra ainda estava sendo travada dentro dela, e mais cedo ou mais tarde, ela teria que escolher um lado. Mas por essa manhã, sob o sol de Los Angeles e o som das risadas de seus irmãos de banda, ela se permitiu acreditar, mesmo que por um instante, que talvez houvesse uma maneira de ter os dois.

A leveza do apartamento era contagiante. Slash, animado com a aparente trégua, pegou uma guitarra acústica encostada no sofá e começou a dedilhar um riff bluesy e descontraído. Duff, mastigando seu segundo donut, acompanhava com um grave suave, batendo na mesa de centro com os dedos.

"Lembra aquela vez em Indianápolis?", Slash disse entre um acorde e outro, um sorriso malandro sob o chapéu. "Quando o Axl decidiu que eu pularia a janela do hotel pra cair na piscina? Só que era o terceiro andar."

"E a piscina estava vazia!", Duff completou, rindo. "A segurança nos achou tentando puxar aquela idiota de volta pela cortina."

Axl revirou os olhos, mas um sorriso torto escapou. "Eu teria conseguido se vocês não tivessem estragado tudo."

"Conseguido o quê? Um pescoço quebrado?", Izzy soltou, encostando-se na moldura da porta da cozinha com seu café. A piada saiu fácil, natural. Era o seu papel no grupo: a voz seca e cínica que equilibrava a loucura deles.

Axl olhou, e o orgulho em seus olhos era tão claro quanto o sol da manhã. "Pelo menos eu teria ido em estilo", ele retruou, caminhando até ela. Ele pegou seu copo de café e tomou um gole, fazendo careta. "Doce demais. Como você consegue beber isso?"

"Com prática, Rose. Muita prática em te aguentar", ela respondeu, pegando o copo de volta, seus dedos se encontrando brevemente com os dele.

O toque foi rápido, mas elétrico. Um fio de entendimento passado entre eles, carregado da noite anterior e da manhã tranquila.

Slash, observando a cena, mudou o riff para o início de "Patience". Ele não cantou, apenas tocou a melodia suave, um comentário musical sobre o momento.

Axl rolou os olhos, mas não parou Slash. Em vez disso, ele se virou para Izzy, sua expressão mais séria. "Hoje a gente ensaia aquele último novo de 'Rocket Queen'. Acho que você vai gostar, tem um solo seu que vai arrancar a alma deles."

Era um convite. Um retorno à normalidade. À música.À única linguagem em que todos eles eram realmente fluentes.

Izzy sentiu um peso levantado de seus ombros. A música era seu porto seguro, o lugar onde ela não precisava tocar nada além de seus dedos nas cordas. Onde ela era apenas um músico, não um gênero.

"Tá bom", ela especial, um verdadeiro sorriso finalmente alcançando seus olhos. "Mas se você mudar uma letra de novo no meio do show, eu juro que vou enfiar a palheta na sua..."

Duff interrompeu com uma risada. "É, melhor ele não, Iz. A última vez que ele fez isso, você quase cortou o baixo na cabeça dele."

"Ele mereceu", Izzy e Axl disseram em uníssono, e então se olharam, surpresos, antes de rirem juntos.

O som das risadas deles se misturou com a guitarra de Slash, enchendo o apartamento bagunçado de uma sensação de lar. Por um momento, tudo estava perfeito. Eles eram apenas quatro desajustados e uma garota – uma garota, o pensamento passou pela mente de Izzy como um arrepio, mas ela o abafou – que faziam música juntos. O resto do mundo, com suas expectativas e segredos complicados, poderia esperar.

Enquanto se preparava para sair, pegando jaquetas e chaves, Axl segurou a porta para ela. Seus olhos a fitaram, e ele sussurrou, baixo o suficiente para que só ela ouvisse: "Você está bem mesmo, né?"

Ela olhou para ele, para os caras à sua frente, para a guitarra que esperava por ela no estúdio. E pela primeira vez em semanas, ela poderia responder com uma verdade que não fazia completamente.

"Estou sim, Axl. Estou bem."

E por enquanto, com o sol aquecendo seu rosto e o som da banda ao seu redor, era a verdade.

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Anos Depois -1992

O apartamento em Los Angeles cheirava a tinta fresca e velas caras. Quatro anos se passaram desde uma noite no mirante, e cada um deles deixou uma camada de poeira rosa sobre a relação deles. O sucesso do Guns N' Roses era agora um império, e Izzy Stradlin sua imperatriz mais relutante.

Seu cabelo, outrora totalmente negro, agora tinha uma metade inferior pintada de um rosa que ia desbotando para um coral pálido perto das pontas. Era a única parte dela que ela sentia que controlava de verdade. Axl Odiava. "Parece que você pegou fogo e apagou com leite", ele resmungara uma vez, vendo ela passar os dedos pelas mechas coloridas diante do espelho.

A rotina deles era um casamento de conveniência disfarçado de paixão rock and roll. Acordavam tarde, Axl já com o telefone colado no ouvido, gritando com gerentes e produtores. Izzy fingiu dormir até sair do quarto. Ela passava as manhãs no estúdio caseiro, trabalhando em riffs que nunca mostraria para a banda. Eram músicas diferentes, mais introspectivas, que não combinavam com o som épico que Axl perseguia obsessivamente para o Use Your Illusion.

"Onde você estava ontem à noite?" Axl disse na manhã de terça-feira,entrando no estúdio sem fazer barulho. Ela pulou, tirando os fones de ouvido.

"Saí para caminhar. Precisava de ar."

Ele acompanhou seus olhos azuis estreitando-se. Ele usava um roupão de seda vermelha que ela lhe dera no aniversário dois anos antes. "Você tem saído muito para 'caminhar' ultimamente."

"É Los Angeles, Axl. A cidade é feita para ser caminhada."

Ele se mudou, seu cheiro familiar de cigarro e um perfume amadeirado caro enchendo o espaço entre eles. Sua mão tocou o cabelo rosa dela, não com carinho, mas com uma curiosidade clínica. "Você é diferente."

"Pessoas mudam."

"Algumas mudam demais." Sua mão desceu para seu ombro, depois para o braço, onde ele abriu suavemente. "Às vezes sinto que estou vivendo com um estranho."

Ela não respondeu. Como poderia? Ele estava certo.

As noites eram piores. Quando fez sexo, foi rápido e funcional, como se ambos cumprissem cumprindo uma obrigação. Axl tentou às vezes recuperar a antiga paixão, mas suas mãos perdidas no corpo dela, como se estivessem procurando por algo que não encontravam mais. Izzy se deixou tocar, desaparecendo dentro de si mesma até tudo acabar.

Naquelas noites, depois de ele adormecer, ela saiu da cama e foi até a varanda. Los Angeles estendia-se diante dela, um tapete infinito de luzes. Ela tirou um pequeno pedaço de papel do bolso do roupão - o número do médico em West Hollywood. Já estava amassado e desbotado de tanto ser manuseado. Ela sabia o que eu precisava fazer. Mas o medo era um peso morto em seu peito.

A Ideia do Clipe

Foi durante uma reunião com a gravadora que a ideia surgiu. O diretor, um homem chamado Andy Morahan, falou animado sobre sua visão para "November Rain".

"Precisamos de algo épico! Um casamento! Uma igreja no meio do deserto! Tragédia! Paixão!" Ele gesticulava intensamente. "E Axl, você precisa de uma musa. Alguém para representar esse amor transcendental."

Todos os olhos na sala se voltaram para Izzy. Ela estava vestindo uma camiseta larga do The Stooges e jeans, seu uniforme padrão agora. Sentiu todas as pupilas percorrendo seu corpo, seu cabelo rosa.

"Tem que ser você, Iz", disse Axl, não como um pedido, mas como uma declaração. Sua mão encontrou a dela sob a mesa, num gesto que deveria ser íntimo, mas que a fez sentir-se como uma propriedade. "Quem mais poderia ser?"

A ironia era tão densa que ela quase se engasgou com o café. Eu , ela pensou. A pessoa que você mal registrou mais.

Nos dias que antecederam as filmagens, Axl tornou-se obsessivo. Ele a levou para provas de vestido, escolhendo pessoalmente o vestido de noiva - um Valentino branco e imaculado que custava mais que a primeira guitarra dela.

"Você vai estar linda", ele disse,observar-a no espelho do provador. Suas mãos bateram em seus ombros nus, e ela sentiu um calafrio. "Como costumava ser."

Ela olhou para seu próprio reflexo - o vestido branco, o cabelo rosa e negro, o rosto pálido sob as luzes do provador. Parecia uma performance de mau gosto. Uma paródia de tudo o que ela era e não era.

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O conjunto no Novo México era um forno. A igreja falsa no meio do deserto parecia um milagre absurdo. Izzy passou três horas na cadeira de maquiagem, enquanto transformava seu rosto andrógino em imagem suave e feminina que a música personalizada. O cabelo rosa foi cuidadosamente preso e escondido.

Quando ela saiu do trailer, vestida no Valentino branco, a equipe inteira parou para olhar. Axl a fitou, e por um segundo, ela viu o velho brilho nos olhos dele - a admiração, o desejo, o amor pela imagem que ela projetava.

"Meu Deus, Iz", ele sussurrou, se aproximando. "Você está... perfeito."

Ela forçou um sorriso. Perfeita como uma boneca de porcelana. Frágil. Falsa.

A cena do casamento foi a mais difícil. Sob o calor de 40 graus, com o vestido pesado colado em seu corpo, ela teve que encarar Axl - de fraque impecável - e fingir que estava se casando com o amor de sua vida. Cada "eu aceito" que ela sussurrou soou como uma traição a si mesma.

Quando chegou na cena em que seu personagem "morria", algo dentro dela se acalmou. Deitar no caixão de madeira, fechar os olhos, fingir não existir... foi a coisa mais honesta que ela fez em semanas. Por alguns minutos, no escuro úmido da madeira, ela não precisa ser ninguém. Podia simplesmente ser.

"Foi lindo", Andy disse quando a cena terminou. "Tão... trágico."

Axl ajudou a sair do caixão, sua mão firme na dela. "Você estava incrível", ele disse, e parecia significar.

Ela não respondeu. Como poderia explicar que aquela era a única cena em que não estava presente?

No vôo de volta para Los Angeles, Axl estava eufórico, revendo as filmagens no laptop. "Vai ser lendário, Iz. Como nosso amor."

Ela olhou pela janela, para as nuvens abaixo. Seu amor era como aquelas nuvens - parecia sólido de longe, mas quando você chegava perto, era apenas vapor, impossível de se agarrar.

Em casa, a rotina retornou. Acordar tarde, evite o estúdio, finja não notar a distância crescente entre eles. Axl tentou se reconectar - roubou-lhe joias caras, marcou jantares românticos - mas cada gesto parecia um remendo em um buraco que só cresceu.

Uma noite, ele se encontrou na varanda, olhando para a cidade novamente, o pedaço de papel do médico em suas mãos.

"O que é isso?" ele disse, tentando pegar o papel.

"Nada", ela disse, guardando-o rapidamente no bolso.

"Izzy..." Sua voz estava cansada. "O que está acontecendo com você? Com ​​a gente?"

Ela virou-se para enfrentá-lo. A luz da cidade iluminava seu rosto, revelando as linhas de preocupação ao redor de seus olhos. Ele estava envelhecendo. Eles estavam envelhecendo juntos, mas em maneiras diferentes.

"Estou cansada, Axl", ela disse, e era a verdade mais pura que ela lhe dera em anos.

"De mim?"

"De tudo." Ela fechou os olhos. "De fingir."

Ele ficou em silêncio por um longo momento. Quando ela abriu os olhos, ele estava olhando para ela com uma expressão que ela nunca vira antes - não raiva, não frustração, mas uma tristeza profunda e resignada.

"Eu também estou cansado, Iz", ele admitiu, sua voz quase uma sugestão. "Cansado de tentar alcançar alguém que parece estar sempre se afastando."

Eles ficaram ali, na varanda, dois fantasmas num casamento que já havia acontecido há muito tempo, observando as luzes de Los Angeles piscarem como vagalumes presos em âmbar. O pior não era a raiva ou o ódio, Izzy ouviu. Era o silêncio. O vasto, infinito silêncio que se instala entre eles, preenche apenas com tudo o que nunca foi aqui.

O silêncio na casa de Malibu tornou-se um terceiro ocupante. Ele se instalou nos sofás brancos, emparelhou sobre a piscina infinita, ecoou nos corredores vazios. Já não era mais o silêncio cômodo de duas pessoas que se entendem sem palavras, mas o silêncio pesado de dois estranhos dividindo o mesmo teto.

Izzy passando a maior parte do tempo em seu estúdio caseiro, um anexo que Axl mandou construir para ela em um de seus gestos mais extravagantes. Lá, longe dos olhos dele, ela não precisa performar. Usava binder – uma faixa compressora que achava seu peito – sob as camisetas largas, e aquela ação simples, tão secreta, lhe dava um rompimento profundo e prejudicado. Era seu pequeno ato de rebelião, seu grito de liberdade abafado pelo algodão.

Axl, por sua vez, mergulhou ainda mais fundo no trabalho. O estúdio de gravação principal da casa estava sempre ocupado, com Slash, Duff e uma rotação interminável de músicos de sessão entrando e saindo. Às vezes, Izzy ouvia os acordes familiares de "Don't Cry" ou "November Rain" vindos de lá, e uma pontada de saudade de algo que nem mesmo existe de verdade a atingia.

Eles ainda jantavam juntos, às vezes. Sentavam-se na mesa de jantar de mármore, tão grande que os colocavam a metros de distância um do outro. A governanta servia pratos elaborados que nenhum dos dois tinha vontade de comer.

"O ensaio foi bem hoje?", ela perguntou, por falta de coisa melhor a dizer.

"Foi uma merda. O Slash chegou atrasado de novo." Ele não olhou para ela, focando no vinho no copo.

Ela concordou, enfiando o garfo em uma salada que não tinha gosto de nada.

A única vez que o silêncio se quebrou a verdade foi durante a discussão sobre sua imagem. A gravadora pressionava por mais aparições públicas, mais fotos do "casal de ouro do rock".

"Eles querem que a gente faça uma sessão de fotos para a Rolling Stone", disse Axl uma noite, jogando uma revista na mesa. "Juntos. Algo íntimo."

Izzy sentiu o estômago embrulhar. "Íntimo" trazia ela vestida de forma feminina, com maquiagem, talvez até um vestido. Significava Axl com o braço em volta dela, possessivo, sorridente para a câmera. Significava fingir, de novo e de novo.

"Eu não quero, Axl."

"Você nunca quer mais nada, Izzy!" A frustração dele estourou, como sempre acontecia. "É sempre não. Não para fotos, não para entrevistas, não para a porra do clipe! O que diabos você quer?"

Eu quero sumir, ela pensou. Quero parar de existir como essa pessoa que você vê.

"Eu só quero um pouco de paz", ela disse em voz baixa.

"Paz?" Ele riu, um som seco e amargo. "Nós somos a banda de rock mais famosa do mundo, Izzy. Paz não faz parte do contrato."

Ele se chamou, derrubando a cadeira para trás com o barulho. "Você vai fazer uma sessão de fotos. Você vai sorrir. Você vai vestir o que um estilista mandar. Porra, Izzy, é só por algumas horas! Consegue fazer isso por mim? Pela banda?"

Ele não estava pedindo. Estava exigido. E nos olhos dele, ela não via mais amor, apenas a fúria de um general vendo seu império desmoronar por causa da insubordinação de um soldado.

A sessão de fotos foi um suplício. Um estilista trouxe vestidos justos, tops de renda, saias de couro que eram um eco fantasmagórico de seu antigo eu. Izzy vestiu um vestido preto simples, o menos pior da pilha, e se decidiu a usar qualquer coisa mais revelada. A maquiagem pesada no seu rosto parecia uma máscara de gesso.

O fotógrafo tentou posicioná-los. "Axl, por trás dela, suas mãos na cintura dela... isso, perfeito."

As mãos de Axl queimavam através do tecido do vestido. Ela conseguia sentir cada dedo, uma marca de propriedade sobre um corpo que não lhe pertencia. Ele sussurrou em seu ouvido, seu hálito quente contra sua pele: "Relaxa, Iz. É só uma foto."

Ela forçou os lábios a se curvarem. O flash da câmera a cegou, e por um segundo, ela se viu no espelho do camarim de 1988, uma eternidade atrás. A mesma mulher bonita e infeliz a olhar. Nada havia mudado. Tudo havia mudado.

Na noite seguinte, ela não conseguiu dormir. O apartamento estava silencioso, Axl finalmente dormiu depois de tomar alguns comprimidos para a insônia. Ela se declarou e foi até o banheiro, trancando a porta. Encostou a testa no espelho frio, suas mãos apertando a pia.

O pedaço de papel com o número do médico estava em sua carteira, dobrado e escondido. Ela o pegou, suas mãos tremiam. Era apenas um número. Sete dígitos que podiam mudar tudo. Ou destruir tudo.

Ela imaginou descartar. Imaginar a voz do outro lado da linha. Marque uma consulta. Começar o processo. Como injeções de testosterona. Uma mudança gradual de seu corpo. Uma voz envolvente. Os pelos aparentemente. O torso está ficando plano.

E então imaginei a expressão de Axl. A confusão se transforma em repulsa. Ó nojo. Uma raiva. A traição que ele sentiria.

Mas também imaginou acordar um dia e, pela primeira vez, olhar no espelho e considerar a pessoa que olhou de volta. Não é uma atriz, não é uma performance, mas ela mesma.

Era um sonho tão distante, tão perigoso, que doía.

Ela deslizou pelo chão do banheiro, o papel apertado no punho. As lágrimas não vieram. Elas já ficaram secas há muito tempo, aumentando por uma dor surda e constante, como uma pedra no fundo de um poço.

Do lado de fora, a cidade de Los Angeles nunca dormia. Lá embaixo, milhões de pessoas vivem suas vidas, algumas verdadeiras, outras não. Izzy Stradlin, um guitarrista famoso, a musa de Axl Rose, uma mulher que todos cobiçavam, se encontravam sentadas no chão frio do banheiro, um fantasma em sua própria casa, atraído pelo próprio reflexo, segurando em sua mão a única coisa real que ele restava: um pequeno pedaço de papel com sete dígitos que era, ao mesmo tempo, sua sentença de morte e sua única chance de vida.

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A festa na mansão de Beverly Hills foi um furacão de ostentação. Luzes de cristal cegantes, champanhe Veuve Clicquot fluindo em cascata em uma fonte improvisada, e uma coleção de corpos esculturais que lembram saídos de uma campanha da Calvin Klein. Izzy, em seu tailleur preto de corte impecavelmente masculino que comprara em segredo, sentiu-se como um corvo entre pavões. Cada risada alta, cada beijo no ar, cada olhar que pousava nela e desviava rapidamente, era uma pequena alfinetada.

Foi então que eu vi. Do outro lado do salão abarrotado, perto de uma escultura de aço que se assemelhava a um raio congelado, Axl estava no centro de um círculo. E no centro do seu universo, naquele momento, estava Elara, a modelo do momento. Uma visão nórdica de cabelos platinados tão lisos que lembra derramar sobre seus ombros nus. Seu vestido era um deslize de seda vermelha que se agarrava a cada curva de um corpo que era a própria definição de "mulher feita em laboratório".

Elara riu de algo que Axl disse, uma gargalhada alta e despreocupada que cortou o burburinho como um vidraço. Sua mão, com unhas vermelhas perfeitas, tocou o antebraço dele, os dedos estendidos ali com uma intimidade que fez a mandíbula de Izzy cerrar. E Axl... Axl não se levou. Inclinou-se mais perto, um sorriso largo e genuíno iluminando seu rosto – um sorriso que Izzy não via direcionado a ela há uma eternidade. Ele parecia... leve. Aliviado da complexidade opressiva que seu relacionamento se tornará.

Uma frieza se mantém pelo estômago de Izzy, sólida e pesada como chumbo. Não era o ciúme quente e irracional dos filmes. Era um reconhecimento gelado e devastador. Elara era a encarnação de uma feminilidade simples, inquestionável, que não precisava ser desenterrada com dor de dentro de uma armadura. Era uma flor rara e exótica, enquanto ela era um músculo teimoso crescendo em uma fenda de rocha. E Axl, o homem que jurou amar a tempestade dentro dela, estava claramente se aquecendo sob aquele sol fácil.

Ela se virou e fugiu do salão, buscando refúgio em uma varanda deserta. A noite de Los Angeles estava pesada e quente, cheirando a jasmim e à fumaça distante da cidade. Ela se agarrou à balaustrada de mármore, os nós dos dedos brancos. O tecido áspero do tailleur, sua armadura, agora parecia uma fantasia de criança, ridícula e ineficaz.

A imagem de Elara, radiante e incontestável em sua própria pele, queimava atrás de suas ocorrências. A imagem de Axl, sorrindo para ela. E então, outra imagem se sobrepôs: a dela mesma, anos atrás, na capa de uma revista, com um olhar de fogo e um corpo que, na época, ela conseguiu, por breves momentos, habitar sem tanto ódio.

Uma ideia começou a se formar, não como um pensamento, mas como um impulso visceral, uma necessidade desesperada de contra-atacar, de provar algo – para Axl, para o mundo, mas principalmente para si mesma. Se aquele era o jogo, ela jogaria. Mas com suas próprias regras distorcidas.

Na manhã seguinte, o sol entrou forte pela janela do quarto, iluminando a poeira que dançava no ar. Axl ainda dormia, um braço jogado sobre o rosto. Izzy falou em silêncio. O desespero da noite anterior havia se solidificado em uma determinação fria e temerária.

Ela não concordou com Axl. Não ligado para a banda. Não chamou uma produtora. Pegou o telefone, discou um número que ela, como ícone do rock, tinha na ponta dos dedos – o editor-chefe da Rolling Stone.

"Preciso de um estúdio. Hoje. Agora. Sozinha." Sua voz era um fio de tensão, mas inquestionável.

Duas horas depois, ela estava em um estúdio branco e impessoal. O fotógrafo, um italiano famoso por suas imagens cruzadas, parecia intrigado e um pouco assustado pela intensidade dela.

"O que você quer, Izzy?" ele perguntou, ajustando a câmera.

"Quero que você me mostre o que eles veem", ela respondeu, a voz rouca."O que ele vê."

A sessão de fotos para a Rolling Stone foi um furacão de emoções contraditórias. Sob as luzes quentes, com o clique da câmera ecoando como tiros, Izzy não se entregou totalmente. Era sua arma, sua vingança silenciosa, e ela a controlaria. Ficou de calcinha – preta, simples – e usou as mãos, os braços, seus longos cabelos (a parte rosa agora vibrante sob as luzes do estúdio) para se cobrir e se revelar ao mesmo tempo. Era uma dança de mostrar-e-esconder que espelhava perfeitamente sua existência. Algumas poses eram de desafio, o queixo erguido, o olhar fixo na lente como um desafio. Outras eram de uma vulnerabilidade calculada, os olhos baixos, os braços cruzados sobre o torso.

Em nenhum momento ela estava totalmente exposta, mas em todos os momentos ela estava completamente visível. O fotógrafo capturou a mensagem perfeitamente: Aqui estou eu. Não é uma mulher que você pensa que eu sou. Algo mais. Algo que vocês não conseguem decifrar.

Ao sair do estúdio, uma estranha euforia a envolvida. O ar de Los Angeles pareceu mais limpo, o sol mais brilhante. Ela havia algo por si mesma, algo que era só seu, um ato de pura, egoísta e necessidade rebelde. Ela não pensou em Axl, na banda, nas consequências. Naquele momento, só existia o zumbido latejante da adrenalina em suas veias e a sensação de ter, finalmente, fortalecendo o controle de um fragmento de sua própria narrativa.

A euforia, é claro, foi de curta duração.

Axl descobriu a pior maneira possível: vender o material bruto, não aprovado por ela, que vazou para a imprensa especializada. Alguém no estúdio, seduzido pelo dinheiro ou pela fama, vendeu algumas imagens preliminares. Ela estava no quarto, ensaiando um novo riff, quando a porta se abriu com violência.

Ele não concordou. Sua raiva era mais assustadora por ser silenciosa. Seu rosto estava pálido, seus olhos, duas fendas azuis e geladas. Na mão, ele segurava uma cópia impressa de uma das fotos. Na imagem, Izzy estava de costas para a câmera, usando apenas uma calcinha preta. A vertebral era uma linha pálida e elegante, suas costas musculosas de guitarrista em destaque. Uma de suas mãos puxava levemente os cabelos, expondo a nuca, enquanto a outra segurava seu braço, em um gesto que podia ser de proteção ou de contenção. Uma pose era, inegavelmente, sensual. Mas era uma sensualidade de uma fera acuada, não de uma pin-up.

"O que é isso, Izzy?" A voz dele era baixa, plana, carregada de um veneno que ela nunca ouviu antes.

Ela baixou a guitarra, seu coração acelerando. "Uma sessão de fotos."

"EU SEI O QUE É!" A fúria irrompeu, fazendo-a estremecer. "Para quem? Para que? Para quem você está fazendo essas poses, Izzy? Por que você está se vendendo assim, como uma... uma garota de programa de revista?"

O ciúme dele era um animal feio e possessivo. Ele não passa pela dor ou pela complexidade dessas imagens. Ele via apenas sua mulher, semi-nua, oferecendo uma imagem íntima e poderosa para o mundo, e não para ele. Era uma traição ao seu domínio, à sua posse.

"Eu não estou me vendendo", ela retrucou, a voz trêmula de raiva. "Estou me reclamando. É meu corpo! Minha imagem!"

“SEU CORPO?” Ele avançou, jogando a foto impressa na direção dela. Ela flutuou até o chão, entre eles. "Seu corpo é parte de nós, Izzy! Parte da banda! Parte do que construímos! E você o coloca por aí, de graça, para qualquer um ver... como se eu... como se nós... não significamos nada!"

Ele não estava entendendo. Ele estava perdendo tudo a uma questão de posse, de ciúmes mesquinhos. A revolta que ela sentiu no estúdio voltou, multiplicada.

"Talvez você não significa mais o que pensou que fez, Axl", ela cuspiu, as palavras saindo como lâminas. "Talvez eu fico cansada de ser só sua 'parte'. Talvez eu queira ser inteira de mim!"

Ele a encarou, e pela primeira vez, sob a fúria, ela viu um lampejo de outra coisa: confusão. Uma confusão profunda e machucada. Ele não tinha o vocabulário, a compreensão, para analisar o que ela realmente estava dizendo. Tudo o que ele via era que a mulher que amava estava se afastando de uma maneira que ele não conseguia controlar ou compreender, e usando sua própria imagem como arma.

"Inteiro?" ele repetiu, o tom agora carregado de um desdém amargo. "Parece mais que você está se despedaçando, Izzy. E está levando tudo junto com você."

Ele se virou e saiu do quarto, deixando-a sozinha com o som de sua própria respiração ofegante e a imagem impressa no chão. A foto a encarava, sua própria imagem silenciosa e poderosa acusando-a. Ela pensou que se sentiria vitoriosa ao provocá-lo, ao ver ciúmes em seus olhos. Em vez disso, sente-se vazio e mais sozinho do que nunca. A fenda entre eles não era mais apenas sobre gênero ou identidade; era sobre a incapacidade fundamental de um entender a linguagem da dor do outro. E ela acabou de aprofundá-la com um terremoto.

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Uma bomba não explodiu apenas na casa de Malibu. Ela detonou em todas as capas de revistas, em todos os programas de fofoca, em todas as rádios. As imagens de Izzy para a Rolling Stone eram o assunto absoluto. E, como ela previra, ninguém as interpretou como um grito de agonia. Para o mundo, era uma "renascença sensual de Izzy Stradlin", uma "deusa do rock reafirmando seu poder".

Axl, já ferido e confuso pela briga, foi forçado a engolir essa narrativa pública. Ele via a foto em todo lugar – a imagem dela de costas, a nuca exposta, a curva da coluna – e cada vez era uma fachada. Era sua Izzy, mas oferecida ao mundo de uma maneira que ele sentia ser só dele para ver.

O golpe final aconteceu durante uma entrevista coletiva para promover a turnê. Um repórter de uma revista de fofoca, com um sorriso maroto, pegou o microfone.

"Axl, todo o mundo está falando das novas fotos de Izzy na Rolling Stone. Impactantes, não? Até o Bret Michaels, do Poison, comentou ontem no MTV Headbangers Ball. Disse, e cito: 'Se a Izzy não estava com o Axl, eu estaria na porta do estúdio dela com uma jukebox nas costas. A mulher é um furacão, e aquelas fotos provam isso.' O que você acha do comentário do Bret?"

A pergunta caiu como uma granada no palco. Slash, ao lado de Axl, baixou a cabeça, escondendo um sorriso constrangido sob o chapéu. Duff pareceu querer se fundir com o baixo. A expressão de Axl congelou. Os holofotes queimados. Ele podia sentir a expectativa da sala, todos esperando uma resposta macho, descontraída, de rockstar.

Por um segundo, ele ficou paralisado. A imagem de Bret Michaels, aquele cantor de hair metal com seus lenços coloridos e sorriso fácil, ousando cobiçar publicamente o que era dele. O comentário foi uma brincadeira, uma bobagem de entrevista, mas para Axl, naquele momento, foi a humilhação final. Era uma notificação pública de que a intimidade dele com Izzy havia se tornado um espetáculo, um bem comum para ser comentado e cobiçado.

Ele forçou os cantos da boca a se curvarem em algo que parecesse com um sorriso arrogante.

"O Bret sempre teve bom gosto", ele disse, a voz saindo mais áspera que o normal. "Mas ele pode economizar o combustível da van. A Izzy tem dono."

A plateia riu, achando que era uma piada. Mas não era. A palavra "dono" ecoou no ar, transmitida de um veneno possessivo que fez Slash levantar a cabeça e olhar para ele com preocupação.

Na limusine no caminho de casa, o silêncio era pesado. Axl não disse uma palavra, apenas olhou pela janela, sua mandíbula tensionada. A fúria nele era um animal vivo, rosnando por dentro. Não era mais só sobre as fotos. Era sobre o comentário de Bret Michaels. Era sobre todo o mundo olhando para Izzy e vendo o que ele sentia que era só seu para ter. Era sobre ele, Axl Rose, o homem mais temido e desejado do rock, sendo publicamente desafiado em seu próprio território.

Quando chegou em casa, ele encontrou Izzy na sala, lendo uma cópia da própria Rolling Stone. Ela parecia pensativa, não triunfante.

Ele parou na frente dela, bloqueando a luz.

"Você deve estar muito satisfeito", ele cuspiu, a raiva transbordando finalmente.

Ela transparente os olhos, calmamente. "Como o quê?"

"Com o seu circo! Com todo mundo babando em cima de você! Até o fodido do Bret Michaels se achou no direito de dar em cima de você na minha cara!"

Izzy fechou a revista lentamente. "Eu não controlei o que Bret Michaels disse, Axl."

"MAS VOCÊ CONTROLOU ISSO!" ele mencionou, apontando para a capa. "Você colocou essa ideia na cabeça das pessoas! Você se embalou e se colocou na vitrina! E agora todo homem com uma guitarra e um par de calças apertadas acha que pode... que pode..."

"Que pode o quê, Axl?" Ela se falou, enfrentou-o. Seus olhos estavam escuros, mas não com medo. Com cansaço. "Cobiçar o que é seu?"

"ISSO MESMO!" O grito saiu como um uivo.

Ela balançou a cabeça, uma expressão de profunda decepção no rosto.

"Eu não sou sua, Axl. Nunca fui. Essas fotos... elas não são um convite. Elas são minha declaração de independência. E se você, ou o Bret Michaels, ou qualquer outro homem nesse planeta, não consegue ver a diferença, então o problema é de vocês, não meu."

Ela pegou a revista e saiu da sala, deixando-o sozinha com sua fúria impotente. Ele ficou parado ali, o rugido do silêncio enchendo seus ouvidos. Ele conseguiu o ciúme que, em segredo, talvez desejasse provocar. Mas na batalha por posse, ele acabou percebendo que Izzy não era um território a ser conquistado. Ela era uma nação se declarando soberana, e ele estava do lado errado da fronteira, gritando sozinho no pacote.

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O mundo exterior via uma deusa do rock renascida. As revistas elogiavam a "ousadia" e o "poder" de Izzy Stradlin. O telefone da casa não parava de tocar com propostas de trabalho, entrevistas, novas sessões de fotos ainda mais ousadas. Cada elogio era uma fachada. Eles estavam elogiando a persona, a casca, a mentira que ela havia embalada em papel seda e entregue ao mundo como um presente envenenado.

Dentro da casa em Malibu, o ar era irrespirável. Axl tornara-se uma tempestade silenciosa e explodirá. Ele não a confrontou diretamente novamente, mas sua presença era uma acusação constante. Ele a observou com um olhar que era metade fúria, metade uma confusão profunda que ela quase preferia à raiva. Era o olhar de um homem que vê uma quebra-cabeça que sempre poderia montar de repente se reorganizar em uma imagem completamente diferente e incompreensível.

A declaração do Bret Michaels ecoava na mente dela não como um elogio, mas como a prova final do equívoco universal. Eles viam um corpo a ser desejado. Ela via uma prisão a ser escapada. A fúria possessiva de Axl só solidificou isso. Ele não estava bravo por ela estar sofrendo; estava bravo porque outros homens estavam olhando para o que ele considerava sua propriedade.

Naquela noite, ele tentou tocá-la. Não com a ternura rara dos últimos tempos, mas com uma posse renovada, quase prejudicial. Suas mãos percorreram seu corpo como se estivessem reafirmando fronteiras, reivindicando um território que escorregasse entre os dedos. Izzy ficou imóvel, seu corpo tornando-se madeira sob seu toque. Era a mesma desconexão de sempre, mas agora compartilhou de um novo significado: ela não era mais uma mulher se desconectando; era um homem sendo violado em um corpo que não era seu.

Ele vê a frieza dela e se afasta bruscamente, com um resmungo de frustração.

"O que há de errado agora?", a voz dele um rosnado no escuro.

Ela não respondeu. Como explicar? Como dizer que cada toque dele, agora filtrado através do olhar público e do seu próprio despertar, era como lixa em sua pele?

Dias se passaram. A tensão não diminui; cristalizou-se. Izzy passa horas trancada no seu estúdio, não compondo, apenas olhando para o pedaço de papel com o número do médico. Ele estava mais amassado do que nunca, as letras quase ilegíveis. Era sua tábua de salvação e sua sentença de morte.

Uma gota d'água foi um ensaio. A banda estava afinando, Slash e Duff tentando manter a paz com piadas desajeitadas. Axl, de mau humor palpável, começou a criticar tudo – o som, o andamento, o tom de Izzy.

"Essa porra de guitarra tá muito aguda, Iz. Abaixa essa merda", ele tentou, sem olhar para ela.

Ela ajustou os controles, os dedos trêmulos. A música era seu único refúgio, e agora ele estava invadindo até isso.

Ele não parou. Cada nota que ela tocava estava errada. Cada acorde, fora de lugar. A raiva dele, contida desde as fotos, estava encontrando uma válvula de escape, e ela era o alvo mais fácil.

"Porra, Izzy, é como tocar com um iniciante! Você está ouvindo alguma coisa? Ou está muito ocupado se admirando nas suas fotos?"

O comentário saiu como um chicote. Slash parou de tocar. Duff baixou o baixo.

Izzy baixou a paleta. O estúdio estava em silêncio, o único que era a respiração ofegante de Axl. Ela olhou para ele, e não viu o homem que amava, mas um estranho cheio de desdém. Viu todos os olhares possessivos, todos os comentários objetificantes, toda a dor de anos compactada naquele único olhar.

Ela não disse uma palavra. Lentamente, tirei a guitarra e coloquei no suporte. Suas mãos não tremiam mais. A decisão, finalmente, cristalizar-se-á. O preço do silêncio tornara-se alto demais.

Ela atravessou o estúdio em silêncio, passou por Axl sem olhar para ele, por Slash e Duff com seus rostos preocupados, e saiu. Não foi um gesto dramático. Foi a ação quieta e final de alguém que não tinha mais nada a dizer naquela língua.

Foi direto para o quarto, trancou a porta e pegou o telefone. Desta vez, suas mãos estavam firmes. Ela descobriu o número. A linha conectada.

"Clínica do Dr. Evans, boa tarde."

Izzy respirou fundo. O som da banda retomando o ensaio, abafado, chegava até ela. O som da vida que ela estava prestes a deixar para trás.

"Alô?", a voz da recepcionista soou novamente, questionadora.

"Sim", a voz de Izzy saiu clara e calma, sem vestígio da angústia de semanas. "Eu gostaria de marcar uma consulta. O mais breve possível."

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O som da banda retomando o ensaio era um zumbido distante, um eco de uma vida que já não lhe pertence. A voz calma da recepcionista do outro lado da linha soava mais real, mais presente, do que qualquer acorde de guitarra.

"Claro. Temos disponível na próxima terça-feira, às 10h da manhã. Serve para você?"

“Sim”, a voz de Izzy saiu firme, sem hesitação. "Sirva perfeitamente."

Ela anotou os detalhes com as mãos surpreendentemente resultados, desligou o telefone e ficou sentado na beira da cama, ouvindo o ruído abafado do estúdio. Não havia euforia, nem medo paralisante. Apenas um silêncio interior profundo, como uma calmaria que se segue a uma tempestade devastadora. A decisão foi tomada. O caminho à frente era uma incógnita aterrorizante, mas a estagnação havia se tornado insuportável.

Nos dias que se antecederam à consulta, ela se tornou uma espectadora da própria vida. Observe Axl com uma distância clínica. Suas explosões de ciúme, sua possessividade, sua incapacidade de ver além da própria dor – tudo parecia pequeno e distante, como assistir a uma peça de teatro ruim. Ela já não estava mais no palco com ele. Já havia saído pela porta dos fundos.

Axl, sentindo a mudança, tornou-se mais volátil. A fúria inicial dera lugar a uma confusão irritada. Ele tentou puxar de volta com os métodos antigos – presentes caros, flores, tentativa de sexo agressivo que ela agora recusava com uma calma que o deixava louco.

"O que há de errado com você?" ele disse, após ela se virar para ele na cama mais uma noite. "Você é uma estátua de gelo."

Ela olhou para ele no escuro, e suas palavras saíram suaves, mas finas como uma lâmina. "Estou cansado de interpretar, Axl. A peça acabou."

Ele não respondeu. Talvez, no fundo, ele já comenta. Talvez sentisse o chão se movendo sob seus pés, o império que construíra desmoronando porque a sua rainha decidiu que nunca quisa a coroa.

Na manhã da consulta, Izzy vestiu roupas comuns – jeans, uma camiseta larga, um casaco – e saiu de casa enquanto Axl ainda dormia. O ar da manhã em Los Angeles estava fresco, e pela primeira vez em anos, ela sentia que respirava de verdade.

A clínica do Dr. Evans era discreta, em um prédio moderno de West Hollywood. A sala de espera era silenciosa, com revistas sobre arte e cultura, nada que lembrasse as capas de rock com sua própria imagem. Ela se enviou,suas mãos pousadas no colo, surpreendentemente calmas.

Quando seu nome foi chamado, ela se pronunciou. Cada passo em direção ao consultório foi um passo para longe de Izzy Stradlin, guitarrista, musa, propriedade de Axl Rose. E um passo em direção a IZ, quem quer que ele fosse.

A porta do consultório foi fechada atrás dela. Do lado de fora, o mundo do rock and roll continua girando, com seus escândalos, suas músicas e seus dramas. Mas naquela sala, algo novo e frágil estava prestes a começar. O silêncio não era mais uma sentença. Era uma promessa.

Evans era um homem de meia idade, de óculos e expressão serena, sentado atrás de uma mesa de madeira clara. O ambiente era profissional, acolhedor, sem julgamentos.

"Bom dia", ele disse. "Por favor, sinta-se."

Ela se mandou, as mãos pousadas no colo, sentindo o tecido áspero do jeans contra sua pele. O silêncio do consultório era diferente do silêncio pesado de casa - era um silêncio que esperava, que dava espaço.

“Conte-me o que a traz aqui hoje”, pediu o Dr. Evans, com sua voz calma.

Izzy respirou fundo. As palavras vieram então, não como uma torrente, mas como um rio denso finalmente encontrando uma saída. Ela falou de uma vida inteira sentindo-se como um estrangeiro em seu próprio corpo. Falou da infância em Indiana, onde preferia jogar baseado com os meninos. Falou do pavor mensal que seu próprio ciclo lhe causou, como uma traição biológica. Falou dos palcos, onde milhares de olhos devoravam uma figura feminina que não era ela.

Quando Axl falou, sua voz vacilou levemente. "Ele ama uma pessoa que não existe. E eu... eu cansei de interpretá-la."

O Dr. Evans ouviu, seus olhos sérios por trás dos óculos. Quando ela terminou, exausta mas mais leve, ele falou com importância.

"O que você descreve é ​​consistente com disforia de gênero. É uma angústia que surge da desconexão entre o gênero designado no nascimento e a identidade de gênero verdadeira."

As palavras ecoaram no silêncio do consultório. Não era um diagnóstico assustador, mas um reconhecimento. Alguém finalmente colocou em palavras o que ela sentiu há tanto tempo.

"E... há algo que possa ser feito?" sua voz saiu como uma sugestão.

“Sim”, ele respondeu. "Existem caminhos. A transição é um processo único para cada pessoa. Pode envolver terapia hormonal, para alinhar suas características físicas com sua identidade. E envolve uma transição social - viver de acordo com sua identidade verdadeira."

Ele explicou sobre a testosterona, sobre as mudanças: a voz mais grave, os pelos faciais, a redistribuição de gordura. Cada palavra era uma porta que se abria.

“É importante pensar no aspecto social também”, ele continuou. "Nome, pronomes... alguns pacientes escolhem novos nomes, outros mantêm os que têm.O que seria mais confortável para você?"

Izzy olhou para as próprias mãos - as mãos que criaram riffs que fizeram estádios inteiros gritarem.

"Izzy", ela disse, em voz firme. "Quero continuar Izzy Stradlin."

O médico inclinou a cabeça, interessado. "Pode me contar sobre essa escolha?"

“Porque Izzy Stradlin é quem eu sou”, ela explicou, os olhos faiscando com uma determinação recém-nascida. "A música, a guitarra, a história... isso é real. O problema nunca foi o nome, foi a gaiola de 'mulher' que prenderam em volta dele. Eu não preciso destruir Izzy Stradlin - preciso libertá-lo."

Era uma declaração de guerra contra as expectativas alheias, não contra si mesma. Ela não rejeitava sua história - reassumia sua autoria.

Evans concordou, um respeito genuíno em seu olhar. "É sua jornada, Izzy. Você define os termos."

Ele então explicou os próximos passos: exames de sangue, acompanhamento psicológico, o início gradual da terapia hormonal.

Quando ela saiu do consultório, o sol da tarde parecia diferente. Não mais o sol implacável que iluminava uma farsa, mas o sol do primeiro dia de algo verdadeiro.

Ela caminhou até o carro e sentou-se ao volante, olhando para o próprio reflexo no retrovisor. Pela primeira vez em anos, não senti a urgência de desviar o olhar. Havia um longo caminho pela frente - conversas difíceis, mudanças, preconceitos - mas ela finalmente tinha um mapa.

Izzy Stradlin ligou o carro e saiu daquela rua tranquila de West Hollywood. O mundo lá fora continuava o mesmo, mas ela não. Ela tinha um nome - o seu nome - e um futuro onde finalmente poderia habitar sua própria pele.

O caminho de volta da clínica para Malibu foi um aspirador. A rádio estava ligada em uma estação qualquer, tocando "Sweet Child O' Mine". A ironia foi tão cortante que Izzy quase desligou o aparelho. A música que fora o hino não oficial do amor deles agora soava como uma elegia.

Enquanto dirigia, a realidade da consulta se solidificou em sua mente, trazendo uma conclusão importante: ela precisava sair. Sair da banda, sair daquela casa, sair da vida que construíra com Axl.

Na cabeça dela, não havia espaço para meias medidas ou para a possibilidade de ele entender. Como ele entendeu? O homem que via ciúmes possessivos onde havia um grito de dor, que confundia vulnerabilidade com provocação, que amava a casca porque nunca suspeitou que havia um caroço diferente dentro.

Ela imaginou contar para ele. Viu o rosto dele se contorcendo de confusão para nojo, depois para raiva. Ouviu os gritos, as acusações de traição, de loucura. Viu a imprenca sensacionalista devorando a história, transformando sua verdade mais íntima em um circo midiático. "A Mulher do Guns N' Roses Era um Homem!" As manchetes praticamente se escreveram em sua mente.

Não. Ele não entendia.A banda não entende. O mundo, certamente, não entenderia.

A fama, que sempre fora uma gaiola, agora parecia uma prisão de máxima segurança. Cada olhar, cada microfone, cada fã seria um obstáculo no seu caminho para se tornar quem ela era. E no centro disso tudo, Axl estaria – ferido, traído e furioso. Ele não seria seu porto seguro; seria uma tempestade.

Chegando em casa, a mansão parecia maior e mais vazia do que nunca. Um mausoléu de mármore e vidro para um relacionamento que já estava morto. Ela subiu silenciosamente para o quarto e começou a juntar suas coisas. Não tudo, ainda não. Apenas o essencial – algumas roupas, seu caderno de composições, sua guitarra acústica favorita. Cada objeto colocado na mala era um prego no caixão da vida que levava.

Ela olhou para a cama que dividiam, lembrando das noites em que ele a segurava durante as cólicas, da ternura que ele era capaz de mostrar. Uma parte dela doía com a ideia de perder aquilo. Mas era uma ternura baseada em uma mentira. Ele confortava uma mulher que não existia. E ela não aguentava mais ser essa mulher, nem mesmo pelo conforto de seus braços.

A decisão de sair da banda foi mais fácil. A música era sua alma, mas o Guns N' Roses era o palco onde ela era forçada a performar sua própria negação. Cada show seria uma tortura. Cada ensaio, um lembrete. Ela não poderia fazer a transição sob os holofotes, com Slash, Duff e Steven como placa cativa de sua transformação. A dinâmica da banda, a irmandade, não sobreviveria a isso. E ela não queria ser a razão do fim.

Sua mente traçou um plano frio e prático. Ela se mudaria para um lugar discreto. Iniciaria a terapia hormonal longe dos olhos do mundo. Só então, quando estava mais seguro em sua nova pele, ele considerou seu futuro na música – sozinho, ou talvez com uma nova formação, com pessoas que o conheceram apenas como IZ

Quando ouviram o carro de Axl na garagem, ela fechou a mala e a empurrou para debaixo da cama. Seu coração batia forte, mas suas mãos estavam firmes. Ele entrou no quarto, parecendo exausto e ainda carregando a energia residual da prosperidade dos últimos dias.

"Onde você estava?" ele perguntou, jogando as chaves na cômoda.

"Resolvendo umas coisas", ela respondeu, com sua voz puramente neutra.

Ele a observou, seus olhos procurando por algo – uma briga, uma desculpa, um motivo para acontecer. Mas ela não deu. Ela já havia saído daquela guerra.

A noite caiu sobre Malibu, e Izzy ficou acordada, olhando para o teto. Ao seu lado, Axl dormia, sua respiração um ritmo familiar que em breve seria apenas uma memória. Ela sabia que o que estava prestes a fazer machucá-lo profundamente. Ele a veria como uma desertora, uma traidora que destruiu a banda e seu coração por um capricho.

Mas para Izzy, não era sobre ele. Finalmente, era sobre ela. Era sobre a possibilidade de acordar um dia e, pela primeira vez, olhar no espelho e considerar o rosto que olhou de volta. O preço era alto – perder o homem que amava, a banda que ajudou a construir, a fama que conquistou. Mas o custo de continuar fingindo era a sua própria alma.

E naquela noite, sob o mesmo teto, deitada ao lado do homem que ainda a chamava de "linda", Izzy Stradlin começou, em silêncio, a se despedir.

A luz da manhã começou uma briga pelas persianas, pintando listras pálidas no rosto de Axl adornado. Izzy expressou seus traços familiares – a curva do maxilar, a franja ruiva espalhada no travesseiro – e sentiu uma dor profunda e silenciosa se espalhou em seu peito. Era agora ou nunca.

Ela se pronuncia em silêncio, usa o mesmo jeans e camiseta larga do dia anterior. Sua mala já estava no porta-malas do carro, escondida sob um cobertor. Tudo o que era realmente importante dela já não estava mais dentro daquelas paredes.

Quando Axl se mexeu na cama, ela estava parada na varanda, olhando para o oceano, com as mãos enfiadas nos bolsos.

"Is?" sua voz veio rouca de sono. "Você está bem?"

Ela não se virou. "Precisamos conversar, Axl."

Ele se sentou na cama, esfregando o rosto. "O que foi agora? Mais fotos? Outra crise?"

Ela fechou os olhos por um segundo, respirando fundo. Então se virou para enfrentá-lo.

"Acabou", ela disse, sua voz extremamente calma. "Eu vou embora."

O rosto dele passou de sonolento para alertar em um segundo. "O que? Vai embora para onde? Em turnê? Com ​​quem?"

"Vou embora de verdade, Axl. Da banda. De você. Dessa vida."

Ele riu, um som incrédulo e seco. "Você está brincando. Por causa daquela merda de discussão sobre as fotos? Izzy, para com isso."

"Não é sobre as fotos." Ela deu um passo para dentro do quarto. "É sobre tudo. É sobre eu não conseguir mais viver essa mentira."

"Que mentira?" Ele se declarou, sua voz começando a subir. "A mentira de que somos a porra do casal mais fodido do rock? A mentira de que temos tudo?"

"A mentira de que eu sou uma mulher!"

As palavras caíram no quarto como um tijolo de concreto. Axl ficou paralisado, sua boca aberta. Ele piscou, como se tentasse processar sons que não faziam sentido.

"O... o que?" foi tudo o que ele conseguiu dizer.

"Eu não sou uma mulher, Axl. Nunca fui. Por dentro, eu sou um homem." As palavras saíramam agora, claras e firmes. "Chama-se disforia de gênero. É por isso que eu sempre usei suas camisas. É por isso que eu odiava aqueles vestidos. É por isso que cada vez que você me chamava de 'linda' ou 'garota',era como se você estivesse me esfaqueando."

Ele balançou a cabeça, lentamente, sua expressão mudando de confusão para algo mais duro. "Isso é... isso é a coisa mais ridícula que eu já ouvi. Você está claramente passando por uma crise, Izzy. Talvez por causa da pressão, da fama..."

"Pare." A voz dela cortou o ar. "Não me condene. Eu já fui um médico. Vou começar uma transição."

"Transição?" Ele repetiu a palavra como se fosse um insulto. "O que diabos isso significa?"

"Significa que vou tomar testosterona. Minha voz vai absorver. Vou crescer barba. Meu corpo vai mudar. Vou me tornar quem eu sempre fui."

O rosto de Axl perdeu toda a cor. Ele deu um passo para trás, como se ela tivesse confessado ser um assassino.

"Você... você está louca", ele sussurrou, horrorizado. "Isso é uma doença. Você precisa de ajuda, mas não desse tipo."

"É exatamente esse tipo de ajuda que eu preciso!" ela falou, a emoção finalmente quebrando sua calma. "E eu não preciso da sua permissão!"

"É uma banda?" A voz dele estava se tornando um rosnado. "E a nossa vida? Você vai jogar tudo fora por essa... essa fantasia?"

"Não é uma fantasia! É a única coisa real em mim há anos!" Ela pegou uma jaqueta que estava em uma cadeira. "Já arrumei minhas coisas. Vou ficar em um hotel."

"IZZY!" Ele avançou, agarrando seu braço com força. "Você não vai a lugar nenhum. Nós vamos resolver isso. Vamos encontrar um psiquiatra, um..."

Ela deixou o braço com força, libertando-se. "Não há 'nós' para resolver, Axl. Há eu, finalmente resolvendo a mim mesmo. E você não faz parte disso."

Ele a encarou, e pela primeira vez, ela viu não apenas raiva ou nojo em seus olhos, mas uma dor sincera e profunda. A dor de um homem que vê o mundo desmoronar sem entender o porquê.

"Então tudo foi mentira?" sua voz estava quebrada. "Todo nosso amor? Cada 'eu te amo'?"

O coração de Izzy abriu. "O amor era real. Só não era pelo que você pensou que era."

Ela se virou e caminhou em direção à porta. Cada passo era uma agonia.

"Se você sair por essa porta", a voz de Axl veio gelada por trás dela, "não volte. Está fora da banda. Fora da minha vida."

Ela parou na soleira da porta, sem se virar.

"Eu sei", ela sussurrou.

E então ela saiu. A porta se fechou atrás dela com um som final. Ela desceu as escadas, entrou no carro e ligou o motor. Suas mãos tremiam no volante, mas suas lágrimas eram silenciosas. Ela não olhou para trás.

Enquanto dirigia para longe da casa, para longe de Axl, para longe de tudo o que conhecia, uma parte dela se partia em mil pedaços. Mas outra parte, pequena e frágil,começou a respirar pela primeira vez. O caminho à frente era uma incógnita aterrorizante, mas era seu caminho. E pela primeira vez em sua vida, Izzy Stradlin seguiu em frente sozinho, em direção a si mesmo.

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Os primeiros dias longe de Axl e da hospedagem foram um vazio surreal. O quarto de hotel anônimo em West Hollywood era um mundo à parte da opulência de Malibu. O silêncio era diferente – não era pesado com tensão não dita, mas vazio, esperando para ser necessário.

A primeira injeção de testosterona foi um marco solitário. Ela aplicou sozinha no quarto do hotel, com as mãos trêmulas. Não houve fanfarra, nem celebradas. Basta um clique seco do aplicador e uma picada rápida na coxa. Mas naquele momento, ela sentiu algo que nunca havia experimentado antes: agência. Controle sobre o próprio corpo, sobre o próprio destino.

As mudanças não foram imediatas, mas os efeitos psicológicos foram. Uma paz estranha começou a se instalar. A constante agitação de desespero e desconexão começou a se dissipar, lenta mas perceptivelmente. Era como se seu cérebro, finalmente, recebesse o combustível certo depois de uma vida inteira funcionando com o errado.

A imprensa, é claro, foi implacável. " Onde Está Izzy?"; "Crise sem Guns N' Roses?" ; "Axl Rose Destruído pelo Sumiço da Namorada" . Ela evitou as manchetes, mas era impossível escapar completamente. Cada especulação era um corte, um lembrete ao mundo que ela deixara para trás.

Ela manteve contato apenas com uma pessoa da vida antiga: Duff. Ele era o mais pé no chão, o menos dramático. Ele não entendeu completamente, mas respeitava. Foi Duff quem, discretamente, ajudou a encontrar um pequeno apartamento seguro e discreto para ela se estabelecer. Foi a única ponte que ela permitiu permanecer.

Enquanto seu corpo começava a mudar – a voz um pouco mais áspera, um fiapo de barba escura no queixo, uma nova energia –, sua música também mudou. As composições que saíam de sua guitarra no apartamento silencioso eram diferentes. Menos raiva performática, mais introspecção. Eram canções sobre identidade, sobre perda, sobre a coragem assustadora de se reconstruir do zero. Ela não sabia se algum dia alguém ouviria, mas compôs-las era uma terapia vital.

Cerca de três meses após sua saída, ela recebeu uma conexão inesperada. Era Slash.

"Iz", a voz familiar dele tão estranha no telefone. "Como... como você está?"

"Estou bem, Slash. Melhor do que estive em anos."

Houve um silêncio. "Axl... ele não está bem. Ele está... destruído. E a banda... não é a mesma."

Uma pontada de culpa atravessou Izzy. Mas ela atrasou. "Eu sinto muito por ele. Mas eu não poderia continuar me destruindo para mantê-lo inteiro."

Slash pareceu entender, do seu jeito desconcertado. "Eu sei. Só... cuide-se, tá? Você ainda é um de nós, não importa o que."

O "não importa o que" ecoou. Ele não sabia das injeções, das mudanças. Mas talvez duvide.Era o máximo de facilidades que ela ganharia naquela vida por um bom tempo.

Um ano se passou. A barba de Izzy agora era visível, um rastro escuro que ela tocava com uma sensação de vitória todos os dias. Sua voz era inconfundivelmente mais grave. Ela usava fichários regularmente, a sensação de um torso plano sob suas camisas era uma alegria silenciosa e diária.

Ela começou a frequentar bares de rock menos conhecidos, lugares onde podia ser apenas mais um rosto na multidão. Às vezes, alguém a reconhecia – "Ei, você não é a...?" – mas ela negava com um aceno de cabeça. Aos poucos, Izzy Stradlin, a estrela do rock, estava se tornando uma lenda, um fantasma.

Foi em um desses bares que ela conheceu Leo, o ex-técnico de iluminação. Ele a reconheceu imediatamente, mas seu olhar não era de curiosidade mórbida ou desejo. Era do reconhecimento.

“IZ”, ele disse, usando o nome que ela agora prefere em espaços seguros. "Ouvi rumores. Você... parece em paz."

Ela é simpática, um sorriso verdadeiro que não faz. "Estou chegando lá."

A jornada estava longe de terminar. Houve uma cirurgia superior no futuro, uma batalha legal para mudar seus documentos, o preconceito que ela sabia que enfrentaria. Mas pela primeira vez, o futuro não era uma sentença. Era uma possibilidade.

Sentada naquele bar, com a música alta abafando o mundo exterior, Izzy Stradlin olhou para seu reflexo no espelho atrás do balcão. O rosto que olhou de volta ainda carregava as marcas de sua história – os olhos que tinham visto o mundo do topo, a boca que tinha cantado para milhões – mas agora, finalmente, era um rosto que ele começou a considerar como seu. A estrada à frente era incerta, mas era sua estrada. E depois de uma vida inteira se sentindo perdido, ele finalmente tinha um mapa: seu próprio coração.

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A vida em seu pequeno apartamento em Silver Lake circulava em um novo ritmo, um mais lento, mais deliberado. As manhãs não eram mais preenchidas com o caos das turnês ou a tensão silenciosa de Malibu. Era dele. Um café forte, a aplicação meticulosa da testosterona – agora um ritual familiar, quase sagrado – e horas perdidas com sua guitarra, explorando sons que eram apenas seus, sem a pressão de precisarem se encaixar no "som do Guns".

As mudanças físicas foram suas pequenas vitórias diárias. O surgimento de mais pelos aparentemente, que ele aparava com um cuidado meticuloso. A voz, que agora quebrava em toneladas mais graves, uma novidade que ainda o incomodava às vezes. A maneira como suas roupas – camisas de flanela, jeans surrados, as mesmas de sempre, mas agora sentidas como verdadeiras – caíram de forma diferente em seus ombros, que negligenciam mais largos, mais definidos. Uma das primeiras coisas que fazer foi cortar o cabelo. Fora-se a juba negra e rosa que caiu até a cintura; agora era um corte curto e despojado, que deixava sua nuca exposta e enquadrava seu rosto de forma mais angular, mais masculina. Era prático, moderno,e dele.

Leo, o técnico de iluminação, tornou-se uma presença constante. Não é um romance, mas uma amizade sólida e abrangente. Ele era sua âncora no mundo real, alguém que o conhecia antes e depois, e que nunca piscou com as mudanças. "Combina com você, Izzy", ele disse, ao ver o novo corte. E o uso do nome, a naturalidade, fez bem.

Foi através de Leo que ele conheceu Alex, do grupo de apoio, que agora era um amigo próximo. Alex o apresentou a outros homens trans. Pela primeira vez, Izzy Stradlin não se sentiu como uma anomalia. Ele fez parte de uma comunidade que entendeu a dor e o triunfo de cada pequena mudança.

Cerca de um ano e meio após deixar Axl, ele recebeu uma ligação de seu advogado. A papelada para a mudança de gênero nos documentos estava completa. O nome permanente é o mesmo: Izzy Stradlin. Mas o 'M' do sexo agora era um 'F', retificado para 'M'. Izzy Stradlin era, perante a lei, um homem. Quando o novo documento de identidade chegou pelo correio, ele ficou sentado na cozinha por um longo tempo, apenas olhando para ele. A foto mostrava seu rosto mais angular, com uma barba rala, o cabelo curto. Os olhos, porém, eram os mesmos – mas agora olharam para o mundo com uma clara que faltara antes.

Foi nessa época que um pequeno selo independente, especializado em rock alternativo, bateu à sua porta. Eles ouviram rumores, mas a abordagem deles foi diferente. Eles não queriam o "ex-Guns N' Roses". Eles pediram ao Izzy Stradlin que estivesse compondo músicas cruas e introspectivas em seu apartamento.

A ideia de voltar aos estúdios era assustadora. Mas também era tentadora. A música ainda era sua linguagem fundamental. Ele foi enviado, sob condições restritas: controle criativo total, nenhuma pergunta invasiva sobre sua transição, e a divulgação seria discreta.

As sessões de gravação foram uma experiência completamente nova. Sem Axl respirando em seu pescoço, sem a pressão de criar um "hit". Era apenas ele, alguns músicos de sessão talentosos e respeitosos, e um engenheiro de som que parecia entender a alma por trás das canções. As músicas que vieram eram sombrias, melancólicas, mas com um fio de esperança teimosa. Falavam de perda, de identidade, de renascimento. Era uma trilha sonora de sua própria transformação.

O álbum, simplesmente intitulado "Stradlin", foi lançado silenciosamente. Não houve turnê mundial, nem aparições em programas de TV. Apenas algumas entrevistas escritas, onde ele falava sobre música, evitando cuidadosamente o sensacionalismo. A crítica especializada foi surpreendentemente positiva. Eles elogiaram a maturidade do som, a letra crua, a coragem artística. Muitos notaram uma "nova voz" – tanto literal quanto metaforicamente. O mundo estava, lentamente, conhecendo o verdadeiro Izzy Stradlin.

Enquanto isso, o Guns N' Roses continuava, mas uma lacuna deixada por ele era palpável. Duff, em um de seus contatos raros e sóbrios, dissera que o som era diferente, mais pesado, menos groove. Izzy sentiu uma pontada de saudade, não da fama ou do caos, mas da alquimia única que os cinco criaram juntos. Mas era um preço que teve que pagar. A paz de espírito que agora possuía, o direito de ser quem era, valia qualquer soma, qualquer fama. Ele era Izzy Stradlin. Finalmente, completamente, e em paz.

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Anos Depois – 2000

O tempo, como um rio, havia seguido seu curso. O novo milênio chegou, e com ele, Izzy Stradlin encontrou um refúgio distante do frenesi que outrara definiu sua vida. Ele se mudou para uma casa modesta no interior do Arizona, longe dos holofotes e das memórias fantasmagóricas de Los Angeles. O ar era seco e limpo, o céu noturno, um manto de estrelas impossível de se ver na cidade grande.

Sua vida era simples. Acordar com o sol, cuidar de um pequeno jardim de cactos, compor em sua varanda com uma guitarra acústica no colo. A testosterona fez seu trabalho: sua barba era agora espessa, sua voz, inconfundivelmente grave. Ele usava o nome Izzy com uma naturalidade que antes era inimaginável. Era, finalmente, apenas ele mesmo.

Mas a paz do interior não era um esquecimento total. Numa prateleira baixa, perto da lareira, havia uma pequena pilha de revistas de rock. Às vezes, em noites particularmente tranquilas, ele as folheava. E foi assim que viu.

Primeiro, foi a notícia da prisão de Axl. Uma briga em um aeroporto, atendimento a uma segurança. As fotos mostravam um Axl com o rosto inchado, os olhos cheios daquela fúria autodestrutiva que Izzy conhecia tão bem. Uma pontada de dor, afiada e familiar, o atingida. Ele desejou, por um momento insano, poder ter estado lá para acalmá-lo, como fazer tantas vezes no passado. Mas aquele não era mais seu lugar.

Depois, veio o anúncio do noivo. Axl é um supermodelo brasileiro. A foto os mostrou sorrindo, ele com seu visual de rockstar envelhecido, ela, uma visão de beleza exótica e jovial. Izzy observou a imagem por um longo tempo. Não sinto ciúmes. Senti uma tristeza profunda. Era a mesma história, um rosto diferente. Axl ainda estava procurando por algo – ou alguém – para preencher um vazio que Izzy sabia ser intransponível. O casamento, é claro, nunca aconteceu. A notícia do rompimento veio alguns meses depois, em uma pequena nota de rodapé.

Ele ainda amava Axl. Isso nunca mudará. Não era mais o amor ardente e possessivo de outrora, mas uma constância silenciosa, uma cicatriz que doía quando o tempo esfriava. Amava o artista genial, o homem vulnerável que surgia nas raras brechas da arrogância, o parceiro que, de sua própria maneira distorcida, tentava cuidar dele. Mas amava de longe, como se observasse um navio navegando no horizonte, impotente para fazer qualquer coisa além de testemunhar.

O Guns N' Roses ainda existia, mas era uma sombra do que fora. Slash e Duff fizeram o jogo. A banda agora era um projeto praticamente solo de Axl, cercada por músicos contratados. As críticas ao novo material eram duras. Lendo-as, Izzy sentiu uma mistura de pena e uma estranha gratidão. Gratidão por ter escapado daquela gaiola dourada antes que ela se tornasse sua tumba.

Ele nunca tentou fazer contato. E Axl, certamente, não o fez. O orgulho, a mágoa e o abismo de incompreensão entre eles eram grandes demais. Suas histórias foram separadas, como dois rios que, após correrem juntos por um tempo, seguem caminhos diferentes em direção ao mar.

Numa daquelas noites tranquilas no Arizona, Izzy pegou sua guitarra. A música que saiu não era triste. Era resignada. Falava de estradas não tomadas, de amores que se tornam memórias, da paz estranha que se encontra no final da linha. Ele chamou de "Dusty Road".

Enquanto as notas ecoavam no silêncio do deserto, ele sabia que, apesar de tudo, apesar da distância e do silêncio, uma parte de seu coração sempre pertencia àquele homem complicado e tempestuoso que, em outro universo, em outra vida, talvez tivesse conseguido amá-lo por quem ele realmente era. Mas nesta vida, o amor deles era como uma música inacabada – linda em seus fragmentos, mas destinada a nunca encontrar seu acorde final.

O silêncio do Arizona foi quebrado por um toque de telefone insistente. Do outro lado da linha, uma voz que Izzy não ouvia há anos – a do manager histórico da banda, com quem ele mantinha um contato profissional para assuntos de direitos autorais.

"Izzy. Precisamos falar. É sobre o Guns."

O coração de Izzy deu um salto, um reflexo antigo. "O que houve?"

"É o Axl. E... todo mundo. Eles estão falando em uma reunião. Uma turnê. A formação clássica." A voz do gerente soava incrédula e esperançosa ao mesmo tempo. "Slash já topou. Duff também. Só falta você."

O mundo parou por um momento. Uma reunião. Os cinco. Voltarem a ser o Guns N' Roses, o mesmo que pela última vez. A ideia era ao mesmo tempo aterrorizante e irresistivelmente tentadora. Era como ouvir o eco de uma vida passada.

"E o Axl?" Izzy disse, sua voz mais grave do que o gerente lembrava. "Ele... concorda com a minha participação?"

"Ele sabe. Foi difícil, mas ele aceitou. Acho que ele finalmente entende que... bem, que a banda não é a mesma sem você."

Izzy desligou o telefone e ficou olhando para o deserto através da janela. Sua mente era um turbilhão. Ver Axl novamente. Ver todos eles. Não como a pessoa que eles lembravam, mas como ele era agora.

A decisão não foi fácil. Ele passou dias caminhante pelo terreno árido, a guitarra silenciosa em suas costas. No final, a música falou mais alto. A chance de fechar esse capítulo de frente, não fugindo, era algo que ele sentia que se desviava do mesmo.

Na véspera de voltar para Los Angeles, ele ficou parado diante do espelho. O homem que olhou de volta era estranho e familiar. Ele pegou o barbeador e, com movimentos precisos, fez a barba, deixando apenas um rastro de sombra, algo que ele nunca teria conseguido antes. Vestiu uma camisa preta simples e um jeans – roupas de homem, suas roupas. Ele não foi usado para impressionar ninguém. Estava se apresentando ao mundo, finalmente, como Izzy Stradlin.

A viagem de volta para LA foi surreal. A cidade não mudou muito, mas havia mudado completamente.

O ensaio foi marcado em um estúdio familiar. O coração de Izzy batia forte quando ele estacionou sua picape simples ao lado das Ferraris e Porsches dos outros. Ele respirou fundo e entrou.

O silêncio foi absoluto quando ele atravessou a porta. Slash, Duff e Steven estavam lá, envelhecidos, mas com os mesmos olhos. E então ele viu Axl.

Ó tempo parou. Axl estava mais magro, seu rosto marcado pelos anos de excesso e fama. Seus olhos azuis, sempre tão intensos, se arregalaram quando pousaram em Izzy. Eles percorreram seu rosto, a barba, os ombros mais largos, o cabelo curto. A expressão de Axl foi uma jornada em si mesma: choque, confusão, e algo que poderia ser... resignação?

"Puta que pariu", Slash corta o silêncio, um sorriso lento se espalhando sob seu chapéu. "Izzy? Cara, você... você tá com uma pinta foda."

Duff riu, um som genuíno. "Sempre pensei que você era o mais durão da banda."

Foi Steven quem, em sua simplicidade característica, resumiu tudo: "Caralho, Iz. Você parece... você mesmo."

Mas os olhos de Izzy estavam fixos em Axl. O vocalista não disse nada. Ele apenas olhou, como se estivesse vendo um fantasma e uma realidade ao mesmo tempo.

Finalmente, Axl balançou a cabeça, um movimento quase imperceptível. "Vamos... vamos tocar", ele disse, sua voz mais rouca que o normal. "Antes que eu mude de ideia."

Izzy pegou sua guitarra – a mesma que usou em Appetite for Destruction. O peso era familiar, mas as mãos que seguravam eram diferentes. Mais fortes. Mais certo.

Quando os primeiros acordes de "It's So Easy" encheram o estúdio, algo mágico aconteceu. Por algumas horas, as mágoas, os anos de silêncio, a dor da transformação, tudo isolado. Eram apenas cinco músicos, recriando o som que mudou suas vidas.

Izzy não tentou ser o que era. Ele tocou como era agora – com mais peso, mais confiança. Está certo. Durante "Nightrain", seu olhar encontrou o de Axl no refrão. E por um breve segundo, ele viu não o nojo ou a raiva que temia, mas um lampejo de algo que se parecia com... acessível? Ou talvez apenas a tristeza profunda de um homem vendo o que poderia ter sido, se o mundo fosse um lugar diferente.

A música terminou. O estúdio ficou em silêncio novamente, mas desta vez foi um silêncio de história, não de tensão.

Axl baixou o microfone. Ele não olhou para Izzy, mas suas palavras, baixas e destinadas apenas a ele, cortaram o ar:

"Você...soa bem."

Era um pouco. Era quase nada. Mas para Izzy, depois de todos aqueles anos, depois de toda a dor e a luta, aquelas duas palavras soaram como uma absolvição. Não faça Axl, mas dele mesmo. Ele havia apresentado. Ele havia tocado. E ele era, inquestionavelmente, Izzy Stradlin.

Os ensaios continuaram por semanas. Um equilíbrio frágil, tenso e milagroso se circula no estúdio. A química musical estava lá, intacta, como se o tempo não tivesse passado. Os riffs sujos de Izzy ainda se entrelaçavam perfeitamente com os solos flamejantes de Slash, ancorados pelo groove inconfundível de Duff e a batida caótica de Steven.

Mas fora da música, o ar era carregado. Axl manteve uma distância profissional de Izzy. Ele dava instruções, discutia dispostas, mas seus olhos evitavam o contato prolongado. Era como se ele estivesse se esforçando ao máximo para aceitar a presença de Izzy como um músico, sem ter que processar a pessoa que ele se tornara.

Izzy, por sua vez, lidou com isso com uma serenidade que encontrou a si mesmo. Ele não estava mais buscando a validação de Axl. Estava lá pela música, pelo fechamento, e por um respeito saudoso pelos caras que tinham sido sua família em outra vida.

Foi durante um intervalo, enquanto tomavam um café amargo na cozinha do estúdio, que a barreira finalmente rachou.

Slash e Duff estavam discutindo sobre um setlist, e Steven, como sempre, estava um pouco à parte, tentando afinar uma bateria que soava perfeitamente afinada para todos os outros. Axl estava encostado na parede, observando Izzy, que mexia calmamente o açúcar em seu copo.

"Você parece... em paz", Axl disse, sua voz baixa, quase engolida pelo burburinho.

Izzy distraiu os olhos, surpreso. Foi a primeira vez que Axl iniciou uma conversa que não seria prejudicial ao trabalho.

"Estou", respondeu Izzy, sua voz grave soando calma no espaço entre eles. "Finalmente."

Axl balançou a cabeça, olhando para o chão. "Eu... eu nunca entendi. Na época. Só via que você estava se afastando, ficando frio. Eu pensei que era outra coisa. Alguém. Ou que você estava me odiando."

“Eu nunca te odiei, Axl”, disse Izzy, e a verdade daquela afirmação ecoou em seu peito. "Eu estava me odiando. E tentando sobreviver a isso."

Axl atrai os olhos, e pela primeira vez, Izzy vê uma abertura genuína neles. Não era acessível total, nem compreensão plena – isso seria pedir demais – mas era uma trégua. Um desejo de, talvez, entender um fragmento.

"E essa...", Axl gesticulou vagamente na direção a ele, "essa mudança... te ajudou?"

"Salvou minha vida", respondeu Izzy, sem hesitar.

A expressão de Axl se suavizou, a raiva e a confusão dando lugar a uma curiosidade cansada. "A música do seu álbum... 'Dusty Road'... é sobre...?"

"É sobre estradas mais longas. E sobre encontrar paz no final delas."

Eles ficaram em silêncio por um momento, o som dos outros preenchendo o espaço.

"Eu ouvi", Axl admitiu, baixinho. "É uma música boa. Você sempre foi o poeta da porra da banda."

Era um elogio. Torto, cheio de história e dor, mas era um elogio. Um reconhecimento de que a essência de Izzy, aquela que ele sempre amara, ainda estava lá. Talvez até mais forte.

Axl se afastou da parede, se preparando para voltar ao estúdio. Antes de se virar completamente, ele parou.

"É bom ter você de volta, Iz", ele disse, e pela primeira vez em mais de uma década, então como se ele realmente significasse isso. Não "é bom ter a guitarra de volta", ou "o músico de volta". Era "é bom ter você de volta".

A turnê da reunião foi anunciada para o mundo sob um alvoroço midiático histórico. As manchetes gritaram sobre o retorno dos lendários Guns N' Roses. Nos bastidores, porém, a história era diferente. Era sobre cinco homens mais velhos, marcados pela vida, tentando encontrar uma maneira de fazer a música funcionar novamente, apesar de tudo.

E no meio disso tudo, estava Izzy Stradlin. De costas retas, segurando sua guitarra, seu rosto agora familiar para o mundo com sua barba e seu olhar tranquilo. Ele não era mais a garota bonita e andrógina dos anos 80. Era um homem. Um sobrevivente.

Quando as luzes do primeiro show se acenderam e o rugido da multidão envolveu o estádio, Izzy olhou para Axl no centro do palco. O vocalista voltou seu olhar, e num raro gesto, acenou com a cabeça para ele, um pequeno sorriso nos lábios.

Naquele momento, sob as luzes cegantes e o som de cinquenta mil vozes cantando suas músicas, Izzy soube que nunca mais seria completamente entendido por Axl. Suas estradas eram diferentes demais. Mas a música – aquela linguagem antiga e poderosa que os unira no início – ainda era um terreno comum. E talvez, naquele palco, com os acordes familiares ecoando na noite, isso fosse o suficiente. Era mais do que ele jamais imaginou que teria de volta. Era uma redenção, não para o Guns N' Roses, mas para si mesmo.

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O rugido da multidão ainda zumbia nos ouvidos de Izzy, um eco fantasma da energia que tomou conta do estádio horas antes. O hotel era uma bolha de silêncio opressivo depois daquela cacofonia gloriosa. Ele estava no seu quarto, desfazendo a mala, quando a batida na porta o fez estremecer.

Era Axl.

Ele estava parado no corredor, vestindo um roupão do hotel sobre uma calça de moletom. Seu cabelo ruivo, outrara uma juba selvagem, estava mais curto, dominado, com mechas de grisalho nos cantos das têmporas que iluminavam sua pele pálida. Os anos tiveram linhas cravadas mais profundas ao redor de sua boca e da testa, mapas de noites sem dormir e raivas não resolvidas. Mas seus olhos, aqueles olhos azuis que podiam queimar com fúria ou brilhar com uma intensidade quase sobrenatural, ainda eram os mesmos. Agora, porém, estavam sombrios, carregados de um cansaço que ia além do físico.

"Preciso falar com você", Axl disse, sua voz um pouco rouca do show.

Izzy concordou, afastando-se para deixá-lo entrar. O quarto era padrão, impessoal, mas o ar ficou instantaneamente carregado com a história que ambos carregavam.

Axl caminhou até a janela, olhando para as luzes da cidade lá embaixo. Suas mãos, famosas por seus gestos dramáticos no palco, estavam enfiadas nos bolsos do roupão, como se ele estivesse se segurando.

"Hoje à noite... foi estranho", Axl começou, sem se virar. "Foi como voltar no tempo. Mas ao mesmo tempo... não foi." Ele finalmente se virou, seus olhos percorrendo Izzy, da altura progressivamente maior (ou era postura?) ao corte prático de seu cabelo, à barba escura que delineava seu queixo. "Você é diferente."

"Eu estou eu", respondeu Izzy, sua voz grave soando calma no quarto silencioso.

"Sim." A frase foi uma admissão. Axl balançou a cabeça, uma expressão de perplexidade em seu rosto. "Eu... eu nunca vou entender completamente, Iz. Tudo isso. A transição... a palavra tão estranha na minha boca." Ele fez uma pausa, procurando as palavras. "Na minha cabeça, por todos esses anos, você era... você era a Izzy que partiu. A mulher que eu amei e que, do meu ponto de vista, me abandonou por uma crise que eu não consegui compreender."

Izzy permaneceu em silêncio, permitindo que ele falasse. Era isso que Axl sempre precisara – uma audiência,um canal para o furacão interno.

"Ver você hoje no palco... homem... foi como se a pessoa que eu esperava ver teve morrido. E no lugar dela... está você." Ele disse a última palavra não com desdém, mas com uma acessibilidade resignada. "E o mais estranho é que... a música ainda está lá. A sua essência na guitarra... ainda é a mesma. Isso me confunde mais do que tudo."

Ele deu um passo à frente, sua expressão séria.

"Conte-me. Por favor. Apenas... conte-me. O que eu não vi? O que estava acontecendo com você quando ainda estávamos juntos?"

E então, sob a luz fraca do quarto de hotel, com a cidade de Los Angeles testemunhando do lado de fora, Izzy contornou. Desta vez, não foi o relato clínico que dera ao Dr. Evans. Foi a história dele e de Axl. Ele falou da agonia de ser beijada e chamado de 'linda' quando por dentro ele se sentiu um homem. Falou do desespero por trás das fotos da Rolling Stone, um grito sombrio que Axl interpretou como provocação. Falou do peso insuportável de viver uma mentira 24 horas por dia, sob os holofotes mais brutais do mundo.

Ele falou, e Axl ouviu. Não interrompi. Apenas conseguiu, seu rosto uma máscara em transformação lenta, da confusão para uma compreensão dolorosa, e finalmente, para uma tristeza profunda e ossuda.

Quando Izzy terminou, o silêncio que se seguiu foi diferente. Era o silêncio de um véu sendo levantado.

"Meu Deus, Izzy", Axl sussurrou, sua voz completamente quebrada. Ele passou uma mão pelo rosto, e Izzy viu, com um choque, o brilho das lágrimas em seus olhos. "Eu... eu te machuquei tanto. E eu nem... eu nem sabia. Eu só via você se afastando e puxava você com mais força para perto, como um idiota."

"Você não sabia", disse Izzy, e era a verdade. "Como poderia? Eu não sabia como te dizer. E o mundo... o mundo não era um lugar para essa conversa naquela época."

Axl balançou a cabeça, uma lágrima escapando e rolando por sua bochecha. Ele ficou enxugado de raiva, pois se envergonhava da mostra de vulnerabilidade.

"Toda essa raiva que eu carreguei todos esses anos...", ele disse, olhando para as próprias mãos. "Era por uma pessoa que nunca existiu. Eu estava com raiva de um fantasma."

Ele esconde os olhos, e o olhar que encontrou o de Izzy foi limpo de raiva pela primeira vez em mais de uma década. Havia apenas uma dor imensa e um arrependimento.

"Eu sinto muito, Iz", a voz de Axl era um fio de som. "Eu sinto muito por não ter visto. Por não ter entendido. Por ter sido... eu."

Izzy sentiu seu próprio peito pressionado. Ele não esperava um pedido de desculpas. Nunca. Aquilo era... inesperado.

"Não há perdão que apague o passado, Axl", disse Izzy gentilmente. "Mas obrigado por você finalmente estar me ouvindo. De verdade."

Axl concordou, engolindo em seco.Ele se virou e caminhou em direção à porta, parando na soleira.

"O show de amanhã...", ele disse, sem se virar. "Vai ser diferente. Agora que eu... agora que eu sei."

Ele saiu, fechando a porta suavemente atrás de si.

Izzy ficou sozinho no quarto, o coração batendo forte. Ele olhou para seu próprio reflexo na janela escura. O homem que olhou de volta era a soma de todas as suas batalhas, suas dores e suas vitórias. E pela primeira vez, ele sentiu que Axl, finalmente, também o via. Não como ele era, não como ele costumava ser, mas como ele se tornara. E naquele momento, isso era o mais próximo de paz que os dois jamais conheceriam.

O show da noite seguinte foi uma experiência transcendental. Algo havia mudado fundamentalmente no ar entre eles. Axl não evitou mais o olhar de Izzy. Pelo contrário, ele parecia procurá-lo, como se estivesse se reorientando, vendo pela vez a pessoa real que estava primeiro ali, no seu flanco direito, criando uma base sobre a qual sua voz poderia voar.

Durante "Sweet Child O' Mine", quando Axl virou e cantou a linha "She's got a smile that it looks to me..." seus olhos encontraram os de Izzy, e houve um entendimento silencioso. A música era a mesma, as palavras eram as mesmas, mas o significado havia se transformado. Já não era sobre uma mulher idealizada; era sobre uma memória, sobre o amor que existia, mesmo que baseado em uma incompreensão. Era um adeus, mas um adeus em paz.

A turnê prosseguiu, cidade após cidade, estádio após estádio. A imprensa e os fãs notaram a diferença. Chamaram de “a magia de volta”, “a energia renovada”. Eles atribuíram ao nostálgico reencontro da formação clássica. Só Izzy e Axl sabiam a verdade mais profunda. A magia não tinha shows; ela havia sido transformada. Purificada pelo fogo da verdade.

Nos bastidores, a dinâmica era diferente. Não eram mais os jovens selvagens de outrara, mas homens que atravessaram seus próprios infernos particulares. Slash e Duff, sempre mais perceptivos do que respeitam, respeitavam o espaço que se criava entre o vocalista e o guitarrista. Eles viam os olhares mais longos, os acenos de cabeça respeitosos, a ausência da tensão elétrica que costumavam emparelhar entre os dois.

Numa noite, após um show particularmente eletrizante em Nova York, o grupo estava em um bar tranquilo do hotel. A euforia do palco ainda os envolvia. Axl, com um copo de uísque na mão, mudou-se de Izzy, que observava o movimento da cidade pela janela.

"Pergunta de um milhão de dólares", Axl disse, sua voz um pouco rouca, mas sem a aspereza de antes. "Você se arrependeu? De tudo? Da fama, da banda... de nós?"

Izzy virou-se, olhando para o rosto marcado do homem que outrora fora o grande amor de sua vida. Ele viu as linhas de preocupação, os vestígios de velhas fúrias, mas também uma nova camada de resignação.

"Não", respondeu Izzy, sua voz grave soando condenada. "Não me arrependo. A música que fizemos... ela importou. Ela ainda importa." Ele fez uma pausa, escolhendo as palavras com cuidado. "E o nosso amor... ele foi real, Axl. Foi intenso e complicado e, às vezes, doloroso. Mas foi real. Só... não era sustentável. A base era de areia."

Axl concordou, olhando para o líquido âmbar em seu copo. "Areia movida", ele corrigiu, com um sorriso triste. "Mas puta que pariu, que viagem foi aquela, né?"

Izzy retribuiu o sorriso. "Foi sim."

Eles ficaram em silêncio por um momento, o som do trânsito lá fora preenchendo o espaço entre eles.

"E essa sua vida agora?", Axl perguntou, genuinamente curioso. "O Arizona... uma música solo... é o suficiente?"

Izzy surgiu no seu pequeno refúgio no deserto, na paz do silêncio, na liberdade de ser completamente si mesmo. Pensou na sua música, agora um reflexo honesto de sua alma, não um produto.

"É mais do que suficiente", ele disse. "É tudo."

Axl estudou seu rosto, e pareceu ver a verdade ali. Havia uma pontada de inveja em seus olhos, não maliciosa, mas daquela que sabe que nunca encontrará aquela mesma paz.

“A banda acaba em Los Angeles”, Axl disse, mudando de assunto. "O último show. Vai ser um circo."

"Sem sempre é", Izzy aleatória.

"Depois disso...", Axl hesitou. "O que você vai fazer?"

"Vou para casa. Voltar para o meu silêncio." Izzy olhou para Axl. "E você?"

Axl deu de ombros, um gesto familiar que parecia carregar o peso do mundo. "Não sei. Talvez... tente algo diferente. Algo mais quieto." Ele riu, um som sem humor. "Quem sabe?"

O último show em Los Angeles foi um evento épico. Quando as luzes se acenderam no final, com o público ainda gritando, os cinco membros se reuniram no centro do palco. Foi um momento raro, não coreografado. Slash, Duff, Steven, Axl e Izzy. Eles se olharam, e naquele olhar havia uma vida inteira de loucuras, glórias, brigas e, finalmente, uma compreensão tardia.

Axl surpreendeu a todos, incluindo Izzy, ao colocar um braço sobre seus ombros – não o abraço possessivo de outrora, mas um gesto de camaradagem, de respeito. Um flash infinito de câmeras capturou a imagem: os lendários Guns N' Roses, reunidos, com Izzy Stradlin, o homem, no centro, seu rosto sereno sob as luzes.

No camarim, enquanto todos comemoravam, Izzy começou a arrumar suas coisas com calma. Sua mala de guitarra estava pronta. Ele não transmitiu mais ao mundo de festas intermináveis ​​e dramas de bastidores.

Axl o vê se preparando para sair e se mudou.

"Então é isso?", ele perguntou.

"É isso", Izzy confirmou.

"Eu...", Axl começou, mas as palavras falharam. Em vez disso, ele estendeu a mão. "Obrigado, Iz. Por voltar. Por... por tudo."

Izzy abriu sua mão. A abertura foi firme, carregada de tudo o que não poderia ser aqui.

"Cuide-se, Axl."

"Você também."

E então Izzy saiu. Ele atravessou o corredor abarrotado, saiu pela porta dos fundos e entrou na noite de Los Angeles. Desta vez, não houve dor, nem lágrimas. Havia apenas uma sensação de conclusão.

Ele entrou em seu carro e seguiu em direção ao leste, em direção ao deserto, em direção ao seu silêncio. A estrada à frente era longa, mas ele a conhecia bem. Era a estrada para casa. Para si mesmo. E pela primeira vez, ele não estava fugindo de nada. Estava, simplesmente, indo para casa.

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Anos Depois -- 2010

Los Angeles respirava nostalgia naquela noite úmida de 2010. Izzy Stradlin estava na cidade por obrigações, uns papéis de direitos autorais que insistiam em mantê-lo amarrado a um passado que preferia esquecer. Seu refúgio era o Arizona, onde a poeira do deserto soterrou velhos fantasmas. Mas ali, no coração da Sunset Strip, os fantasmas sussurravam mais alto.

Foi numa banca de jornal que ele viu o anúncio: Axl Rose tocando no Whiskey a Go-Go. A velha boate onde tudo começara. O coração deu um salto, um reflexo antigo. A decisão de ir foi um impulso, uma rendição verdadeira parte de si que ainda se lembrava do gosto da fama e do caos.

Dentro do Whisky, o ar era espesso e familiar. Izzy se enfiou num canto escuro, sua silhueta transformada pelos anos – mais sólida, mais masculina, a barba escura e o cabelo curto sendo seu melhor disfarce. E então o palco se iluminou.

Axl Rose subiu, envolvido em sua aura de rockstar eterno. O cabelo ruivo-alaranjado, o cavanhaque icônico, os óculos escuros refletindo as luzes. Jeans azul escuro, jaqueta de couro, tênis escuros. Era ele, mas esculpido pelo tempo, carregando o peso das décadas nos ombros. Sua voz ecoou pela sala, mais grave, mais experiente, mas com a mesma ferocidade que Izzy lembrava.

Cada música era um soco. "You Could Be Mine", "Welcome to the Jungle"... e então "Paradise City". Axl cantou com uma intensidade visceral, seus olhos ocultos atrás dos óculos percorrendo a multidão anônima. Por um instante, pareceu olhar na direção de Izzy, mas foi apenas um acaso, um reflexo da luz. Ele não sabia. Não poderia saber.

O último acorde de "Paradise City" ainda ecoava nos ouvidos de Izzy Stradlin quando ele enfiou as mãos nos bolsos da jaqueta e saiu para a calçada da Whisky a Go-Go. A noite de Los Angeles, mais fria que a do Arizona, trouxe um rompimento imediato. Aquele lugar era um caldeirão de fantasmas, e ele precisava de espaço.

Afastou-se um pouco da porta, encostou-se na parede áspera do prédio e acendeu um cigarro. A brasa pontilhava a escuridão enquanto ele puxava a fumaça para dentro dos pulmões, tentando enganar os nervos. Seus olhos percorreram a fachada familiar da boate. 2001. A última vez que ele estivera aqui com a formação clássica. O som era mais pesado, as rugas mais profundas, mas a química... a química ainda estava lá, como um último suspiro de uma era dourada. Lembrou-se de Axl naquele palco, suado, com uma energia diferente de 2010 – mais próxima do furacão original, mas já mostrando as fissuras.

Enquanto ele mergulhava nessa memória, a porta do barco se abriu, vomitando luz, som e um pequeno séquito. No centro, envolvido por seguranças grandalhões, estava Axl Rose.

A adrenalina do show ainda estava nele. Ele usava jeans azul escuro, uma jaqueta de couro aberta sobre uma camiseta suada, e os óculos aviador, mesmo à noite. Seu cabelo ruivo-alaranjado estava um pouco despenteado pelo esforço. Ele ria de algo baixo, um som rouco, enquanto era conduzido em direção a um SUV preto e discretamente blindado que esperava na calçada.

Izzy congelou, o cigarro suspenso a meio caminho dos lábios. Ele estava na sombra, apenas um vulto fumando. Por um instante, achei que passaria desesperado.

Foi então que Axl, quase chegando ao carro, parou. Não de repente, mas com uma hesitação estranha. Como se um sexto sentido tivesse cortado a nuca dele. Ele se virou, lentamente, e seus óculos escuros, refletindo as luzes neon da Sunset Strip, apontaram diretamente para a silhueta encostada na parede.

A expressão de Axl era ilegível por trás dos óculos, mas sua postura mudou. A descontração pós-show evaporou, aumentou por uma tensão repentinamente. Seu queixo se atrai um pouco. Os seguranças, percebendo a mudança, ficaram mais alertas.

Os dois homens ficaram parados, separados por apenas alguns metros de calçada, mas por um abismo de vinte anos.

Axl não disse uma palavra. Não fez um gesto. Apenas ficou ali, apesar da figura que, ele sabia mesmo sem ver completamente o rosto, era Izzy Stradlin. Era uma percepção visceral, uma corrente elétrica que sempre existia entre eles, reconectando-se depois de uma década desligada.

Izzy, por sua vez, não conseguiu se mover. A fumaça do cigarro subia lentamente entre seus dedos, um véu frágil entre o presente e o passado. Ele via uma pergunta, muda mas gritante, na postura congelada de Axl.

É você?

Por que agora?

E então, muito lentamente, Axl gritou a mão e, com um gesto quieto, levou uma das seguranças que se aproximavam. Era um sinal. Um convite. Um desafio.

O silêncio entre eles era um ser vivo, pesado e pulsante. A fumaça do cigarro de Izzy subia em espirais preguiçosas, um contraste suave com a eletricidade estática que cortava o ar entre os dois homens.

Por trás dos óculos escuros, Axl não piscava. Seu rosto era uma máscara impenetrável, mas a abertura de seu queixo, a leve voltada para frente de seu corpo, tudo gritava um reconhecimento profundo e perturbado. Ele não precisa ver os detalhes — o corte de cabelo, a barba, a postura mais sólida. Ele sabia. Conhecia aquela energia como conhecia os demônios próprios.

Izzy, por sua vez, sentiu as pernas ficarem brigas. A memória de 2001, aquela turnê de reencontro composta de trégua tensa e olhares evitados, batida nele com força total. Era mais fácil aquelas graças raras e controladas. Isso era… selvagem. Imprevisto.

Finalmente, com uma lentidão que parecia durar uma era, a mão direita de Axl se moveu. Dois dedos tocaram a armação de seus óculos de aviador e os empurraram para a testa, revelando seus olhos.

Eram os mesmos olhos azuis que queimavam com o fogo interno de uma chuva, mas agora cercados por mapas de batalhas travadas — noites sem dormir, fúrias incontidas, desapontamentos profundos. E neles, agora, não havia raiva. Houve um choque tão profundo que beirava a vulnerabilidade.

“Strandlin?”

O nome saiu como um sopro rouco, quase engasgado pela incredulidade. Não era uma saudação. Era uma confirmação, uma pergunta jogada no universo como um desafio.

Izzy não soube o que dizer. “Axl” parecia pequeno demais. Um aceno de cabeça foi a única resposta que seu corpo paralisado permitiu.

As seguranças olharam de um para o outro, confusos. Eles protegeram Axl de fãs e paparazzi, não de fantasmas de um passado distante que surgiam da escuridão fumando cigarros.

Axl ignorou todos ao seu redor. Seu mundo tinha uma redução calçada e o homem diante dele.

“Céus, Izzy,” ele disse, em voz mais baixa agora, um fio de som carregado de uma emoção crua. “O que diabos você está fazendo aqui?”

Ele não esperou uma resposta. Seus olhos percorreram Izzy da cabeça aos pés, uma avaliação rápida e intensa, absorvendo as mudanças, os anos, a transformação silenciosa que ele só conheceu através de rumores distantes.

“Eu… passeando,” Izzy finalmente conseguiu falar, a voz saindo mais grave do que ele lembrava, e o som pareceu solidificar a realidade do momento. "Vi que você ia tocar. Resolvi dar uma olhada."

“Uma olhada,” Axl repetiu, um sorriso torto e amargo surgindo em seus lábios. “Depois de uma década enterrada no seu deserto, você decide 'dar uma olhada'.” Ele balançou a cabeça, como se tentasse decifrar um enigma impossível. "E aí? O que achou?"

A pergunta era sobre o show, mas o subtexto era sobre tudo. O que você achou de mim ver? Ainda me autorizo? Ainda sente algo?

Antes que Izzy pudesse formular qualquer resposta, Axl tomou uma decisão. Ele fez um gesto brusco com a cabeça para a segurança mais próxima.

“Dá um tempo.”

Ó segurança hesitou. "Sr. Rose..."

“Agora”, Axl cortou, sua voz recuperando um traço da velha autoridade, mas sem a fúria de outrara. Era uma ordem.

Relutantemente, as seguranças se afastaram alguns passos, dando-lhes um frágil círculo de privacidade na calçada movimentada.

Axl deu dois passos à frente, fechando a distância entre eles. O cheiro dele — suor de palco, couro envelhecido e o mesmo perfume amadeirado caro — invadiu os sentidos de Izzy como um furacão de memórias.

“Você parece…”, Axl começou, seus olhos escaneando o rosto de Izzy mais uma vez, procurando o garoto que ele conhecia sob as camadas do homem que estava ali. “Diferente.”

“Passou-se algum tempo, Rose”, respondeu Izzy, encontrando um fio de sua antiga firmeza.

“Não é isso,” Axl sussurrou, sua voz tão baixa que só Izzy podia ouvir. "É você. Finalmente." Ele fez uma pausa, e seus olhos encontraram os de Izzy com uma intensidade avassaladora. “É mesmo você, não é?”

Era a pergunta que sempre pairava entre eles, desde aquele primeiro suspiro de verdade anos atrás. E agora, na calçada do Whiskey a Go-Go, sob as luzes neons que testemunharam seu começo, ela finalmente foi feita.

A SUV preta esperava, sua porta ainda aberta, um convite para o mundo real. Mas ali, naquele pequeno espaço entre o passado e o presente, tudo parecia possível. O que aconteceria a seguir dependia da resposta que não fora dada com palavras, mas que pareava no ar, tão pesado e real quanto o próprio Axl Rose diante dele.

A pergunta de Axl pairou no ar, compartilhada por duas décadas de história não contada. "É mesmo você, não é?"

Izzy sentiu o peso daquelas palavras. Elas não eram sobre aparência, mas sobre essência. Sobre a alma que sempre existe, agora finalmente habitando o corpo certo. Ele segurou o olhar de Axl, aqueles olhos azuis que outrora só viam o que queriam ver, e agora enxergam através de todas as camadas.

"Sempre fui", respondeu Izzy, sua voz grave soando estranhamente calma no burburinho do Sunset Strip. "Só demorei pra chegar aqui."

Axl emitiu um som baixo, entre um riso e um suspiro. Seus olhos percorreram o rosto de Izzy mais uma vez, como se estivessem recompondo um quebra-cabeça familiar com peças rearranjadas.

“Porra, Izzy,” ele murmurou, balançando a cabeça. "Na boa? Você tá com uma cara de pau do caralho. Ainda mais do que nos velhos tempos."

Era um elogio torto, tipicamente Axl. Izzy sentiu o canto da boca se erguer levemente.

“Precisei desenvolver”, ele retrucou, tragando uma última vez no cigarro antes de apagá-lo na parede.

O silêncio caiu novamente, mas agora era diferente - menos carregado de choque, mais de curiosidade. Axl parecia hesitar, algo raro nele. Ele olhou para o SUV que esperava, depois de volta para Izzy.

"Onde você está hospedado?" uma pergunta surgiu abruptamente.

Izzy encolheu os ombros. "Num hotel perto do centro. Nada chique."

“Merda de lugar,” Axl resmungou. Ele pareceu lutar mesmo por um momento, seus dedos batendo uma batida nervosa na própria coxa. "Olha... você tem carro aqui?"

"Aluguei hum."

“Então me segue,” Axl disse, uma decisão tomada com sua característica impulsividade. "Vamos dar uma volta. Conversar. Esse lugar..." ele gesticulou em direção à boate, "...tá cheio de fantasmas."

Izzy arqueou uma sobrancelha. "Seguir você pra onde, exatamente?"

“Só dirija”, respondeu Axl, um brilho familiar de teimosia nos olhos. "Pelo amor de Deus, Izzy. São dez anos. Você some, se transforma num... numa lenda do deserto, e aparece do nada na minha calçada. A gente não vai resolver isso em cinco minutos na frente da porra do Whisky."

Era uma armadilha. Izzy sabia. Cada minuto com Axl Rose era uma armadilha perigosamente sedutora. Mas uma curiosidade - e aquela parte dele que nunca conseguiu realmente se libertar do homem - falou mais alto.

"Tá bom," Izzy chegou, sentindo a loucura da decisão em suas veias. "Te sigo."

Um sorriso rápido, quase triunfante, cruzou o rosto de Axl antes que ele pudesse escondê-lo. Ele acenou para a segurança.

"Encontramos no Point Dume. Deem meia hora."

O chefe de segurança pareceu horrorizado. "Sr. Rose, o protocolo..."

"Foda-se o protocolo!" Axl Cortou, já está virando. "É o Stradlin. Não é uma Madonna." Ele jogou um último olhar para Izzy. "Consegue manter o ritmo?"

“Consigo te acompanhar desde sempre, Rose”, respondeu Izzy, um eco de sua antiga personalidade surgindo naturalmente.

Axl riu, um som genuíno e original, e se tornou seu SUV. Izzy observou ele entrar, seu coração batendo em ritmo acelerado. Isto era uma loucura. Perigoso. E, uma parte dele admitida, surpreendentemente excitante.

Ele entrou em seu carro comercial comum, com mãos firmes no volante. Quando um SUV preta de Axl saiu do meio-fio, Izzy engatou a marcha e batidas, dois fantasmas do rock and roll refizendo seu velho ritual de perseguição pelas estradas de Los Angeles, levando consigo o peso de tudo que não fora aqui e a promessa perigosa de tudo que poderia ser.

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Um SUV preto de Axl deslizou pelo trânsito noturno de Los Angeles como um tubarão em águas familiares. Izzy seguiu, mantendo uma distância segura, as mãos firmes no volante do carro oferecido. Era uma cena surreal - ele, que trocou a fama pelo anonimato do Arizona, agora acompanhando Axl Rose em uma carreata noturna pelas mesmas ruas que outrora percorreram como reis.

Axl não dirigiu para o Point Dume. Pelo menos não diretamente. Ele pegou a Pacific Coast Highway, e a cidade foi dando lugar ao oceano escuro à sua direita. A Lua pintava uma trilha prateada sobre as águas. Era um caminho que ambos conheciam bem - a rota para as praias e penhascos onde, em outra vida, fugiam das pressões da fama, das brigas, de tudo.

Após cerca de vinte minutos, um SUV sinalizou e entrou em um mirante deserto. Um lugar que não existia nos mapas turísticos, um pedaço de terra à beira do penhasco que eles descobriram nos anos 80. O lugar onde, uma vez, Izzy contou a Axl sobre sua primeira guitarra.

Izzy estacionou ao lado do SUV. O ar salgado do mar invadiu o carro quando ele abriu a porta. Axl já estava fora, encostado no capô dianteiro do veículo, olhando para o oceano. Ele havia tirado a jaqueta de couro, e a brisa noturna moldava a camiseta suada contra seu torso.

“Pensei que estávamos pro Point Dume”, disse Izzy, fechando a porta do carro.

Axl se virou, seu rosto iluminado apenas pela luz fraca das estrelas e pelo brilho distante da cidade atrás deles. "Mudei de ideia. Esse lugar é melhor. Sem... gente."

Ele tirou um maço de cigarros do bolso do jeans e ofereceu um a Izzy. Um gesto antigo, um ritual.

Izzy aceitou, e por um momento, as mãos deles se tocaram. Um choque sutil, um eco de toques incontáveis ​​do passado. Axl não suspendeu a mão imediatamente. Seus olhos encontraram os de Izzy no escuro.

"Por que agora, Izzy?" a pergunta saiu suave, sem a fúria de antes, apenas uma curiosidade profunda e cansada. "Depois de todos esses anos. Por que voltar? Por que me procurar?"

“Eu não te procurei, Axl,” Izzy corrigiu, acendendo o cigarro. O isqueiro iluminou brevemente seus rostos. "Foi um acaso. Eu vim resolver uns papéis."

"Coincidência do caralho", Axl riu baixo, acendendo seu próprio cigarro. "Nada na nossa vida nunca foi por acaso, e você sabe disso."

Ele deu uma tragada longa, a fumaça se misturando à névoa noturna que subia do oceano.

"Eu ouvi coisas sobre você, sabia?" Axl contínuo, seus olhos fixos no horizonte escuro. "Rumores. Que você tinha sumido de vez. Que estava vivendo como uma eremita no meio do nada. Que... que tinha mudado." Ele fez uma pausa significativa. "Mas ver é diferente de ouvir."

Izzy ficou em silêncio, deixando Axl processando.

“É estranho”, Axl murmurou, quase para si mesmo. "Eu olho pra você e... a essência é a mesma. Ainda é o mesmo maldito Stradlin teimoso e quieto que eu conheci. Mas o pacote... o pacote é diferente." Ele finalmente olhou para Izzy. "Funcionou? Uma... mudança? Você tá... bem?"

A pergunta era sincera. Havia uma preocupação lá, por baixo de toda a confusão e arrogância.

Izzy sentiu algo dentro dele ceder. "Funcionou, Axl. Estou bem. Melhor do que nunca estive."

Axl concordou lentamente, como se assimilasse a informação. "Bom. Isso é... bom." Ele jogou a ponta do cigarro no chão e esmagou-a com o pé. "Eu sempre pensei que tinha alguma coisa errada, sabia? Na época, eu só não consegui botar o dedo no que era. Pensei que era droga, ou depressão, ou que você tinha metido o pé porque me odiava." Ele deu uma risada amarga. "Agora faz um puta sentido."

Ele se afastou do carro e foi até a beirada do penhasco, olhando para as ondas quebrando lá embaixo.

"Foi difícil?" a pergunta veio baixa, informações pelo vento.

“Foi a coisa mais difícil que já fiz”, respondeu Izzy, juntando-se a ele. "E a mais necessidade."

Eles ficaram em silêncio por um tempo, apenas dois homens de meia-idade à beira de um penhasco, ouvindo o som do oceano, carregando o peso de uma história compartilhada.

“Eu sinto muito,” Axl disse de repente, sua voz quase sussurrada. "Por não ter entendido. Por ter sido um babaca. Por... tudo."

Izzy olhou para o perfil de Axl iluminado pela Lua. Foi a primeira vez em trinta anos que ele ouvia Axl Rose pedindo desculpas de verdade, sem reservas, sem justificativas.

“Já era, Axl,” ele disse suavemente. "A gente era jovem e estúpido. E o mundo era diferente."

“Eu ainda sou um babaca, na maioria das vezes”, Axl admitiu, um sorriso torto em seus lábios. "Mas pelo menos agora eu sei porque você realmente foi embora." Ele se virou para enfrentar Izzy. "E eu... eu estou feliz por você. Na verdade. Parece que você finalmente se encontrou."

As palavras eram simples, mas para Izzy, vindas daquele homem complicado e orgulhoso, soavam como uma absolvição final.

"E você, Axl?" Izzy disse. "Se encontrou?"

Axl olhou para o oceano por um longo momento antes de responder.

“Às vezes acho que tô mais perdido do que nunca”, ele confessou, sua voz contém de uma rara vulnerabilidade. "Mas a música ainda tá lá. Ainda é a única coisa que faz sentido."

Ele olhou para Izzy, e no escuro, seus olhos brilharam com uma mistura de saudade e acessíveis.

"É bom te ver, Izzy. É bom te ver bem."

E naquele mirante à beira do mar, sob as mesmas estrelas que testemunharam seu começo, os dois homens finalmente encontraram uma paz que a fama, o dinheiro e a juventude nunca lhes ensinaram dado. O passado não foi resolvido, mas foi, finalmente, em paz.

A brisa do oceano ficou mais fria, e Izzy sentiu o peso da noite em seus ossos. Aquele momento de paz era precioso, mas frágil. Como tudo com Axl, ele sabia que não poderia durar.

“Preciso ir, Axl,” Izzy disse, sua voz soando suave mas firme no escuro. "Amanhã cedo tenho que resolver esses papéis e pegar o vôo de volta."

Axl virou-se para ele rapidamente, a vulnerabilidade do momento anterior dando lugar a uma centelha familiar de teimosia.

"Já? Porra, Izzy, faz uma década!" Ele correu uma mão pelo cabelo, agitado. "Olha, vamos pra minha casa. Só por umas horas. Tem um bar decente, umas memorabilia... a gente pode tomar um uísque, botar o papo em dia *de verdade*. Sem essa pressa."

Izzy hesitou. A armadilha se fecha. A casa de Axl não era apenas um lugar - era um covil de memórias, um território perigoso.

"Axl..."

"Por favor." A palavra saiu baixa, quase engasgada. Axl relatou a pedia. Geralmente, sugestões. "Só um drink. Pra celebrar... sei lá. Você estar bem. A gente não se matar depois de todo esse tempo."

Seus olhos no escuro suplicavam, e Izzy sentia sua resistência minguar. Era uma loucura. Era perigoso. Mas a parte dele que ainda carregava o fantasma do que eles não conseguiam dizer não.

"Um drink," Izzy descobriu, sentindo o coração acelerar. "Só hum."

Um sorriso rápido e vitorioso iluminando o rosto de Axl. "É isso aí. Me segue."

A viagem até a casa de Axl em Malibu foi um contraste surreal com a tranquilidade do mirante. A SUV preta avançava com determinação, e Izzy seguia, cada curva na estrada familiar como uma fachada de saudade.

A casa não era mais a mansão opulenta dos anos 90, mas ainda era impressionante - moderna, de concreto e vidro, aninhada no penhasco com vista para o oceano. Mais sóbria, mas ainda inconfundivelmente dele.

Ao entrar, o cheiro era diferente - menos festa, mais luxo solitário. Madeira polida, couro e um leve aroma de maresia. Axl jogou como chaves em uma mesa de entrada de mármore.

"Lembra do primeiro ísque decente que a gente roubou com o adiantamento da gravadora?" Axl disse, indo direto para um bar embutido iluminado.

"Lembro. Você derramou metade no tapete do hotel", respondeu Izzy, os cantos dos olhos enrugando em um quase-sorriso.

Axl riu, um som genuíno que ecoou na sala vasta. "Porra, era isso mesmo." Ele pegou uma garrafa de um single malt caro e encheu dois copos baixos, sem cerimônia. "Aqui."

Ele entregou um copo para Izzy, seus dedos se encontrando brevemente no cristal. O toque foi quente, um choque elétrico que percorreu o braço de Izzy.

“Saúde”, disse Axl, erguendo seu copo, seus olhos fixos em Izzy sobre a borda. "Aos fantasmas... e aos que finalmente encontrei paz."

"Saúde," Izzy ecoou, sua voz um pouco rouca.

O uísque era suave e defumado, queimando de maneira agradável em seu peito. Eles ficaram em pé ali, no meio da sala de estar gigante, cercados por lembranças de uma vida que Izzy havia deixado para trás - guitarras em estandes, discos de ouro, fotos com molduras caras.

“É estranho,” Axl murmurou, olhando para Izzy. "Ver você aqui. Nessa casa. Dessa... nova maneira."

Izzy sentiu o ar ficar pesado novamente. O "um drink" estava se tornando algo mais, a linha entre passado e presente se desfazendo com cada gole.

“Axl...” Izzy começou, um último aviso.

“Eu sei, eu sei”, Axl interrompeu, colocando seu copo vazio na mesa com um clique decisivo. Ele fechou a distância entre eles, parando a apenas alguns centímetros de Izzy. Seu olhar era intenso, implorando. "Só me deixa olhar. Só por um minuto."

Antes que Izzy pudesse responder, a mão de Axl alegre-se, hesitante. Seus dedos tocaram a barba de Izzy, um contato leve como uma pena, mas que se sentiu como um raio.

“Porra, Izzy,” Axl sussurrou, sua voz embargada. "É realmente você."

E então, sem aviso, ele se inclinou e capturou os lábios de Izzy em um beijo.

Não foi gentil ou hesitante. Foi faminto, desesperado, carregado de duas décadas de tão solidão, raiva e uma saudade profunda que fazia. Era o gosto do uísque, do sal do mar e de tudo que não fora aqui.

Por um instante que pareceu uma eternidade, Izzy ficou paralisado. E então, com um gemido baixo que foi tanto de rendição quanto de derrota, ele respondeu.

Sua mão entrelaçou-se nos cabelos de Axl, puxando-o mais perto. O copo caiu de sua outra mão, o uísque manchando o carpete caro, mas nenhum deles se importou.

Era um caos familiar, um fogo que nunca se apagou, apenas adormeceu. E agora, na casa silenciosa em Malibu, com o som das ondas como testemunha, ele queimou mais forte do que nunca. O passado não estava apenas vivo - ele estava os devorando vivos, e nesta noite, nem um deles tinha forças para lutar contra ele.

O beijo era um redemoinho, um furacão de décadas de sentimentos reprimidos. O gosto de uísque e sal era o mesmo de sempre, mas tudo ao redor era diferente. A textura da barba de Izzy contra a pele de Axl, a sensação de seus ombros mais largos sob as mãos, a forma como ele agora se inclinava suavemente para baixo para alcançá-lo – cada detalhe era um contraste gritante com as memórias que Axl carregava.

Foi Izzy quem cortejou o beijo, afastando-se com um suspiro ofegante. Seu peito subia e descia rapidamente, seus lábios estavam vermelhos e seus olhos, cheios de uma tempestade de conflito, procuravam os de Axl na penumbra da sala.

"Axl... para," ele sussurrou, a voz rouca.

Mas Axl não queria parar. Seus olhos estavam vidrados, embaçados pelo desejo e pela confusão. Ele se moveu para frente novamente, tentando capturar os lábios de Izzy mais uma vez, suas mãos agarrando os quadris dele com uma familiaridade que doía.

"Izzy... por favor..."

Izzy colocou as mãos no peito de Axl, segurando-o firme, criando uma distância de centímetros que parecia um abismo.

"Não, Axl. Espera." A respiração de Izzy estava pesada. Ele encontrou as palavras no turbilhão de sua mente. "O que... o que é isso? O que você está fazendo?"

“Eu te quero”, Axl respondeu, simplesmente, cruamente, como se fosse a verdade mais óbvia do mundo.

Izzy balançou a cabeça, uma dor profunda em seu olhar. "Olha para mim, Axl. Olha para mim." Sua voz era firme agora. "Eu não sou a mesma pessoa. Não sou a 'garota' que você beijava nos anos 80. Sou um homem."

"Eu sei!" A resposta de Axl saiu como um latido, contendo de frustração. "Porra, Izzy, eu sei. Eu tenho olhos."

"Então o que isso significa?" A pergunta de Izzy ecoou na sala silenciosa. "Você... gosta de homens agora, é isso? Dez anos sem me ver, eu apareço como... isso... e você me joga no sofá como se nada tivesse mudado?"

Axl pareceu parar, a fúria dando lugar a uma confusão mais profunda. Ele recuou um passo, passando uma mão pelo rosto.

"Eu não... eu não sei o que isso significa", ele admitiu, sua voz mais baixa. "Só sei que é você. É sempre você, porra. Sempre foi."

"Isso não é uma resposta!" Izzy insistiu, sua própria confusão transbordando. "Por trinta anos, você só se envolveu com mulheres. Só mulheres. E agora... isso? O que mudou, Axl? É só a nostalgia falando mais alto? É o fantasma do que a gente foi? Porque eu não sou mais um fantasma. Eu sou real. E eu preciso saber se você está me beijando porque finalmente me vê, ou só porque seu orgulho não aguenta a ideia de que a única pessoa que você nunca conseguiu controlar agora é alguém que você nem sabe se deveria querer."

As palavras saíram como um dilúvio, cada uma uma fachada na fachada que ambos mantinham.

Axl ficou parado, apesar de Izzy, sua respiração ainda ofegante. Uma pergunta simples – "Você gosta de homens?" – parecia ecoar na vasta sala, uma pergunta que ele nunca havia se feito, ou se fez e enterrou profundamente.

"Eu não sei", ele repetiu, sua voz um fio de som. Ele olhou para as próprias mãos, como se elas pudessem ter uma resposta. "Eu só sei que... quando eu te vi naquela calçada... foi como... como encontrar uma parte de mim que estava faltando. E essa parte... essa parte agora tem uma barba e uma voz mais grossa. E eu não sei o que fazer com isso, mas eu também não consigo parar de querer."

Ele extraiu os olhos, e a vulnerabilidade neles era quase assustadora.

"É você, Izzy. Em qualquer corpo. Em qualquer forma. É sempre você. E isso me assusta mais do que qualquer outra porra nesse mundo."

A confissão pairou no ar, crua e não polida. Não foi uma resposta, foi um desabafo. Era a admissão de que, para Axl Rose, algumas conexões eram tão profundas que transcendiam o gênero,identidade e o próprio entendimento.

Izzy ficou imóvel, as palavras de Axl ecoando em seu ser. Não era a resposta clara que ele procurava, mas era, talvez, a única resposta verdadeira que Axl era capaz de dar.

E no silêncio pesado que se seguiu, a linha entre o passado e o presente não apenas se desfez – ela se tornou irrelevante. O que importava era aquele momento, aquela confissão desesperada, e a pergunta que agora emparelhava entre eles: o que eles fariam com essa verdade complicada e avassaladora?

A confissão de Axl ecoou na sala silenciosa, uma verdade desgrenhada e assustadora emparelhando no ar entre eles. É sempre você. A simplicidade brutal daquela frase desarmou Izzy mais do que qualquer explicação complexa poderia ter feito.

Ele olhou para Axl – realmente olhou. Viu o homem de 48 anos, não é uma lenda. Viu uma confusão genuína em seus olhos, uma vulnerabilidade que ele tão raramente permitia que alguém visse. Viu as linhas de uma vida de excessos e solidão ao redor de sua boca. E viu, também, o desejo cru e incontestável que ainda queimava por baixo de tudo.

Izzy soltou um suspiro longo e trêmulo. A resistência dentro dele começou a ceder, não por fraqueza, mas por uma compreensão profunda. Ele também sentiu aquilo. A atração que sempre existia entre eles era uma força primal, uma atração que funcionava além da lógica, do gênero, do tempo.

“Eu também não sei o que isso significa, Axl,” Izzy admitiu, sua voz um sussurro rouco. "E isso me assusta tanto quanto você."

Ele deu um passo à frente, fechando a distância que havia criado. Sua mão extraordinariamente-se, espelhando o gesto de Axl de momentos anteriores. Seus dedos tocaram o cavanhaque ruivo, sentindo a textura áspera sob sua pele.

“Mas eu também sei que é você,” Izzy continuou, seus olhos presos nos de Axl. "Sempre foi. E talvez... talvez a gente nunca vá entender. Talvez não precise entender."

Axl prendeu a respiração quando os dedos de Izzy tocaram seu rosto. Seus olhos se fecharam por um segundo, um suspiro de alívio escapando de seus lábios. Quando os abrimos novamente, uma tempestade de confusão havia dado lugar a uma determinação quieta.

“Então para tentar entender,” Axl sussurrou, sua voz falou sobre uma intensidade avassaladora. "Só... sente."

Desta vez, quando ele se inclinou, não houve hesitação. O beijo foi uma questão de discussão e confirmação. Menos desesperado que antes, mas infinitamente mais profundo. As mãos de Axl encontraram o rosto de Izzy, puxando-o para perto, enquanto os braços de Izzy envolveram o torso de Axl, sentindo os músculos firmes sob a camiseta.

Era diferente. Tão diferente. A sensação de uma barba contra outro, a textura de um corpo masculino sólido contra o outro, a maneira como eles se encaixavam – era uma nova geografia de uma terra antiga. E ainda assim, no meio de toda a novidade, o núcleo era o mesmo. A química inegável,a paixão tempestuosa, a sensação de estar em casa.

Eles se moveram em direção ao sofá grande, tropeçando em seus próprios pés, rindo baixo entre um beijo e outro – um som raro e precioso. Quando caiu no sofá de couro, Axl por cima de Izzy, ele parou por um momento, seus olhos escaneando o rosto debaixo dele.

"Porra, Izzy Stradlin", ele murmurou, um sorriso de incredulidade maravilhada em seus lábios. "Quem diria, hein?"

Izzy respondeu puxando-o para outro beijo, mais lento agora, mais exploratório. Suas mãos deslizaram por baixo da camiseta de Axl, encontrando a pele quente das costas, sentindo as velhas cicatrizes e a nova tensão muscular. Era uma redescoberta, uma reaprendizagem de um corpo que ele conhecia em uma versão diferente.

Axl, por sua vez, parecia fascinado pelas mudanças. Suas mãos percorreram os ombros mais largos de Izzy, o torso plano e definido, a textura da barba em seu pescoço. Cada toque era uma pergunta silenciosa, e cada suspiro de Izzy era uma resposta.

E naquela noite, na casa silenciosa em Malibu, eles não eram dois rockstars envelhecidos presos no passado. Eram simplesmente dois homens redescobrindo uma conexão que o tempo e a transformação não poderiam erradicar. As perguntas ainda estavam lá, emparelhando no ar como fumaça. O amanhecer trará consequências e uma realidade complexa.

Mas por aquelas horas, sob o céu estrelado que testemunhara toda a sua história, a única coisa que importava era a verdade simples e avassaladora que Axl havia pronunciado: É sempre você. E naquele momento, para ambos, isso era mais do que suficiente.

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O caminho até o quarto foi um borrão de portas e corredores, suas mãos entrelaçadas como uma âncora em meio à tempestade de nervos que assolava Izzy. Quando a porta do quarto principal se fechou com um clique suave, o mundo exterior cessou de existir. A realidade do que estava prestes a acontecer foi um golpe ou Izzy com força total, fazendo seu estômago embralhar.

Axl o deixou para outro beijo, profundo e possessivo, mas Izzy colocou as mãos no peito sólido do vocalista, criando um centímetro de distância que parecia um abismo.

"Espera", a voz de Izzy saiu com um sussurro rouco, carregado de uma vulnerabilidade que ele não permitia que ninguém visse há anos. Seu coração martelava contra as costelas. "Axl... eu preciso que você saiba. Antes que... antes que a gente vá mais longe."

Axl parou instantaneamente, seus olhos intensos, agora adaptados ao escuro, buscando os de Izzy. "O que é?"

Izzy engoliu seco, sentindo as palavras queimadas em sua garganta. "Eu... não fiz todas as cirurgias. Não lá embaixo." A confissão saiu em um fluxo apressado, como se fosse perigosa. "Tirei os seios. Tomei testosterona por anos. Minha voz, meu corpo... mudou. Mas... eu ainda tenho... a mesma anatomia de sempre."

O silêncio que se seguiu foi espesso e pesado. Izzy conseguiu quase ouvir os pensamentos de Axl girando em sua cabeça – a confusão, o processamento, a luta interna contra uma vida inteira de especificidades e identidades rigidamente definidas.

"Pare." A voz de Axl saiu rouca, mas inesperadamente suave. Ele estendeu a mão e tocou o rosto de Izzy, seus dedos poeirentos de suor traçando a linha angular de sua mandíbula, a textura de sua barba. "Você acha que eu estou aqui porque você tem ou não tem lá embaixo?" Sua mão desceu, palmando o peito liso e musculoso de Izzy através da camiseta, sentindo as costelas e os músculos definidos. "Eu te quero. Tudo. Do jeito que você é. Do jeito que você escolheu ser."

As palavras foram um bálsamo que acalmou uma ferida antiga. Um suspiro trêmulo escapou de Izzy, e então, ele se rendeu.

Desta vez, quando seus lábios se encontraram, não havia mais barreiras. Era um beijo de fome acumulada, de décadas de saudade. As mãos de Axl encontraram a barra da camiseta preta de Izzy e a puxaram para cima, sobre sua cabeça. O ar frio do quarto atingiu a pele nua de Izzy, fazendo-o estremecer. Ele fez o mesmo com a camiseta suada de Axl, revelando o torso pálido e familiar, agora mais largo, marcado pelo tempo, mas ainda assim inconfundivelmente Axl.

Os dedos de Axl percorreram o torso de Izzy com uma reverência que partiu seu coração. Ele tocou os músculos definidos do abdômen, os braços fortes de anos segurando uma guitarra, os ombros que agora carregavam sua verdade com orgulho. E então, seus dedos encontraram as cicatrizes. Linhas horizontais, limpas e discretas, onde outrara havia seios. Axl não hesitou. Ele se curvou e pressionou os lábios contra uma delas, um beijo suave e demorado, não de pena, mas de profundo respeito. Seus lábios então subiram, encontrando um mamilo, que a testosterona havia tornado mais sensível. Ele o lambeu, depois o chupou com devoção, e um gemido baixo e surpreso escapou de Izzy. Era um toque que ele nunca permitiu que ninguém explorasse, e agora, nas mãos – e na boca – de Axl, sentiu-se não como uma violação, mas como uma cura.

Axl desceu, sua boca um rastro de fogo pela pele de Izzy. Beijou seu estômago contraído, a curva de seus quadris, a virilha. Ele não evitou nada, não hesitou. Quando seus lábios encontraram aquele ponto íntimo, agora diferente, aumentado e sensível pela testosterona, Izzy arqueou as costas da cama com um grito abafado.

"Deus, Axl..." sua voz estava quebrada, as mãos se enterrando nos cabelos ruivos e suaves de Axl.

Axl não tinha pressa. Ele explorou com a língua, lenta e metodologicamente, aprendendo uma nova geografia do prazer de Izzy. A sensibilidade era diferente – mais intensa, mais focada, respondendo a cada movimento circular e sugado de sua língua de uma forma que era ao mesmo tempo nova e profundamente familiar. Ele sentiu o corpo de Izzy tremer incontrolavelmente sob sua boca, uma série de gemos e suspiros sendo arrancados dele a cada nova descoberta.

Quando Axl inseriu o primeiro dedo, lubrificado e infinitamente cuidadoso, Izzy sentiu todos os músculos do seu corpo tensionados. Era o momento da verdade.

“Relaxa, amor”, a voz de Axl soou abafada contra sua coxa, uma sugestão áspero que era ao mesmo tempo uma ordem e uma súplica. "Eu te conheço. Lembro como você gosta."

E era verdade. Seus dedos trabalharam com uma paciência que ninguém no mundo exterior associaria a Axl Rose. Ele massageou, abrindo-o com uma delicadeza que fazia os olhos de Izzy marejarem. E então, ele encontrou. Aquele ponto interno, a próstata, agora o centro nervoso de todo o seu prazer. Quando Axl pressionou suavemente contra ele, uma corrente elétrica percorreu a espinha de Izzy.

"Mais..." Izzy falou, sua voz uma coisa rouca e desconhecida, suas quadris se erguendo do colchão involuntariamente. "Por favor, mais..."

Axl acrescentou um segundo dedo, acompanhando e apresentando seus movimentos precisos e experientes. Ele beijou a coxa interna de Izzy enquanto trabalhava, seus dedos encontrando um ritmo que fazia Izzy perder a noção de tudo, exceto aquela sensação avassaladora que se acumulava em seu núcleo.

Quando Axl se posicionou entre suas pernas, seus olhos encontraram os de Izzy no escuro. Havia uma pergunta silenciosa neles.

"Sim," Izzy sussurrou, sua voz trêmula mas certa. "Por favor."

A expansão foi lenta, gradual, uma tradição que fez Izzy prender a respiração. Era como voltar para casa depois de uma longa e exaustiva guerra. A sensação de ser preenchida, a profundidade, a maneira como seus corpos se encaixavam – era fundamentalmente a mesma, mas reverberava de uma forma nova e poderosa em seu corpo transformado.

"Você tá tão bom," Axl rosnou no ouvido de Izzy, sua voz um som grave e visceral que ecoou em seus ossos. Suas quadris começaram a se mover, encontrando um ritmo ancestral que ambos conheciam de cor, mas que agora carregava o peso de toda a sua história transformada. "Sempre você... sempre..."

Axl alcançou entre seus corpos suados, sua mão grande e familiar envolvendo o clitóris ereto e sensível de Izzy. Ele começou a masturbá-lo em perfeita sincronia com as investidas profundas de suas quadris. A combinação da estimulação interna, que atingia sua elasticidade com uma precisão devastadora, e a fricção externa, rápida e insistente, foi demais para Izzy suportar. Suas gemas se tornaram mais altas, mais desesperadoras, cada um um reconhecimento do prazer que o consumia.

“Vem comigo,” Axl tentou, sua voz um comando suave mas inquestionável perto de seus lábios. "Quero te ver gozar. Quero sentir."

Foi uma gota d'água. O orgasmo atingiu Izzy não como uma onda, mas como um terremoto, violento e total, arrancando-lhe um grito prolongado do nome de Axl enquanto seu corpo era sacudido por violentas contrações. A sensação de se esvaziar, de se tornar completamente, foi tão intensamente prazerosa quanto libertadora. Sentir o corpo de Izzy se contrair ao seu redor fez Axl seguir logo atrás, seu próprio orgasmo chegando com um gemido rouco e profundo, seu rosto enterrado no pescoço suado de Izzy, seu corpo tremendo contra o dele.

O silêncio que se separou foi quebrado apenas pelo som ofegante de sua respiração tentando voltar ao normal. Axl não se moveu, não se aposentou. Ele deixou sobre Izzy, dentro dele, seu peso uma ansiedade quente e reconfortante. Sua mão levantou e tirou os cabelos negros e molhados da testa de Izzy.

"Viú?" Axl sussurrou, sua voz um fio de som cansado e satisfeito, seus lábios tocando os de Izzy em um beijo suave e pós-sexo. "Ainda é você. Sempre você."

E deitado ali, envolto no calor e no cheiro do homem que sempre ocupou seu coração, Izzy Stradlin finalmente, completamente, acreditei. Não era sobre o corpo que ele tinha ou não tinha. Era sobre a pessoa que ele era. E essa pessoa – forte, transformada, verdadeira – era amada, era desejada, e era, finalmente, completamente vista.

O peso de Axl era uma âncora quente e familiar, um fardo que Izzy carregava com um prazer resignado há mais de trinta anos. A respiração do vocalista, ainda ofegante, era um sopro quente contra seu pescoço. Ele sentiu as batidas aceleradas do coração de Axl contra seu próprio peito, um tambor sincronizado com o seu. O cheiro deles estava misturado – suor, sexo, o perfume amadeirado de Axl e o aroma terroso e simples que era apenas Izzy.

Axl não se mexia. Parecia preso no momento, seu corpo relaxado, mas ainda profundamente conectado ao de Izzy. Sua mão, que antes agarrava com força, agora acariciava o braço de Izzy com uma languidez pós-clímax, os dedos traçando padrões aleatórios na pele.

“Porra, Izzy,” a voz de Axl saiu rouca, abafada pela carne do ombro de Izzy. "Isso foi..."

Ele não terminou a frase. Não havia palavras. Izzy entendeu. Tinha sido mais do que sexo. Tinha sido uma colisão de linhas do tempo, uma reconfiguração de toda a sua história compartilhada.

Lentamente, Axl se moveu, finalmente se retirando. Izzy sentiu uma pontada de perda com a partida, seguida pela sensação física de vazio. Mas então Axl se deitou ao seu lado, de frente para ele, em vez de se virar e adormecer como costumava fazer nos velhos tempos. Seus olhos no escuro eram sérios, examinando o rosto de Izzy como se estivesse vendo pela primeira vez.

Ele estendeu a mão e tocou a barba de Izzy novamente, seus dedos explorando a textura.

"É estranho", Axl murmurou, sua voz um fio de som. "Mas é bom. Combina com você."

Seus dedos então desceram, tocaram de leve os lábios inchados de Izzy de tanto beijar.

"Eu te machuquei?" Axl disse, uma nota de preocupação sincera em sua voz.

Izzy balançou a cabeça, incapaz de falar. A dor era no mínimo, um lembrete físico do que havia compartilhado, ofuscado pelo calor residual que permeava seu corpo.

A mão de Axl continua sua jornada, descendo pelo pescoço, sobre o osso da clavícula, até relacionada plana no peito liso de Izzy, bem sobre seu coração.

“Aqui,” Axl sussurrou. "É o mesmo. Ainda bate igual."

Era verdade. Sob todas as mudanças, uma essência permanente. O núcleo de quem eles eram, um para o outro, era imutável.

"Eu senti falta disso," Axl admitiu, seus olhos fechando por um momento, como se a admissão fosse dolorosa. "De você. Dessa... calma depois."

Izzy finalmente encontrou sua voz. "A calma nunca foi seu forte, Rose."

Axl abriu os olhos e um sorriso pequeno e cansado ao tocar seus lábios. "É porque ela sempre veio de você. Quando você foi embora, levou a porra da calma com você."

Era a verdade mais profunda que Axl já dissera. Izzy sempre fora sua âncora, o porto seguro da tempestade que era Axl Rose. E quando Izzy partiu para salvar o mesmo, ele inadvertidamente condenou Axl a uma deriva eterna.

Axl se moveu mais perto, enterrando o rosto no crook do pescoço de Izzy, sua respiração quente contra a pele. Era um gesto de extrema intimidação e vulnerabilidade, muito mais do que o sexo que tinha acabado de ter.

"Não vai embora", Axl murmurou, sua voz um pedido suave, quase uma oração. "Não ainda. Fica até eu dormir."

Era um pedido infantil. Axl, o titã, o deus do rock, temeroso de ser deixado sozinho no escuro. Izzy sentiu seu coração se apertar. Ele atrai o braço e se envolve em torno dos ombros largos de Axl, puxando-o para mais perto.

"Eu fico." Izzy sussurrou contra seus cabelos.

O corpo de Axl relaxou contra o dele, toda a tensão restante se dissipou em um suspiro profundo. A luz do amanhecer começava a pintar o céu de um azul acinzentado atrás das cortinas, delineando os contornos do quarto. O mundo lá fora, com suas responsabilidades e realidades complexas, estava chegando. Mas por agora, naquele momento silencioso e roubado, eles eram apenas Axl e Izzy. Dois homens, duas almas velhas e cansadas, que descobriram o caminho de volta um para o outro através de um labirinto de tempo, raiva e transformação. E, pelo menos por algumas horas, isso era o suficiente.

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O despertar foi gradual, como emergir de um sonho profundamente vívido. Os primeiros raios de sol filtravam-se pelas pesadas cortinas do quarto, pintando listras douradas no carpete escuro. Izzy abriu os olhos, e a realidade da noite anterior atingiu-o com uma onda de calor que nada tinha a ver com a luz da manhã.

Axl ainda dormia ao seu lado, virado de lado, um braço jogado sobre o travesseiro que Izzy acaboua de abandonar. Seu rosto, em tranquilidade, estava livre das linhas de tensão e fúria que o assombravam durante o dia. Parecia mais jovem, quase vulnerável. A respiração era profunda e regular, um som suave que enchia o silêncio do quarto.

Izzy deslizou para fora da cama com o cuidado de não acordá-lo. O ar frio do quarto arrepiou sua pele nua, e ele sentiu uma leve pontada entre as pernas, uma sensação familiar, porém há muito esquecido. A pele era sensível, um pouco inchada pela intensidade da noite anterior. Em vez de desconforto, uma ponta de prazer perverso percorreu-o. Era a prova física, carnuda, de que tudo aquilo havia acontecido. Era uma marca de Axl nele, e, estranhamente, ele gostava disso.

Ele pegou suas roupas do chão, mas hesitou. Ao vestir seu jeans, ele pegou uma camisa de algodão preta, larga e macia, que Axl deixou cair sobre uma poltrona. Era imensamente nele, chegando até a metade das coxas, e cheirava inconfundivelmente a Axl – uma mistura de seu perfume caro, suor seco e algo que era simplesmente ele. Abrindo uma gaveta da cômoda, encontrei uma pilha de cuecas novas. Puxou uma preta, sentindo o tecido macio contra sua pele sensível ao vesti-la.

No banheiro, fechou a porta e encarou seu reflexo no espelho. Seu rosto estava marcado pela noite – olhos um pouco inchados, a barba por fazer. Mas havia algo mais... uma atenção em seus olhos que ele não via há anos. Uma paz.

Ligou o chuveiro e deixou a água quente cair sobre seu corpo, lavando o suor e o cheiro do sexo. Enquanto a água corre sobre sua pele, sua mente reviva a cada momento. A boca de Axl em seu pescoço. A paciência inesperada de seus dedos. A sensação avassaladora de ser necessária, conhecida e aceita de uma forma que transcendeu toda a física. Ele tocou o local entre as pernas, sentindo uma sensibilidade aumentada, e um calafrio percorreu sua espinha. Foi intenso. Foi brutal em sua honestidade. E foi perfeito.

Após o banho, ele fez a barba com o kit de Axl, o barbeador elétrico zumbindo suavemente enquanto revelava a linha de seu queixo, seu rosto limpo e definido emergindo. Parecia-se mais com ele mesmo do que nunca.

Descalço e veste apenas a camisa enorme de Axl e a cueca, ele saiu do banheiro e desceu silenciosamente para a cozinha. A casa era um labirinto de espaços abertos e luz matinal. Encontrou a cozinha – uma obra-prima de aço inoxidável e granito, imaculada e pouco usada.

Abra uma geladeira. Havia pouca coisa – algumas garrafas de água, condimentos, umas cervejas. Mas no armário, encontrei um pacote de café gourmet e uma cafeteira italiana. Encheu-a com água e pó, acionando o fogão. O aroma rico e terroso do café começou a preencher a cozinha, um contraponto doméstico à loucura da noite anterior.

Enquanto esperava o café ficar pronto, ele olhou pela janela da cozinha. A vista era deslumbrante – o oceano Pacífico se estendia até o horizonte, infinito e calmo. Ele se encostou no balcão, envolvido pelo tecido macio da camisa de Axl, sentindo o cheiro do homem e do café se misturarem. Era um momento de tranquilidade surreal, um interlúdio de normalidade doméstica após uma noite que reescrevia as regras do seu universo.

Ele estava assustado. Confuso. Mas, pela primeira vez em muito, muito tempo, também estava esperançoso. O som dos passos pesados ​​de Axl descendo as escadas fez o coração de Izzy acelerar. Ele se virou na janela momentos antes de Axl entrar na cozinha.

O vocalista parou no limiar, esfregando os olhos sonolentos. Ele vestia apenas uma calça de moletom cinza, baixo no quadril, seu torso pálido e definido exposto ao ar fresco da manhã. Seus olhos, ainda pesados ​​de sono, percorreram Izzy da cabeça aos pés – o rosto limpo e barbeado, a camisa preta enorme que praticamente engoliu seu torso, a cueca preta, as pernas nuas e pés descalços no chão de mármore frio.

"Caralho", Axl rouquejou, sua voz ainda áspera do sono. "Parece 87 aí."

Izzy sentiu um calor subir em seu rosto. "É sua camisa."

"Eu sei", Axl disse, um sorriso lento e sonolento se formando em seus lábios. "Combina mais com você do que comigo agora." Ele se mudou, parando a poucos centímetros de Izzy. Seus olhos estavam mais claros agora, examinando o rosto limpo de Izzy. "Você fez a barba."

Izzy encolheu os ombros, virando-se para despejar o café imediatamente em duas canecas grandes de cerâmica. "É o que se faz de manhã."

Ele sentiu as mãos de Axl envolvendo sua cintura por trás, puxando-o para trás contra seu corpo quente. O queixo de Axl descansou em seu ombro.

"Cheira a café", Axl murmurou, seu hálito quente no pescoço de Izzy. "E a você." Ele enterrou o nariz na curva do pescoço de Izzy e inalou profundamente. "Você sempre cheirou tão bem, Iz. Não importa o que."

Izzy sentindo-se imóvel, a caneca de café em sua mão. Uma intimidação era avassaladora. Mais do que o sexo da noite anterior, essa familiaridade doméstica parecia mais perigosa, mais propícia a criar raízes.

"O que você está fazendo?" Izzy disse, sua voz mais suave do que ele pretendia.

"Aproveitando o momento," Axl respondeu, seus lábios roçando levemente a pele do pescoço de Izzy. "Antes que você volte para o seu deserto e eu volte a ser... isso." Ele fez um gesto vago com a mão em direção à casa opulenta e vazia ao redor.

Izzy colocou as duas canecas no balcão e virou os braços de Axl. O vocalista não soltou, mantendo o preso em um abraço solto.

“Eu não tenho muita coisa para o café da manhã”, disse Izzy, olhando para os olhos azuis e sério de Axl. "Só café."

“Merda, eu não como café da manhã há anos,” Axl disse com um encolher de ombros. "Mas você... fazendo café na minha cozinha. Vestindo minha camisa." Ele balançou a cabeça, uma expressão de maravilha incrédula em seu rosto. "É a coisa mais normal que aconteceu aqui em uma década. É a mais estranha."

Ele finalmente soltou Izzy e pegou uma das canecas, levando-a aos lábios e tomando um gole longo.

"Porra, isso é bom", ele disse, surpreso. "Você sempre fez o melhor café."

"É só café, Axl."

"Não", disse Axl, seu olhar intenso. "Não é."

Eles ficaram em silêncio por um momento, bebendo seu café de pé na cozinha, a luz da manhã banhando-os. Era um momento de paz tão frágil que Izzy quase tinha medo de respirar.

“Então,” Axl disse, finalmente quebrando o silêncio. "O que acontece agora, Stradlin?"

Izzy olhou para o fundo de sua caneca. "Eu tenho que ir ao centro hoje. Aquele negócio dos direitos autorais. E meu voo de volta é amanhã cedo."

A expressão de Axl fechou-se suavemente, mas ele acenou com a cabeça. "Certo. Direitos autorais. O passado sempre nos alcançando, não é?"

“É por isso que eu vim”, Izzy lembrou-o suavemente.

"E é a única razão?" A pergunta de Axl era importante, emparelhando não entre eles.

Izzy olhou para ele, para o homem que ainda segurava sua caneca de café como se fosse uma tábua de salvação. Ele poderia mentir. Podia proteger o mesmo e o Axl da complicação que isso representava. Mas depois da noite que passou, depois da manhã que estavam compartilhando, isso pareceria uma traição maior do que qualquer partida.

"Não," Izzy admitiu, sua voz um sussurro. "Não foi a única razão."

Um sorriso lento e genuíno se mantém pelo rosto de Axl, iluminando seus olhos. Era uma vislumbre rara do homem que ele costumava ser, antes que a fama e o isolamento o suportassem.

“Bom,” Axl disse, seu olhar intenso. "Isso é algo, então."

Ele colocou a caneca no balcão e se mudou de Izzy novamente, desta vez pegando sua mão livre e entrelaçando os dedos com os dele.

“Vamos combinar uma coisa”, disse Axl, seu interesse acariciando as costas da mão de Izzy. "Você vai resolver suas burocracias. Eu vou... lidar com minhas coisas. E hoje à noite... você volta aqui. A gente janta. Fala. Só... fica. Mais uma noite."

Era um pedido, não uma exigência. E isso, mais do que qualquer outra coisa, fez o coração de Izzy se apertar.

"E amanhã?" Izzy disse, com sua voz suave.

“Amanhã pode cuidar de si mesmo”, Axl sussurrou, inclinando-se para frente até que seus testamentos se tocassem. "Só me dá mais uma noite, Iz. Por favor."

Olhando para os olhos daquele homem complicado e tempestuoso que, de alguma forma, ainda era sua casa, Izzy percebeu que não havia força no universo que pudesse fazê-lo dizer não.

"Tá bom," ele sussurrou. "Mais uma noite."

O sorriso que iluminou o rosto de Axl foi como o sol nascendo sobre o oceano atrás deles – brilhante, quente e cheio de promessas. E por mais assustador que fosse, por mais complicado que soubesse que seria, Izzy não conseguiu deixar de acreditar, mesmo que só por aquele momento, que aquela promessa poderia, finalmente, ser real.

 

 

💫 Fim.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Chapter 9: A Maré e a Âncora

Summary:

Quando a mente se torna mar revolto, o amor precisa aprender a respirar debaixo d’água.

Izzy está preso em um silêncio profundo, submerso em uma depressão que o arrasta lentamente para o fundo. Axl, paciente e incansável, se torna sua âncora — o gesto simples de escovar seus cabelos e alimentá-lo se transforma em um ato de amor silencioso. Entre noites longas e ondas imprevisíveis, eles descobrem que cuidar também é uma forma de amar.

Notes:

Avisos ⚠️💙: Representação de Depressão Profunda, Cenas de Automutilação (não gráfica, mas explícita em sua descrição emocional),
Ideação de Autoextermínio, Desespero Emocional, Crises de Ansiedade e Transtornos Alimentares (perda de apetite).

Se você é sensível a estes temas, por favor, priorize seu bem-estar. Pode pular este capítulo. Sua saúde mental vem em primeiro lugar. 💙

Este capítulo é um dos mais íntimos que já escrevi. Ele fala sobre cuidar quando o outro não consegue se cuidar, sobre empatia e paciência, e sobre o poder de ficar, mesmo quando tudo parece ruir.
Escrevi com o coração apertado e com muito respeito a quem já passou por momentos assim — vocês não estão sozinhos. 💙

Por favor, leiam com calma, cuidem de si e, se algo tocar fundo demais, façam uma pausa.

A arte pode doer, mas também pode curar. 🌙

Chapter Text

Los Angeles, 1988

O silêncio era o primeiro sinal.

No apartamento bagunçado de West Hollywood que dividiam com Duff, Slash e um Steven Adler quase sempre ausente, o som súbito da falta de ruído era mais alarmante que qualquer gritaria. A guitarra base de Izzy não ecoava pelo corredor. Não havia o ruído constante de suas botas no chão, o tilintar de uma garrafa de bourbon, o sussurro áspero de sua voz.

Axl percebeu na volta de mais um dia caótico de ensaios e entrevistas. A casa estava estranhamente parada. Ele encontrou Slash e Duff na sala, visivelmente desconfortáveis.

"O Izzy sumiu no quarto de vocês hoje cedo," Slash comentou, ajustando o chapéu. "Tentei chamar pra um ensaio, ele só grunhiu. Parece que tá de ressaca pesada."

Mas Axl sabia que não era ressaca. Era a coisa. A coisa que às vezes descia sobre Izzy como um nevoeiro negro, tornando o mundo exterior uma agressão insuportável. A pressão da fama repentina, as turnês intermináveis, as expectativas – para Izzy, que sempre foi o alicerce quieto da banda, o peso às vezes simplesmente quebrava algo dentro dele.

Axl subiu as escadas em silêncio e empurrou a porta do quarto que dividiam – um segredo guardado a sete chaves de todos, especialmente da imprensa.

Izzy estava de costas, encolhido sob os lençóis, mesmo com o calor opressivo de LA. Ele não estava dormindo. Axl conseguia sentir a vigília tensa emanando dele.

"Iz?" sua voz foi mais suave do que a que ele usava com qualquer outra pessoa no planeta.

Não houve resposta. Apenas um pequeno tremor nos ombros de Izzy sob o cobertor.

Era isso. A maré tinha virado, arrastando Izzy para as profundezas de uma depressão silenciosa e paralisante.

Nos dias que se seguiram, Axl, o furacão humano, tornou-se um redemoinho de atividade contida. Ele inventou desculpas para a banda e para a gravadora – "o Izzy tá com uma virose fodida", "o estômago dele não tá legal". Ele cancelou compromissos, enfrentou a irritação do manager, e fez do quarto deles um santuário silencioso.

A primeira batalha foi física. Axl trazia comida – coisas simples, que Izzy conseguia engolir. Um sanduíche, uma sopa enlatada. Ele se sentava na beira da cama, e sua paciência era uma coisa assombrosa.

"Vamos, Stradlin. Só um pedaço."

Ele segurava um pedaço de pão perto da boca de Izzy, e após um longo, agonizante momento, os lábios de Izzy se separavam para aceitá-lo. Era um ato de pura vontade, e Axl testemunhava cada um deles em silêncio respeitoso.

Mas o ritual mais poderoso era o do cabelo.

O cabelo de Izzy, então uma juba negra e lisa que ia até seus ombros, estava se tornando uma massa oleosa e embaraçada de negligência e desespero.

No terceiro dia, Axl voltou do banheiro com uma escova.

"Tá um caos, Iz," ele murmurou, sua voz isenta de julgamento.

Ele se sentou atrás de Izzy na cama, suas costas contra a cabeceira, e puxou o corpo inerte de Izzy para descansar contra seu peito. Izzy não resistiu. Era muito esforço.

E então começou. A mão de Axl, famosa por segurar um microfone com força de matar, segurou a escova com uma delicadeza de ourives. Os primeiros passos nos nós foram um trabalho de arqueologia – lentos, meticulosos, desfazendo cada emaranhado com uma concentração que fazia a respiração de Axl ficar sincronizada com o movimento.

Puxa suavemente, desliza, desfaz.

Izzy fechou os olhos. A sensação era a única coisa real em um mundo de algodão e estática. A escova arrastando em seu couro cabeludo, a calor sólido do corpo de Axl atrás dele, a paciência infinita daqueles dedos. Era um contraste tão violento com o caos que reinava dentro de sua cabeça que uma única lágrima quente escapou e rolou por sua face, sumindo na gola de sua camiseta suada.

Axl não comentou. Ele não disse "vai ficar tudo bem" ou "você precisa sair dessa". Ele apenas continuou. Puxa, desliza, desfaz. Era sua linguagem de amor. Não eram palavras grandiosas ou gestos dramáticos. Era a persistência silenciosa de escovar o cabelo do homem que amava, fio a fio, até que estivesse liso e limpo novamente.

Lá embaixo, Slash e Duff trocavam olhares confusos. Eles ouviam os passos abafados de Axl no andar de cima, o silêncio incomum. Sabiam que algo estava errado com Izzy, mas a fachada de "ressaca" era mantida. A lealdade da banda, no entanto, era mais forte que a curiosidade. Eles não invadiam.

Quando o cabelo de Izzy finalmente estava livre de nós, Axl passou a mão por ele em um último gesto suave.

"Pronto," ele sussurrou, seu queixo roçando o topo da cabeça de Izzy.

Ele então pegou o sanduíche meio comido da mesa de cabeceira. "Agora, mais um pedaço."

E Izzy, exausto, vazio, mas ancorado pelaquele cuidado obstinado, abriu a boca e aceitou.

A maré negra dentro dele ainda rugia, alta e imponente. Mas naquele quarto abafado, com o som distante do trânsito de L.A e a respiração calma de Axl em seu ouvido, ele tinha encontrado uma âncora. E enquanto Axl Rose estivesse disposto a ser essa âncora, Izzy Stradlin sabia, no fundo de seu ser adoecido, que talvez não se afogasse.

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A consciência de Izzy era um mar espesso e oleoso. Ele flutuava nele, um peso inerte, sem vontade de nadar em direção à superfície. Os sons do mundo exterior chegavam até ele como ecos distantes e distorcidos – o ronco do carro de Slash saindo, o som abafado do baixo de Duff no andar de baixo, a campainha do telefone insistente que alguém sempre atendia. Eram ruídos de uma vida que parecia pertencer a outra pessoa, em outro universo.

A única coisa real era o calor atrás dele. O sólido, imóvel calor do corpo de Axl. Ele tinha perdido a noção de quanto tempo eles estavam ali sentados na cama, suas costas contra a cabeceira, o corpo de Izzy encaixado entre as pernas de Axl como um quebra-cabeça que sempre se encaixava, não importava o estado das peças.

A escova deslizava por seu cabelo com um ritmo hipnótico. Puxa, desliza, desfaz. Ele conseguia sentir a paciência de Axl em cada movimento, uma paciência que ele sabia ser um recurso escassíssimo naquele homem. Era isso que partia o que ainda restava de seu coração intacto. Axl, o furacão, contido e focado na tarefa singular de desembaraçar os nós em seu cabelo, como se desfazê-los pudesse, por magia, desfazer os nós em sua mente.

Uma parte dele queria gritar. Queria sacudir aquelas mãos e dizer: Para! Não adianta! Não é só o cabelo que está um emaranhado!

Mas a outra parte, maior e mais cansada, simplesmente se rendia. Cada puxada suave da escova era um fio condutor de volta à realidade. A sensação no couro cabeludo era um ponto fixo no caos interno. E o silêncio de Axl era um bálsamo. Ele não tentava preencher o vazio com palavras vazias de incentivo. Ele simplesmente estava. Sua presença era um fato, como a parede ou o chão – algo sólido em que se apoiar quando tudo mais era líquido e escorregadio.

Ele sentiu os dedos de Axl, não mais segurando a escova, mas passando por seus fios agora macios.

"Pronto."

A palavra era um sopro quente em seu ouvido, tão suave que quase se perdeu no zumbido em sua cabeça.

Então, Axl se moveu, e Izzy sentiu um frio momentâneo onde o calor do corpo dele havia estado. Um lamento silencioso surgiu em sua garganta. Não vá.

Mas Axl não foi embora. Ele apenas pegou algo da mesa de cabeceira. Quando ele se acomodou novamente, a ponta de uma colher de metal tocou suavemente seus lábios. Era iogurte. Frio, doce.

Axl não disse "abre". Ele apenas esperou. A mensagem era clara: Eu estou aqui. Você precisa disso. Eu não vou embora.

A vergonha queimou o rosto de Izzy. Ele, Izzy Stradlin, guitarrista de uma das bandas mais selvagens do planeta, sendo alimentado como uma criança. Mas sob a vergonha, havia um alívio profundo e avassalador. A responsabilidade de levantar o próprio braço, de levar a comida à própria boca, era grande demais. E Axl, com sua impaciência lendária, estava assumindo aquela pequena, monumental responsabilidade por ele.

Sua boca se abriu. O sabor doce e frio do iogurte explodiu em sua língua, e foi a primeira coisa que ele realmente sentiu em dias. Um gemido baixo, quase inaudível, escapou dele.

Ele sentiu o corpo de Axl relaxar um pouco atrás dele, uma leve exalação de alívio. Era um feedback. Uma pequena vitória.

Colherada após colherada, em silêncio. O mundo lá fora continuava. A banda, a fama, as expectativas – tudo isso ainda existia, uma tempestade prestes a arrombar a porta. Mas ali, naquele quarto, por aquele momento, existia apenas o ritmo lento da colher, o gosto do iogurte e o calor sólido e teimoso de Axl Rose, segurando a âncora contra a maré, recusando-se a deixá-lo afundar.

Os dias se fundiram em um borrão de silêncio e pequenos rituais. Izzy não sabia mais se era terça ou sábado, se haviam se passado três dias ou uma semana. O tempo havia perdido seu significado linear, substituído pelo ciclo previsível da presença de Axl.

Axl era um paradoxo ambulante. Lá fora, ele era o furacão – o vocalista imprevisível, a estrela incandescente cujos caprichos e explosões todos temiam. Mas dentro daquele quarto, ele era uma força calma e constante. Sua energia, normalmente tão dispersa e volátil, estava agora focada com uma intensidade laser em uma única missão: manter Izzy ancorado.

Naquela manhã, o sol entrava com mais força, cortando como uma lâmina através das frestas das persianas. Izzy encolheu-se instintivamente, enterrando o rosto no travesseiro que cheirava a Axl e a ele mesmo – um cheiro abafado, de sono não reparador e solidão compartilhada.

Ele ouviu a porta se abrir e fechar. Os passos de Axl eram mais leves do que o normal, como se ele estivesse tentando não perturbar a frágil paz do ambiente. Em vez de ir direto para a cama, ele foi até a janela. Izzy, de olhos fechados, sentiu, mais do que viu, a mudança de luz quando Axl ajustou cuidadosamente as persianas, não as abrindo totalmente, mas filtrando a luz brilhante para um tom suave e dourado que não agredia os olhos.

Era um gesto pequeno. Minúsculo. Mas para Izzy, cuja pele parecia fina demais para o mundo, cujos nervos estavam expostos como fios descascados, foi um ato de profunda compreensão. Axl não estava apenas cuidando de seu corpo; ele estava tentando curar seus sentidos hiperestimulados.

Axl se aproximou da cama. Em vez da escova, ele trazia uma toalha úmida e quente.

"Vamos te limpar um pouco," ele disse, sua voz um murmúrio baixo que se misturava ao ronco distante da cidade.

Izzy não teve energia para responder, mas não resistiu quando as mãos de Axl, incrivelmente gentis, começaram a passar a toalha quente em seu rosto. O calor era um bálsamo. Ele limpou sua testa, suas pálpebras fechadas, a linha de seu queixo. Era um cuidado íntimo, maternal quase, que faria Izzy corar de vergonha em seu estado normal. Agora, era apenas mais uma tábua de salvação.

Enquanto Axl trabalhava, lavando o suor e a letargia de sua pele, Izzy permitiu-se, pela primeira vez, observar Axl verdadeiramente. As olheiras escuras sob seus olhos. A linha de tensão em seus ombros, que ele sempre carregava, mas que agora parecia mais pronunciada. A paciência em seus dedos era real, mas custava a ele. Izzy conseguia ver o custo. Axl estava segurando seu próprio caos para conter o de Izzy.

A culpa, então, foi uma nova camada de peso. Ele estava prendendo Axl. Estava atrasando a banda, preocupando todo mundo. O pensamento era um enxame de vespas em sua mente, aumentando o zumbido interno.

Como se lesse seus pensamentos, Axl parou, a toalha ainda na mão, e olhou diretamente para seus olhos.

"Para," ele disse, suave, mas firme. "Não faça isso consigo mesmo. Eles podem esperar. O mundo pode esperar."

Sua mão encontrou a de Izzy na cama, os dedos entrelaçando-se com os dele. O toque era quente, sólido, real.

"Você é mais importante."

As palavras não eram uma declaração dramática. Eram ditas com a simplicidade de um fato. Como dizer que o céu é azul. E naquele momento, naquele quarto, Izzy quase acreditou.

Axl terminou de limpá-lo e, em seguida, trouxe uma xícara de chá de camomila. Ele não forçou. Apenas colocou-a na mesa de cabeceira ao lado de Izzy, ao alcance de sua mão, se ele quisesse.

"Quando você estiver pronto," ele disse.

Então, ele pegou sua própria guitarra, que estava encostada na parede, e se sentou no chão, de costas para a cama. Ele não tocou nenhum riff dos Guns. Em vez disso, seus dedos começaram a dedilhar algo suave, melancólico, uma melodia que Izzy nunca ouvira antes. Era uma música triste, mas não desesperançosa. Era uma música que dizia: Estou aqui. Estou com você. A tempestade vai passar.

Izzy fechou os olhos, o som da guitarra de Axl envolvendo-o como um cobertor. A maré negra ainda estava lá, alta e ameaçadora. Mas pela primeira vez, ele sentiu que talvez, apenas talvez, não precisasse enfrentá-la sozinho. Enquanto a música de Axl preenchesse o silêncio, ele podia simplesmente flutuar, e isso era o suficiente. Por enquanto, era mais do que suficiente.

A melodia suave da guitarra de Axl foi a primeira coisa a desaparecer da névoa. Depois, foi o calor constante de seu corpo ao lado da cama. A lucidez voltou a Izzy não como um clarão, mas como um amanhecer lento e doloroso, revelando os estragos que a tempestade interna havia causado.

Com a clareza veio a vergonha. Uma vergonha ácida que queimou seu estômago vazio. Ele reviu os últimos dias – a imobilidade, o silêncio, o cuidado meticuloso de Axl. Ele viu as olheiras de Axl, a tensão em seus ombros. Cuidar de mim é um fardo, o pensamento ecoou em sua mente, claro e cruel. Eu estou atrasando a banda. Estou drenando ele.

A determinação, então, nasceu de um lugar torto – não do desejo de melhorar, mas do pânico de ser um peso. Ele não podia continuar sendo a âncora que mantinha Axl preso à beira de um abismo.

Na manhã seguinte, quando Axl entrou no quarto com uma xícara de café, ele encontrou Izzy em pé, vestindo um jeans e uma camiseta surrada. O cabelo estava molhado, como se ele tivesse tentado, sem muito entusiasmo, lavar a oleosidade dos dias anteriores.

"Iz?" A surpresa na voz de Axl era evidente.

"Preciso ir ao ensaio," a voz de Izzy saiu áspera por falta de uso, mas plana, sem emoção. "Já perdi tempo demais."

Axl estudou seu rosto, seus olhos perscrutadores tentando decifrar a máscara de normalidade que Izzy tentava desesperadamente vestir.

"Você não precisa. A gente pode cancelar mais um dia. Você mal consegue ficar em pé."

"Eu preciso," Izzy insistiu, sua voz ganhando um tom cortante. Ele se virou e começou a procurar um par de meias limpas, evitando o olhar de Axl. "Não posso ficar aqui me afogando em autopiedade. E você... você tem coisas mais importantes para fazer do que ficar me fazendo de inválido."

O silêncio que se seguiu foi carregado. Izzy podia sentir o olhar de Axl queimando em suas costas.

"Inválido?" A voz de Axl era baixa, perigosamente calma. "É isso que você acha que eu estava fazendo?"

Izzy não respondeu. Enfiou os pés nas botas de couro, sentindo o mundo girar ligeiramente com o movimento rápido.

"Porra, Izzy!" A fúria explodiu de Axl de repente, fazendo Izzy estremecer. Ele fechou a distância entre eles em dois passos largos, agarrando o braço de Izzy com força. "Você acha que isso é sobre pena? Que eu estou aqui porque você é um 'fardo'?"

Seus olhos azuis cintilavam com uma raiva ferina.

"Eu estou aqui porque eu quero estar aqui! Porque você é a porra da pessoa mais importante nessa merda toda! A banda pode esperar! O mundo pode pegar fogo! Mas você... você desaparece, Izzy! E quando você some, tudo para de fazer sentido!"

Izzy tentou se soltar, mas a força de Axl era implacável. "Eu não quero sua piedade, Axl! Não quero que você segure minha mão como se eu fosse quebrar!"

"NÃO É PIEDADE, SEU IDIOTA! É AMOR!" Axl gritou, sua voz ecoando no quarto pequeno. A palavra pairou no ar, pesada e nua, muito mais vulnerável do que qualquer raiva. "É amor, porra! E é a única coisa que me impede de queimar essa porra toda até o chão!"

Ele soltou o braço de Izzy com um empurrão de frustração. "Mas tudo bem. Tudo bem. Se você quer fingir que tá bem, vai lá. Vai pro ensaio. Vira essa garrafa de whisky e finge que está tudo sob controle. Mas não vem me dizer que é por minha causa. Não coloca essa merda em cima de mim."

Axl deu as costas, seus ombros subindo e descendo rapidamente. Ele estava magoado. Profundamente magoado. E ver aquela dor, saber que ele a havia causado, foi a pior punição que Izzy poderia imaginar.

Sem uma palavra, Izzy saiu do quarto. Desceu as escadas e saiu do apartamento, a porta batendo atrás dele com um estrondo final.

No ensaio, ele tocou mecanicamente. Seus dedos encontraram os acordes, mas a música estava morta para ele. Ele evitou o olhar de todos, especialmente o de Slash, que parecia entendê-lo um pouco demais. Ele bebeu. Muito. Tentando afogar a vergonha, a culpa e o eco das palavras de Axl.

É amor, porra.

Mais tarde, naquela noite, ele não voltou para o apartamento. Ficou bêbado o suficiente para cair em um sono inquieto no sofá de um estúdio vazio. Quando acordou de um pesadelo, suando e com o coração acelerado, o primeiro pensamento que veio à sua mente não foi o alívio de ter saído, mas a memória do calor de Axl atrás dele na cama, e o som suave da escova deslizando em seu cabelo.

Ele havia confundido cuidado com fraqueza, e amor com um fardo. E ao se afastar para "poupar" Axl, ele havia ferido o único homem disposto a navegar na sua tempestade. A âncora estava lá, segura e forte, e ele, o idiota teimoso, havia cortado a corda.

---

A fuga de Izzy não trouxe o alívio que ele esperava. Pelo contrário, cada dia que passava longe do apartamento, longe de Axl, era como arrancar um pedaço de sua própria pele. A tristeza que ele tentara evitar tornou-se uma companhia constante, mais profunda e silenciosa do que qualquer episódio depressivo anterior.

Ele não voltou para o apartamento que dividiam. Em vez disso, tornou-se um fantasma nos bastidores da própria banda. Aparecia para os ensaios exatamente na hora, tocava suas partes com precisão cirúrgica e vazia, e sumia antes que alguém pudesse puxar conversa. Evitava olhares, especialmente o de Axl, que agora era uma muralha de gelo.

O Axl que ele encontrava nos ensaios não era mais a âncora paciente. Era o furacão em sua forma mais destrutiva. Sua raiva, antes dirigida ao mundo, agora tinha um alvo claro: Izzy. Cada nota que Izzy tocava era errada. Cada sugestão que ele dava era ignorada ou ridicularizada com um comentário ácido.

"Esá com medo de sujar as mãos, Stradlin? Toca essa porra com vontade!" Axl rosnava durante "It's So Easy", seu olhar desafiador perfurando Izzy como uma adaga.

Izzy não revidava. Ele apenas abaixava a cabeça, seus dedos continuando seu trabalho mecânico na guitarra. A dor era um preço que ele achava que merecia pagar. Ele havia rejeitado o cuidado de Axl, chamado de piedade o que era amor. Agora, ele colhia os frutos amargos daquela rejeição.

As noites eram as piores. Enfiado em um motel barato que cheirava a mofo e desespero, ele se afogava em uísque barato, tentando anestesiar a solidão que latejava em seu peito. A cama era dura e fria, um contraste brutal com o calor do corpo de Axl que ele sentira falta. O silêncio era ensurdecedor, quebrado apenas pelo zumbido de um neon do lado de fora e pelos ecos das palavras de Axl em sua mente.

É amor, porra.

Agora, ele entendia. Entendia com uma clareza agonizante. Não era sobre ser um fardo. Era sobre ser visto. Axl o via, em toda a sua fragilidade e escuridão, e escolhera ficar. E Izzy, em seu orgulho doentio e medo de ser uma carga, empurrou aquela oferta de volta com ambas as mãos.

Ele começou a faltar ensaios. Deixava recados vagos com o manager. A tristeza profunda que ele tentara evitar ao se afastar agora o consumia por completo, amplificada pela perda autoinfligida. Ele via Slash e Duff trocando olhares preocupados, mas ninguém ousava cruçar a linha que ele mesmo desenhara ao redor de si.

Uma tarde, ele estava encostado na parede do backstage de um pequeno show, observando Axl no palco. O vocalista era um espetáculo de energia bruta e fúria, mas Izzy, que o conhecia como ninguém, conseguia ver as rachaduras. A performance era exagerada, a raiva um pouco forçada, como se ele estivesse tentando provar algo – para a plateia, para a banda, para si mesmo. E principalmente para Izzy.

Seus olhos se encontraram por um breve instante através da fumaça e das luzes. A fúria em Axl ainda estava lá, mas por trás dela, Izzy viu um lampejo de algo que o fez parar o coração: uma dor profunda, uma pergunta não respondida. Por que você foi embora?

Foi a gota d'água. A tristeza que carregava tornou-se insustentável. Ele se afastou da parede e saiu do backstage, perdendo-se nas ruas escuras de Los Angeles. Caminhou sem destino, o som da banda diminuindo atrás dele até se tornar apenas mais um ruído na cidade.

Ele havia achado que estava poupando Axl ao se afastar. Agora percebia que infligira uma dor ainda maior a ambos. A âncora estava lá, oferecendo estabilidade em meio à tempestade, e ele, em sua arrogância triste, escolheu afundar sozinho nas profundezas, carregando consigo o peso de ter rejeitado a única coisa que poderia mantê-lo à tona.

A maré dentro dele agora era um oceano negro de arrependimento, e ele estava se afogando nele, sem forças para nadar de volta para a superfície, para a luz, para o calor. Para Axl.

O dinheiro para o motel acabou. O uísque barato também. Tudo o que restou foi o vazio, agora tão profundo que Izzy conseguia ouvir o eco de seus próprios passos dentro de si mesmo. Não havia mais para onde correr. O apartamento, aquele lugar que ele evitava como a praga, era a única opção restante.

Ele voltou numa terça-feira à noite, quando sabia que todos estariam no ensaio. A porta não estava trancada. O cheiro do lugar atingiu-o como um soco – uma mistura de cigarro, cerveja velha, couro e uma ausência específica que ele reconheceu como sendo o perfume de Axl. A casa estava mais bagunçada do que o normal, com uma energia negligenciada que doía de se ver.

Sem fazer barulho, ele foi até o quarto que antes dividia com Axl. A porta estava fechada. Ele tentou a maçaneta. Trancada. Um nó se formou em sua garganta. Ele se virou e quase colidiu com Slash, que saía do banheiro, uma toalha nos ombros.

"Iz?" Slash pareceu genuinamente surpreso. Seus olhos escanearam Izzy, rapidamente, notando a palidez, a perda de peso, a aura de abandono. "Onde você esteve, cara?"

Izzy encolheu os ombros, desviando o olhar. "Por aí."

Slash não pressionou. Ele era o único que entendia, em algum nível, a necessidade de desaparecer. "O quarto do Axl... ele trancou." Ele fez uma pausa, hesitante. "Você pode pegar a minha cama de solteiro. Eu durmo no sofá. É mais confortável que parece."

E foi assim que Izzy Stradlin, um dos fundadores do Guns N' Roses, tornou-se um hóspede clandestino em sua própria casa, dividindo um quarto minúsculo com o guitarrista solo, enquanto o vocalista, seu ex-amante, mantinha-se trancado atrás de uma porta a poucos metros de distância.

A vida tornou-se um ritual de evasão. Ele saía do quarto só quando tinha certeza de que Axl não estava. Se ouvia a voz de Axl na sala ou na cozinha, ele se trancava no quarto ou saía pela porta dos fundos. A dor da rejeição que ele infligira a Axl transformara-se em uma ferida aberta, e a única forma de lidar com ela era infligindo mais dor a si mesmo.

Foi numa noite particularmente silenciosa, com Slash fora em um date e o apartamento vazio, que a dor interna tornou-se física. A pressão em seu peito, o peso da solidão, a culpa – tudo ficou grande demais para conter. Ele estava no banheiro, olhando para seu reflexo pálido no espelho, quando sua mão, quase por vontade própria, pegou a lâmina de um barbeador descartável.

A primeira faixa no antebraço foi mais uma surpresa do que uma dor. Um ardor limpo, seguido por um fino filete de vermelho vivo. E então, um alívio. Um alívio tão profundo e imediato que fez seus joelhos tremerem. Era como se ele estivesse liberando um pouco da pressão interna, da escuridão que o consumia. A dor física era uma distração bem-vinda da dor emocional, uma que ele podia ver, controlar e, acima de tudo, esconder.

Nos dias que se seguiram, os cortes tornaram-se seu segredo mais sombrio. Sempre nos mesmos lugares, sempre fáceis de cobrir. As jaquetas de couro, outrora um símbolo de atitude rock and roll, tornaram-se sua armadura. As camisas de mangas compridas, mesmo no calor abafado de LA, tornaram-se sua segunda pele. Ele se vestia com cuidado, camada após camada, escondendo a vergonha e a dor sob tecido e couro.

Ele via Axl ocasionalmente, de longe. O vocalista parecia mais magro, seus olhos carregando uma fúria fria e distante. Ele não olhava mais para Izzy. Agora, ele olhava através dele, como se fosse um estranho, um fantasma sem importância. Era a punição final, e Izzy a aceitava como seu destino.

Ele estava de volta ao apartamento, mas estava mais sozinho do que nunca. A âncora havia sido levantada, e ele agora flutuava em um mar de sua própria criação, cercado por pessoas, mas isolado em sua dor autoinfligida, marcando sua própria pele para lembrar-se de um amor que ele mesmo havia destruído. A tempestade não havia passado; ela simplesmente se internalizara, e Izzy estava se afundando nela, corte após corte, em um silêncio ensurdecedor.

O apartamento tornou-se um campo de batalha silencioso, onde a guerra era travada através de portas fechadas, olhares evitados e a espessa atmosfera de coisas não ditas. Izzy transformara-se num especialista em invisibilidade. Sabia os horários de todos, os sons de cada passo no corredor. Aprendeu a distinguir o andar pesado e irritado de Axl do passo mais desleixado de Slash e do caminhar firme de Duff.

Viver no mesmo espaço que Axl e ser tratado como um estranho era uma tortura diária. Toda vez que a porta do quarto de Axl se abria, o coração de Izzy dava um salto, uma mistura patética de esperança e medo. Mas Axl nunca olhava para ele. Sua presença era ignorada com uma frieza que era mais cruel que qualquer gritaria.

A única pessoa que ainda tentava furar a barreira era Slash. Certa noite, chegando mais cedo do ensaio, ele encontrou Izzy encolhido na cama de solteiro, vestindo uma jaqueta de couro pesada dentro de casa.

"Tá com frio, cara?" Slash perguntou, jogando seu chapéu na cômoda.

Izzy apenas encolheu os ombros, virando-se para a parede. "É o jeito."

Slash não disse mais nada, mas Izzy sentiu o peso do olhar preocupado do amigo. Ele sabia. Ou pelo menos desconfiava. A banda toda devia saber que algo estava muito errado, mas ninguém tinha o manual para consertar aquilo.

A solidão era um veneno que se espalhava por suas veias. Nos momentos de quietude, quando o apartamento estava vazio, a tentação da lâmina tornava-se um sussurro constante em sua mente. Era seu único controle em um mundo que desmoronava. Um banheiro trancado, o som metálico do barbeador sendo aberto, o ardor agudo que limpava sua mente por alguns preciosos segundos. Depois, a vergonha. A pressão do tecido da camisa sobre os cortes frescos era um lembrete constante de sua fraqueza.

Ele tentou se jogar na música, mas as cordas da guitarra parecem não ter mais alma. Tentou se afogar em álcool, mas a bebida só amplificava o vazio. Até as drogas, que outrora ofereciam um escape, já não funcionavam. Nada preenchia o buraco que ele mesmo cavara.

Uma tarde, ele ouviu Axl e Duff discutindo na sala.

"Ele está um fantasma, Axl! Alguém tem que fazer alguma coisa!", a voz de Duff era raramente elevada, o que mostrava a gravidade.

"Eu não sou o babysitter dele!", a resposta de Axl veio carregada de um cansaço raivoso. "Ele quis espaço, ele tem! Agora ele que se vire!"

A porta da frente bateu com força, sinalizando que Axl saíra. Izzy ficou paralisado atrás da porta do quarto, as palavras ecoando em sua cabeça. Babysitter. Era assim que Axl via aqueles dias de cuidado? Como uma obrigação? A vergonha queimou seu rosto, confirmando todos os seus piores medos.

Naquela noite, os cortes foram mais profundos. A dor física era um grito abafado para a dor que ele não conseguia expressar. Sangue escorreu pelo ralo do banheiro, manchando a porcelana branca. Ele se encostou na parede fria, ofegante, sentindo uma paz doentia e temporária. Pela primeira vez, um pensamento perigoso cruzou sua mente: e se eu simplesmente não parar?

O som da porta do apartamento se abrindo o fez sair do transe. Ele limpou rapidamente a pia, puxou a manga para baixo e saiu do banheiro, quase colidindo com Slash no corredor.

"Iz, cara...", Slash começou, seus olhos escaneando o rosto pálido e suado de Izzy.

"Estou bem," Izzy interrompeu, a voz mais áspera que o normal. "Só cansado."

Ele se esgueirou para o quarto, trancando a porta atrás de si. Deitou na cama, o braço latejando sob as mangas. Lá fora, a vida continuava. Os carros passavam, a cidade pulsava. Mas dentro daquele quarto, dentro daquele corpo, Izzy Stradlin estava se despedaçando, peça por peça, corte por corte, afundando em uma escuridão que ele mesmo alimentava, convencido de que era o único destino que merecia. A âncora estava perdida, e ele já não tinha forças para nadar.

O cheiro de sangue velho e desinfetante no banheiro havia se tornado uma assinatura fantasma. Slash, com sua percepção aguçada que ia muito além dos acordes de guitarra, não conseguia mais ignorar. A palidez cadavérica de Izzy, as mangas sempre compridas no calor de Los Angeles, a maneira como ele se encolhia ao menor toque acidental – tudo gritava uma verdade que ninguém queria encarar.

A gota d'água foi encontrar uma mancha marrom-avermelhada no lavabo, mal lavada, quando ele foi escovar os dentes de manhã. Não era de tinta. Não era de ferrugem.

Naquela noite, Slash esperou. Esperou Duff sair para um encontro, esperou Steven sumir em seu próprio mundo de drogas, esperou Axl trancar-se em seu quarto com um ruído abafado de TV. O apartamento caiu em um silêncio pesado, quebrado apenas pela respiração ofegante que ele conseguia ouvir do outro lado da porta do quarto que agora dividia com Izzy.

Ele não bateu. Empurrou a porta e entrou.

Izzy estava sentado na beira da cama, a cabeça baixa. Ele vestia uma camiseta branca de mangas compridas, e mesmo no escuro, Slash pôde ver as manchas escuras que começavam a aparecer no tecido fino, no antebraço esquerdo.

"Izzy," a voz de Slash saiu mais suave do que ele pretendia.

Izzy estremeceu violentamente, como um animal acuado, puxando as mangas para baixo com um movimento rápido e cheio de culpa.

"Saí," a voz de Izzy saiu um rosnado, fraca e quebrada.

"Não." Slash fechou a porta atrás de si e se apoiou nela, cruzando os braços. Seu chapéu estava baixo, sombreando seus olhos, mas a preocupação era palpável. "Não vou sair. O que você está fazendo consigo mesmo, cara?"

"Nada. Não é da sua conta." Izzy tentou se levantar, mas suas pernas falharam. A fraqueza era evidente.

"É da minha conta quando você está se desfazendo no meu quarto!" Slash não gritou, mas a frustração estalou em sua voz. "Porra, Iz! Olha pra você! Você some, volta um fantasma, e agora isso?" Ele apontou vagamente para o braço de Izzy. "Isso aqui? Isso é a solução?"

"Você não entende!" a voz de Izzy quebrou em algo entre um grito e um choro. Ele se levantou, finalmente, suas mãos tremendo. "Ninguém entende! É... é a única coisa que faz parar!"

"Faz parar o quê?!" Slash deu um passo à frente, sua paciência se esgotando. "A dor? A merda toda? E aí, você acha que se cortar até não aguentar mais vai resolver alguma coisa?"

"É melhor do que não sentir nada!" Izzy gritou de volta, suas mãos se agarrando aos próprios braços, como se tentasse se conter. "É melhor do que ser um fardo! Um peso morto que todo mundo tem que carregar!"

E então, a verdade veio à tona, um rio de veneno e dor que transbordou.

"Ele me odeia, Slash! Ele me odeia e ele tá certo! Eu... eu joguei tudo fora! E agora não aguento mais, não aguento ficar aqui, perto dele, e saber que eu estraguei tudo!"

As lágrimas que Izzy lutou tanto para conter finalmente romperam a barreira, rolando silenciosas por seu rosto pálido. Ele desabou de volta na cama, seu corpo todo tremendo, os ombros sacudindo em um choro silencioso e desesperado.

Slash ficou parado, observando o colapso. A raiva dele se dissipou, substituída por uma dor profunda. Ele se aproximou e se sentou ao lado de Izzy no colchão estreito.

"Iz," ele disse, sua voz agora um sussurro áspero. "O Axl não te odeia. Ele tá... ele tá ferrado também. Mas ele não te odeia."

Ele hesitou, então colocou uma mão no ombro trêmulo de Izzy. O contato fez Izzy estremecer, mas ele não se afastou.

"Ninguém aqui te vê como um fardo," Slash continuou, escolhendo suas palavras com cuidado. "A gente se preocupa. Eu me preocupo. Porra, você é um dos meus melhores amigos. Ver você assim... é a pior merda que tem."

A porta do corredor rangeu. Os dois congelaram. Passos pesados se aproximaram e pararam do lado de fora do quarto. Uma pausa carregada, e então os passos recuaram, seguidos pelo som da porta do quarto de Axl se fechando com um clique suave.

Ele tinha ouvido. Tudo.

Izzy enterrou o rosto nas mãos, um novo surto de vergonha e agonia lavando-o. O segredo estava fora. A fragilidade estava exposta. E o homem que ele mais amava e temia agora sabia da profundidade de sua ruína.

Slash suspirou, esfregando o rosto.

"Vamos te ajudar, Iz," ele murmurou. "Você não precisa fazer isso sozinho. Ninguém precisa."

Mas as palavras, embora bem-intencionadas, pareciam pequenas e distantes para Izzy. O abismo dentro dele parecia ter se ampliado, engolindo a última réstia de dignidade que ele pensava ter. O silêncio do apartamento agora era ainda mais pesado, carregado com o conhecimento de que seus demônios não eram mais apenas seus. Eles eram de todos agora. E ele não sabia se isso era um alívio ou uma sentença ainda pior.

O apartamento nunca mais foi o mesmo depois daquela noite. Um novo tipo de silêncio se instalou – não mais apenas a ausência de palavras entre Izzy e Axl, mas um silêncio pesado, consciente, que carregava o eco do desespero de Izzy e da verdade que agora pairva no ar como um fantasma concreto.

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Izzy tornou-se uma sombra ainda mais tênue. O confronto com Slash, em vez de trazer alívio, multiplicou sua vergonha. Agora, ele não apenas carregava seu próprio fracasso, mas também o fardo de saber que os outros sabiam. Cada olhar de Slash, mesmo que preocupado, sentia-se como um julgamento. Cada vez que Duff lhe oferecia uma cerveja com um aceno quieto, ele via piedade.

E Axl... Axl era a parte mais dolorosa daquela nova realidade. Ele não estava mais apenas frio ou ignorante. Agora, havia uma hesitação palpável nele. Uma ou duas vezes, seus olhos encontraram os de Izzy por uma fração de segundo a mais do que o normal, e neles, Izzy não via mais raiva pura. Via algo confuso, algo ferido e, para seu terror, uma centelha de algo que parecia... preocupação. Era pior que o ódio. A raiva era simples, direta. A preocupação era complexa, carregada de um passado que Izzy sentia ter traído.

Ele parou de se cortar. Não por uma súbita epifania de autocura, mas porque o ato perdeu seu poder. A dor física já não conseguia competir com a agonia psicológica de saber que seus segredos mais sombrios não eram mais apenas seus. A lâmina agora parecia uma solução covarde, e ele já se sentia covarde o suficiente.

Em vez disso, ele se retraiu ainda mais. Parou de ir aos ensaios completamente. As desculpas esgotaram-se, e a gravadora começou a pressionar. O manager ligava para o apartamento, e Izzy ouvia Axl atender, sua voz tensa, inventando novas desculpas – "uma gripe forte", "uma infecção". Mentiras para cobrir a verdade feia que ambos conheciam.

Izzy passava os dias deitado na cama de solteiro, olhando para o teto. A guitarra no canto acumulava poeira. A vontade de compor, de tocar, de existir naquele mundo, havia se evaporado. Ele era um corpo ocupando espaço, um peso morto que, apesar das palavras de Slash, ele sabia que era um fardo.

Certa tarde, ele saiu do quarto para buscar água e encontrou Axl na cozinha, encostado na geladeira, bebendo diretamente de uma garrafa de suco. Eles ficaram parados, congelados no pequeno espaço. O ar entre eles estava carregado de tudo não dito – a memória do cuidado de Axl, a dor da rejeição de Izzy, o desespero exposto, a preocupação não verbalizada.

Axl abriu a boca como se fosse dizer algo. Seus olhos azuis, por um breve instante, pareceram suaves, vulneráveis. Izzy prendeu a respiração, seu coração batendo forte contra as costelas.

Mas então, o rosto de Axl se fechou novamente. Ele engoliou em seco, desviou o olhar e deixou a garrafa no balcão com um baque mais forte que o necessário.

"Tem pizza na geladeira, se quiser," ele murmurou, a voz saindo áspera, quase inaudível, antes de sair da cozinha sem olhar para trás.

Era um gesto pequeno. Quase nada. Mas para Izzy, foi um raio de algo em meio à escuridão. Não era um perdão. Não era um abraço. Era um fio, tênue e frágil, de que Axl ainda se importava o suficiente para lembrar que ele precisava comer.

Izzy ficou parado na cozinha sozinho, ouvindo a porta do quarto de Axl se fechar. Ele não comeu a pizza. Mas aquele pequeno gesto, aquele quase-olhar, aquelas palavras quase-amáveis, ficaram com ele.

A maré dentro dele ainda estava alta, o arrependimento ainda era um sabor constante em sua boca. Mas naquele momento, pela primeira vez desde que tudo desmoronou, a escuridão não parecia mais absoluta. Havia uma fenda, minúscula, por onde uma luz tênue podia entrar. E ele se pegou pensando, com uma centelha de algo que se parecia com esperança, que talvez, apenas talvez, um fio fosse o suficiente para começar a puxá-lo de volta para a superfície.

A pressão da gravadora e os rumores sobre o estado de Izzy tornaram-se grandes demais. Um show foi marcado, um show importante. A ordem era clara: a formação original tinha que aparecer, unida, ou os contratos seriam revistos.

Izzy foi arrastado de volta à realidade. O apartamento tornou-se um caos de equipamentos, roupas de palco e tensão pré-show. Pela primeira vez em semanas, ele não pôde se esconder. Ele teve que ensaiar, embora seus dedos parecessem de madeira e sua guitarra soasse como um instrumento estranho.

No dia do show, o camarim era um microcosmo da disfunção deles. Slash afina sua guitarra em um canto, um baseado já fumegando entre seus dedos. Duff alonga os ombros, sua expressão séria. Steven, nervoso e alterado, bate ritmos erraticos em qualquer superfície. E Axl... Axl estava no modo performance total. Seus olhos brilhavam com uma luz intensa e artificial, sua energia era elétrica, quase agressiva. Ele ditava o ritmo, dava ordens, um general se preparando para a batalha.

E Izzy? Izzy estava lá. Vestido, maquiado, com a guitarra na mão. Mas por dentro, ele estava a milhas de distância. O rugido da multidão do lado de fora do camarim era como o som de um tsunami se aproximando, e ele se sentia preso na praia, impotente.

O show começou. "Welcome to the Jungle" explodiu nos alto-falantes, e cinquenta mil vozes gritaram em uníssono. Izzy tocou. Seus dedos lembravam os movimentos, a memória muscular o carregava. Mas era como assistir a outra pessoa tocando. Ele via sua própria mão no braço da guitarra, mas não sentia a madeira, não sentia as cordas.

Seus olhos, no entanto, estavam fixos em Axl.

Axl era um deus no palco. Ele comandava a multidão, sua voz um uivo perfeito de fúria e paixão. Ele corria de um lado para o outro, suor já encharcando seu cabelo, seu corpo um instrumento de pura energia. E então, durante "Rocket Queen", aconteceu.

Uma groupie, uma loira com shorts minúsculos e um top que mal a continha, conseguiu subir no palco. Ela se aproximou de Axl com a confiança de quem sabia que não seria repelida. Axl a puxou para perto, seus quadris se movendo contra os dela em uma dança lasciva e performática. A multidão gritou mais alto. E então, ele a beijou.

Não foi um beijo rápido. Foi profundo, possessivo, um espetáculo para as câmeras e para os fãs. Um beijo que dizia: Eu sou Axl Rose, e isso é o que eu faço.

Para Izzy, foi como ser esfaqueado. Cada nota que ele tocava depois daquele beijo era um esforço consciente. O mundo parecia desbotar, os sons se tornaram abafados. Ele conseguia ver a boca de Axl, aquela mesma boca que sussurrara "é amor, porra" em seu ouvido, agora selada na boca de uma estranha. A mensagem era clara e cruel: a vida seguia em frente. Axl seguia em frente.

Ele não demonstrou. Sua expressão permaneceu a mesma máscara neutra de sempre. Seus dedos não erraram uma nota. Mas por dentro, algo que ele vinha tentando reconstruir desmoronou novamente. Aquele fio tênue de esperança? Arrebentado.

Quando saíram do palco, suados e com a adrenalina no auge, o camarim era um caos de gente. A groupie estava lá, rindo, agarrando o braço de Axl. Axl ria com ela, seu braço em volta de seus ombros, aceitando os cumprimentos de todos.

Izzy se afastou, indo para um canto mais escuro, longe da festa. Ele tirou a guitarra e a colocou no caso com movimentos mecânicos. Suas mãos tremiam levemente.

Foi quando Slash se aproximou. Ele chegou quieto, encostando-se na parede ao lado de Izzy. Ele não disse nada por um momento, apenas acendeu um cigarro e ofereceu um a Izzy. Izzy aceitou com um aceno de cabeça.

"Ele sempre faz essa merda," Slash disse finalmente, sua voz baixa, só para Izzy ouvir. "É parte do show. Não significa nada."

Izzy deu uma tragada longa, sentindo a fumaça queimar seus pulmões. "Eu sei," ele mentiu, sua voz rouca.

Slash olhou para ele, seus olhos escuros sérios sob a aba do chapéu. "Não, você não sabe. Se soubesse, não estaria aí se desfazendo."

Izzy não respondeu. Não podia. A verdade era que aquele beijo significava algo. Significava que Axl podia tocá-lo, beijá-lo, cuidar dele em seus piores momentos, e depois seguir em frente e fazer a mesma coisa com uma fã aleatória. Significava que, para Axl, talvez tudo fosse realmente apenas um show.

"Vamos dar um rolê depois," Slash sugeriu, jogando a ponta do cigarro no chão e esmagando-a. "Só nós dois. Tomar uma cerveja longe dessa bagunça."

Era uma oferta de trégua. Uma oferta de amizade em meio à guerra silenciosa que Izzy travava consigo mesmo e com Axl. Izzy olhou para Slash, para o único homem naquela banda que parecia genuinamente tentar entender, e não apenas julgar.

"Okay," Izzy concordou, sua voz um sussurro. "Tá bom."

Enquanto Slash se afastava para pegar sua jaqueta, Izzy olhou através do camarim lotado. Axl estava no centro, a groupie ainda grudada nele, rindo de algo que alguém dissera. Seus olhos encontraram os de Izzy por um segundo. Desta vez, não havia preocupação. Havia um desafio. Um "e aí, você viu?" mudo.

Izzy desviou o olhar primeiro. Ele pegou seu caso de guitarra e se virou para seguir Slash para fora dali. A dor era uma bola de chumbo em seu estômago, mas ele a carregaria, como sempre carregou. Sozinho. Mas talvez, pela primeira vez, não completamente sozinho. Porque naquela noite, ele tinha Slash. E naquele mundo insano, isso talvez fosse o suficiente para não se afogar completamente.

O bar era tudo o que o mundo do Guns N' Roses não era. Escuro, silencioso, cheirando a cerveja velha e madeira encerada, sem fãs, sem holofotes, sem expectativas. Era o tipo de lugar para onde Slash ia quando o circo ficava grande demais.

Ele conduziu Izzy para um boteco na Santa Monica, um daqueles lugares que só existiam nos becos, longe do glamour do Sunset Strip. O dono, um velho de braços tatuados, apenas acenou para Slash e trouxe duas cervejas sem precisar perguntar.

Eles sentaram em um booth no fundo, a madeira rachada e o couro gasto. O silêncio entre eles era diferente do do apartamento – era mais cômodo, menos carregado de fantasmas.

Slash pegou seu copo e tomou um longo gole. "Porra, que noite," ele resmungou, esfregando o rosto.

Izzy apenas assentiu, girando seu próprio copo na mesa, observando as bolhas subirem. A imagem do beijo de Axl ainda queimava em sua retina.

"Ele não faz por mal, sabia?" Slash disse, como se lesse seus pensamentos. "É só... o jeito dele de sobreviver àquela merda toda. De provar que ainda é o cara."

"Eu sei como ele é," Izzy respondeu, sua voz saindo mais áspera do que pretendia. "Eu o conheço há mais de dez anos, porra."

Slash olhou para ele através da penumbra. "Então devia saber que aquilo lá não significa porra nenhuma. É só performance." Ele fez uma pausa. "Diferente de... outras coisas."

Izzy sentiu as palavras como um golpe baixo. Ele ergueu os olhos, encontrando o olhar sério de Slash. Havia uma compreensão lá que o deixou desconfortável. Quanto Slash realmente sabia? Suspeitava?

"Que outras coisas?" Izzy perguntou, desafiador.

Slash deu de ombros, um gesto típico dele. "Sei lá. Coisas que não são performance." Ele tomou outro gole de cerveja. "Coisas que importam."

Eles ficaram em silêncio por um momento, o som baixo de um jukebox tocando blues antigo preenchendo o espaço entre eles.

"Eu não estou bem, Slash," a confissão saiu de Izzy antes que ele pudesse parar. Baixa, quase um sussurro, mas no silêncio do bar, soou como um grito.

Slash não pareceu surpreso. "Eu sei, cara. Todo mundo sabe."

"E o que eu faço?" A pergunta era de um desespero tão genuíno que até Izzy se surpreendeu por tê-la feito.

Slash olhou para ele por um longo momento, seus olhos escuros sérios. "Você para de tentar carregar o mundo sozinho, Iz. Essa porra de 'homem forte e silencioso' só funciona até certo ponto." Ele apontou o copo para Izzy. "A gente é uma banda, porra. Uma porra de uma família disfuncional do caralho, mas é o que a gente tem. Você não precisa fazer isso sozinho."

"O Axl—" Izzy começou, mas Slash o interrompeu.

"O Axl é uma merda de um caso à parte," ele disse, secamente. "Ele tá tão perdido quanto você, só que o jeito dele de lidar é fazendo mais barulho." Ele se inclinou para frente sobre a mesa. "Mas você tem a mim. Você tem o Duff. Porra, até o Steven se importa, no jeito dele. A gente pode te ajudar, mas você tem que deixar."

Izzy olhou para o amigo, realmente olhou. Slash, o guitarrista lendário, o party animal, estava ali, em um bar sujo, tentando jogar uma corda de salvação para ele. Era mais do que ele esperava. Mais do que ele sentia que merecia.

"Eu... eu não sei como," Izzy admitiu, sua voz falhando.

"Começa não se trancando no quarto," Slash disse, um sorriso pequeno tocando seus lábios. "E talvez não usando mangas compridas no calor da porra de Los Angeles." Seu olhar foi significativo, mas sem julgamento. "A gente começa por aí."

A simples menção às mangas fez Izzy se encolher internamente, lembrando-se dos segredos que ele ainda carregava sob o tecido. Mas pela primeira vez, a ideia de não carregá-los sozinho não parecia aterrorizante. Parecia... possível.

Ele tomou um gole longo de sua cerveja, sentindo o líquido frio descer por sua garganta. O bar era seguro. Slash era seguro.

"Tá bom." Izzy disse, sua voz um pouco mais firme.

Slash acenou com a cabeça, satisfeito. "Bom. Agora me fala uma coisa... você ainda tem aquele riff que você tava trabalhando no mês passado? Aquela coisa meio bluesy?"

A pergunta era sobre música. Algo normal. Algo seguro. E era um começo.

Enquanto eles conversavam sobre riffs e acordes, o peso no peito de Izzy não desapareceu. A dor do beijo de Axl ainda estava lá, latejante. A escuridão ainda o aguardava em casa. Mas naquele bar, naquele momento, com um copo de cerveja na mão e um amigo do seu lado, ele não estava sozinho. E pela primeira vez em muito tempo, isso fez toda a diferença.

A trégua no bar se transformou em uma nova rotina. Slash, percebendo que Izzy precisava de uma âncora que não fosse Axl, tornou-se presença constante. Eles não falavam muito sobre sentimentos – não era o estilo deles – mas a companhia era suficiente.

Os ensaios continuavam tensos, mas agora Izzy tinha um porto seguro. Quando Axl entrava em uma de suas crises de perfeccionismo, gritando com todos, Slash trocava um olhar rápido com Izzy, um quase-imperceptível revirar de olhos que dizia "ignore o drama queen". Era um código silencioso, uma aliança.

E foi essa aliança que começou a chamar a atenção. A atenção errada.

No apartamento, Izzy e Slash passavam horas no quarto que dividiam. A porta ficava fechada, mas não trancada. Dentro, não havia segredos obscuros – apenas dois homens que compartilhavam uma linguagem musical. Slash ensaiava solos, Izzy trabalhava em riffs de base, e a música, pela primeira vez em semanas, voltou a fazer um pouco de sentido para Izzy. Era um espaço seguro, longe do julgamento de Axl.

Mas para Axl, parado do outro lado do corredor em seu quarto trancado, aquele silêncio por trás da porta era mais suspeito que qualquer barulho. Ele ouvia os sussurros abafados, o som baixo das guitarras, a risada rara e rouca de Izzy que ele mesmo não conseguia provocar há tempos.

O ciúme, venenoso e irracional, começou a fermentar nele.

Ele via Slash e Izzy saindo juntos para comer, voltando com sacolas de comida que não eram compartilhadas com o resto da casa. Via a cumplicidade entre eles, a maneira como Slash, sem ser óbvio, colocava-se sempre entre Izzy e qualquer potencial estresse.

Uma tarde, após um ensaio particularmente brutal onde Axl criticara cada nota de Izzy com uma fúria que parecia pessoal, Slash se aproximou de Izzy no camarim e disse baixo: "Vamos dar um rolê de moto. Limpa a cabeça."

Izzy, pálido e abatido, apenas assentiu. Quando eles saíram, Axl os viu da janela, Slash dando uma jaqueta de couro extra para Izzy – uma jaqueta que Axl reconheceu como sendo a preferida de Slash.

Foi a gota d'água.

Naquela noite, quando Izzy voltou para o quarto que dividia com Slash, ele encontrou Axl parado no corredor, encostado na parede, os braços cruzados. Seus olhos estavam escuros, sua boca uma linha fina.

"Tá ficando bem próximo do Slash, hein, Stradlin?" a voz de Axl saiu gelada, carregada de insinuação.

Izzy parou, sua mão ainda na maçaneta. "Ele é meu amigo."

"Amigo," Axl repetiu, o tom sendo de deboche. "É isso que tão chamando agora? Passar horas trancados no quarto? Sair pra passeios de moto? É um novo tipo de 'amizade' muito conveniente, não é?"

Izzy sentiu um calafrio percorrer sua espinha. Ele puxou as mangas do seu moletom para baixo, um gesto nervoso. "Não é o que você tá pensando."

"E o que eu estou pensando, Izzy?" Axl deu um passo à frente, invadindo seu espaço. Seu cheiro, uma mistura de uísque e raiva, envolveu Izzy. "Porque do meu ponto de vista, parece que você arrumou um substituto. Alguém menos complicado. Alguém que não exige tanto... cuidado."

A palavra foi cuspida como um insulto.

"Ele não é um substituto!" A voz de Izzy saiu mais alta do que ele pretendia, um fio de pânico nela. A ideia de que Axl pudesse pensar algo assim era aterrorizante. "Ele só... ele tá me ajudando."

"Ajudando como?" Axl insistiu, seus olhos azuis queimando com intensidade perigosa. "O que exatamente ele tá fazendo por você que eu não posso fazer? O que tem de tão especial nos passeios de moto e nas sessões de guitarra dele?"

Havia uma dor genuína por trás da fúria de Axl, uma confusão ferida que Izzy conseguia ver, mas não sabia como consertar. Como explicar que Slash era um porto seguro justamente porque não era Axl? Porque não carregava o peso da história deles, da rejeição, da culpa?

"Ele não é você," Izzy sussurrou, a verdade saindo antes que ele pudesse parar.

A expressão de Axl se transformou. A raiva deu lugar a algo mais cru, mais machucado. Ele balançou a cabeça, um movimento lento e descrente.

"É," ele disse, sua voz agora baixa e vazia. "É isso mesmo. Ele não é eu."

Ele deu as costas e começou a andar pelo corredor, parando na porta de seu próprio quarto.

"Só toma cuidado, Iz," ele disse, sem se virar. "Às vezes, quando a gente tá se afogando, a gente se agarra em qualquer coisa que flutua. Mas nem tudo que flutua é uma tábua de salvação. Às vezes é só... lixo."

A porta do quarto de Axl se fechou com um baque surdo, ecoando no corredor silencioso.

Izzy ficou parado ali, tremendo. As palavras de Axl o atingiram como mil agulhas. Ele olhou para a porta do quarto que dividia com Slash, um santuário de normalidade, e então para a porta fechada de Axl, um monumento a tudo que estava quebrado entre eles.

Ele entrou no quarto e trancou a porta atrás de si. Slash não estava. Sozinho, ele se encostou na porta e deslizou até o chão, enterrando o rosto nos joelhos. O tecido grosso do moletom esfregou contra as cicatrizes em seus braços, um lembrete físico de sua dor.

Ele estava se agarrando a Slash para não se afogar. Mas Axl tinha razão – isso estava machucando ele, estava alimentando seu ciúme doentio e afastando-os ainda mais. Ele estava preso entre a âncora que o mantinha à tona e o farol que, mesmo distante, ainda era o único que ele realmente queria alcançar. E ele não sabia como ter os dois.

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A noite foi longa e inquieta para Izzy. As palavras de Axl ecoaram em sua mente, cada uma uma facada. "Lixo." Ele se sentiu exatamente assim – como algo descartável que Axl via sendo recolhido por outro. A raiva, um sentimento que ele há muito não permitia sentir, começou a ferver sob a superfície de sua apatia.

Na manhã seguinte, ele acordou com uma determinação nova e frágil. Ele sabia que não podia continuar naquela guerra fria. Ele estava cansado de ser um fantasma em sua própria vida.

Ele esperou Slash sair para um compromisso. Esperou o apartamento ficar silencioso. Então, ele se dirigiu à porta do quarto de Axl e bateu, não com hesitação, mas com firmeza.

"Não estou a fim, Slash," a voz cansada de Axl veio de dentro.

"Sou eu," Izzy disse, sua voz mais grave do que o normal.

Houve um silêncio prolongado. Então, o som da tranca sendo girada. A porta se abriu.

Axl estava de pé, com roupas amarrotadas, o cabelo despenteado e os olhos inchados. Ele parecia tão acabado quanto Izzy se sentia.

"O que você quer?" Axl perguntou, sua voz áspera.

"Precisamos falar," Izzy disse, empurrando a porta e entrando no quarto antes que Axl pudesse protestar.

O quarto estava uma bagunça – roupas no chão, garrafas vazias, partituras espalhadas. Era a imagem externa do caos interno de Axl.

"Falar?" Axl riu, um som seco e amargo. "Agora você quer falar? Depois de semanas me tratando como um estranho? Depois de trocar ideia com o Slash como se eu não existisse?"

"Eu não troquei você por ninguém!" Izzy explodiu, a raiva que ele mantinha contida transbordando. "Porra, Axl! Você acha que é fácil? Você acha que é fácil ver você todo dia e lembrar de tudo que eu estraguei? Lembrar que eu fui eu que empurrei você pra longe quando você só tentava me ajudar?"

Axl pareceu surpreso com a explosão. Ele ficou em silêncio, observando Izzy, que respirava ofegante.

"Eu me cortei, Axl!" A confissão saiu como um grito, cheia de vergonha e dor. Izzy puxou as mangas do moletom para cima, revelando os braços marcados por linhas vermelhas e roxas, algumas recentes, outras cicatrizando. "Viu? É isso que eu me tornei! Um covarde que marca a própria pele porque não aguenta a dor de dentro! E você lá, beijando groupies no palco como se eu não existisse!"

Os olhos de Axl se arregalaram, fixos nos braços de Izzy. A raiva dele se dissipou instantaneamente, substituída por um horror silencioso. Ele deu um passo à frente.

"Izzy... meu Deus... aquela groupie não significou nada..."

"E o que significa alguma coisa, Axl?" Izzy continuou, as lágrimas começando a rolar livremente agora. "O Slash é a única coisa que me impede de fazer algo pior! A única pessoa que me trata como se eu ainda fosse um ser humano, e não um fardo ou um... um lixo!"

A última palavra saiu como um soluço.

Axl fechou a distância entre eles. Suas mãos agarram os braços de Izzy com urgência. "Eu não quis dizer aquilo. Eu só... eu te vi com ele e... eu não aguento te perder."

"Você não me perdeu pro Slash! Você me perdeu porque eu soub que não mereço você!"

"Eu não quero alguém perfeito! Eu te quero você!" Axl gritou, puxando Izzy contra ele.

E então, não havia mais palavras. O beijo foi desesperado, caótico, cheio de lágrimas salgadas. Mãos tremendo enquanto arrancavam roupas, não por desejo, mas por necessidade de sentir a pele um do outro, de provar que ainda existiam um para o outro.

Quando Axl o penetrou, foi com uma mistura de fúria e devoção. Cada movimento era uma afirmação - "Você é meu". E cada gemido de Izzy era uma rendição - "Eu sou seu". Era áspero, intenso, carregado de semanas de dor acumulada. Axl beijava as cicatrizes nos braços de Izzy entre um movimento e outro, sussurrando "desculpa" e "te amo" em um mesmo suspiro.

Depois, deitados entrelaçados na cama bagunçada, a respiração deles voltou ao normal. Axl traçou suavemente as cicatrizes no braço de Izzy.

"Nunca mais," ele sussurrou. "E nunca mais ninguém. Só nós dois."

Izzy enterrou o rosto no pescoço de Axl. "Só nós dois," ele repetiu, como um juramento.

Pela primeira vez em semanas, Izzy sentiu que talvez houvesse uma luz. Ele ainda estava quebrado, mas não estava mais sozinho. Axl estava de volta, segurando a âncora, e desta vez, Izzy não teria forças para soltá-la.

A poeira do confronto e da paixão começou a assentar. O quarto estava mergulhado em penumbra, o ar pesado com o cheiro de sexo, suor e lágrimas secas. Axl não se afastou. Seu corpo permaneceu sobre o de Izzy, um peso quente e familiar que, em vez de oprimir, ancorava. A respiração ofegante de ambos foi aos poucos se acalmando, sincronizando, até se tornar um único ritmo no silêncio do quarto.

Axl foi o primeiro a se mover. Com uma delicadeza que contrastava brutalmente com a intensidade do sexo, ele desceu pelo corpo de Izzy. Seus lábios, que momentos antes haviam mordido e sido mordidos com fúria, agora tocavam as cicatrizes nos braços de Izzy com uma reverência que fez o guitarrista estremecer. Cada toque era um pedido de desculpas, cada beijo suave uma promessa.

"Eu nunca mais vou deixar você se sentir assim," a voz de Axl era um sussurro áspero contra a pele marcada. "Nunca mais, Izzy. Eu juro."

Izzy não conseguia falar. Um novo tipo de lágrima, limpa e quente, escorreu de seus olhos, molhando o travesseiro. Ele enterrou os dedos nos cabelos ruivos e úmidos de Axl, puxando-o para mais perto, permitindo que aquele cuidado lavasse parte da vergonha que carregava.

Lentamente, Axl subiu novamente, deitando-se ao lado dele e envolvendo-o em seus braços. Eles ficaram assim, entrelaçados, a pele grudada pelo suor, ouvindo os batimentos cardíacos um do outro acalmarem.

"Eu não beijei aquela groupie porque quis," Axl disse, quebrando o silêncio, sua voz baixa perto do ouvido de Izzy. "Foi... automático. Parte do show. Parte da porra do personagem. Mas quando eu te vi assistindo... porra, Iz, eu vi sua alma se partindo e eu... eu não consegui parar."

"Eu sei," Izzy sussurrou, sua voz rouca. "Eu sei como o show é. Mas doeu. Doeu porque... porque aqui," ele levou a mão de Axl até seu próprio peito, sobre o coração, "aqui ainda é só seu. Sempre foi."

Axl apertou a mão contra o peito de Izzy, como se pudesse segurar aquele coração. "E o meu é seu," ele respondeu, simplesmente. "Só seu. Não importa quantas groupies subam no palco. Não importa quantas fotos a imprensa tire. O que importa é isso aqui. Nós dois. Sempre foi."

Eles ficaram em silêncio novamente, mas desta vez o silêncio era diferente. Não era pesado ou carregado. Era pacífico. Curativo. A guerra entre eles havia cessado, pelo menos por enquanto.

Axl começou a passar os dedos pelos cabelos de Izzy, da mesma forma paciente e metódica de semanas atrás, mas agora sem a dor da distância entre eles. Era um gesto de posse, sim, mas também de profunda ternura.

"Você vai ficar bem," Axl murmurou, não como uma pergunta, mas como uma declaração. "Nós vamos ficar bem."

Izzy fechou os olhos, afundando no toque e no calor. A escuridão ainda estava lá, nos cantos de sua mente, esperando. As cicatrizes em seus braços ainda doíam. Mas pela primeira vez, ele realmente acreditou que talvez, com Axl segurando sua mão, ele pudesse aprender a navegar por ela, em vez de se afogar.

O som da porta da frente do apartamento se abrindo e os passos desengonçados de Slash ecoaram no corredor. Por um instante, Izzy sentiu o corpo de Axl tensionar. Mas então, ele relaxou, puxando Izzy mais perto ainda.

"Deixa ele," Axl sussurrou. "Deixa todo mundo. Por agora, é só nós."

E era verdade. Naquele quarto, naquele momento, não existiam Guns N' Roses, não existiam fãs, não existiam groupies ou expectativas. Existiam apenas Axl e Izzy. Dois homens quebrados tentando se remendar um ao outro, encontrando na bagunça que eram a única coisa que sempre fizeram sentido. A âncora estava lançada. E pela primeira vez, Izzy sentiu que talvez pudesse parar de lutar contra a correnteza e simplesmente... flutuar.

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O sono que veio para Izzy foi o primeiro sono verdadeiramente reparador em meses. Não foi a fuga inconsciente do álcool ou o colapso exausto da exaustão mental. Foi um sono profundo, pesado, envolto no calor e no cheiro familiar de Axl. Não houve pesadelos. Apenas um vazio silencioso e pacífico.

Ele acordou com a sensação de peso e calor. Axl ainda estava lá. Não havia se afastado durante a noite. Seu braço estava jogado sobre a cintura de Izzy, seu rosto enterrado na nuca dele, respirando calmamente. A luz da manhã filtrada pelas cortinas sujas pintava listras douradas na poeira que dançava no ar. O apartamento estava silencioso, um milagre raro.

Izzy não se moveu. Permaneceu deitado, absorvendo a rara sensação de segurança. Os braços ainda latejavam sob as mangas do moletom que ele havia vestido novamente após o sexo – um hábito difícil de quebrar. Mas a dor era diferente agora. Já não era um lembrete agudo de fracasso, mas sim uma cicatrização, uma promessa de que a pior parte talvez tivesse passado.

Axl mexeu-se atrás dele, um murmúrio sonolento escapando de seus lábios contra a pele de Izzy. Seu braço se apertou levemente em volta de sua cintura.

"Você está acordado?" a voz de Axl era áspera de sono, um sussurro quente em seu ouvido.

Izzy acenou com a cabeça, sem se virar. "Estou"

Eles ficaram em silêncio por um longo momento. O mundo lá fora começava a acordar. O som dos carros no Sunset Strip, o latido distante de um cachorro. A vida continuava. Mas dentro daquele quarto, o tempo parecia ter parado.

"Estou com fome," Axl declarou, seu queixo esfregando o ombro de Izzy. "Vamos fazer café da manhã."

Era uma ideia tão comum, tão doméstica, que quase doeu. Café da manhã. Algo que casais normais faziam. Algo que eles não faziam há uma eternidade.

"Tá," Izzy concordou, sua voz ainda rouca.

Axl se soltou dele e sentou na cama, espreguiçando-se. Seu cabelo ruivo estava um caos absoluto, e havia uma paz em seus olhos que Izzy não via há muito tempo. Ele olhou para Izzy, e um pequeno sorriso tocou seus lábios.

"Você parece uma merda," Axl disse, mas o tom era afetuoso.

"Você também," Izzy retruou, e pela primeira vez em semanas, um sorriso genuíno, ainda que pequeno e cansado, surgiu em seu rosto.

Era estranho. A dor ainda estava lá, pairando como um fantasma nos cantos do quarto. As palavras cruéis ainda ecoavam em suas memórias. As cicatrizes ainda marcavam sua pele. Mas naquele momento, vestindo um moletom suado em uma cama bagunçada, com Axl Rose sorrindo para ele como se ainda houvesse um "eles" para salvar, Izzy sentiu algo que pensara ter perdido para sempre: um fio de esperança.

Axl se levantou e estendeu a mão para ele. "Vem. Antes que os outros acordem e estraguem nosso silêncio."

Izzy olhou para a mão estendida. A mesma mão que havia batido em paredes, que havia agarrado um microfone com fúria, que havia acariciado seu rosto com uma paciência infinita. Ele pegou a mão de Axl e se deixou puxar para cima.

O caminho até a cozinha foi silencioso, suas mãos ainda entrelaçadas. O apartamento estava um caos, mas pela primeira vez, não parecia um reflexo de sua desintegração interna. Parecia apenas... uma casa. Uma casa bagunçada, disfuncional, mas uma casa, no entanto.

Enquanto Axl remexia na geladeira em busca de comida, Izzy se encostou no balcão, observando-o. A maré dentro dele ainda se movia, mas a âncora estava firme. A tempestade não havia passado, mas ele finalmente acreditou que poderia aprender a navegar nela. Com Axl ao leme, talvez eles não apenas sobrevivessem. Talvez, um dia, eles pudessem realmente encontrar a costa.

A cozinha do apartamento era um retrato fiel da vida deles: caótica, mal equipada, mas com seus próprios rituais estabelecidos. Axl abriu a geladeia e franziu o nariz.

"Tem ovo velho, manteiga meio derretida e... caralho, o que é isso verde no tupperware?" ele resmungou, cutucando um recipiente duvidoso.

Izzy encostou-se no balcão, observando a cena com um cansaço que já não era mais desesperador, apenas resignado. "Tem pão. E café. É o que importa."

Axl fechou a geladeira com um baque. "Merda, você tá certo. O básico." Ele pegou a velha cafeteira italiana, enchendo-a com água e pó com uma familiaridade que surpreendeu Izzy. Axl nunca fora o tipo de fazer coisas domésticas.

Enquanto o café começava a borbulhar, enchendo a cozinha com seu aroma rico e terroso, Axl pegou duas fatias de pão de forma e as colocou na torradeira velha e manchada. Ele se movia com uma concentração incomum, como se fazer aquele café da manhã simples fosse a tarefa mais importante do mundo.

Izzy ficou quieto, absorvendo aquele momento de normalidade surreal. Axl Rose, o furacão em forma de homem, tentando torrar pão para eles em uma manhã de quarta-feira comum. Era tão absurdo que era quase bonito.

A torradeira saltou com um clique. Axl pegou as fatias douradas e as passou na manteiga meio derretida, espalhando-a de forma desigual. Ele colocou um prato na frente de Izzy e outro no balcão para si mesmo.

O café estava pronto. Axl encheu duas canecas desiguais – uma do Guns N' Roses, outra de um bar qualquer – e colocou uma na frente de Izzy.

"Pronto," ele disse, como se tivesse acabado de preparar um banquete.

Eles ficaram em pé no balcão da cozinha, comendo o pão torrado e bebendo o café em silêncio. O pão estava um queimado nas bordas e a manteiga não estava bem derretida, mas para Izzy, foi a melhor refeição que teve em meses.

Axl observou Izzy enquanto ele comia, seus olhos acompanhando cada movimento. "Você precisa ganhar um pouco de peso, Stradlin," ele comentou entre uma mordida e outra. "Esá parecendo um fantasma."

"É o estilo rock and roll," Izzy respondeu, um eco seco de seu antigo humor.

Axl quase sorriu. "É, bem punk. Mas come mesmo assim."

Quando terminaram, Axl pegou os pratos vazios e os colocou na pia. Ele então se virou e encarou Izzy, seus olhos ficando sérios novamente.

"O show de hoje à noite..." ele começou, hesitante.

Izzy sentiu um frio na espinha. A ideia de voltar ao palco, de enfrentar as luzes e a multidão, fez seu estômago embrulhar.

"Você não precisa tocar se não tiver pronto," Axl disse rapidamente, lendo o medo em seu rosto. "Eu invento alguma coisa. Digo que você tá doente de verdade."

Mas Izzy balançou a cabeça. Ele estava cansado de se esconder. Cansado de ser o elo fraco. "Eu vou. Vou tocar."

Axl estudou seu rosto por um longo momento, como se procurasse por sinais de que ele ia desmoronar. "Tem certeza?"

"Tenho," Izzy disse, e surpreendeu a si mesmo ao perceber que era verdade. "Mas... você para de ficar me olhando como se eu fosse explodir a qualquer minuto. Toca a porra do show normal."

Um sorriso lento se espalhou pelo rosto de Axl. Era um daqueles raros sorrisos genuínos que alcançavam seus olhos. "Tá bom, Stradlin. Mas se você... se precisar..."

"Eu sei," Izzy interrompeu. "Eu sei."

Slash apareceu na cozinha, ainda com os olhos pesados de sono, mas seu olhar foi direto para Izzy, depois para Axl, e então para os dois juntos. Uma sobrancelha se ergueu levemente sob sua franja, mas ele não comentou. Ele apenas pegou a cafeteira e encheu sua própria caneca.

"Café da manhã romântico?" Slash perguntou, o canto de sua boca se curvando em um meio sorriso.

"Foda-se, Slash," Axl resmungou, mas sem sua habitual aspereza. Era quase um cumprimento.

Izzy manteve-se quieto, sentindo o calor subir em seu rosto. Ele puxou instintivamente as mangas do moletom, um gesto que não passou despercebido por nenhum dos dois homens na sala.

Slash se inclinou contra o balcão ao lado de Izzy. "Tudo bem, cara?" ele perguntou, baixo o suficiente para só Izzy ouvir.

Izzy acenou com a cabeça, evitando o olhar. "Tá."

Slash não pareceu convencido, mas aceitou a resposta com um aceno. "Se precisar de algo... você sabe."

Enquanto Slash se virava para peber seu café, Izzy sentiu o olhar de Axl sobre ele. Era um olhar pesado, protetor, quase possessivo. Axl não estava mais apenas olhando para Izzy; ele estava vigilante. Seus olhos azuis seguiam cada movimento, cada piscar de olhos, cada pequeno tremor nas mãos de Izzy.

Mais tarde, quando Izzy foi para o quarto que dividia com Slash para se trocar para o ensaio, Axl apareceu na porta.

"Deixa a porta aberta," Axl disse, sua voz não deixando espaço para discussão.

Izzy parou, a mão na gola do moletom que ele ia tirar. "Por quê?"

"Porque eu quero," Axl respondeu, cruzando os braços e se apoiando no batente da porta. Seu olhar era intenso, fixo em Izzy. Era claro que ele não estava apenas sendo controlador; ele estava com medo. Medo do que Izzy poderia fazer sozinho atrás de uma porta fechada.

Slash, que estava amarrando seus tênis no outro lado do quarto, olhou para os dois e depois para o chão, entendendo o subtexto. Ele se levantou. "Vou lá fora fumar um", disse, escorregando pela porta e passando por Axl com um aceno de cabeça.

Axl entrou no quarto, fechando a porta atrás de si, mas não a trancou. Ele se aproximou de Izzy.

"Deixa eu ver," Axl pediu, sua voz mais suave agora.

Izzy congelou. "O quê?"

"Os seus braços, Izzy. Deixa eu ver como estão."

A vergonha queimou o rosto de Izzy. Ele balançou a cabeça, recuando um passo. "Não. Já viram o suficiente."

"Eu não vi o suficiente," Axl insistiu, fechando a distância entre eles. Sua mão tocou o braço de Izzy sobre o tecido do moletom. "Eu preciso saber. Preciso saber que você tá melhorando."

"E se eu não estiver?" a pergunta saiu como um sussurro quebrado. "E se eu nunca melhorar de verdade, Axl? O que você vai fazer?"

A expressão de Axl ficou séria, seus olhos procurando os de Izzy. "Eu vou ficar aqui do mesmo jeito. Todo santo dia. Até você acreditar que merece ficar melhor."

Ele não esperou permissão. Com movimentos lentos, mas firmes, suas mãos encontraram as mangas do moletom de Izzy e começaram a puxá-las para cima.

Izzy fechou os olhos, sentindo o pânico misturado com um estranho alívio. O ar frio do quarto atingiu sua pele conforme Axl revelava os antebraços. As marcas vermelhas e roxas, algumas frescas, outras já cicatrizando em linhas brancas, estavam todas lá. Um mapa de sua dor.

Axl emitiu um som baixo, um misto de dor e raiva contida. Seus dedos traçaram as cicatrizes mais antigas com uma ternura que fez Izzy estremecer.

"Nunca mais," Axl sussurrou, sua voz grossa de emoção. "Por favor, Izzy. Promete pra mim."

As lágrimas welled nos olhos de Izzy novamente, mas desta vez ele não as lutou. Ele deixou que escorressem silenciosamente enquanto Axl examinava cada marca, como se pudesse, com o toque, apagar a dor que as causou.

"Eu prometo tentar," Izzy finalmente sussurrou, a promessa mais honesta que poderia fazer.

Era o suficiente. Axl puxou as mangas de volta para baixo, não como uma forma de esconder a evidência, mas como um gesto de proteger aquela promessa frágil. Ele puxou Izzy para um abraço forte, seu rosto enterrado no cabelo dele.

"Eu estou de olho em você, Stradlin," Axl murmurou contra seu couro cabeludo. "Sempre vou estar."

E pela primeira vez, em vez de se sentir sufocado por aquele cuidado obsessivo, Izzy se sentiu... protegido. A âncora não era mais um peso; era uma linha salva-vidas. E ele finalmente estava pronto para segurá-la também.

 

💫 Fim.